quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Concílio Vaticano II - DECRETOS.


Decretos

DECRETO
AD GENTES
SOBRE A ATIVIDADE
MISSIONÁRIA DA IGREJA

PROÉMIO

A vocação missionária da Igreja

1. A Igreja, enviada por Deus a todas as gentes para ser «sacramento universal de salvação», (1) por íntima exigência da própria catolicidade, obedecendo a um mandato do seu fundador (2), procura incansàvelmente anunciar o Evangelho a todos os homens. Já os próprios Apóstolos em que a Igreja se alicerça, seguindo o exemplo de Cristo, «pregaram a palavra da verdade e geraram as igrejas» (3). Aos seus sucessores compete perpetuar esta obra, para que «a palavra de Deus se propague ràpidamente e seja glorificada (2 Tess. 3,1), e o reino de Deus seja pregado e estabelecido em toda a terra.

No estado actual das coisas, de que surgem novas condições para a humanidade, a Igreja, que é sal da terra e luz do mundo (4), é com mais urgência chamada a salvar e a renovar toda a criatura, para que tudo seja instaurada em Cristo e n'Ele os homens constituam uma só família e um só Povo de Deus.

Por isso, este sagrado Concílio, agradecendo a Deus a grandiosa obra já realizada pelo esforço generoso de toda a Igreja, deseja delinear os princípios da actividade missionária e reunir as forças de todos os fiéis, para que o Povo de Deus, continuando a seguir pelo caminho estreito da cruz, difunda por toda a parte o reino de Cristo, Senhor e perscrutador dos séculos (5), e prepare os caminhos para a sua vinda.

CAPÍTULO I

PRINCÍPIOS DOUTRINAIS

Desígnio do Pai

2. A Igreja peregrina é, por sua natureza, missionária, visto que tem a sua origem, segundo o desígnio de Deus Pai, na «missão» do Filho e do Espírito Santo (6).

Este desígnio brota do «amor fontal», isto é, da caridade de Deus Pai, que, sendo o Princípio sem Princípio de quem é gerado o Filho e de quem procede o Espírito Santo pelo Filho, quis derramar e não cessa de derramar ainda a bondade divina, criando-nos livremente pela sua extraordinária e misericordiosa benignidade, e depois chamando-nos gratuitamente a partilhar da sua própria vida e glória. Quis ser, assim, não só criador de todas as coisas mas também «tudo em todas as coisas» (1 Cor. 15,28), conseguindo simultâneamente a sua glória e a nossa felicidade. Aprouve, porém, a Deus chamar os homens a esta participação na sua vida, não só de modo individual e sem qualquer solidariedade mútua, mas constituindo-os num Povo em que os seus filhos, que estavam dispersos, se congregassem em unidade (7).

Missão do Filho

3. Este desígnio universal de Deus para a salvação do género humano realiza-se não sòmente dum modo quase secreto na mente humana, ou por esforços, ainda que religiosos, pelos quais os homens de mil maneiras buscam. a Deus a ver se conseguem chegar até Ele ou encontrá-l'O, embora Ele não esteja longe de cada um de nós (cfr. Act. 17, 27); com efeito, estes esforços precisam de ser iluminados e purificados, embora, por benigna determinação da providência de Deus, possam algumas vezes ser considerados como pedagogia ou preparação evangélica para o Deus verdadeiro (8). Para estabelecer a paz ou a comunhão com Ele e uma sociedade fraterna entre os homens, apesar de pecadores, Deus determinou entrar de modo novo e definitivo na história dos homens, enviando o seu Filho na nossa carne para, por Ele, arrancar os homens ao poder das trevas e de satanás (9) e n'Ele reconciliar o mundo consigo (10). Constituiu, portanto, herdeiro de todas as coisas Aquele por quem fizera tudo(11), para n'Ele tudo restaurar (12).

Cristo Jesus, de facto, foi enviado ao mundo como verdadeiro mediador entre Deus e os homens. Como é Deus, n'Ele habita corporalmente toda a plenitude da divindade (Col. 2,9); e sendo o novo Adão pela sua natureza humana, é constituído cabeça da humanidade renovada, cheio de graça e de verdade (Jo. l,14). Assim, o Filho de Deus, pelo caminho duma verdadeira Incarnação, veio para fazer os homens participantes da sua natureza divina e, sendo rico, fez-se por nós necessitado para que nos tornássemos ricos da sua pobreza (13). O Filho do Homem não veio para que o servissem, mas para ser ele a servir e para dar até a sua vida em redenção por muitos, isto é, por todos (14). Os santos Padres constantemente proclamam nada estar remido que não tivesse sido primeiro assumido por Cristo (15). Ora ele assumiu por inteiro a natureza humana tal qual ela existe em nós, pobres e miseráveis, rejeitando dela apenas o pecado (16). De si mesmo disse Cristo, a quem o Pai santificou e enviou ao mundo (cfr. Jo. 10,36): «O Espírito do Senhor está sobre mim; por isso me ungiu e me enviou a anunciar a boa nova aos pobres, a sarar os contritos de coração, a proclamar a libertação dos cativos e a restituir a vista aos cegos» (Lc. 4,18). E outra vez: «Veio o Filho do Homem para buscar e salvar o que estava perdido» (Lc. 19,10).

Aquilo que uma vez foi pregado pelo Senhor ou aquilo que n'Ele se operou para salvação do género humano, deve ser proclamado e espalhado até aos confins da terra (17), começando por Jerusalém (18), de modo que tudo quanto foi feito uma vez por todas, pela salvação dos homens, alcance o seu efeito em todos, no decurso dos tempos.

Missão do Espírito Santo

4. Para isso, precisamente, enviou Cristo o Espírito Santo da parte do Pai, para realizar no interior das almas a sua obra salvadora e impelir a Igreja à sua própria dilatação. Não há dúvida de que o Espírito Santo já actuava no mundo antes de Cristo ser glorificado (19). Contudo, foi no dia de Pentecostes, em que desceu sobre os discípulos para ficar para sempre com eles (20), que a Igreja foi pùblicamente manifestada diante duma grande multidão, que a difusão do Evangelho entre os gentios por meio da pregação . teve o seu início, e que, finalmente, a união dos povos numa catolicidade de fé foi esboçada de antemão na Igreja da nova Aliança, a qual fala em todas as línguas e entende e abraça todas as línguas na sua caridade, superando assim a dispersão de Babel (21). Pelo Pentecostes começaram os «actos dos Apóstolos», como pela descida do Espírito Santo sobre Maria fora concebido Cristo, e como pela descida do mesmo Espírito Santo sobre Cristo, quando orava, fora o Senhor impelido à obra do seu ministério (22). O próprio Senhor Jesus, antes de dar livremente a sua vida pelo mundo, de tal maneira dispôs o ministério apostólico e de tal forma prometeu enviar o Espírito Santo, que a ambos associava na tarefa de levar a cabo sempre e em toda a parte a obra da salvação (23). O Espírito Santo é quem «unifica na comunhão e no ministério, e enriquece com diversos dons hierárquicos e carismáticos» (24) toda a Igreja através dos tempos, dando vida às instituições eclesiásticas (25), sendo como que a alma delas, e instilando nos corações dos fiéis aquele mesmo espírito de missão que animava o próprio Cristo. Por vezes precede visivelmente a acção apostólica (26), como também incessantemente a acompanha e dirige de vários modos (27).

A Igreja enviada de Cristo

5. O Senhor Jesus, logo desde o princípio «chamou a Si alguns a quem Ele quis, e escolheu doze para andarem com Ele e para -os mandar a pregar» (Mc. 3,13) (28). Os Apóstolos foram assim a semente do novo Israel e ao mesmo tempo a origem da sagrada Hierarquia. Depois, realizados já definitivamente em Si, pela sua morte e ressurreição, os mistérios da nossa salvação e da renovação do universo, o Senhor, com todo o poder que adquiriu no céu e na terra (29), antes de subir ao Céu (30) fundou a sua Igreja como sacramento de salvação e enviou os seus Apóstolos a todo o mundo tal qual Ele também tinha sido enviado pelo Pai (31), dando-lhes este mandato: «Ide, pois, fazei discípulos de todas as nações, baptizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, ensinando-as a cumprir tudo quanto vos prescrevi» (Mt. 28, 19-20). «Ide por todo o mundo, proclamai a Boa Nova a toda a criatura. Quem acreditar e for baptizado, será salvo; mas quem não acreditar, será condenado» (Mc. 16,15 ss.). Daí vem à Igreja o dever de propagar a fé e a salvação de Cristo, tanto em virtude do expresso mandamento que dos Apóstolos herdou a Ordem dos Bispos ajudada pelos presbíteros em união com o sucessor de Pedro e sumo pastor da Igreja, como em virtude da vida comunicada aos seus membros por Cristo, «do qual o corpo todo inteiro bem ajustado e coeso por toda a espécie de junturas que o alimentam, com a acção proporcionada a cada membro, realiza o seu crescimento em ordem à própria edificação na caridade» (Ef. 4,16). A missão da Igreja realiza-se pois, mediante a actividade pela qual, obedecendo ao mandamento de Cristo e movida pela graça e pela caridade do Espírito Santo, ela se torna actual e plenamente presente a todos os homens ou povos para os conduzir à fé, liberdade e paz de Cristo, não só pelo exemplo de vida e pela pregação mas também pelos sacramentos e pelos restantes meios da graça, de tal forma que lhes fique bem aberto caminho livre e seguro para participarem plenamente no mistério de Cristo.

Continuando esta missão e explicitando através da história a missão do próprio Cristo, que foi enviado a evangelizar os pobres, a Igreja, movida pelo Espírito Santo, deve seguir o mesmo caminho de Cristo: o caminho da pobreza, da obediência, do serviço e da imolação própria até à morte, morte de que Ele saiu vencedor pela sua ressurreição. Foi assim também que todos os Apóstolos caminharam na esperança completando com muitas tribulações e fadigas o que faltava aos trabalhos de Cristo pelo seu corpo, que é a Igreja (32). Muitas vezes, mesmo, a semente foi o sangue dos cristãos (33).

Actividade missionária da Igreja: seus diversos modos

6. Esta tarefa que deve ser levada a cabo pela Ordem dos Bispos presidida pelo sucessor de Pedro e com a oração e a cooperação de toda a Igreja, é uma e a mesma em toda a parte, sejam quais forem os condicionalismos, embora difira quanto ao exercício conforme as circunstâncias. Mas as diferenças que nesta actividade da Igreja se têm de reconhecer, não se originam na natureza íntima da «missão», mas nos condicionalismos em que essa «missão» se exerce.

Esses condicionalismos tanto podem depender da Igreja como dos povos, dos agrupamentos ou até dos indivíduos a quem a «missão,, se dirige. A Igreja, de facto, embora de si possua a totalidade ou à plenitude dos meios de salvação, não actua nem pode actuar sempre e imediatamente com todos eles, mas vai por tentativas e por passos na sua acção e no seu esforço de levar a efeito os desígnios de Deus. As vezes até, depois dum avanço, felizmente lançado, vê-se infelizmente obrigada a deplorar de novo uma regressão, ou, pelo menos, a demorar-se num certo estádio de semi-vitalidade e insuficiência. Quanto aos indivíduos, agrupamentos e povos, a esses só gradualmente os atinge e os penetra, e só assim os traz à plenitude católica. A cada condicionalismo e a cada situação devem corresponder acções apropriadas ou meios aptos.

O nome de «missões» dá-se geralmente àquelas actividades características com que os pregoeiros do Evangelho, indo pelo mundo inteiro enviados pela Igreja, realizam o encargo de pregar o Evangelho e de implantar a mesma Igreja entre os povos ou grupos que ainda não crêem em Cristo. Essas «missões» são levadas a efeito pela actividade missionária e exercem-se ordinàriamente em certos territórios reconhecidos pela Santa Sé. O fim próprio desta actividade missionária é a evangelização e a implantação da Igreja nos povos ou grupos em que ainda não está radicada (34). Assim, a partir da semente da palavra de Deus, é necessário que se desenvolvam por toda a parte igrejas autóctones particulares, dotadas de forças próprias e maturidade, com hierarquia própria unida ao povo fiel, suficientemente providas de meios proporcionados a uma vida cristã plena, contribuindo para o bem da Igreja universal. O meio principal desta implantação é a pregação do Evangelho de Jesus Cristo. Para o anunciar, enviou o Senhor pelo mundo inteiro os seus discípulos, a fim de que os homens, uma vez renascidos pela palavra de Deus, fossem agregados pelo Baptismo à Igreja, a qual, como corpo do Verbo encarnado, se nutre e vive da palavra de Deus e do pão eucarístico.

Nesta actividade missionária da Igreja dão-se, por vezes, simultâneamente, situações diversas: a de começo ou implantação, primeiro, e a de crescimento ou juventude, depois. Ultrapassadas estas etapas, não acaba, contudo, a acção missionária da Igreja, mas é às igrejas particulares já constituídas que incumbe o dever de a continuar pregando o Evangelho a todos aqueles que ainda tenham ficado de fora. Há a considerar também que as comunidades em que a Igreja vive, não raras vezes e por variadas causas mudam radicalmente, de maneira a poderem daí advir condições de todo novas. Então, deve a Igreja ponderar se tais condicionalismos não exigem de novo a sua actividade missionária.

Mais: por vezes, as circunstâncias são tais que não há possibilidades, por um tempo, de propor directa e imediatamente a mensagem evangélica: então é evidente que podem os missionários e até devem dar ao menos o testemunho da caridade e da beneficência de Cristo, pacientemente, com prudência e ao mesmo tempo grande confiança. Assim, não só prepararão os caminhos ao Senhor mas até o tornarão já de alguma maneira presente.

É, pois, bem de ver como a actividade missionária dimana intimamente da própria natureza da Igreja, cuja fé salvífica propaga, cuja unidade católica dilatando aperfeiçoa, em cuja apostolicidade se apoia, cujo afecto colegial de sua hierarquia exercita, cuja santidade testemunha, difunde e promove. É bem de ver também que a actividade missionária entre gentios difere tanto da actividade pastoral que se exerce com os fiéis, como das iniciativas pela reunificação dos cristãos. Contudo, ambas estas actividades andam estreitamente ligadas à actividade missionária da Igreja (35): pois a divisão dos cristãos prejudica a santíssima causa de pregar o Evangelho a toda a criatura (36) e fecha a muitos o acesso à fé. Por isso, por uma necessidade missionária, todos os baptizados são chamados a unir-se num rebanho para assim poderem dar um testemunho unânime de Cristo, seu Senhor, perante os gentios. Mas se ainda não podem, de completo acordo, dar testemunho duma só fé, é preciso que, ao menos, estejam animados de mútua estima e caridade.

Actividade missionária da Igreja: suas causas e necessidades

7. A razão desta actividade missionária vem da vontade de Deus, que «quer que todos os homens sejam salvos e cheguem ao pleno conhecimento da verdade. Ora há um só Deus, e um só que é mediador de Deus e dos homens, o homem Cristo Jesus, que se deu a si mesmo como preço de resgate por todos» (l Tim. 2, 4-6), «e não há salvação em nenhum outro» (Act. 4,12). Portanto, é preciso que todos se convertam a Cristo conhecido pela pregação da Igreja e que sejam incorporados, pelo Baptismo, a Ele e à Igreja, seu corpo. O próprio Cristo, aliás, ao inculcar por palavras expressas a necessidade da fé e do Baptismo (37), confirmou também, por isso mesmo, a necessidade da Igreja, na qual os homens entram pelo Baptismo, que é como que a porta de entrada. Por isso, não se poderiam salvar aqueles que, não ignorando que Deus fundou por intermédio de Jesus Cristo a Igreja católica como necessária, não quisessem, apesar disso, entrar nela ou nela perseverar» (38). Por isso também, embora Deus, por caminhos que só Ele sabe, possa conduzir à fé, sem a qual é impossível ser-se-Lhe agradável (39), os homens que ignoram o Evangelho sem culpa sua, incumbem à Igreja, apesar de tudo, a obrigação (40) e o sagrado direito de evangelizar. Daí vem que a actividade missionária conserve ainda hoje e haja de conservar sempre toda a sua eficácia e a sua necessidade.

Por ela incessantemente vai cobrando e organizando as forças para seu crescimento o Corpo místico de Cristo (41). Ao exercício desta actividade são impelidos, sem cessar, os membros da Igreja, pela caridade com que amam a Deus e com que desejam comunicar a todos os homens os bens espirituais tanto da vida presente como da futura.

Finalmente, por esta actividade missionária é Deus plenamente glorificado enquanto os homens por ela recebem, plena e conscientemente, a obra de salvação que Ele em Cristo levou a cabo. E assim se realizam por ela os desígnios de Deus, aos quais Cristo serviu com obediência e amor para glória do Pai que o enviou (42), e para que todo o género humano forme um só Povo de Deus, se una num só corpo de Cristo, e se edifique num só templo do Espírito Santo: o qual, ao restabelecer a concórdia fraterna, vem precisamente ao encontro das aspirações mais íntimas de todos os homens. Finalmente, quando todos os que participam da natureza humana, uma vez regenerados em Cristo pelo Espírito Santo e já na visão unânime da glória de Deus Pai, puderem dizer: «Pai nosso» (43), então se há-de realizar deveras o intento do Criador ao fazer o homem à Sua imagem e semelhança.

Actividade missionária da Igreja na vida e na história humana

8. Também com a própria natureza humana e suas aspirações tem íntima conexão a actividade missionária. Com efeito, ao dar a conhecer Cristo, a Igreja revela, por isso mesmo, aos homens a genuína verdade da sua condição e da sua integral vocação, pois Cristo é o princípio e o modelo da humanidade renovada e imbuída de fraterno amor, sinceridade e espírito de paz, à qual todos aspiram.

Cristo e a Igreja que d'Ele dá testemunho pela pregação evangélica, transcendem todos os particularismos de estirpe ou de nação e, por isso, não podem ser considerados estranhos a ninguém e em nenhuma parte (44). É próprio Cristo é aquela verdade e aquele caminho que a pregação evangélica a todos abre ao levar aos ouvidos de todos as palavras que Ele mesmo disse: «Arrependei-vos e crede no Evangelho» (Mc. 1,15). Porém, como quem não crê já está julgado (45), as palavras de Cristo são, ao mesmo tempo, palavras de juízo e de graça, de morte e de vida. n que só infligindo a morte ao que é velho podemos ter acesso à novidade de vida: e isto, que vale, em primeiro lugar, das pessoas, vale também dos diversos bens deste mundo que estão marcados tanto pelo pecado do homem como pela bênção de Deus: «porque todos pecaram e todos estão privados da glória de Deus» (Rom. 3,23). Por si mesmo e por próprias forças não há ninguém que se liberte do pecado e se eleve acima de si mesmo, ninguém absolutamente que se liberte a si mesmo da sua enfermidade, da sua solidão ou da sua escravidão (46), mas todos precisam de Cristo como modelo, mestre, libertador, salvador, vivificador. De facto, na história humana, mesmo sob o ponto de vista temporal, o Evangelho foi um fermento de liberdade e de progresso e apresenta-se sempre como fermento de fraternidade, de unidade e de paz. Não é sem razão, por isso, que Cristo é celebrado pelos fiéis como «o esperado das nações e o seu salvador» (47).

Carácter escatológico da actividade missionária da Igreja

9. A actividade missionária desenrola-se entre o primeiro e o segundo advento do Senhor, em que a Igreja há-de ser reunida dos quatro ventos como uma colheita, no reino de Deus (48). Mas antes de o Senhor vir, tem de ser pregado o Evangelho a todos os povos (49).

A actividade missionária não é outra coisa, nem mais nem menos, que a manifestação ou epifania dos desígnios de Deus e a sua realização no mundo e na sua história, na qual Deus, pela missão, manifestamente vai tecendo a história da salvação. Pela palavra da pregação e pela celebração dos sacramentos de que a Eucaristia é o centro e a máxima expressão, torna presente a Cristo, autor da salvação. Por outro lado, tudo o que de verdade e de graça se encontrava já entre os gentios como uma secreta presença de Deus, expurga-o de contaminações malignas e restitui-o ao seu autor, Cristo, que destrói o império do demónio e afasta toda a malícia dos pecados. O que de bom há no coração e no espírito dos homens ou nos ritos e culturas próprias dos povos, não só não se perde, mas é purificado, elevado e consumado para glória de Deus, confusão do demónio e felicidade do homem (50). A actividade missionária tende assim para a plenitude escatológica (51): por ela, com efeito, se estende, segundo as dimensões e os tempos que o Pai fixou com o seu próprio poder (52), o Povo de Deus a quem foi dito profèticamente: «Dilata o acampamento das tuas tendas e estende as telas das tuas barracas! Não te acanhes» (Is. 54,2) (53); por ela cresce o Corpo místico até constituir esse homem perfeito, na força da idade, que realiza a plenitude de Cristo (54); por ela se levanta e se vai edificando sobre os alicerces dos Apóstolos e dos profetas e com o próprio Cristo Jesus por pedra angular (Ef. 2,20), o templo espiritual onde Deus é adorado em espírito e verdade (55).

CAPÍTULO II

A OBRA MISSIONÁRIA EM SI MESMA

Introdução: A actividade missionária da Igreja no mundo actual

10. Enviada por Cristo a manifestar e a comunicar a todos os homens e povos a caridade de Deus, a Igreja reconhece que tem de levar a cabo uma ingente obra missionária. É que, na verdade, dois biliões de homens, número que cresce de dia para dia, em grandes e determinados agrupamentos, unidos por laços estáveis de vida cultural, por antigas tradições religiosas, por estreitos vínculos de relações sociais, ou ainda não receberam a mensagem do Evangelho, ou mal ouviram falar dela; dentre eles, uns seguem alguma das grandes religiões, outros permanecem estranhos ao conhecimento de Deus, outros negam expressamente a sua existência, ou até mesmo a atacam. A fim de poder oferecer a todos o mistério de salvação e a vida trazida por Deus, a Igreja deve inserir-se em todos esses agrupamentos, impelida pelo mesmo movimento que levou o próprio Cristo, na incarnação, a sujeitar-se às condições sociais e culturais dos homens com quem conviveu.

Art. 1

O TESTEMUNHO CRISTÃO

Testemunho de vida e diálogo

11. A Igreja tem de estar presente a estes agrupamentos humanos por meio dos seus filhos que entre eles vivem ou a. eles são enviados. Com efeito, todos os fiéis cristãos, onde quer que vivam, têm obrigação de manifestar, pelo exemplo da vida e pelo testemunho da palavra, o homem novo de que se revestiram pelo Baptismo, e a virtude do Espírito Santo por quem na Confirmação foram robustecidos, de tal modo que os demais homens, ao verem as suas boas obras, glorifiquem o Pai (1) e compreendam, mais plenamente o sentido genuíno da vida humana e o vínculo universal da comunidade humana.

Para poderem dar frutuosamente este testemunho de Cristo, unam-se a esses homens com estima e caridade, considerem-se a si mesmos como membros dos agrupamentos humanos em que vivem, e participem na vida cultural e social através dos vários intercâmbios e problemas da vida humana; familiarizem-se com as suas tradições nacionais e religiosas; façam assomar à luz, com alegria e respeito, as sementes do Verbo neles adormecidas; mas atendam, ao mesmo tempo, à transformação profunda que se opera entre os povos e trabalhem por que os homens do nosso tempo não dêem tanta importância à ciência e tecnologia do mundo moderno que se alheiem das coisas divinas, mas, antes pelo contrário, despertem para um desejo mais profundo da verdade e da caridade reveladas por Deus. Assim como o próprio Cristo perscrutou o coração dos homens e por meio da sua conversação verdadeiramente humana os conduziu à luz divina, assim os seus discípulos, profundamente imbuídos do Espírito de Cristo, tomem conhecimento dos homens no meio dos quais vivem, e conversem com eles, para que, através dum diálogo sincero e paciente, eles aprendam as riquezas que Deus liberalmente outorgou aos povos; mas esforcem-se também por iluminar estas riquezas com a luz evangélica, por libertá-las e restituí-las ao domínio de Deus Salvador.

Presença da caridade

12. A presença dos cristãos nos agrupamentos humanos seja animada daquela caridade com que Deus nos amou, e com a qual quer que também nós nos amemos uns aos outros (2).

Efectivamente, a caridade cristã a todos se estende sem discriminação de raça, condição social ou religião; não espera qualquer lucro ou agradecimento. Portanto, assim como Deus nos amou com um amor gratuito, assim também os fiéis, pela sua caridade, sejam solícitos pelos homens, amando-os com o mesmo zelo com que Deus veio procurá-los. E assim como Cristo percorria todas as cidades e aldeias, curando todas as doenças e todas as enfermidades, proclamando o advento do reino e Deus (3), do mesmo modo a Igreja, por meio dos seus filhos, estabelece relações com os homens de qualquer condição, de modo especial cm os pobres e aflitos, e de bom grado por eles gasta as forças (4). Participa nas suas alegrias e dores, conhece as suas aspirações e os problemas da sua vida e sofre com eles nas ansiedades da morte, trazendo-lhes a paz e a luz do Evangelho.

Trabalhem e colaborem os cristãos com todos os outros na recta ordenação dos problemas económicas e sociais. Dediquem-se, com cuidado especial, à educação das crianças e da juventude por meio das várias espécies de escolas, as quais hão-de ser consideradas não só como meio exímio de formação e promoção da juventude cristã, mas também, simultâneamente, como serviço da maior importância para os homens, e em particular para as nações em vias de desenvolvimento, a fim de elevar a dignidade do homem e preparar condições de vida mais humanas. Além disso, tomem parte nos esforços dos povos que, lutando contra a fome, a ignorância e a doença, se afadigam por melhorar as condições de vida e por assegurar a paz no mundo. Nesta actividade prestem os fiéis, com prudência, a sua colaboração efectiva às iniciativas promovidas pelas instituições particulares e públicas, pelos governos, pelos organismos internacionais, pelas diversas comunidades cristãs e religiões não-cristãs.

A Igreja, porém, não quer, de maneira nenhuma, imiscuir-se no governo da cidade terrena. Nenhuma outra autoridade reclama para si senão a de, com a ajuda de Deus, estar ao serviço dos homens pela caridade e pelo serviço fiel (5).

Intimamente unidos com os homens na vida e no trabalho, os discípulos de Cristo esperam oferecer-lhes o verdadeiro testemunho de Cristo e trabalhar na salvação deles, mesmo quando não podem anunciar plenamente a Cristo. Porque não procuram o progresso e a prosperidade material dos homens, mas promovem a sua dignidade e fraterna união, ensinando as verdades religiosas e morais, que Cristo esclareceu com a Sua luz. Deste modo, vão abrindo pouco a pouco o acesso mais pleno a Deus. Assim, os homens são auxiliados na aquisição da salvação pela caridade para com Deus e para com o próximo, e começa a brilhar o mistério de Cristo, no qual apareceu o homem novo que foi criado segundo Deus, (cfr. Ef. 4,24), e no qual se revela a caridade divina.

Art. 2

A PREGAÇÃO DO EVANGELHO E A REUNIÃO DO POVO DE DEUS

Evangelização e conversão

13. Sempre que Deus abre a porta da palavra para anunciar o mistério de Cristo (7) a todos os homens (8), com confiança e constância (9) seja anunciado (10) o Deus vivo, e Aquele que Ele enviou para a salvação de todos, Jesus Cristo(11), para que os não-cristãos, sob a inspiração interior do Espírito Santo (12), se convertam livremente à fé no Senhor, e adiram sinceramente Aquele que, sendo «caminho, verdade e vida» (Jo. 14,6), cumula todas as suas esperanças espirituais, mais ainda, supera-as infinitamente. Esta conversão há-de considerar-se como inicial, mas suficiente para o homem cair na conta de que, arrancado ao pecado, é introduzido no mistério do amor de Deus, que o chama a entabular relações pessoais consigo em Cristo. Pois, sob a acção da graça de Deus, o neo-convertido inicia o caminho espiritual pelo qual, comungando já pela fé no mistério da morte e ressurreição, passa do homem velho ao homem novo que tem em Cristo a sua perfeita realização (13).

Esta passagem, que traz consigo uma mudança progressiva de mentalidade e de costumes, deve manifestar-se e desenvolver-se, com as suas consequências sociais, durante o tempo do catecumenado. Porque o Senhor em que acreditamos, é sinal de contradição (14), o homem convertido experimenta frequentemente rupturas e separações, mas também alegrias que Deus concede sem medida (15). A Igreja proíbe severamente obrigar quem quer que seja a abraçar a fé, ou induzi-lo e atraí-lo com processos indiscretos, do mesmo modo que reclama com vigor o direito de ninguém ser afastado da fé por meio de vexações iníquas (16).

Em conformidade com o antiquíssimo costume da Igreja, investiguem-se os motivos da conversão e, se for necessário, purifiquem-se.

Catecumenado e iniciação cristã

14. Aqueles que receberam de Deus por meio da Igreja a fé em Cristo (17), sejam admitidos ao catecumenado, mediante a celebração de cerimónias litúrgicas; o catecumenado não é mera exposição de dogmas e preceitos, mas uma formação e uma aprendizagem de toda a vida cristã; j prolongada de modo conveniente, por cujo meio os discípulos se unem comi Cristo seu mestre. Por conseguinte, sejam os catecúmenos conveniente: mente iniciados no mistério da salvação, na prática dos costumes evangélicos, e com ritos sagrados, a celebrar em tempo sucessivos (18), sejam introduzidos na vida da fé, da liturgia e da caridade do Povo de Deus.

Em seguida, libertos do poder das trevas pelos sacramentos da iniciação cristã (19), mortos com Cristo e com Ele sepultados e ressuscitados (20) recebem o Espírito (21) de adopção de filhos e celebram com todo o Povo de Deus o memorial da morte e ressurreição do Senhor.

É de desejar que a liturgia do tempo quaresmal e pascal seja reformada de maneira a preparar os corações dos catecúmenos para a celebração do mistério pascal, durante cujas solenidades eles são regenerados para Cristo pelo Baptismo.

Esta iniciação cristã realizada no catecumenado deve ser obra não apenas dos catequistas ou sacerdotes, mas de toda a comunidade dos fiéis, especialmente dos padrinhos, de forma que desde o começo os catecúmenos sintam que pertencem ao Povo de Deus. Visto que a vida da Igreja é apostólica, os catecúmenos devem igualmente aprender a cooperar activamente; pelo testemunho da sua vida e a profissão da sua fé, na evangelização e na construção da Igreja.

Enfim, o estado jurídico dos catecúmenos deve ser fixado claramente no novo Código. Pois eles estão já unidos à Igreja (22), já são da casa de Cristo (23), e, não raro, eles levam já uma vida de fé, de esperança e de caridade.

Art. 3

A FORMAÇÃO DA COMUNIDADE CRISTÃ

Formação da comunidade cristã

15. O Espírito Santo, que chama todos os homens a Cristo pelas sementes do Verbo e pela pregação do Evangelho e suscita nos corações a homenagem da fé, quando gera no seio da fonte baptismal para uma nova vida os que crêem em Cristo, reune-os num só Povo de Deus que é graça escolhida, sacerdócio real, nação santa, povo adquirido»

Portanto, os missionários, colaboradores de Deus (25), devem fazer nascer comunidades de fiéis que, levando uma vida digna da vocação que receberam (26), sejam tais que possam exercer as funções a elas confiadas por Deus: sacerdotal, profética e real. E deste modo que uma comunidade cristã se torna sinal da presença de Deus no mundo: pelo sacrifício eucarístico, com efeito, passa incessantemente com Cristo ao Pai (27), alimentada cuidadosamente pela palavra de Deus (28) dá testemunho de Cristo (29), caminha, enfim, na caridade e arde em espírito apostólico (30).

Uma comunidade cristã deve ser constituída desde o começo de tal maneira que possa, na medida do possível, prover por si mesma às suas necessidades. Esta comunidade de fiéis, dotada das riquezas culturais da sua própria nação, deve estar profundamente enraizada no povo: devem desabrochar as famílias penetradas do espírito evangélico (31) e ajudadas por escolas idóneas; devem organizar-se associações e agrupamentos por meio dos quais o apostolado dos leigos possa penetrar do espírito evangélico toda a sociedade. A caridade deve brilhar, enfim, entre os católicos de rito diferente (32).

Deve também nutrir-se entre os néofitos o espírito ecuménico, pensando justamente que os irmãos que crêem em Cristo são discípulos de Cristo, regenerados pelo Baptismo, participantes de numerosos bens do Povo de Deus. Quanto o permitirem as condições religiosas, deve promover-se a acção ecuménica, de sorte que, banindo toda a aparência de indiferentismo, de confusionismo e odiosa rivalidade, os católicos colaborem com os irmãos separados, em conformidade com as disposições do decreto sobre o Ecumenismo, por meio da comum profissão de fé em Deus e em Jesus Cristo diante dos gentios, na medida do possível, e pela cooperação em questões sociais e técnicas, culturais e religiosas. Colaborem, sobretudo, por amor de Cristo, seu Senhor comum: que o Seu nome os una! Esta colaboração deve ser estabelecida não sòmente entre os indivíduos, mas também, a juízo do Ordinário do lugar, entre igrejas ou comunidades eclesiais e as suas obras.

Os cristãos, provenientes de todos os povos e reunidos em Igreja, «não se distinguem dos outros homens nem pelo país, nem pela língua, nem pela organização política» (33); devem, por isso, viver para Deus e para Cristo segundo os usos do seu próprio povo; cultivem verdadeira e eficazmente, como bons cidadãos, o amor da pátria, mas evitem absolutamente o desprezo pelas outras raças, o nacionalismo exagerado, e promovam o amor universal dos homens.

Para conseguir estes resultados, têm grandíssima importância e são dignos de um interesse particular os leigos, isto é, os fiéis cristãos que, incorporados em Cristo pelo Baptismo, vivem no mundo. A eles pertence, depois de penetrados do Espírito de Cristo, animar interiormente, à maneira de fermento, as realidades temporais e dispô-las para que se realizem sempre segundo Cristo (34).

Não basta, porém, que o povo cristão esteja presente e estabelecido num país; não basta também que ele exerça o apostolado do exemplo; está estabelecido, está presente com esta finalidade: anunciar Cristo aos seus concidadãos não-cristãos pela palavra e pela acção, e ajudá-los a receber plenamente a Cristo.

Ora bem: para a implantação da Igreja e para o desenvolvimento da comunidade cristã, são necessários ministérios diversos, que, suscitados pelo apelo divino no seio da mesma comunidade dos fiéis, devem ser encorajados e cultivados por todos com diligente cuidado; entre estes ministérios, há as funções dos sacerdotes, dos diáconos e dos catequistas, e a acção católica. De modo análogo, os religiosos e as religiosas desempenham, quer pela oração quer pela acção, um serviço indispensável para enraizar nos corações o reino de Cristo, fortificá-lo e estendê-lo mais ao longe.

Constituição do clero local

16. Com imensa alegria, a Igreja dá graças pelo dom inapreciável da vocação sacerdotal que Deus concedeu a tão avultado número de jovens entre os povos recentemente convertidos a Cristo. A Igreja, efectivamente, lança raízes mais vigorosas em cada agrupamento humano, quando as várias comunidades de fiéis tiram dentre os seus membros os próprios ministros da salvação na ordem dos Bispos, dos presbíteros e dos diáconos, que servem os seus irmãos, de tal sorte que as jovens igrejas adquirem a pouco e pouco a estrutura diocesana com clero próprio.

Aquilo que foi decidido por este Concílio a propósito da vocação e da formação sacerdotal, observe-se religiosamente nos lugares em que a Igreja começa a implantar-se e também nas novas igrejas. Preste-se muita atenção ao que foi dito sobre a formação espiritual intimamente unida à formação doutrinal e pastoral da vida vivida segundo o espírito do Evangelho, sem consideração de vantagem pessoal ou interesse familiar, e sobre a formação do sentido íntimo do mistério da Igreja. Assim aprenderão de maneira maravilhosa a consagrar-se inteiramente ao serviço do corpo de Cristo e à obra do Evangelho, a aderir ao próprio Bispo como fiéis colaboradores e a prestar leal colaboração aos seus irmãos (35).

Para conseguir este fim geral, toda a formação dos alunos deve ser orientada à luz do mistério da salvação, como vem exposto na Escritura. Descubram e vivam este mistério de Cristo e da salvação dos homens presente na Liturgia (36).

Estas exigências comuns da formação sacerdotal, que é também pastoral e prática, devem harmonizar-se, segundo as disposições do Concílio (37), com o desejo de ir ao encontro do modo particular de pensar e de agir da sua própria nação. Os espíritos dos alunos devem, pois, abrir-se e cultivar-se para bem conhecerem e poderem apreciar a cultura do seu país; nas disciplinas filosóficas e teológicas, devem tomar conhecimento das relações que há entre as tradições e as religiões nacionais e a religião cristã (38). Do mesmo modo, a formação sacerdotal deve ter em vista as necessidades pastorais da região: os alunos devem aprender a história, a finalidade e o método da acção missionária da Igreja, e as condições particulares, sociais, económicas e culturais do seu próprio povo. Devem ser educados no espírito de ecumenismo e convenientemente preparados para o diálogo fraterno com os não-cristãos (39). Tudo isto pede que os estudos para o sacerdócio sejam realizados, quanto possível, em ligação contínua e convivência com a gente do próprio país (40). Procure-se enfim, dar, uma formação que prepare para a ordenada administração eclesiástica, e até mesmo a económica.

Dever-se-á também escolher sacerdotes capazes que, depois de alguma experiência pastoral, realizem estudos superiores em Universidades, mesmo estrangeiras, sobretudo em Roma, e em outros Institutos científicos, de sorte que as igrejas jovens tenham à sua disposição sacerdotes do clero local, dotados de ciência e experiência convenientes, para desempenharem as funções eclesiásticas de maior responsabilidade.

Nos lugares em que as Conferências episcopais julgarem oportuno, restabeleça-se a ordem do diaconado como estado de vida permanente, em conformidade com as normas da Constituição sobre a Igreja (41). É útil, com efeito, que para exercer um ministério verdadeiramente diaconal, quer pregando a palavra de Deus como catequistas, quer dirigindo em nome do pároco e do Bispo comunidades cristãs dispersas, quer exercendo a caridade em obras sociais ou caritativas, sejam fortificados pela imposição das mãos, transmitida desde o tempo dos Apóstolos, e mais estreitamente unidos ao altar, para que desempenhem o seu ministério mais eficazmente, por meio da graça sacramental do diaconado.

Formação dos catequistas

17. De modo semelhante, é digno de elogio aquele exército com tantos méritos na obra das missões entre pagãos, o exército dos catequistas, homens e mulheres, que, cheios do espírito apostólico, prestam com grandes trabalhos uma ajuda singular e absolutamente necessária à expansão da fé e da Igreja.

Hoje em dia, em razão da escassez de clero para evangelizar tão grandes multidões e exercer o ministério pastoral, o ofício dos catequistas tem muitíssima importância. A sua formação deve, portanto, fazer-se de maneira tão acomodada ao progresso cultural, que eles possam desempenhar o mais perfeitamente possível o seu múnus como colaboradores eficazes da ordem sacerdotal, múnus esse que se vai complicando com novas e maiores obrigações.

É preciso, portanto, multiplicar as escolas diocesanas e regionais, nas quais os futuros catequistas estudem cuidadosamente a doutrina católica, sobretudo em matéria bíblica e litúrgica, assim como o método catequético e a prática pastoral, e se formem na moral cristã (42), exercitando-se sem desfalecimentos na piedade e na santidade de vida. Além disso, devem organizar-se reuniões ou cursos de actualização nas disciplinas e nas artes úteis ao seu ministério, e de renovação e robustecimento da sua vida espiritual. Por outro lado, aos que se dedicam inteiramente a esta ocupação, dever-se-á proporcionar, por uma justa remuneração, conveniente nível de vida e segurança social (43).

É de desejar que se proveja, de maneira conveniente, à formação e sustentação dos catequistas, por meio de subsídios especiais da sagrada Congregação de «Propaganda Fide». Parecendo necessário e conveniente, funde-se uma Obra para os catequistas.

Além disso, as igrejas serão reconhecidas ao trabalho generoso dos catequistas auxiliares, cuja ajuda lhes será indispensável. São eles que presidem às orações nas comunidades e ensinam a doutrina. É preciso, pois, tratar da sua conveniente formação doutrinal e espiritual. Por outro lado, é de desejar que, onde parecer oportuno, seja confiada pùblicamente, durante a celebração duma acção litúrgica, a missão canónica aos catequistas que tiverem recebido a devida formação, a fim de. estarem com maior autoridade ao serviço da fé junto do povo.

Promoção da vida religiosa

18. Desde o período da implantação da Igreja, deve ter-se o cuidado de promover a vida religiosa; esta não sòmente presta ajuda preciosa e absolutamente necessária à actividade missionária, mas, por uma consagração mais íntima feita a Deus na Igreja, manifesta e significa com esplendor também a natureza íntima da vocação cristã. (44)

Os Institutos religiosos que trabalham na implantação da Igreja, profundamente impregnados das riquezas místicas que são a glória da tradição religiosa da Igreja, devem esforçar-se por as exprimir e as transmitir, segundo o génio e carácter de cada povo. Devem examinar como é que as tradições ascéticas e contemplativas, cujos germes foram, algumas vezes, espalhados por Deus nas civilizações antigas, antes da pregação do Evangelho, podem ser assumidas pela vida religiosa cristã.

Devem cultivar-se nas igrejas jovens as diversas formas de vida religiosa para que mostrem os diversos aspectos da missão de Cristo e da vida da Igreja, e se dediquem às várias obras pastorais, e preparem convenientemente os seus membros para as desempenhar. No entanto, procurem os Bispos nas Conferências que não se multipliquem Congregações com o mesmo fim apostólico, com prejuízo da vida religiosa e do apostolado.

São dignas de menção especial as diversas iniciativas em vista ao enraizamento da vida contemplativa; certos Institutos, guardando os elementos essenciais da instituição monástica, trabalham por implantar a riquíssima tradição da sua Ordem; outros voltam às formas mais simples do monaquismo antigo. Todos, no entanto, devem procurar uma autêntica adaptação às condições locais. Uma vez que a vida contemplativa pertence à plenitude da presença da Igreja, é preciso que ela seja instaurada por toda a parte nas novas igrejas.

CAPÍTULO III

AS IGREJAS PARTICULARES

Incremento das Igrejas jovens

19. A obra de implantação da Igreja num determinado agrupamento humano atinge em certa medida o seu termo, quando a comunidade dos fiéis, enraizada já na vida social e adaptada à cultura local, goza de alguma estabilidade e firmeza: com recursos próprios, ainda que insuficientes, de clero local, de religiosos e de leigos; possui já os ministérios e instituições necessárias para viver e desenvolver a vida do Povo de Deus, sob a orientação do próprio Bispo.

Nestas igrejas jovens, a vida do Povo de Deus deve adquirir a maturidade em todos os sectores da vida cristã, renovada segundo as normas deste Concílio: os grupos de fiéis tornam-se de dia para dia mais conscientemente comunidades de fé, de liturgia e de caridade; pela sua actividade cívica e apostólica, os leigos trabalham por instaurar na sociedade uma ordem de caridade e de justiça; os meios de comuniçação social são empregados de maneira oportuna e prudente; graças a uma vida verdadeiramente cristã, as famílias tornam-se viveiros do apostolado dos leigos e das vocações sacerdotais e religiosas. A fé, enfim, é ensinada por meio duma catequese adaptada, é celebrada numa liturgia conforme ao génio do povo, e, por uma legislação canónica conveniente, passa para as instituições e para os costumes locais.

Os Bispos, cada um com o seu presbitério, cada vez mais penetrados do sentido de Cristo e da Igreja, devem sentir e viver com a Igreja universal. Deve manter-se íntima a comunhão das igrejas jovens com a Igreja inteira, cujos elementos tradicionais elas devem juntar à sua cultura própria, para fazer crescer a vida do Corpo místico por meio de trocas mútuas(1). Por isso, devem cultivar-se os elementos teológicos, psicológicos e humanos que podem contribuir para fomentar este sentido de comunhão com a Igreja universal.

Estas igrejas, porém, não raro situadas nas regiões mais pobres do globo, vêem-se ainda a braços com insuficiência, ordinàriamente muito grave, de sacerdotes, e com falta de recursos materiais. Por isso, têm muitíssima necessidade de que a acção missionária continuada da Igreja inteira lhes subministre os socorros que sirvam, antes de mais, para o desenvolvimento da igreja local e para a maturidade da vida cristã. Esta acção missionária deve atender também às igrejas fundadas há longa data que se encontram em estado de retrocesso ou decadência.

Estas igrejas, todavia, devem renovar o seu zelo pastoral comum e as obras oportunas para aumentar em número, discernir com mais segurança e cultivar com mais eficácia as vocações para o clero diocesano e para os Institutos religiosos (2), de maneira que, pouco a pouco, possam prover às suas próprias necessidades e auxiliar as outras.

A sua actividade missionária

20. A igreja particular, pela obrigação que tem de representar o mais perfeitamente possível a Igreja universal, deve ter consciência que foi também enviada aos habitantes do mesmo território que não crêem em Cristo, a fim de ser, pelo testemunho da vida de cada um dos fiéis e de toda a comunidade, um sinal a mostrar-lhes Cristo.

Além disso, para o Evangelho chegar a todos, é indispensável o ministério da palavra. É preciso que o Bispo seja, antes de mais, um pregador da fé, que conduza a Cristo novos discípulos (3). Para se desempenhar, como convém, desta nobre incumbência, deve conhecer bem a situação do seu rebanho, as opiniões íntimas dos seus concidadãos a respeito de Deus, tomando cuidadosamente em linha de conta as mudanças introduzidas pela urbanização, migração e indiferentismo religioso.

Nas igrejas jovens, os sacerdotes nativos empreendam com ardor a obra da evangelização, organizando uma acção comum com os missionários estrangeiros, com os quais formam um presbitério único, unido debaixo da autoridade do Bispo, não só para apascentar os fiéis e celebrar o culto divino, mas também para pregar o Evangelho àqueles que estão fora. Eles devem mostrar-se prontos e, havendo ocasião, oferecer-se com fervor ao Bispo para empreender o trabalho missionário nas regiões afastadas e abandonadas da sua própria diocese, ou em outras dioceses.

Do mesmo zelo em relação aos seus concidadãos, sobretudo os mais pobres, devem sentir-se animados os religiosos e as religiosas, bem como os leigos.

As Conferências episcopais procurem organizar, em tempos. determinados, cursos de renovação bíblica, teológica, espiritual e pastoral, para que, na variedade e mudança de situações, o clero adquira um conhecimento mais pleno da ciência teológica e dos métodos pastorais.

Quanto ao mais, observe-se religiosamente o que este Concílio determinou, especialmente no decreto sobre o ministério e a vida dos sacerdotes.

Para que esta obra missionária duma igreja particular possa ser levada a bom termo, é necessário que haja ministros capazes, oportunamente preparados em conformidade com o condicionalismo de cada igreja. Uma vez que os homens se reúnem cada vez mais em grupos, convém absolutamente que as Conferências episcopais tenham planos comuns sobre . o diálogo a instituir com esses grupos. Se em certas regiões se encontram grupos de homens, que são impedidos de abraçar a fé católica pelo facto de não poderem adaptar-se à forma particular que a Igreja aí tenha revestido, é de desejar que se proveja de maneira especial a essa situação (4), até que todos os cristãos possam ser congregados numa só comunidade. Os Bispos devem chamar para as suas dioceses ou receber de boa vontade os missionários de que a Sé Apostólica puder dispor para esta finalidade, e favorecer eficazmente as suas iniciativas.

Para que este zelo missionário comece a florescer entre os naturais do país, convém absolutamente que as igrejas jovens participem efectivamente na missão universal da Igreja, enviando elas também missionários a anunciar o Evangelho por toda a terra, ainda que elas sofram de falta de clero. A comunhão com a Igreja inteira estará, de certo modo, consumada quando, também elas, tomarem parte activa na acção missionária junto de outros povos.

Promoção do apostolado dos leigos

21. A Igreja não está fundada verdadeiramente, nem vive plenamente, nem é o sinal perfeito de Cristo entre os homens se, com a Hierarquia, não existe e trabalha um laicado autêntico. De facto, sem a presença activa dos leigos, o Evangelho não pode gravar-se profundamente nos espíritos, na vida e no trabalho de um povo. Por isso, é necessário desde a fundação da Igreja prestar grande atenção à formação dum laicado cristão amadurecido.

Os leigos pertencem, ao mesmo tempo, ao Povo de Deus e à sociedade civil: pertencem, por um lado, à nação em que nasceram, de cujos tesouros culturais participam pela educação, a cuja vida estão ligados por múltiplos laços sociais, para cujo progresso cooperam com o seu esforço nas suas profissões, cujos problemas sentem e procuram resolver como próprios; pertencem também a Cristo, porque foram regenerados na Igreja pela fé e pelo Baptismo, a fim de serem de Cristo(5) pela renovação da vida e acção, para que em Cristo tudo seja submetido a Deus, e, enfim, Deus seja tudo em todos (6).

O principal dever deles, homens e mulheres, é o testemunho de Cristo, que eles têm obrigação de dar, pela sua vida e palavras, na família, no grupo social, no meio profissional. É necessário que se manifeste neles o homem novo criado segundo Deus em justiça e santidade verdadeira (7). Devem exprimir esta novidade de vida no meio social e cultural da sua pátria, em conformidade com as tradições nacionais. Devem conhecer esta cultura, purificá-la, conservá-la, desenvolvê-la segundo as novas situações, enfim, dar-lhe a sua perfeição em Cristo, a fim que a fé em Cristo e a vida da Igreja deixem de ser estranhas à sociedade em que vivem mas comecem a penetrá-la e a transformá-la. Devem unir-se aos seus concidadãos com caridade sincera, a fim de que no seu comportamento apareça um novo laço de unidade e de solidariedade universal, haurida no mistério de Cristo. Devem transmitir a fé em Cristo também àqueles a quem estão ligados pela vida e profissão; esta obrigação impõe-se tanto mais quanto a maior parte dos homens não podem ouvir o Evangelho e conhecer a Cristo senão pelos seus vizinhos leigos. Mais ainda: onde for possível, devem os leigos estar prontos a cumprir, em colaboração mais imediata com a Hierarquia, a missão especial de anunciar o Evangelho e comunicar a doutrina cristã, a fim de tornarem mais vigorosa a Igreja nascente.

Os ministros da Igreja, por sua vez, devem ter em muito apreço o apostolado activo dos leigos. Devem formá-los para, como membros de Cristo, tomarem consciência da sua responsabilidade em relação aos outros homens; devem instruí-los profundamente no mistério de Cristo, iniciá-los nos métodos práticos, assistir-lhes nas dificuldades, em conformidade com o pensamento da Constituição sobre a Igreja e do decreto sobre o Apostolado dos leigos.

Bem respeitadas as funções e as responsabilidades próprias dos pastores e dos leigos, a jovem igreja toda inteira deve dar um único testemunho vivo e firme de Cristo, a fim de se tornar um sinal luminoso da salvação que em Cristo veio até nós.

Diversidade na Unidade

22. A semente da palavra de Deus, germinando em boa terra, regada pelo orvalho divino, absorve a seiva, transforma-a e assimila-a para produzir fruto abundante. Certamente, de modo análogo à economia da encarnação, as igrejas jovens, enraizadas em Cristo e construídas sobre o fundamento dos Apóstolos, recebem, por um maravilhoso intercâmbio, todas as riquezas das nações que foram dadas a Cristo em heranças. Recebem dos costumes e das tradições dos seus povos, da sabedoria e da doutrina, das artes e das disciplinas, tudo aquilo que pode contribuir para confessar a glória do criador, ilustrar a graça do Salvador, e ordenar, como convém, a vida cristã (9).

Para conseguir este objectivo, é necessário que em cada grande espaço socio-cultural, se estimule uma reflexão teológica tal que, à luz da tradição da Igreja universal, as acções e as palavras reveladas por Deus, consignadas na Sagrada Escritura, e explicadas pelos Padres da Igreja e pelo magistério, sejam sempre de novo investigadas. Assim se entenderá mais claramente o processo de tornar a fé inteligível, tendo em conta a filosofia ou a sabedoria dos povos, e a maneira de os costumes, o sentido da vida e a ordem social poderem concordar com a moral manifestada pela revelação divina. Deste modo se descobrirá o caminho para uma mais profunda adaptação em toda a extensão da vida cristã. Toda a aparência de sincretismo e de falso particularismo, será assim excluída, a vida cristã conformar-se-á bem ao génio de cada cultura (10), as tradições particulares e qualidades próprias de cada nação, esclarecidas pela luz do Evangelho, serão assumidas na unidade católica. Enfim, as novas igrejas particulares, enriquecidas pelas suas tradições, terão o seu lugar na comunhão eclesiástica, ficando intacto o primado da cátedra de Pedro, que preside a toda a assembleia da caridade (11).

É, portanto, de desejar, ou antes, convém absolutamente que as Conferências episcopais, dentro dos limites de cada grande espaço socio-cultural, se unam entre si para, de ânimo concorde e pondo em comum os seus planos, conseguirem este objectivo da adaptação.

CAPÍTULO IV

OS MISSIONÁRIOS

A vocação missionária

23. Embora a todo o discípulo de Cristo incumba a obrigação de difundir a fé conforme as suas possibilidades(1), Cristo Senhor chama sempre dentre os discípulos os que Ele quer para estarem com Ele e os enviar a evangelizar os povos (2). E assim, mediante o Espírito Santo, que para utilidade comum reparte os carismas como quer (3), inspira no coração de cada um a vocação missionária e ao mesmo tempo suscita na Igreja Institutos (4), que assumem, como tarefa própria, o dever de evangelizar, que pertence a toda a Igreja.

De facto, são marcados com vocação especial aqueles que, dotados de índole natural conveniente e das qualidades e talentos requeridos, estão prontos para empreender o trabalho missionário (5), quer sejam nativos quer estrangeiros: sacerdotes, religiosos e leigos. Enviados pela legítima autoridade, partem, movidos pela fé e obediência, para junto dos que estão longe de Cristo, escolhidos para uma obra à qual foram destinados (6) como ministros do Evangelho, «a fim de que a oblação dos gentios seja aceite e santificada no Espírito Santo» (Rom. 15,16).

Espiritualidade missionária

24. Porém, ao chamamento de Deus, o homem deve responder de forma tal que, sem se deixar guiar pela carne e sangue(7), todo ele se entregue à obra do Evangelho. Mas esta resposta não pode ser dada senão por impulso e virtude do Espírito Santo. O enviado entra, portanto, na vida e missão d'Aquele que «a si mesmo se aniquilou tomando a forma de servo» (Fil. 2,7). Por conseguinte, deve estar pronto a perseverar toda a vida na vocação, a renunciar a si e a todas as suas coisas, e a fazer-se tudo para todos (8).

Anunciando o Evangelho aos povos, dê a conhecer confiadamente o mistério de Cristo, do qual é legado, de maneira que ouse falar d'Ele como convém (9), não se envergonhando do escândalo da cruz. Seguindo os passos do seu mestre, manso e humilde de coração, mostre que o Seu jugo é suave e leve a Sua carga (10). Mediante uma vida verdadeiramente evangélica (11), com muita paciência, longanimidade, suavidade, caridade sincera (12), dê testemunho do seu Senhor até à efusão do sangue, se for necessário. Alcançará de Deus virtude e força para descobrir a abundância de gozo que se encerra na grande prova da tribulação e da pobreza absoluta (13).

Persuada-se que a obediência é a virtude peculiar do ministro de Cristo que, pela Sua obediência, redimiu o género humano.

Os pregadores do Evangelho, para não negligenciar a graça que em si têm, renovem continuamente o seu espírito (14). Por sua vez, os Ordinários e os Superiores reunam os missionários em tempos determinados, a fim d.e mais se robustecerem na esperança da vocação e se renovarem no ministério apostólico, fundando até, para isso, casas apropriadas.

Formação espiritual e moral

25. Para tão sublime empresa, há-de o futuro missionário preparar-se com esmerada formação espiritual e moral (15). Deve, com efeito, ser capaz de tomar iniciativas, constante para levar a cabo as obras, perseverante nas dificuldades, suportando com paciência e fortaleza a solidão, a fadiga, o trabalho infrutuoso. Com espírito aberto e coração dilatado, irá ao encontro dos homens; abraçará de boa vontade os trabalhos que lhe confiarem; adaptar-se-á também generosamente aos diversos costumes e variadas condições dos povos; com ânimo concorde e mútua caridade colaborará com seus irmãos e com todos quantos se consagram à mesma empresa, de maneira que, juntamente com os fiéis, imitando a comunidade apostólica, tenham um só coração e uma só alma (16).

Estas disposições de espírito sejam diligentemente exercitadas, cuidadosamente cultivadas, elevadas e alimentadas com a vida espiritual, já desde o tempo da formação. Cheio de fé viva e esperança indefectível, o missionário seja homem de oração; arda no espírito de fortaleza, de caridade e de temperança (17); aprenda a bastar-se com o que tem (18); pelo espírito de sacrifício, leve em si o estado de morte de Jesus, a fim de que a vida de Jesus opere naqueles aos quais é enviado (19); com verdadeiro zelo gaste tudo e desgaste-se a si mesmo pelo bem das almas (20), de tal forma que «mediante o exercício diário do seu ministério, cresça no amor de Deus e do próximo» (21). Desta sorte, obedecendo com Cristo à vontade do Pai, continuará a Sua missão sob a autoridade hierárquica da Igreja, e cooperará no mistério da salvação.

Formação doutrinal e apostólica

26. Os que forem enviados aos diversos povos, como bons ministros de Cristo, devem ser alimentados «com a palavra da fé e da boa doutrina» (1 Tim. 4,6), a qual haurirão primeiramente na Sagrada Escritura, perscrutando o mistério de Cristo, de quem serão arautos e testemunhas.

E assim, todos os missionários — sacerdotes, irmãos, irmãs, leigos — sejam preparados e formados, cada qual segundo a sua condição, de maneira a estarem à altura das exigências do trabalho futuro (22). Já desde o começo, de tal modo se processe a sua formação doutrinal, que abranja tanto a universalidade da Igreja como a diversidade das nações. E isto vale tanto de todas as disciplinas, em que se formam para o desempenho do ministério, como das disciplinas úteis para o conhecimento dos povos, das culturas, das religiões, com vistas não só ao passado mas também ao tempo presente. Aquele, pois, que é destinado a outra nação, tenha em grande apreço o seu património, língua e costumes. Ao futuro missionário importa sumamente que se aplique aos estudos missiológicos, isto é, a conhecer a doutrina e as normas da Igreja em matéria de actividade missionária, a informar-se sobre os caminhos percorridos pelos arautos do Evangelho, ao longo dos séculos, como também sobre a condição presente das missões e sobre os métodos considerados hoje mais eficazes (23).

Embora toda a formação deva estar imbuída de solicitude pastoral, ministre-se-lhes, contudo, peculiar e bem orientada formação apostólica, quer teórica quer prática (24).

Forme-se o maior número possível de irmãos e de irmãs em catequética, para darem maior colaboração no apostolado.

Mesmo aqueles que se dedicam só por algum tempo à acção missionária, devem adquirir a formação adequada à sua condição.

Estas diversas espécies de preparação, porém, devem ser completadas nas próprias terras de missão, de modo que os missionários adquiram mais profundo conhecimento da história, das estruturas sociais e dos costumes dos povos, e se inteirem da ordem moral e dos preceitos religiosos, bem como do verdadeiro pensamento que esses povos, conforme suas tradições sagradas, possuem acerca de Deus, do mundo e do homem (25). Quanto às línguas, aprendam-nas de modo a usá-las com facilidade e elegância, e terem, assim, mais fácil acesso à inteligência e ao coração dos homens (26). Finalmente, sejam devidamente iniciados nas necessidades pastorais características da terra.

Haja também pessoal preparado de modo mais profundo em Institutos missiológicos ou noutras Faculdades ou Universidades, que possa desempenhar cargos de maior responsabilidade (27), e, com a sua ciência, auxiliar os outros missionários no exercício da obra evangelizadora, que, na hora actual, apresenta tantas dificuldades e oportunidades. Além disso, é muito para desejar que as Conferências episcopais regionais tenham à sua disposição um bom número destes peritos e que, nas necessidades do próprio cargo, façam proveitoso uso do seu saber e experiência. Nem falte igualmente quem saiba usar com perícia os instrumentos técnicos e de comunicação social, cuja importância todos reconheçam devidamente.

Institutos missionários

27. Tudo isto, embora absolutamente necessário a cada um dos enviados ao campo do apostolado, na realidade, dificilmente pode ser conseguido pelos indivíduos isolados. Visto que a mesma obra missionária, como prova a experiência, não pode ser realizada pelos indivíduos isolados, a vocação comum reuniu-os em Institutos, nos quais, pelo esforço comum, se formassem convenientemente e executassem essa tarefa em nome da Igreja e segundo a vontade da autoridade hierárquica. Os Institutos, desde há muitos séculos que têm suportado o peso do dia e do calor, consagrando-se inteiramente ou em parte à empresa apostólica. Muitas vezes a Santa Sé confiou à sua evangelização vastos territórios, nos quais reuniram para Deus um novo povo, uma igreja local à volta dos seus próprios pastores. A essas igrejas, fundadas à custa do seu suor e até do seu sangue, prestarão serviço com zelo e experiência em fraterna cooperação, já na cura das almas, já em cargos especiais em função do bem comum.

Algumas vezes, tomarão a seu cargo em toda uma região certos trabalhos mais urgentes, como por exemplo, a missionação de grupos ou de povos que, devido a especiais razões, ainda não receberam a boa nova do Evangelho, ou a ela resistiram até ao presente (28).

Se for preciso, dediquem-se a formar e ajudar com a sua experiência aqueles que se consagram por um tempo determinado à acção missionária.

Por todos estes motivos, e porque há ainda numerosas gentes para conduzir a Cristo, os Institutos continuam a ser da máxima necessidade.

CAPÍTULO V

A ORGANIZAÇÃO DA ACTIVIDADE MISSIONÁRIA

Introdução: sua necessidade

28. Os fiéis, em virtude de possuirem dons diferentes (1), devem colaborar no Evangelho, cada um segundo as suas possibilidades, aptidões, carismas e ministérios (2); é ainda necessário que todos, os que semeiam e os que segam (3), sejam um só (4), a fim de que, «conspirando livre e ordenadamente para o mesmo fim» (5), empreguem unânimemente as suas forças na edificação da Igreja.

Por isso, os trabalhos dos arautos do Evangelho e os auxílios dos restantes fiéis devem ser orientados e unidos de modo a que tudo se faça com ordem (1 Cor. 14,40) em todas as actividades e esferas da cooperação missionária.

Organização geral

29. O cuidado de anunciar o Evangelho em todas as partes da terra pertence, antes de mais, ao corpo episcopal (6); por isso, o Sínodo episcopal ou «Conselho permanente de Bispos para toda a Igreja» (7), entre os assuntos de importância geral (8), deve atender de modo especial à actividade missionária, que é a principal e a mais sagrada da Igreja (9).

Para todas as missões e para toda a actividade missionária, haja um só dicastério competente, a saber, a Congregação de «Propaganda Fide», que orientará e coordenará, em todo o mundo, tanto a actividade como a cooperação missionária, ressalvando-se, contudo, o direito das Igrejas orientais 1°.

Embora o Espírito Santo suscite, de muitos modos, na Igreja de Deus, o espírito missionário, e não poucas vezes se anteceda à acção dos que governam a vida da Igreja, este dicastério, contudo, deve promover, da sua parte, a vocação e a espiritualidade missionária, o zelo e a oração pelas missões, e uma exacta e adequada informação sobre elas. Suscite e distribua os missionários, segundo as necessidades mais urgentes das regiões. Organize um plano de acção; dele promanem as normas directivas, os princípios para a evangelização, e dele procedam os impulsos. Incite e coordene a recolha eficaz de subsídios, que devem distribuir-se segundo a medida da necessidade ou da utilidade, da extensão do território, do número de fiéis e infiéis, das obras e das instituições, dos auxiliares e dos missionários

Em união com o «Secretariado para a união dos cristãos», procure os meios de realizar e ordenar a colaboração fraterna e a convivência com as iniciativas missionárias doutras comunidades cristãs, a fim de se evitar, quanto possível, o escândalo da divisão.

Por isso, importa que este dicastério seja tanto instrumento de administração como órgão de direcção dinâmica, empregando os métodos científicos e os instrumentos adaptados às condições actuais, e tendo em conta a actual investigação da teologia, metodologia e pastoral missionária.

Na direcção deste dicastério, tenham parte muito activa, com voto deliberativo, representantes escolhidos de todos aqueles que trabalham na obra missionária: os Bispos de todo o mundo, depois de ouvidas as Conferências episcopais, e os Superiores dos Institutos e das Obras pontifícias, segundo as normas e proporções que o Romano Pontífice estabelecer. Todos estes, que hão-de ser convocados em datas fixas, exerçam, sob a autoridade do Sumo Pontífice, a suprema orientação de toda a obra missionária.

Esteja à disposição deste dicastério um grupo permanente de consultores peritos, de reconhecida ciência e experiência, aos quais pertence, entre outras coisas, reunir uma informação oportuna sobre as condições locais das várias regiões, a mentalidade dos diferentes grupos humanos, os métodos de evangelização a empregar, e propor conclusões cientificamente fundadas para a cooperação missionária.

Estejam convenientemente representados os Institutos de religiosas, as obras regionais a favor das missões, e as organizações de leigos, sobretudo as internacionais.

Organização local das missões

30. Para que, no exercício da obra missionária, se atinjam os fins e os resultados, devem todos os operários missionários ter um «só coração e uma só alma» (Act. 4,32).

Pertence ao Bispo, como regra e centro de unidade no apostolado diocesano, promover, dirigir e coordenar a actividade missionária, mas de tal modo que se conserve e fomente a iniciativa espontânea dos que participam na obra. Todos os missionários, mesmo os religiosos isentos, estão sob a sua jurisdição nos vários trabalhos que dizem respeito ao exercício do apostolado (11). Para melhor coordenação, constitua o Bispo, na medida do possível, um Conselho pastoral, em que participem, por meio de delegados escolhidos, os clérigos, os religiosos e os leigos. Procure ainda que a acção apostólica não se limite aos convertidos, mas que os operários e os subsídios se destinem equitativamente à evangelização dos não-cristãos.

Organização regional

31. As Conferências episcopais resolvam, de comum acordo, as questões mais graves e os problemas mais urgentes, sem menosprezarem, contudo, as diferenças locais (12). Para não dissipar o número já insuficiente de pessoas e de subsídios e não multpilicar sem necessidade as iniciativas, recomenda-se a fundação de obras comuns que sirvam o bem de todos; por exemplo, seminários, escolas superiores e técnicas, centros de pastoral, catequética, liturgia e dos meios de comunicação social.

Organize-se igualmente uma oportuna cooperação entre as diversas Conferências episcopais.

Actividade dos Institutos missionários

32. E ainda da máxima importância coordenar as actividades exercidas pelos Institutos ou Associações eclesiásticas. Todos eles, seja qual for o seu género, devem secundar o Ordinário do lugar, em tudo o que se relaciona com a actividade missionária. Por isso, aproveitará muito realizar acordos particulares, em que se regulem as relações entre o Ordinário do lugar e o Superior do Instituto.

Quando a um Instituto for confiado um território, o Superior eclesiástico e o Instituto tenham muito a peito orientar tudo para que a nova comunidade cristã se transforme em igreja local, a qual, no momento oportuno, será governada por pastor próprio, com o seu clero.

Ao acabar o encargo do território, surge uma nova condição. Então, as Conferências episcopais e os Institutos, de comum acordo, estabeleçam as normas que hão-de reger as relações entre os Ordinários de lugar e os Institutos (13). Contudo, pertence à Santa Sé estabelecer os princípios gerais, pelos quais se organizarão os acordos regionais ou até particulares.

Os Institutos devem estar prontos a continuar a obra começada, colaborando no ministério ordinário da cura de almas: mas, com o aumento do clero local, deve providenciar-se a que os Institutos, na medida em que for conforme à sua finalidade, se mantenham fiéis à própria diocese, encarregando-se generosamente de obras especiais ou de alguma região.

Coordenação dos Institutos missionários

33. Os diversos Institutos que se dedicam à actividade missionária no mesmo território procurem os processos e os modos de coordenar as suas obras. Serão, portanto, de grande utilidade, as Conferências de religiosos e as Uniões de religiosas, em que participem todos os Institutos da mesma nação ou região. Vejam Conferências o que podem fazer com o esforço comum e mantenham estreitas relações com as Conferências episcopais.

Tudo isto, por igual motivo, convém estendê-lo à colaboração dos Institutos missionários na sua pátria de origem, de modo que mais facilmente e com menos despesas se possam resolver os assuntos e empreendimentos comuns, como, por exemplo, a formação doutrinal dos futuros missionários, os cursos para missionários, as relações para com as autoridades civis ou organismos nacionais e internacionais.

Coordenação dos Institutos científicos

34. Como o recto e ordenado exercício da actividade missionária exige que os operários evangélicos se preparem cientificamente para a sua função, sobretudo para o diálogo com as religiões e culturas não-cristãs, e que sejam ajudados eficazmente na execução, é de desejar que colaborem entre si fraterna e generosamente a favor das missões todos os Institutos científicos que estudam missiologia e outras disciplinas ou artes úteis às missões, como a etnologia e a linguística, a história e a ciência das religiões, a sociologia, a pastoral e outras coisas semelhantes.

CAPÍTULO VI

A COOPERAÇÃO

Introdução. Consciência da responsabilidade

35. Dado que a Igreja é toda ela missionária, e a obra da evangelização é um dever fundamental do Povo de Deus, o sagrado Concílio exorta todos a uma profunda renovação interior, para que tomem viva consciência das próprias responsabilidades na difusão do Evangelho e assumam a parte que lhes compete na obra missionária junto dos gentios.

Dever missionário de todo o povo de Deus

36. Como membros de Cristo vivo e a Ele incorporados e configurados não só pelo Baptismo mas também pela Confirmação e pela Eucaristia, todos os fiéis estão obrigados, por dever, a colaborar no crescimento e na expansão do Seu corpo para o levar a atingir, quanto antes, a sua plenitude(1).

Por isso, todos os filhos da Igreja tenham consciência viva das suas responsabilidades para com o mundo, fomentem em si um espírito verdadeiramente católico, e ponham as suas forças ao serviço da obra da evangelização. Saibam todos, porém, que o primeiro e mais irrecusável contributo para a difusão da fé, é viver profundamente a vida cristã. Pois o seu fervor no serviço de Deus e a sua caridade para com os outros é que hão-de trazer a toda a Igreja o sopro de espírito novo que a fará aparecer como um sinal levantado entre as nações (2), como «luz do mundo» (Mt. 5,14) e «sal da terra» (Mt. 5,13). Este testemunho de vida produzirá mais facilmente o seu efeito, se for dado conjuntamente com as outras comunidades cristãs, segundo as normas do decreto sobre o ecumenismo (3).

Deste espírito renovado brotará espontâneamente a oferta de orações e de obras de penitência a Deus, para que fecunde com a sua graça a acção dos missionários; dele nascerão vocações missionárias e sairão os recursos de que as missões necessitam.

Porém, para que todos e cada um dos fiéis conheçam plenamente o estado actual da Igreja no mundo e oiçam a voz das multidões que clamam: «Vem em nosso auxílio» (4) facilitem-se, até pelos meios modernos de comunicação social, notícias missionárias tais que os façam sensíveis à actividade missionária e lhes abram o coração a tão profundas e imensas necessidades dos homens par lhes poderem valer.

É também necessária uma coordenação das notícias e a cooperação com os organismos nacionais e internacionais.

Dever missionário das comunidades cristãs

37. Como o Povo de Deus vive em comunidades, sobretudo diocesanas e paroquiais, e é nelas que, de certo modo, se torna visível, pertence a estas dar também testemunho de Cristo perante as nações.

A graça da renovação não pode crescer nas comunidades, a não ser que cada uma dilate o campo da sua caridade até aos confins da terra e tenha igual solicitude pelos que são de longe como pelos que são seus próprios membros.

Assim, toda a comunidade reza, coopera e exerce actividade entre os gentios, por meio dos seus filhos a quem Deus escolheu para este importantíssimo encargo.

É muito útil que, contanto que não crie desinteresse pela obra missionária universal, manter relações com os missionários oriundos da própria comunidade ou com determinada paróquia ou diocese das missões, para tornar visível a comunhão entre as comunidades e contribuir para mútua edificação.

Dever missionário dos Bispos

38. Todos os Bispos, como membros do corpo episcopal, sucessor do Colégio apostólico, são consagrados não só em benefício duma diocese mas para salvação de todo o mundo. O mandato de Cristo de pregar o Evangelho a toda a criatura (5) afecta-os, primária e imediatamente a eles, com Pedro e sob Pedro. Daí nascem aquela comunhão e cooperação das igrejas, hoje tão necessárias para levar a cabo a obra da evangelização. Em virtude desta comunhão, cada uma das igrejas leva em si a solicitude por todas as outras, manifestam umas às outras as próprias necessidades, comunicam entre si as suas coisas, pois a dilatação do corpo de Cristo é dever de todo o Colégio episcopal (6).

Na sua diocese, o Bispo, que forma uma só coisa com ela, ao suscitar, promover e dirigir a obra missionária, torna presentes e como que palpáveis o espírito e o ardor missionário do Povo de Deus, de maneira que toda a diocese se torna missionária. É da responsabilidade do Bispo suscitar no seu povo e sobretudo entre os doentes e os oprimidos, almas que ofereçam a Deus, de todo o coração, orações e penitências pela evangelização do mundo; favorecer de bom grado as vocações de jovens e até de clérigos para os Institutos missionários, aceitando reconhecido que Deus escolha alguns para a actividade missionária da Igreja; exortar e ajudar as Congregações diocesanas para que assumam a sua parte nas missões; promover junto dos seus fiéis as obras dos Institutos missionários, mas sobretudo as Obras missionárias pontifícias. Com todo o direito se deve dar o primeiro lugar a estas Obras, uma vez que são meios quer para dar aos católicos um sentido verdadeiramente universal e missionário logo desde a infância, quer para promover colectas eficazes de subsídios para bem de todas as missões segundo as necessidades de cada uma (7).

Como cresce de dia para dia a necessidade de operários na vinha do Senhor e os sacerdotes diocesanos desejam, eles também, ter parte cada vez maior na evangelização do mundo, o sagrado Concílio deseja que os Bispos, ponderando a gravíssima penúria de sacerdotes que impede a evangelização de muitas regiões, enviem, depois da devida preparação, alguns dos seus melhores sacerdotes que se ofereçam para as missões, para as dioceses mais carecidas de clero, com o fim de exercerem aí o ministério missionário em espírito de serviço, pelo menos durante um tempo determinado (8).

Mas, para que a actividade missionária dos Bispos a bem de toda a Igreja se possa exercer mais eficazmente, convém que as Conferências episcopais tomem a direcção de todos os assuntos que dizem respeito a uma ordenada cooperação da própria região.

Nas suas Conferências tratem os Bispos dos sacerdotes do clero diocesano que devem dedicar à evangelização dos gentios; da contribuição fixa que cada diocese, em proporção com os seus recursos, deve oferecer todos os anos para a obra das missões (9); da direcção e organização das formas e dos meios de ajudar directamente as missões; do auxílio e, se for preciso, até da fundação de Institutos missionários e seminários do clero diocesano para as missões; do estreitamento dos laços entre estes Institutos e as dioceses.

Às Conferências episcopais pertence também fundar e promover instituições que fraternalmente recebam e ajudem, com o devido interesse pastoral, os que, por razões de estudo ou de trabalho, emigram das terras de missão. Por eles, com efeito, povos longínquos tornam-se em certo modo vizinhos, e às comunidades cristãs mais antigas oferece-se uma óptima ocasião de dialogar com nações que ainda não ouviram pregar o Evangelho e de lhes mostrar no próprio exercício do amor e da ajuda, o genuíno rosto de Cristo (10).

Dever missionário dos sacerdotes

39. Os sacerdotes representam a pessoa de Cristo e são cooperadores da ordem episcopal, na tríplice função sagrada, que por sua natureza tem relação com a missão da Igreja (11). Entendam, pois, muito bem que a sua vida foi consagrada também ao serviço das missões. Uma vez que pelo seu mesmo ministério — que consiste principalmente na Eucaristia, que aperfeiçoa a Igreja — estão em comunhão com Cristo cabeça e trazem os outros a essa comunhão, não podem deixar de sentir quanto falta ainda para o pleno crescimento do corpo e quanto há que fazer, portanto, para que vá crescendo cada vez mais. Organizarão, pois, de tal maneira o trabalho pastoral que contribua para a dilatação do Evangelho entre os não-cristãos.

Os sacerdotes, no trabalho pastoral, farão por excitar e alimentar entre os fiéis o zelo pela evangelização do mundo, instruindo-os com a catequese e a pregação sobre o dever que a Igreja tem de anunciar Cristo aos gentios; persuadindo as famílias cristãs da necessidade e da honra de cultivar as vocações missionárias entre os próprios filhos e filhas; fomentando o fervor missionário entre os jovens das escolas e associações católicas, de maneira a sairem dentre eles futuros arautos do Evangelho. Ensinem os fiéis a orar pelas missões e não tenham vergonha de lhes pedir esmolas, feitos como que mendigos por Cristo e pela salvação das almas (12).

Os professores dos Seminários e Universidades elucidarão os alunos sobre a verdadeira situação do mundo e da Igreja, para que abram os olhos à necessidade duma evangelização mais intensa dos não-cristãos e o seu zelo se acenda. E ao ensinar as questões dogmáticas, bíblicas, morais e históricas, chamem a atenção para os aspectos missionários nelas contidos, para desse modo se ir formando a consciência missionária dos futuros sacerdotes.

Dever missionário dos Institutos

40. Os Institutos religiosos de vida contemplativa e activa tiveram até agora e continuam a ter a maior parte na evangelização do mundo. O sagrado Concílio reconhece gostosamente os seus méritos e dá graças a Deus por tantos esforços prestados à causa da glória de Deus e do serviço das almas e exorta-os a prosseguir incansàvelmente na obra começada, sabendo, como sabem, que a virtude da caridade, que por vocação têm de cultivar com mais perfeição, impele e obriga a um espírito e a um trabalho verdadeiramente católicos (13).

Os Institutos de vida contemplativa, pelas suas orações, penitências e tribulações, têm uma importância máxima na conversão das almas, visto que é Deus quem pelas nossas orações envia operários para a Sua messe (14), abre as almas dos não-cristãos para ouvir o Evangelho (15), e fecunda nos seus corações a palavra da salvação (16). Pede-se até a esses Institutos que fundem casas nas terras de missão como já bastantes fizeram, para que, levando aí uma vida acomodada às genuínas tradições religiosas dos povos, dêem entre os não-cristãos um testemunho brilhante tanto da majestade e da caridade de Deus como da sua união em Cristo.

Por seu lado, os Institutos de vida activa, quer tenham um fim estritamente missionário quer não, examinem sinceramente diante de Deus se podem alargar mais a sua actividade em ordem à expansão do reino de Deus entre os gentios; se podem deixar a outros, certos ministérios, para dedicar às missões as suas forças; se podem começar a ter actividades nas missões, adaptando, se for preciso, as suas Constituições, embora segundo a mente do fundador; se os seus membros participam quanto podem na actividade missionária; se o seu modo de viver é um testemunho do Evangelho adaptado à índole e às condições do povo.

Uma vez que, sob a inspiração do Espírito Santo, crescem de dia para dia na Igreja os Institutos seculares, a sua ajuda, sob a autoridade do Bispo, pode ser a muitos títulos proveitosa para as missões, como sinal duma entrega plena à evangelização do mundo.

Dever missionário dos leigos

41. Os leigos colaboram na obra de evangelização da Igreja e participam da sua missão salvífica (17), ao mesmo tempo como testemunhas e como instrumentos vivos sobretudo se, depois de chamados por Deus, são incorporados pelos Bispos nesta empresa.

Nas terras já cristãs, os leigos concorrem para a obra de evangelização, fomentando em si e nos outros o conhecimento e o amor pelas missões, suscitando vocações na própria família, nas associações católicas e nas escolas, oferecendo auxílios de toda a espécie para que o dom da fé, que eles receberam de graça, possa ser também oferecido a outros.

Nas terras de missão, os leigos, quer estrangeiros quer nativos, exerçam o ensino nas escolas, administrem as coisas temporais, colaborem na actividade paroquial e diocesana, iniciem e promovam as várias formas de apostolado dos leigos, para que os fiéis das igrejas jovens possam assumir quanto antes a sua parte na vida da Igreja (18).

Finalmente, prestem os leigos, de bom grado, colaboração económico-social aos povos em vias de desenvolvimento; essa colaboração será tanto mais de louvar, quanto mais se relaciona com a criação daquelas instituições que atingem as estruturas fundamentais da vida social ou se ordenam à formação daqueles que têm responsabilidade de governo.

São dignos de particular louvor aqueles leigos que nas Universidades ou em Institutos científicos promovem, com as suas investigações históricas ou científico-religiosas, o conhecimento dos povos e das religiões, ajudando assim os pregadores do Evangelho e preparando o diálogo com os não-cristãos.

Colaborem fraternalmente com os outros cristãos, com os não-cristãos, sobretudo com os membros das organizações internacionais, tendo sempre diante dos olhos e preocupação de que «a edificação da cidade terrena se alicerce no Senhor e para Ele se oriente»(19).

Para desempenhar todas estas funções, precisam os leigos da necessária preparação técnica e espiritual, que se deve dar em Institutos a isso destinados, para que a sua vida seja entre os não-cristãos um testemunho de Cristo, segundo a palavra do Apóstolo: «Não deis ocasião de escândalo nem a judeus nem a gentios nem à Igreja de Deus, como também eu em tudo procuro agradar a todos, não buscando a minha própria utilidade, mas a dos outros, a fim de que sejam salvos» (1Cor. 10, 32-33).

CONCLUSÃO

42. Os Padres do Concílio, em união com o Romano Pontífice, sentindo vivamente a obrigação de difundir por toda a parte o reino de. Deus, saudam muito afectuosamente todos os pregadores do Evangelho, sobretudo aqueles que sofrem perseguição pelo nome de Cristo, e associam-se aos seus sofrimentos (20).

Também eles se sentem inflamados do mesmo amor em que Cristo ardia pelos homens. Mas, conscientes de que Deus é quem faz com que o seu reino venha ao mundo, unem as suas preces às de todos os cristãos para que, por intercessão da Virgem Maria, Rainha dos Apóstolos, as nações sejam quanto antes conduzidas ao conhecimento da verdade (21) e a glória de Deus, que resplandece no rosto de Jesus Cristo, comece a brilhar para todos pelo Espírito Santo (22).

Roma, 7 de Dezembro de 1965

PAPA PAULO VI


Notas

Proémio e Capítulo I

1. Const. dogm. de Ecclesia, Lumen Gentium, 48: AAS 57 (1965), p. 53.

2. Cfr. Mc. 16,15.

3. S. Agostinho, Enarr. in Ps. 44, 23: PL 36, 508; CChr. 38, 150.

4. Cfr. Mt. 5, 13-14.

5. Cfr. Eccli. 36,19.

6. Cfr. Conc. Vatic. II Const. dogm. De Ecclesia, Lumen Gentium, n. 2: AAS 57 (1965), p. 5-6.

7. Cfr. Jo. 11,52.

8. Cfr. S. Ireneu, Adv. Haer. III, 18, 10 «O Verbo que existe junto de Deus, por quem foram feitas todas as coisas, e que sempre estava presente ao género humano...»: PG 7, 932; id. IV, 6, 7: «Com efeito, o Filho, presente desde a primeira hora à sua obra, a todos vai revelando o Pai, a quantos, quando e do modo que o Pai quer» (ibid. 990); cfr. IV, 20, 6 e 7 (ib. 1037); Demonstratio n, 34: Patr. Or., XII, 773; Sources Chrét., 62, Paris 1958, p. 87; S. Clemente de Alexandria, Protrept. 112 1: GCS Clemens I, 79; Strom. VI, 6, 44, 1: GCS ClemensLumen Gentium, n.° 16: AAS 57 (1965), p. 20. II, 453; 13, 106, 3 e 4 (ibid. 485). Para a mesma doutrina, cfr. Pio XII: Radiomensagem, 31 dez. ]952; Cone. Vat. II Const. dogm. De Ecclesia

9. Cfr. Col. 1,13; Act. 10,38.

10. Cfr. 2 Cor. 5,19.

11. Cfr. Hebr. 1,2; Jo. 1, 3 e 10; 1 Cor. 8,6; Col. 1,16.

12. Cfr. Ef. 1,10.

13. Cfr. 2 Cor. 8,9.

14. Cfr. Mc. 10,45.

15. Cfr. S. Atanásio, Ep. ad Epictetum 7: PG 26, 1060; S. Cirilo de Jerusalém, Catech. 4, 9: PG 33, 465; Mário Victorino, Adv. Arium, 3, 3: PL, 8, 1101; S. Basílio, Epist. 261, 2: PG 32, 969; S. Gregório Nazianzeno, Epist. 101: PG 37, 181; S. Gregório Nisseno, Antirrheticus; Adv. Apollin. 17: PG 45, 1156; S. Ambrósio, Epist. 48, 5: PL, 16, 1153; S. Agostinho, In Joahn. Ev. tratado XXIII, 6: PL 35, 1585; CChr 36, 236; além disso, mostra deste modo como não foi o Espírito Santo que nos redimiu, visto que não incarnou: De Agone Christ. 22, 24: PL 40, 302; S. Cirilo de Alexandria, Adv. Nestor, 1, 1: PG 76, 20; S. Fulgéncio, Epist. 17, 3, 5: PL 65, 454; Ad Trasimundum III, 21: PL 65, 284: da tristeza e do temor.

16. Cfr. Heb. 4,15; 9,28.

17. Cfr. Act. 1,8.

18. Cfr. Lc. 24,47.

19. Foi o Espírito que falou pelos Profetas; Symbol. Constantinopol.Sermo 76: PL 54, 405-406: «Quando o Espírito Santo encheu os discípulos do Senhor no dia de Pentecostes, não foi então o começo da sua missão, mas um acréscimo de largueza: porque já os patriarcas, os profetas, os sacerdotes, e todos os santos que houve antigamente, foram robustecidos pela santificação do mesmo Espírito,... embora não fosse a mesma a medida dos dons». Também Sermo 77, 1: PL 54, 412; Leão XIII, Encícl. Divinum illud: ASS (1897), 650-651. Também S. João Crisóstomo, ainda que insista na novidade da missão do Espírito Santo no dia de Pentecostes: In Eph. c. 4, Hom. 10, 1: PG 62, 75. Denz.-Schoenmetzer, 150; S. Leão Magno,

20. Cfr. Jo. 14,16.

21. De Babel e do Pentecostes falam muitas vezes os Santos Padres: Origenes, In Genesim, c. 1: PG 12, 112; S. Gregório Nazianzeno, Oratio 41, 16: PG 36, 449; S. João Crisóstomo, Hom. 2 in Pentec., 2: PG 50, 467; In Act. Apost.: PG 60, 44; S. Agostinho, En. in Ps. 54, 11: PL 36, 636; CChr. 39, 664 s.; Sermo 271: PL 38, 1245; S. Cirilo de Alexandria, Glaphyra in Genesim II: PG 69, 79; S. Gregório Magno, Hom. in Evang., Lib. II, Hom. 30, 4: PL 76, 1222; S. Beda, in Hexaem., Lib. III: PL 91, 125. Veja-se também a imagem que existe no átrio da Basilica de S. Marcos de Veneza. A Igreja fala todas as línguas, e assim a todos acolhe na catolicidade da fé: S. Agostinho, Sermones 266, 267, 268, 269: PL 38, 1225-1237; Sermo 175, 3: PG 38, 946; S. João Crisóstomo, In Epist. I ad Cor., Homil. 35: PG 61, 296; S. Cirilo de Alexandria, Fragm. in Act.: PG 74, 758; S. Fulgêncio, Sermo 8, 2-3: PL 65, 743-744. Acerca do Pentecostes como consagração dos Apóstolos para a missão, cfr. J. A. Cramer, Catena in Acta SS. Apostolorum, Oxford, 1838, pg. 24 s.

22. Cfr. Lc. 3,22; 4,1; Act. 10,38.

23. Cfr. Jo. 14-17; Paulo VI, Alocução proferida no Concílio no dia 14 de Setembro de 1964: AAS 56 (1964), p. 807.

24. Cfr. Const. dogm. De Ecclesia, Lumen Gentium, 4: AAS 57.

25. S. Agostinho, Sermo 267, 4: PL 38, 1231: a0 Espírito Santo faz em toda a Igreja o que a alma em todos os membros dum mesmo corpo». Cfr. Const. dogm. De Ecclesia Lumen Gentium, 7 (com a nota 8): AAS 57 (1965), p. 11.

26. Cfr. Act. 10, 44-47; 11,15; 15,8

27. Cfr. Act. 4,8; 5,32; 8,26. 39; 9,31; 10; 11, 24. 28; 13, 2. 4. 9; 16, 6-7; 20, 22-23; 21, 11, etc.

28. Cfr. também Mt. 10, 1-42.

29. Cfr. Mt. 28,18.

30. Cfr. Act. 1, 4-8.

31. Cfr. Jo. 20,21.

32. Cfr. Col. 1,24.

33. Tertuliano, Apologeticum, 50, 13: PL 1,534; CChr. I, 171.

34. Já S. Tomás de Aquino fala da função apostólica de implantar a Igreja: efr. Sent. Lib. I, dist. 16, q. 1, a. 2 ad 2 e ad 4; a. 3 sol.; Summa Theol. I, q. 43, a. 7 ad 6; I-II, q. 106, a. 4 ad 4. Cfr. Bento XV, Maximum illud, 30 nov. 1919: AAS 11 (1919), 445 e 453; Pio XI, Rerum Ecclesiae, 28 fev. 1926: AAS 18 (1926), 74; Pio XII, 30 abr. 1939 aos Directores das 00. MM. PP.: AAS 36 ID. 24 jun. 1944 aos Directores das OO. MM. PP.: AAS 36 (1944), 210; de novo em AAS 42 1950, 727, e 43 (1951), 508; ID. 29 jun. 1948 ao clero indígena: AAS (1944), 210; 374; ID. Evangelii Praecones, 2 jun. 1951: AAS 43 (1951), 507; ID. Fidei Donum, 15 jan. 1957: AAS 49 (1957), 236; João XXIII, Princeps Pastorum, 28 nov. 1959: AAS 51, (1959), 835; Paulo VI, Hom. 18 out. 1964: AAS 55 (1964), 911. Tanto os Sumos Pontífices como os Santos Padres e os Escolásticos falam muitas vezes da dilatação da Igreja: S. Tomás de Aquino, Comm. in Math. 16,28; Leão XIII, Encicl. Sancta Dei Civitas, 3 dez. 1880: ASS 55 (1880), 241 Bento XV, Encícl. Maximum Illud, 30 nov. 1919 AAS 11 (1919), 442; Pio XI, Encicl. Rerum Ecclesiae, 28 fev. 1926: AAS 18 (1926), 65.

35. Nesta noção de actividade missionária, como se vê, incluem-se também, quanto à substância, aquelas regiões da América Latina, nas quais nem Hierarquia própria, nem maturidade da vida cristã, nem uma pregação suficiente do Evangelho se dão ainda. Se, porém, estes territórios são de jacto tidos pela S. Sé como missionários, isso não depende do Concilio. É por isso que, a propósito da conexão entre a noção de actividade missionária e certos territórios, se diz muito intencionalmente que esta actividade se exerce «geralmente» (plerumque) em certos territórios como tais reconhecidos pela S. Sé.

36. Conc. Vat. II, Decr. De Oecumenismo, Unitatis Redintegratio, n. 1: AAS 57 (1965), p. 90.

37. Cfr. Mc. 16,16; Jo. 3,5.

38. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecelesia Lumen Gentium, n.° 14: AAS 57 (1965), p. 18.

39. Cfr. Hebr. 11,6.

40. Cfr. 1 Cor. 9,16.

41. Cfr. Ef. 4, 11-16.

42. Cfr. Jo. 7,18; 8, 30 e 44; 8,50; 17,1.

43. Acerca desta ideia sintética, ver a doutrina de S. Ireneu sobre a Recapitulação. Cfr. também Hipólito, De Antichristo, 3: «Querendo a todos e desejando salvar a todos, querendo fazer a todos filhos de Deus e chamando todos os santos a formar um só homem perfeito...» PG 10, 732; GCS Hippolyt I, 2 p. 6; Benedictiones Jacob, 7: T. U., 38-1 pg. 18, linha 4 ss.; Origenes, In Joann.«Então, sim, a única ocupação daqueles que chegarem até Deus será a de conhecer a Deus, presididos por aquele Verbo que está junto de Deus; para que assim todos os filhos sejam cuidadosamente formados no conhecimento do Pai, como o Filho que agora é o único que conhece o Pai»: PG, 14, 49; GCS Orig. IV, 20; S. Agostinho, De Sermone Domini in monte, I, 41: «Estimemos tudo aquilo que pode ser conduzido connosco àquele reino, onde ninguém diz: meu Pai, mas todos dizem a um só Deus: Pai nosso»: PL 34, 1250; S. Cirilo de Alexandria, in Joann. I: «Todos estamos em Cristo e nele revive a natureza comum da Humanidade. Pois, por isso mesmo, foi chamado o novo Adão... Com efeito, habitou entre nós aquele que por natureza é o Filho e Deus; por isso, no seu Espírito podemos chamar: Abba, Pai! Habita, de facto, o Verbo entre nós num templo único, que precisamente quis construir para si de algo nosso e por causa de nós, para que tendo-nos a todos em si mesmo, num só corpo, nos reconciliasse a todos com o Pai, como diz Paulo: PG 73, 161-164. Tom. I, n. 16:

44. Bento XV, Maximum Illud, 30 nov. 1919: AAS 11 (1919), p. 445: «Porque sendo a Igreja de Deus católica e não estrangeira para nenhum povo ou nação...» Cfr. João XXIII, Encícl. Mater et Magistra: «A Igreja, por direito divino, pertence a todas as nações... por isso, uma vez que inseriu a sua força, como que nas veias de algum povo, já não é nem se julga como uma instituição qualquer, imposta de fora a esse povo... E, por isso, tudo aquilo que lhes parece bom e honesto, apoiam-no e completam-no» (subentenda-se: aqueles que renasceram em Cristo); 25 maio 1961 AAS 1961, 444.

45. Cfr. Jo. 3,18.

46. Cfr. S. Ireneu, Adv. Haer. III, 15, n. 3: PG 7, 919: «Foram pregadores da verdade e apóstolos da liberdade».

47. Breviarium Romanum, Ant. O, Vésperas do dia 23 de Dez.

48. Cfr. Mt. 24,31; Didachè, 10,5: Funk I, p. 32.

49. Cfr. Me. 13,10.

50. Cone. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia Lumen Gentium, 17: AAS 57 (1965) p. 20-21. S. Agostinho, De Civitate Dei, 19,17: PL 41, 646; Instr. da S. Congregação «de Propaganda Fide» : Collectanea I, n, 135, p. 42.

51. Segundo Orígenes, o Evangelho deve ser pregado antes da consumação deste mundo: Hom. in Lc. XXI: GCS, Orig. IX, 136, 21 ss.; In Matth. comm. ser. 39: X, 75, 25 ss.; 76, 4 ss.; Hom. in lerem. III, 2: VII, 308, 29 ss.; S. Tomás, Summa Theol. I-II, q. 106, a. 4, ad 4.

52. Cfr. Act. 1,7.

53. Hilário de Poitiers, In Ps. 14: PL 9, 301; Eusébio de Cesareia, In Isaiam 54, 2-3: PG 24, 462-463; Cirilo de Alexandria, In Isaiam V, cap. 54, 1-3: PG 70, 1193.

54. Cfr. Ef. 4,13.

55. Cfr. Jo. 4,23.

Capítulo II

1. Cfr. Mt. 5,16.

2. Cfr. 1 Jo. 4,11.

3. Cfr. Mt. 9,35 ss.; Act. 10,38.

4. Cfr. 2 Cor. 12,15.

5. Cfr. Mt. 20,26; 23,11; alocução de Paulo VI, no dia 21 nov. 1964, na aula conciliar: AAS 56 (1964), 1013.

7. Cfr. Col. 4,3.

8. Cfr. Mc. 16,15.

9. Cfr. Act. 4, 13. 29. 31; 9, 27-28; 13,46; 14,3; 19,8; 26,26; 28,31; 1 Tess. 2,2; 2 Cor. 3,12; 7,4; Fil. 1,20; Ef. 3,12; 6, 19-20.

10. Cfr. 1 Cor. 9,15; Rom. 10,14.

11. Cfr. 1 Tess. 1, 9-10; 1 Cor. 1, 18-21; Gál. 1,31; Act. 14, 15-17; 7, 22-31.

12. Cfr. Act. 16,14.

13. Cfr. Col. 3, 5-10; Ef. 4, 20-24.

14. Cfr. Lc. 2,34; Mt. 10, 34-39.

15. Cfr. 1 Tess. 1,6.

16. Cfr. Conc. Vat. II, Declaração De Libertate religiosa, Dignitatis humanae, 2, 4, 10; Const. past. De Ecclesia in mundo huius temporis, Gaudium et spes, n.° 21.

17 Cfr. Conc. Vat. II, Const, dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, 17: AAS 57 (1965), p. 20-21.

18. Cfr. Const. De sacra liturgia, Sacrosanctum Concilium, 64-65: AAS 56 (1964), 117.

19. Cfr. Col. 1,13. Desta libertação da escravidão do demónio e das trevas, cfr. Mt. 12,28; Jo. 8,44; 12,31 (cfr. 1 Jo. 3,8; EL 2, 1-2). Cfr. no Ritual romano, Liturgia do Baptismo.

20. Cfr. Rom. 6, 4-11; Col. 2, 12-13; 1 Ped. 3, 21-22; Mc. 16,16.

21. Cfr. 1 Tess. 3, 5-7; Act. 8, 14-17.

22. Cfr. Concilio Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 14: AAS 57 (1965), p. 19.

23. Cfr. S. Agostinho, Tract. in Joann. 11, 4: PL 35, 1476.

24. Cfr. Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n.° 9: AAS 57 (1965), p. 13.

25. Cfr. 1 Cor. 3,9

26. Cfr. Ef. 4,1.

27. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 10. 11. 34: AAS 57 (1965), p. 10-17; 39-40.

28. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De divina Revelatione, Dei Verbum, n.o 21: AAS 57 (1965), p. 24.

29. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 12. 35: AAS 57 (1965), P. 16; 40-41.

30. Cfr. Ibid., n. 23, 36: AAS 57 (1965), p. 28: 41-42.

31. Cfr. Ibid., 12, 11, 35, 41: AAS 57 (1965), p. 15-16; 40-41, 47.

32. Cfr. Conc. Vat. II, Decreto De Ecclesiis orientalibus, Orientalium Ecclesiarum, n. 4: AAS 57 (1965), P- 77-78.

33. Carta a Diogneto, 5: PG 2, 1173; cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 38: AAS 57 (1965), p. 43.

34. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 32: AAS 57 (1965), p. 38; Cone. Vat. II, Decreto De apostolatu laicorum, Apostolicam Actuositatem, n. 5-7.

35. Cfr. Conc. Vat. II, Decreto De institutione sacerdotali, Optatam totius, n. 4, 8, 9.

36. Cfr. Conc. Vat. II, Const. De sacra liturgia, Sacrosanctum concilium, n. 17: AAS 56 (1964), p. 105.

37. Cfr. Conc. Vat. II, Decreto De institutione sacerdotali, Optatam totius, n. 1.

38. Cfr. João XXIII, Enc. Princeps Pastorum, 28 nov. 1959: AAS 51 (1959), 843-844.

39. Cfr. Conc. Vat. II, Decreto De Oecumenismo, Unitatis Redintegratio, n. 4: AAS 57 (1965), p. 94-96.

40. Cfr. João XXIII, Enc. Princeps Pastorum, 28 nov. 1959: AAS 51 (1959), 842.

41. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 29: AAS 57 (1965), p. 36.

42. Cfr. João XXIII, Enc. Princeps Pastorum, 28 nov. 1959: AAS 51 (1959), p. 855.

43. Trata-se dos chamados « catechistes à plein temps», «full time catechists».

44. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 31, 44: AAS 57 (1965), p. 37, 50-51.

Capítulo III

1. Cfr. João XXIII, Enc. Princeps Pastorum, 28 nov. 1959: AAS 51 (1959) 838.

2. Cfr. Conc. Vat. II, Decreto De ministerio et vita sacerdotali, Presbyterorum Ordinis, n. 11; Decreto De institutione sacerdotali, Optatam totius, n. 2.

3. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, 25: AAS 57 (1965), p. 29.

4. Cfr. Conc. Vat. II, Decreto De ministerio et vita praesbyterorum, Presbyterorum Ordinis, 10, onde, para tornar mais fáceis as obras Pastorais a favor dos diversos agrupamentos sociais, se prevê a constituição de Prelaturas pessoais, na medida em que o ordenado exercício do apostolado o exigir.

5. Cfr. 1 Cor. 15,23.

6. Cfr. 1 Cor. 15,28.

7. Cfr. Ef. 4,24.

8. Cfr. Salmo 2,8.

9. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 13: AAS 57 (1965), p. 17-18.

10. Cfr. Aloc. de Paulo VI na canon. dos Mártires de Uganda, 18 out. 1964: AAS 56 (1964), p. 908.

11. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Eeclesia, Lumen gentium, n. 13: AAS 57 (1965), p. 18.

Capítulo IV

1. Conc. Vat. 11, Const. dogm. De Ecelesia Lumen gentium, n. 17: AAS 57 (1965), p. 26.

2. Cfr. Mc. 3,13 ss.

3. Cfr. 1 Cor. 12,11.

4. Por «Institutos» entendem-se as Ordens, Congregações, Institutos e Associações que trabalham nas Missões.

5. Cfr. Pio XI, Rerum Ecclesiae, 28 fev. 1926: AAS 18 (1926), p. 69-71; Pio XII, Saeculo exeunte, 13 jun. 1940: AAS 32 (1940) p. 256; Evangelii Praecones, 2 jun. 1951: AAS 43 (1951), p. 506.

6. Cfr. Act. 13,2.

7. Cfr. Gál. 1,16.

8. Cfr. 1 Cor. 9,22.

9. Cfr. Ef. 6,19 ss.; Act. 4,31.

10. Cfr. Mt. 11,29 ss.

11. Cfr. Bento XV, Maximum Illud, 30 nov. 1919: AAS 11 (1919), p. 449-450.

12. Cfr. 2 Cor. 6,4 ss.

13. Cfr. 2 Cor. 8,2.

14. Cfr. 1 Tim. 4,14; Ef. 4,23; 2 Cor. 4,16.

15. Cfr. Bento XV, Maximum Illud, 30 nov. 1919: AAS 11 (1919), p. 448-449; Pio XII, Evangelii Praecones, 2 jun. 1951: AAS 43 (1951), p. 507. Na formação dos missionários sacerdotes deve ter-se também em conta o que se prescreve no Conc. Vat. II, Decreto De Institutione sacerdotali, Optatam totius.

16. Cfr. Act. 2,42; 4,32.

17. Cfr. 2 Tim. 1,7.

18. Cfr. Fil. 4,11.

19. Cfr. 2 Cor. 4,10 ss.

20. Cfr. 2 Cor. 12,15 ss.

21. Cfr. Cone. Vat. II, Const. dogm. De Ecelesia, Lumen gentium, n. 41: AAS 57 (1965), p. 46.

22. Cfr. Bento XV, Maximum illud, 30 nov. 1919: AAS 11 (1919), p. 440; Pio XII, Evangelii Praecones, 2 jun. 1951: AAS 43 (1951), p. 507.

23. Bento XV, Maximum illud, 30 nov. 1919: AAS 11 (1919), p. 448; Decr. da S. C. P. F., 20 maio 1923: AAS 15 (1923), p. 369-370; Pio XII, Saeculo exeunte, 2 jun. 1940: AAS 32 (1940), p. 256; Evangelii Praecones, 2 jun. 1951: AAS 43 (1951), p. 507; João XXIII, Princeps Pastorum, 28 nov. 1959: AA.S 51 (1959), p. 843-844.

24. Cfr. Conc. Vat. II, Decr, De Institutione sacerdotali, Optatam totius, n. 19-21; Cfr. também Const. Apost. Sedes Sapientiae, com os Estatutos gerais, 31 maio 1956: AAS 48 (1956), p. 354-365.

25. Pio XII, Evangelii Praecones, 2 jun. 1951: AAS 43 (1951), p. 523-524.

26 Cfr. Bento XV, Maximum illud, 30 nov. 1919: AAS 11 (1919), p. 448; Pio XII, Evangelii Praecones, 2 jun. ].951: AAS 48 (1951), p. 507.

27 Cfr. Pio XII, Fidei donum, 15 jun. 1957: AAS 49 (1957), p. 234.

28 Cfr. Conc. Vat. II, Decr. De ministerio et vita presbyterorum, Presbyterorum Ordinis, n.° 10, onde se trata das dioceses, prelaturas pessoais e coisas parecidas.

Capítulo V

1. Cfr. Rom. 12,6.

2. Cfr. 1 Cor. 3,10.

3. Cfr. Jo. 4,37.

4. Cfr. 1 Cor. 3,8.

5. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 18: AAS 57 (1965), p. 22.

6. Cfr. Conc. Vat. II, ibid., n. 23: AAS 57 (1965), p. 28.

7. Motu proprio Apostolica Sollicitudo, 15 set. 1955: AAS 57 (1965), p. 776.

8. Paulo VI, Aloc. ao Concílio, 21 nov. 1964: AAS 56 (1964), p. 1011.

9. Bento XV, Maximum illud, 30 nov. 1919: AAS 11 (1919), p. 39-40.

10. Se algumas Missões, por razões particulares, estão sob a jurisdição de outros Dicastérios, importa que estes estejam em comunicação com a S. Congregação De Propaganda Fide, para que possa haver uma regra e norma constante e uniforme, na ordenação e direcção de todas as Missões.

11. Cfr. Conc. Vat. II, Decr. De pastorali Episcoporum munere in Ecclesia, Christus Dominus, n:° 35,4.

12. Cfr. Conc. Vat. II, ibid., n.° 36-38.

13. Cfr. Conc. Vat. II, Decr. De pastorali Episcoporum munere in Ecclesia, n.° 35, 5-6.

Capítulo VI

1. Cfr. Ef. 4,13.

2. Cfr. Is. 11,12.

3. Cfr. Conc. Vat. II, Decreto De Oecumenismo, Unitatis Redintegratio, n.° 12: AAS 57 (1965), p. 99.

4. Cfr. Act. 16,9

5. Cfr. Mc. 16,15.

6. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecelesia, Lumen gentium, n. 23-24: AAS 57 (1965), p. 27-29.

7. Cfr. Bento XV, Maximum illud, 30 nov. 1919: AAS 11 (1919), p. 453-454; Pio XI, Rerum Ecclesiae, 28 fev. 1926: AAS 18 (1926), p. 71-73; Pio XII, Evangelii Praecones, 2 jun. 1951: AAS 43 (1951), p. 525-526; ID., Fidei Donum, 15 jan. 1957: AAS 49 (1957), 241.

8. Cfr. Pio XII, Fidei Donum, 15 jan. 1957: AAS 49 (1957), 245-246.

9. Cfr. Conc. Vat. II, Decreto De pastorali Episcoporum munere, Christus Dominus, n. 6.

10. Cfr. Pio XII, Fidei Donum, 15 jan. 1957: AAS 49 (1957), 245.

11. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 28: AAS 57 (1965), 34.

12. Cfr. Pio XII, Rerum Ecclesiae, 28 fev. 1926: AAS 28 (1926), 72.

13. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 44: AAS 57 (1965), p. 50.

14. Cfr. Mt. 9,38.

15. Cfr. Act. 16,14.

16. Cfr. 1 Cor. 3,7.

17. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogmática De Ecclesia, Lumen gentium, n.° 33. 35: AAS 57 (1965), p. 39. 40-41.

18. Cfr. Pio XII, Evangelii Praecones, 2 jun. 1951: AAS 43 (1951), p. 510-514; João XXIII, Princeps Pastorum, 28 nov. 1959: AAS 51 (1959), p. 851-,852.

19. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 46: AAS 57 (1965), p. 52.

20. Cfr. Pio XII, Evangelii Praecones, 2 jun. 1951: AAS 43 (1951), p. 527; João XXIII, Princeps Pastorum, 28 nov. 1959: AAS 51 (1959), p. 864.

21. Cfr. 1 Tim. 2,4.

22. Cfr. 2 Cor. 4,6.

++++++++++++++++++++++++



DECRETO
PRESBYTERORUM ORDINIS
SOBRE O MINISTÉRIO
E A VIDA DOS SACERDOTES

PROÉMIO

Intenção do Concílio

1. Este sagrado Concílio já por várias vezes chamou a atenção de todos para a excelência da Ordem do presbiterado na Igreja(1). Todavia, em virtude desta Ordem ter uma parte sumamente importante e cada vez mais difícil na renovação da Igreja de Cristo, pareceu muito útil tratar dos sacerdotes com mais amplitude e profundeza. As coisas que se dizem neste Decreto aplicam-se a todos os sacerdotes, sobretudo àqueles que têm cura de almas, com a conveniente adaptação quando se trata dos presbíteros religiosos. Com efeito, os presbíteros, em virtude da sagrada ordenação e da missão que recebem das mãos dos Bispos, são promovidos ao serviço de Cristo mestre, sacerdote e rei, de cujo ministério participam, mediante o qual a Igreja continuamente é edificada em Povo de Deus, corpo de Cristo e templo do Espírito Santo. Por isso, para que no meio das situações pastorais e humanas, tantas vezes profundamente mudadas, o seu ministério se mantenha com mais eficácia e se proveja melhor à sua vida, este sagrado Concílio declara e estabelece o seguinte.

CAPÍTULO I

O PRESBITERADO NA MISSÃO DA IGREJA

Natureza do Presbiterado

2. O Senhor Jesus, «a quem o Pai santificou e enviou ao mundo, (Jo. 10,36), tornou participante todo o seu Corpo místico da unção do Espírito com que Ele mesmo tinha sido ungido (2): n'Ele, com efeito, todos os fiéis se tornam sacerdócio santo e real, oferecem vítimas a Deus por meio de Jesus Cristo, e anunciam as virtudes d'Aquele que os chamou das trevas para a sua luz admirável(3). Não há, portanto, nenhum membro que não tenha parte na missão de todo o corpo, mas cada um deve santificar Jesus no seu coração (4), e dar testemunho de Jesus com espírito de profecia(5).

O mesmo Senhor, porém, para que formassem um corpo, no qual «nem todos os membros têm a mesma função» (Rom. 12,4), constituiu, dentre os fiéis, alguns como ministros que, na sociedade dos crentes, possuíssem o sagrado poder da Ordem para oferecer o Sacrifício, perdoar os pecados (6) e exercer oficialmente o ofício sacerdotal em nome de Cristo a favor dos homens. E assim, enviando os Apóstolos assim como Ele tinha sido enviado pelo Pai (7), Cristo, através dos mesmos Apóstolos, tornou participantes da sua consagração e missão os sucessores deles, os Bispos (8), cujo cargo ministerial, em grau subordinado, foi confiado aos presbíteros (9), para que, constituídos na Ordem do presbiterado, fossem cooperadores (10) da Ordem do episcopado para o desempenho perfeito da missão apostólica confiada por Cristo.

O ministério dos sacerdotes, enquanto unido à Ordem episcopal, participa da autoridade com que o próprio Cristo edifica, santifica e governa o seu corpo. Por isso, o sacerdócio dos presbíteros, supondo, é certo, os sacramentos da iniciação cristã, é, todavia, conferido mediante um sacramento especial, em virtude do qual os presbíteros ficam assinalados com um carácter particular e, dessa maneira, configurados a Cristo sacerdote, de tal modo que possam agir em nome de Cristo cabeça(11).

Participando, a seu modo, do múnus dos apóstolos, os presbíteros recebem de Deus a graça de serem ministros de Jesus Cristo no meio dos povos, desempenhando o sagrado ministério do Evangelho, para que seja aceita a oblação dos mesmos povos, santificada no Espírito Santo (12). Com efeito, o Povo de Deus é convocado e reunido pela virtude da mensagem apostólica, de tal modo que todos quantos pertencem a este Povo, uma vez santificados no Espírito Santo, se ofereçam como «hóstia viva, santa e agradável a Deus» (Rom. 12, l). Mas é pelo ministério dos presbíteros que o sacrifício espiritual dos fiéis se consuma em união com o sacrifício de Cristo, mediador único, que é oferecido na Eucaristia de modo incruento e sacramental pelas mãos deles, em nome de toda a Igreja, até quando mesmo Senhor vier (13). Para isto tende e nisto se consuma o ministério dos presbíteros. Com efeito, o seu ministério, que começa pela pregação evangélica, tira do sacrifício de Cristo a sua força e a sua virtude, e tende a fazer com que «toda a cidade redimida, isto é, a congregação e a sociedade dos santos, seja oferecida a Deus como sacrifício universal pelo grande sacerdote, que também se ofereceu a si mesmo por nós na Paixão para que fôssemos o corpo de tão nobre cabeça» (14).

Por isso, o fim que os presbíteros pretendem atingir com o seu ministério e com a sua vida é a glória de Deus Pai em Cristo. Esta glória consiste em que os homens aceitem consciente, livre e gratamente a obra de Deus perfeitamente realizada em Cristo, e a manifestem em toda a sua vida. Os presbíteros, portanto, quer se entreguem à oração e à adoração quer preguem a palavra de Deus, quer ofereçam o sacrifício eucarístico e administrem os demais sacramentos, quer exerçam outros ministérios favor dos homens, concorrem não só para aumentar a glória de Deus mas também para promover a vida divina nos homens. Tudo isto, enquanto dimana da Páscoa de Cristo, será consumado no advento glorioso do mesmo Senhor, quando Ele entregar o reino nas mãos do Pai (15).

O ministério dos presbíteros no mundo

3. Os presbíteros, tirados dentre os homens e constituídos a favor dos homens nas coisas que se referem a Deus, para oferecerem dons e sacrifícios pelos pecados (16), convivem fraternalmente com os restantes homens. Assim também, o Senhor Jesus, Filho de Deus, enviado pelo Pai como homen para o meio dos homens, habitou entre nós e quis assemelhar-se em tudo aos seus irmãos, menos no pecado (17). Já os Apóstolos o imitaram, e S. Paulo doutor das gentes, «escolhido para anunciar o Evangelho de Deus» (Rom: 1,1) atesta que se fez tudo para todos, para salvar a todos (18). Os presbíteros do Novo Testamento, em virtude da vocação e ordenação, de algum modo são segregados dentro do Povo de Deus, não para serem separados dele ou do qualquer homem, mas para se consagrarem totalmente à obra para que Deus os chama (19). Não poderiam ser ministros de Cristo se não fossem testemunhas e dispensadores duma vida diferente da terrena, e nem pode riam servir os homens se permanecessem alheios à sua vida e às suas situações (20). O seu próprio ministério exige, por um título especial, que não se conformem a este mundo (21); mas exige também que vivam neste mundo entre os homens e, como bons pastores, conheçam as suas ovelhas e procurem trazer aquelas que não pertencem a este redil, para que também elas oiçam a voz de Cristo e haja um só rebanho e um só pastor (22). Para o conseguirem, muito importam as virtudes que justamente se apreciam no convívio humano, como são a bondade, a sinceridade, a fortaleza de alma e a constância, o cuidado assíduo da justiça, a delicadeza, e outras que o Apóstolo Paulo recomenda quando diz: «Tudo quanto é verdadeiro, tudo quanto é puro, tudo quanto é justo, tudo quanto é santo, tudo quanto é amável, tudo quanto é de bom nome, toda a virtude, todo o louvor da disciplina, tudo isso pensai» (Fil. 4,8) (23).

CAPÍTULO II

O MINISTÉRIO DOS PRESBÍTEROS

1- FUNÇÕES DOS PRESBÍTEROS

Os presbíteros, ministros da palavra de Deus

4. O Povo de Deus é reunido antes de mais pela palavra de Deus vivo (1), que é justíssimo esperar receber da boca dos sacerdotes (2). Com efeito, como ninguém se pode salvar se antes não tiver acreditado (3), os presbíteros, como cooperadores dos Bispos, têm, como primeiro dever, anunciar a todos o Evangelho de Deus (4), para que, realizando o mandato do Senhor: «Ide por todo o mundo, pregai o Evangelho a todas as, criaturas» (Mc. 16,15) (5), constituam e aumentem o Povo de Deus. Com efeito, é pela palavra da salvação que a fé é suscitada no coração dos infiéis e alimentada no coração dos fiéis; e é mercê da fé que tem início e se desenvolve a assembleia dos crentes, segundo aquele dito do Apóstolo: «a fé vem pelo ouvido, o ouvido, porém, pela palavra de Cristo» (Rom. 10,17). Por isso, os presbíteros são devedores de todos, para comunicarem a todos a verdade do Evangelho (6), de que gozam no Senhor. Portanto, quer quando, por uma convivência edificante entre os povos, os levam a glorificar a Deus (7), quer quando, pregando abertamente, anunciam o mistério de Cristo aos que crêem, quer quando ensinam o catecismo cristão ou explanam a doutrina da Igreja, quer quando procuram estudar à luz de Cristo as questões do seu tempo, sempre é próprio deles ensinar não a própria sabedoria mas a palavra de Deus e convidar instantemente a todos à conversão e à santidade (8). A pregação sacerdotal, não raro dificílima nas circunstâncias hodiernas do mundo, se deseja mover mais convenientemente as almas dos ouvintes, não deve limitar-se a expor de modo geral e abstracto a palavra de Deus mas sim aplicar às circunstâncias concretas da vida a verdade perene do Evangelho.

Assim se exerce de muitos modos o ministério da palavra segundo as diversas necessidades dos ouvintes e os carismas dos pregadores. Nas regiões ou agrupamentos não-cristãos, os homens são conduzidos à fé e aos sacramentos da salvação mediante a mensagem evangélica (9); na comunidade dos cristãos, porém, sobretudo entre aqueles que parecem entender e acreditar pouco o que frequentam, é necessária a pregação da palavra para o próprio ministério dos sacramentos, enquanto são sacramentos da fé que nasce da palavra e da palavra se alimenta (10); o que vale sobretudo para a liturgia da palavra na celebração da missa, na qual se unem intimamente a anunciação da morte e da ressurreição do Senhor, a resposta do povo ouvinte e a própria oblação com que Cristo confirmou a nova aliança no seu sangue; nessa oblação comungam os fiéis não só com o desejo mas também com a recepção do sacramento(11).

Os presbíteros, ministros dos sacramentos

5. Deus, que é o único santo e santificação, quis unir a si, como companheiros e colaboradores, homens que servissem humildemente a obra da santificação. Donde vem que os presbíteros são consagrados por Deus, por meio do ministério dos Bispos, para que, feitos de modo.especial participantes do sacerdócio de Cristo, sejam na celebração sagrada ministros d'Aquele que na Liturgia exerce perenemente o seu ofício sacerdotal a nosso favor (12). Na verdade, introduzem os homens no Povo de Deus pelo Baptismo; pelo sacramento da Penitência, reconciliam os pecadores com Deus e com a Igreja; com o óleo dos enfermos, aliviam os doentes; sobretudo com a celebração da missa, oferecem sacramentalmente o Sacrifício de Cristo. Em todos os sacramentos, porém, como já nos tempos da Igreja primitiva testemunhou S. Inácio mártir (13), os presbíteros unem-se hieràrquicamente de diversos modos com o Bispo, e assim o tornam de algum modo presente em todas as assembleias dos fiéis (14).

Os restantes sacramentos, porém, assim como todos os ministérios eclesiásticos e obras de apostolado; estão vinculados com a sagrada Eucaristia e a ela se ordenam (15). Com efeito, na santíssima Eucaristia está contido todo o tesouro espiritual da Igreja (16), isto é, o próprio Cristo, a nossa Páscoa e o pão vivo que dá aos homens a vida mediante a sua carne vivificada e vivificadora pelo Espírito Santo; assim são eles convidados e levados a oferecer, juntamente com Ele, a si mesmos, os seus trabalhos e todas as coisas criadas. Por isso, a Eucaristia aparece como fonte e coroa de toda a evangelização, enquanto os catecúmenos são pouco a pouco introduzidos na participação da Eucaristia, e os fiéis, já assinalados pelo sagrado Baptismo e pela Confirmação, são plenamente inseridos no corpo de Cristo pela recepção da Eucaristia.

Portanto, o banquete eucarístico é o centro da assembleia dos fiéis a que o presbítero preside. Por isso, os presbíteros ensinam os fiéis a oferecer a Deus Pai a vítima divina no sacrifício da missa, e a fazer, com ela, a oblação da vida; com o exemplo de Cristo pastor, ensinam-nos a submeter de coração contrito à Igreja no sacramento da Penitência os próprios pecados, de tal modo que se convertam cada vez mais no Senhor, lembrados das suas palavras: «Fazei penitência, porque o reino dos céus está próximo» (Mt. 4,17). De igual modo os ensinam a participar nas celebrações da sagrada Liturgia, para que também nelas façam oração sincera; guiam-nos a exercer durante a vida toda o espírito de oração cada vez mis perfeito, segundo as graças e necessidades de cada um, e entusiasmam a todos a observar os deveres do próprio estado, e aos mais adiantados a pôr em prática os conselhos evangélicos, do modo que convém a cada um. Ensinam; por isso, os fiéis para que possam cantar ao Senhor nos seus corações com hinos e cânticos espirituais, dando sempre graças por tudo a Deus Pai em nome de Nosso Senhor Jesus Cristo (17).

Os próprios presbíteros, ao recitar o ofício divino, distribuem pelas horas do dia os louvores e acções de graças que elevam na celebração da Eucaristia; é com o ofício divino que eles, em nome da Igreja, rezam a Deus por todo o povo que lhes fora confiado; mais ainda, por todo o mundo.

A casa de oração em que é celebrada e conservada a Santíssima Eucaristia, e os fiéis se reunem, e na qual a presença do Filho de Deus, nosso Salvador, oferecido por nós no altar do sacrifício, é venerada para auxílio e consolação dos fiéis, deve ser nobre e apta para a oração e para as cerimónias sagradas (18). Nela são convidados os pastores e os fiéis a corresponderem generosamente ao dom d'Aquele que pela sua humanidade continuamente infunde á vida divina nos membros do seu corpo (19). Procurem os presbíteros cultivar rectamente a ciência e a arte litúrgica, para que, pelo seu ministério litúrgico, Deus, Pai e Filho e Espírito Santo, seja louvado cada vez mais perfeitamente pelas comunidades a eles confiadas.

Os presbíteros e o ministério pastoral

6. Exercendo, com a autoridade que lhes toca, o múnus de Cristo cabeça e pastor, os presbíteros reunem, em nome do Bispo, a família de Deus, como fraternidade bem unida, e por Cristo, no Espírito, levam-na a Deus Pai (20). Para exercer este ministério, como também para os restantes ofícios sacerdotais, é conferido o poder espiritual, que é dado para edificação (21). Na edificação da Igreja, porém, os presbíteros devem tratar com todos com grande humanidade, a exemplo do Senhor. Nem devem proceder para com eles segundo o agrado dos homens (22), mas segundo as exigências da doutrina e da vida cristãs, ensinando-os e admoestando-os como filhos caríssimos (23), de harmonia com as palavras do Apóstolo: «Insiste a tempo e fora de tempo, repreende, suplica, admoesta com toda a paciência e doutrina (2 Tim. 4,2) (24).

Por isso, cabe aos sacerdotes, como educadores da fé, cuidar por si ou por outros que cada fiel seja levado, no Espírito Santo, a cultivar a própria vocação segundo o Evangelho, a uma caridade sincera e operosa, e à liberdade com que Cristo nos libertou (25). De pouco servirão as cerimónias, embora belas, bem como as associações, embora florescentes, se não se ordenam a educar os homens a conseguir a maturidade cristã 28. Os presbíteros ajudá-los-ão a promoverem esta maturidade, para que até nos acontecimentos, grandes ou pequenos, consigam ver o que as coisas significam e qual é a vontade de Deus. Sejam ensinados também os cristãos a não viverem só para si, mas, segundo as exigências da nova lei da caridade, cada um, assim como recebeu a graça, a administre mùtuamente (27), e assim todos cumpram cristãmente os seus deveres na comunidade humana.

Embora sejam devedores de todos, os presbíteros têm como recomendados a si de modo particular os pobres e os mais fracos, com os quais o próprio Senhor se mostrou unido (28), e cuja evangelização é apresentada como sinal da obra messiânica (29). Também com particular diligência acompanhem os jovens e, além disso, os cônjuges e os pais, que é para desejar se reunam em grupos amigáveis, para se ajudarem mutuamente a proceder cristãmente com mais facilidade e plenitude na vida tantas vezes difícil. Lembrem-se os presbíteros de que todos os religiosos, homens e mulheres, como porção eleita na casa do Senhor, são dignos de cuidado especial, para seu proveito espiritual em benefício de toda a Igreja. Finalmente, sejam o mais solícitos possível com os doentes e moribundos, visitando-os e confortando-os no Senhor (30),

Porém, o múnus de pastor não se limita ao cuidado singular dos fiéis, mas estende-se também própriamente à formação da genuína comunidade cristã. Para que seja cultivado devidamente o espírito de comunidade, deverá abraçar não só a igreja local mas também a Igreja inteira. A comunidade local, porém, não deve fomentar só o cuidado pelos seus fiéis mas também, imbuída de zelo missionário, deve preparar a todos o caminho para Cristo. Considera, todavia, como recomendados de modo especial os catecúmenos e os neófitos, que devem ser educados gradualmente no conhecimento e na prática da vida cristã.

Nenhuma comunidade cristã se edifica sem ter a sua raiz e o seu centro na celebração da santíssima Eucaristia, a partir da qual, portanto, deve começar toda a educação do espírito comunitário(31). Esta celebração, para ser sincera e plena, deve levar não só às várias obras de caridade e ao auxílio mútuo, mas também à acção missionária, bem como às. várias formas de testemunho cristão.

Além disso, a comunidade eclesial exerce, pela caridade, oração, exemplo e obras de penitência, uma verdadeira maternidade para com as almas que devem ser conduzidas a Cristo. Com efeito, ela constitui um instrumento eficaz que indica e prepara aos que ainda não crêem o caminho para Cristo e para a Sua Igreja, e também anima, alimenta e fortalece os fiéis em ordem ao combate espiritual.

Na estruturação da comunidade cristã, os presbíteros nunca servem alguma ideologia ou facção humana, mas, como anunciadores do Evangelho e pastores da Igreja, trabalham pelo aumento espiritual do corpo de Cristo.

II - RELAÇÕES DOS PRESBÍTEROS COM OS OUTROS

Relações entre os Bispos e os presbíteros

7. Todos os presbíteros participam de tal maneira com os Bispos no mesmo e único sacerdócio e ministério de Cristo que a unidade de consagração e missão requer a sua comunhão hierárquica com a Ordem episcopal (32). Esta comunhão, manifestam-na de modo perfeito, por exemplo na concelebração litúrgica, quando, juntamente com eles, professam celebrar o banquete eucarístico (33). Portanto, os Bispos, pelo dom do Espírito Santo dado aos presbíteros na sagrada ordenação, têm-nos como necessários cooperadores e conselheiros no ministério e múnus de ensinar, santificar e apascentar o Povo de Deus (34). Isto mesmo afirmam, claramente, os documentos litúrgicos dos primeiros tempos da Igreja, quando pedem solenemente a Deus para o Presbítero ordinando a infusão do «espírito de graça e conselho, para que, com o coração puro, ajude e governe o povo» (35), como o espírito de Moisés, no deserto, se comunicou aos setenta varões prudentes (36), e, «servindo-se Moisés do auxílio destes, tornou-se-lhe fácil governar a grande multidão do povo» (37). Por causa desta comunhão no mesmo sacerdócio e ministério, os Bispos devem estimar os presbíteros (38), como irmãos e amigos, e ter a peito o bem deles, quer o material, quer sobretudo o espiritual. Recai sobre eles, muito particularmente, a grave responsabilidade da santificação dos seus sacerdotes (39); ponham, pois, particular empenho na contínua formação do seu presbitério (40). Estejam dispostos a ouvi-los, consultem-nos e troquem com eles impressões sobre os problemas pastorais e o bem da diocese. Para que isto se torne eficiente, haja, em conformidade com as actuais circunstâncias e necessidades (41), com estrutura e funções a determinar; um conselho ou senado de sacerdotes (42), que representam o presbitério, e pelos seus conselhos, podem ajudar eficazmente o Bispo no governo da diocese.

Os presbíteros, porém, tendo presente a plenitude do sacramento da Ordem recebido pelos Bispos, reverenciem neles a autoridade de Cristo pastor supremo. Adiram ao seu Bispo com caridade e obediência sinceras (43). Esta obediência sacerdotal em espírito de cooperação fundamenta-se na própria participação do ministério episcopal conferida aos presbíteros pelo sacramento da Ordem e pela missão canónica (44).

A união dos presbíteros com os seus Bispos é tanto mais necessária em nossos dias, quanto, por diversas razões, os empreendimentos apostólicos não só revestem múltiplas formas, mas também ultrapassam necessàriamente os limites da paróquia ou diocese. Assim, nenhum presbítero pode realizar suficientemente a sua missão, isoladamente, más só num esforço comum com os outros presbíteros, sob a direcção dos que estão à frente dá Igreja.

União e cooperação fraterna entre os presbíteros

8. Os presbíteros, elevados ao presbiterado pela ordenação, estão unidos entre si numa íntima fraternidade sacramental. Especialmente na diocese a cujo serviço, sob o Bispo respectivo, estão consagrados, formam um só presbitério. Embora ocupados em diferentes obras, exercem o mesmo ministério sacerdotal a favor dos homens. Todos são enviados para cooperarem na obra comum, quer exerçam o ministério paroquial ou supra-paroquial, quer se dediquem à investigação científica ou ao ensino, quer se ocupem em trabalhos manuais compartilhando a sorte dos operários, onde isso pareça conveniente e a competente autoridade o aprove, quer realizem qualquer outra obra apostólica ou orientada ao apostolado. Todos têm uma só finalidade, isto é, a edificação do corpo de Cristo que, especialmente em nossos dias, requer múltiplas actividades e novas adaptações. Por isso, é da máxima importância que todos os presbíteros, diocesanos ou religiosos, se ajudem mùtuamente, para que sejam sempre cooperadores da verdade (45). Cada membro do colégio presbiterial está unido aos outros por laços especiais de caridade apostólica, de ministério e de fraternidade. Isto mesmo, desde tempos remotos é significado litùrgicamente quando os presbíteros presentes são convidados a impor as mãos, juntamente com o Bispo ordenante, sobre o novo eleito, e bem como quando concelebram, num só coração, a sagrada Eucaristia. Cada presbítero se une, pois, com seus irmãos por vínculo de caridade, oração e omnímoda cooperação, e assim, se manifesta aquela unidade na qual Cristo quis que os seus fossem consumados, para que o mundo conheça que o Filho foi enviado pelo Pai (46).

Por este motivo, os mais idosos recebam os mais novos como irmãos e ajudem-nos nos seus primeiros empreendimentos e encargos do ministério; esforcem-se por compreender a sua mentalidade, embora diferente, e ajudem com benevolência as suas iniciativas. Do mesmo modo, os jovens reverenciem a idade e experiência dos mais velhos, aconselhem-se com eles nas questões referentes à cura de almas, e colaborem de bom grado.

Animados de espírito fraterno, os presbíteros não esqueçam a hospitalidade (47), cultivem a beneficência e comunhão de bens (48), tendo particular solicitude com os doentes, os atribulados, os que estão sobrecarregados de trabalho, os que vivem sós, os que vivem longe da Pátria, bem como com os que sofrem perseguição (49). Reunam-se também espontâneamente e com alegria, para descanso do espírito, lembrados das palavras com que o Senhor convidou os Apóstolos fatigados: «vinde, vamos para um lugar deserto para descansar um pouco (Mc. 6,31). Sobretudo para que os presbíteros encontrem auxílio mútuo na vida espiritual e intelectual, para que mais fàcilmente possam cooperar no ministério e para se defenderem dos perigos da solidão que possam surgir, promova-se entre eles algum modo de vida comum, ou alguma convivência, que podem revestir diversas formas, conforme as necessidades pessoais ou pastorais, por exemplo, habitar juntos, onde isso seja possível, ou tomar as refeições em comum, ou pelo menos ter reuniões frequentes e periódicas. Devem ter-se em especial apreço e promover diligentemente as associações, que com estatutos aprovados pela competente autoridade eclesiástica promovem a santidade dos sacerdotes no exercício do ministério, por uma apropriada regra de vida e ajuda fraterna, e assim estão ao serviço de toda a Ordem dos presbíteros.

Finalmente, em razão da mesma comunhão no sacerdócio, sintam-se os presbíteros especialmente obrigados para com os que se vêem em dificuldades; dêem-lhes o auxílio oportuno, mesmo que seja necessário adverti-los discretamente. Ajudem com caridade fraterna e com magnanimidade aqueles que em alguma coisa se apartaram do recto caminho, façam por eles instantes preces a Deus e procedam sempre para com eles como verdadeiros irmãos e amigos.

Relações dos presbíteros com os leigos

9. Embora os sacerdotes do Novo Testamento, em virtude do sacramento da Ordem, exerçam no Povo e para o Povo de Deus o múnus de pais e mestres, contudo, juntamente com os fiéis, são discípulos do Senhor, feitos participantes do. seu reino pela graça de Deus que nos chama (50), Regenerados com todos na fonte do Baptismo, os presbíteros são irmãos entre os irmãos (51), membros dum só e mesmo corpo de Cristo cuja edificação a todos pertence (52).

Devem os presbíteros de tal modo estar à frente que, não procurando os próprios interesses mas os de Jesus Cristo (53), trabalhem na obra comum com os leigos e vivam no meio deles segundo o exemplo do Mestre, que «veio» para o meio dos homens, «não para ser servido, mas para servir e dar a vida pela redenção de muitos» (Mt. 20,28). Os presbíteros reconheçam e promovam sinceramente a dignidade e participação própria dos leigos na missão da Igreja. Estejam dispostos a ouvir os leigos, tendo fraternalmente em conta os seus desejos, reconhecendo a experiência e competência deles nos diversos campos da actividade humana, para que, juntamente com eles, saibam reconhecer os sinais dos tempos. Sabendo discernir se os espíritos vêm de Deus (54), perscrutem com o sentido da fé, reconheçam com alegria e promovam com diligência os multiformes carismas dos leigos, tanto os mais modestos como os mais altos. Entre os demais dons de Deus que se encontram com profusão entre os fiéis, são dignos de especial atenção os que atraem a uma vida espiritual mais alta. Entreguem-se aos leigos, com confiança, obras do serviço da Igreja, deixando-lhes espaço e liberdade de acção, convidando-os oportunamente a que tomem eles as suas iniciativas (55).

Os presbíteros, finalmente, foram postos no meio dos leigos para os levar todos à unidade «amando-se uns aos outros com caridade fraterna, e tendo os outros por mais dignos» (Rom. 12, 10). É, pois, dever deles congraçar de tal maneira as diferentes mentalidades que ninguém se sinta estranho na comunidade dos fiéis. São os defensores do bem comum do qual têm cuidado em nome do Bispo, e simultâneamente reivindicadores da verdade para que os fiéis não se deixem enredar por qualquer doutrina (56). São-lhes confiados com peculiar solicitude os que se afastaram da prática dos sacramentos e sobretudo da fé, dos quais, como bons pastores, não deixarão de se aproximar.

Segundo as normas sobre o ecumenismo (57), não esqueçam os irmãos que não vivem em plena comunhão eclesial connosco.

Terão ainda como confiados a si todos os que não reconhecem Cristo como seu Salvador.

Os fiéis, por sua vez, tomem consciência de que devem estar obrigados aos seus presbíteros; por isso, dediquem-lhes filial amor como a pais e pastores seus. Tomem parte nas suas preocupações, auxiliem-nos quanto lhes for possível com orações e obras, para que eles melhor possam vencer as dificuldades e cumprir mais frutuosamente os seus encargos (58).

III-A DISTRIBUIÇÃO DOS PRESBÍTEROS
E AS VOCAÇÕES SACERDOTAIS

Adequada distribuição dos presbíteros

10. O dom espiritual, recebido pelos presbíteros na ordenação, não os prepara para uma missão limitada e determinada, mas sim para a missão imensa e universal da salvação, «até aos confins da terra (Act. 1, 8); de facto, todo o ministério sacerdotal participa da amplitude universal da missão confiada por Cristo aos Apóstolos. Com efeito, o sacerdócio de Cristo, de que os presbíteros se tornaram verdadeiramente participantes, dirige-se necessariamente a todos os povos e a todos os tempos, nem é coarctado por nenhuns limites de sangue, nação ou idade, como já é prefigurado misteriosamente na pessoa de Melquisedec (59). Lembrem-se, por isso, os presbíteros que devem tomar a peito a solicitude por todas as igrejas. Portanto, os presbíteros daquelas dioceses que têm maior abundância de vocações, mostrem-se de boa vontade preparados para, com licença ou a pedido do próprio Ordinário, exercer o seu ministério em regiões, missões ou obras que lutam com falta de clero.

Além disso, revejam-se de tal modo as normas da incardinação e excardinação que, mantendo-se embora em vigor esta antiquíssima instituição, corresponda, todavia, melhor às necessidades pastorais de hoje. Sempre que o método apostólico o exigir, facilite-se não só a conveniente distribuição dos sacerdotes, mas também as obras pastorais peculiares que, segundo os diversos agrupamentos sociais, devem ser levadas a cabo em alguma região, ou nação ou em qualquer parte do mundo. Para isso, podem ser erigidos com utilidade alguns seminários internacionais, dioceses especiais ou prelaturas pessoais ou outras instituições, nas quais, da maneira a estabelecer em cada caso e salvos sempre os direitos do Ordinário de lugar, os presbíteros possam ser integrados ou incardinados para o bem comum de toda a Igreja.

Todavia, quanto for possível, não sejam enviados os presbíteros um a um para uma nova região, sobretudo se não conhecerem bem a sua língua e os seus costumes, mas, a exemplo dos discípulos de Cristo (60), dois a dois ou três a três, de tal modo que se possam ajudar mùtuamente. Convém igualmente que se cuide solicitamente da sua vida espiritual, bem como da sua saúde de alma e de corpo; e, quanto for possível, preparem-se-lhes lugares e condições de trabalho, segundo as circunstâncias pessoais de cada um. Muito convém igualmente que aqueles que vão para outra nação, procurem conhecer bem não só a língua dela, mas também a índole psicológica e social própria do povo a quem desejam servir em humildade, comunicando com ele o mais perfeitamente possível, de tal modo que sigam o exemplo do Apóstolo Paulo, que pôde dizer de si mesmo: «Sendo livre com relação a todos, fiz-me servo de todos, para ganhar a muitos. Fiz-me judeu com os judeus, para ganhar os judeus...» (l Cor. 9, 19-20).

Solicitude pelas vocações sacerdotais

11. O pastor e bispo das nossas almas (61) constituiu a sua Igreja de tal modo que o povo escolhido e adquirido com o seu sangue (62) tivesse sempre e até ao fim dos tempos os seus sacerdotes, a fim de que os cristãos não fossem jamais como ovelhas sem pastor (63). Conhecendo esta vontade de Cristo, os Apóstolos, por inspiração do Espírito Santo, julgaram ser seu dever escolher ministros «capazes de ensinar também os outros» (2 Tim. 2, 2). Este dever faz parte da própria missão sacerdotal, em virtude da qual o presbítero é feito participante da solicitude de toda a Igreja, para que jamais faltem na terra operários para o Povo de Deus. Todavia, visto que «ao piloto da barca e aos que nela devem ser levados... é comum o trabalho» (64), seja, por isso, informado todo o povo cristão de que é seu dever colaborar de diversos modos, pela oração frequente e por outros meios à sua disposição (65), para que a Igreja tenha sempre os sacerdotes necessários ao cumprimento da sua missão divina. Portanto, procurem antes de mais os presbíteros com o ministério da palavra e com o testemunho duma vida que manifeste claramente o espírito de serviço e a verdadeira alegria pascal, pôr diante dos olhos dos fiéis a excelência e a necessidade do sacerdócio, e, não se poupando a cuidados e a incómodos, ajudar aqueles que, jovens ou adultos, prudentemente julgarem idóneos para tão grande ministério, a preparar-se convenientemente e assim poder um dia, com plena liberdade externa e interna, ser chamados pelos Bispos. Para atingir este fim, é da máxima utilidade a diligente e prudente direcção espiritual. Os pais e os professores, e todos quantos de qualquer modo estão empenhados na formação das crianças e dos jovens, de tal maneira os instruam que, conhecendo a solicitude do Senhor pelo seu rebanho, e considerando as necessidades da Igreja, estejam preparados a responder generosamente com o profeta ao chamamento divino: «Eis-me aqui, envia-me» (Is. 6,8). Todavia, esta voz do Senhor que chama, não deve ser de maneira nenhuma esperada como se tivesse de chegar aos ouvidos do futuro presbítero dum modo extraordinário. Com efeito, deve ser antes entendida e discernida a partir dos sinais que diàriamente dão a conhecer aos cristãos prudentes a vontade de Deus; estes sinais devem ser considerados atentamente pelos presbíteros (66).

A eles, portanto, se recomendam vivamente as Obras de vocações, quer diocesanas, quer nacionais (67). Nas pregações, na catequese, nas publicações, importa declarar com a maior clareza as necessidades da Igreja tanto local com universal; ponham-se em evidência o sentido e a importância do ministério sacerdotal, como sendo aquilo em que se conjugam tão grandes alegrias com tão grandes obrigações e em que, sobretudo, como ensinam os santos Padres, se pode dar a Cristo o maior testemunho de amor (68).

CAPÍTULO III

A VIDA DOS PRESBÍTEROS

I-A VOCAÇÃO DOS PRESBÍTEROS À PERFEIÇÃO

União com Cristo, sacerdote santo

12. Pelo sacramento da Ordem, os presbíteros são configurados com Cristo sacerdote, como ministros da cabeça, para a construção e edificação do seu corpo, que é a Igreja, enquanto cooperadores da Ordem episcopal. Já pela consagração do Baptismo receberam com os restantes fiéis, o sinal e o dom de tão insigne vocação e graça para que, mesmo na fraqueza humana (1), possam e devam alcançar a perfeição, segundo a palavra do Senhor: «Sede, pois, perfeitos, como o vosso Pai celeste é perfeito» (Mt. 5, 48). Estão, porém, obrigados por especial razão a buscar essa mesma perfeição visto que, consagrados de modo particular a Deus pela recepção da Ordem, se tornaram instrumentos vivos do sacerdócio eterno de Cristo, para poderem continuar pelos tempos fora a sua obra admirável, que restaurou com suprema eficácia a família de todos os homens (2). Fazendo todo o sacerdote, a seu modo, as vezes da própria pessoa de Cristo, de igual forma é enriquecido de graça especial para que, servindo todo o Povo de Deus e a porção que lhe foi confiada, possa alcançar de maneira conveniente a perfeição d'Aquele de quem faz as vezes, e cure a fraqueza humana da carne a santidade d'Aquele que por nós se fez pontífice «santo, inocente, impoluto, separado dos pecadores» (Heb. 7,26).

Cristo, que o Pai santificou ou consagrou e enviou ao mundo (3), «entre a Si mesmo por nós, para nos remir de toda a iniquidade e adquirir um povo que Lhe fosse aceitável, zeloso do bem» (Tit. 2,14), e assim, pela sua Paixão, entrou na glória (4). De igual modo os presbíteros, consagrados pela unção do Espírito Santo e enviados por Cristo, mortificam em si mesmos as obras da carne e dedicam-se totalmente ao serviço dos homens, e assim, pela santidade de que foram enriquecidos em Cristo, podem caminhar até ao estado de varão perfeito(5).

Deste modo, exercendo o ministério do Espírito e da justiça, se forem dóceis ao Espírito de Cristo que os vivifica e guia, são robustecidos na vida espiritual. Pelos ritos sagrados de cada dia e por todo o seu ministério exercido em união com o Bispo e os outros sacerdotes, eles mesmos se dispõem à perfeição da própria vida. Por sua vez, a santidade dos presbíteros muito concorre para o desempenho frutuoso do seu ministério; ainda que a graça de Deus possa realizar a obra da salvação por ministros indignos, todavia, por lei ordinária, prefere Deus manifestar as suas maravilhas por meio daquelas que, dóceis ao impulso e direcção do Espírito Santo, pela sua íntima união com Cristo e santidade de vida, podem dizer com o Apóstolo: «se vivo, já não sou eu, é Cristo que vive em mim, (Gál. 2,20).

Por isso, este sagrado Concílio, para atingir os seus fins pastorais de renovação interna da Igreja, difusão do Evangelho em todo o mundo e diálogo com os homens do nosso tempo, exorta veementemente todos os sacerdotes a que, empregando todos os meios recomendados pela Igreja (7), se esforcem por atingir cada vez maior santidade, pela qual se tornem instrumentos mais aptos para o serviço de todo o Povo de Deus.

A santidade no exercício do ministério

13. Os presbíteros atingirão a santidade pelo próprio exercício do seu ministério, realizado sincera e infatigàvelmente no espírito de Cristo. Sendo eles os ministros da palavra, todos os dias lêem e ouvem a palavra do Senhor que devem ensinar aos outros. Esforçando-se por a receberem em si mesmos, cada vez se tornam mais perfeitos discípulos do Senhor, segundo a palavra do Apóstolo Paulo a Timóteo: «Medita estas coisas, permanece nelas, para que o teu aproveitamento seja manifesto a todos. Atende a ti e à doutrina. Persevera nestas coisas. Fazendo isto, não só te salvas a ti, mas também aos que te ouvem (1 Tim. 4, 15-16). Investigando como mais convenientemente poderão dar aos outros aquilo que meditaram (8), mais profundamente saborearão «as insondáveis riquezas de Cristo» (Ef. 3,8) e a multiforme sabedoria de Deus (9). Tendo diante de si que é o Senhor quem abre os corações (10) e que a sublimidade não vem deles mas da virtude de Deus(11), na própria pregação unam-se mais intimamente com Cristo mestre e deixem-se levar pelo seu espírito. Assim unidos a Cristo, participarão da caridade de Deus, cujo mistério, escondido desde os séculos (12), foi revelado em Cristo.

Como ministros das coisas sagradas, é sobretudo no sacrifício da missa que os presbíteros dum modo especial fazem as vezes de Cristo, que se entregou como vítima para a santificação dos homens. Por isso, são convidados a imitar aquilo que tratam, enquanto, celebrando o mistério da morte do Senhor, procuram mortificar os seus membros de todos os seus vícios e concupiscências (13). No mistério do sacrifício eucarístico, em que os sacerdotes realizam a sua função principal, exerce-se continuamente a obra da nossa Redenção (14). Por isso, com instância se recomenda a sua celebração quotidiana, porque, mesmo que não possa ter a presença dos fiéis, é acto de Cristo e da Igreja (15). Assim, enquanto que os presbíteros se unem com a própria acção de Cristo sacerdote, oferecem-se todos os dias totalmente a Deus, e, alimentando-se do Corpo do Senhor, participam amorosamente na caridade d'Aquele que se dá como alimento aos fiéis. De igual modo, na administração dos sacramentos unem-se à intenção e caridade de Cristo, o que se dá especialmente quando se mostram sempre totalmente dispostos a administrar o sacramento da Penitência todas as vezes que os fiéis racionalmente o pedirem. Na recitação do ofício divino, emprestam à Igreja a sua voz, que persevera na oração, em nome de todo o género humano, unida a Cristo, «sempre vivo a interceder por nós» (Hebr. 7,25).

Conduzindo e apascentando o Povo de Deus, são incitados pela caridade do Bom Pastor a dar a sua vida pelas ovelhas (16), prontos para o supremo sacrifício, seguindo o exemplo daqueles sacerdotes que mesmo em nossos dias não recusaram entregar a sua vida. Sendo educadores na fé e tendo eles mesmos «firme confiança de entrar no santuário mediante o sangue de Cristo» (Heb. 10,19), aproximam-se de Deus «com coração sincero, na plenitude da fé» (Heb. 10,22); dão mostras duma esperança firme perante os fiéis (17), a fim de poderem consolar aqueles que se encontram na angústia, com aquela exortação com que eles são exortados por Deus (18); chefes da comunidade, cultivam a ascese própria dos pastores de almas, renunciando às próprias comodidades, buscando não aquilo que lhes é útil a si, mas a muitos, para que se salvem (19), aperfeiçoando-se sempre cada vez mais no desempenho do seu múnus pastoral, dispostos a tentar novas vias, onde for necessário, guiados pelo Espírito de amor, que sopra onde quer (20).

Unidade de vida dos presbíteros em Cristo

14. No mundo de hoje, sendo tantos os deveres a cumprir e tão grande a diversidade de problemas em que se angustiam os homens, frequentìssimamente com urgência de solução, correm os mesmos homens o perigo de se dispersarem por muitas coisas. Também os presbíteros, implicados e dispersos por muitíssimas obrigações do seu ministério, podem perguntar, não sem ansiedade, como lhes será possível reduzir à unidade a sua vida interior com a sua acção exterior. Esta unidade de vida não pode ser construída com a mera ordenação externa do seu ministério nem apenas com a prática dos exercícios de piedade, por mais que isto concorra para ela. Mas poderão os presbíteros construí-la, seguindo, na prática do ministério, o exemplo de Cristo Nosso Senhor, cujo alimento era fazer a vontade d'Aquele que O enviou para realizar a sua obra (21).

Cristo, para continuar no mundo incessantemente a fazer a vontade do Pai mediante a Igreja, actua realmente pelos seus ministros, e assim permanece sempre o princípio e a fonte de unidade da sua vida. Portanto, os presbíteros alcançarão a unidade da sua vida, unindo-se a Cristo no conhecimento da vontade do Pai e no dom de si mesmos pelo rebanho que lhes foi confiado (22). Assim, fazendo as vezes do Bom Pastor, encontrarão no próprio exercício da caridade pastoral o vínculo da perfeição sacerdotal, que conduz à unidade de vida e acção. Esta caridade pastoral (23) flui sobretudo do sacrifício eucarístico, que permanece o centro e a raiz de toda a vida do presbítero, de tal maneira que aquilo que se realiza sobre a ara do sacrifício, isso mesmo procura realizar em si a alma sacerdotal. Isto, porém, só se pode obter, na medida em que, pela oração, os sacerdotes penetram cada vez mais profundamente no mistério de Cristo.

Para que possam realizar concretamente a unidade de vida, considerem todas as suas iniciativas, examinando qual será a vontade de Deus (24), ou seja, qual é a conformidade das iniciativas com as normas da missão evangélica da Igreja. A fidelidade para com Cristo não se pode separar da fidelidade para com a Igreja. Por isso, a caridade pastoral exige que os presbíteros, para que não corram em vão (25), trabalhem sempre em união com os Bispos e com os outros irmãos no sacerdócio. Procedendo assim, encontrarão os presbíteros a unidade da própria existência na unidade da missão da Igreja, e assim unir-se-ão com o Senhor, e por meio d'Ele com o Pai, no Espírito Santo, a fim de que possam encher-se de consolação e superabundar na alegria (26).

II -PECULIARES EXIGÊNCIAS ESPIRITUAIS NA VIDA DOS PRESBÍTEROS

Humildade e obediência

15. Entre as virtudes que sobretudo se requerem no ministério dos presbíteros, deve nomear-se aquela disposição de espírito pela qual estão sempre prontos não a procurar a própria vontade, mas a vontade d'Aquele que os enviou (27). A obra divina, para que o Espírito Santo os assumiu (28), transcende todas as forças e a sabedoria humana, pois «Deus escolheu o que há de fraco no mundo, para confundir os fortes» (l Cor. 1,27). Consciente, portanto, da própria fraqueza, o verdadeiro ministro de Cristo trabalha na humildade, examinando o que é agradável a Deus (29), e, como que assumido pelo Espírito (30), é conduzido pela vontade d'Aquele que quer que todos os homens se salvem. Pode descobrir esta vontade e realizá-la nas circunstâncias de cada dia, servindo humildemente aqueles que lhe foram confiados por Deus, na tarefa que lhe foi entregue e nos acontecimentos da sua vida.

O ministério sacerdotal, porém, sendo ministério da própria Igreja, só em comunhão hierárquica com todo o corpo se pode desempenhar. Portanto, a caridade pastoral instiga os presbíteros, agindo nesta comunhão entreguem a sua vontade por obediência ao serviço de Deus e dos seus irmãos, recebendo com espírito de fé e executando o que lhes é preceituado ou recomendado pelo Sumo Pontífice, pelo próprio Bispo e outros Superiores, entregando-se e «super-entregando-se» (31), de todo o coração, a qualquer cargo, ainda que humilde e pobre, que lhes seja confiado. Desta forma conservam a necessária unidade e estreitam-na com os seus irmãos no ministério, sobretudo com aqueles que o Senhor pôs como chefes visíveis da sua Igreja, e trabalham para a edificação do corpo de Cristo, que cresce ,,por toda a espécie de junturas que o alimentam» (32). Esta obediência, que leva a uma maior maturidade dos filhos de Deus, exige de sua natureza que, quando no desempenho do seu múnus, movidos pela caridade, tentem prudentemente novas vias para maior bem da Igreja, proponham confiadamente as suas iniciativas, manifestem solìcitamente as necessidades do seu rebanho, dispostos sempre a sujeitar-se ao juízo daqueles que exercem o múnus principal de reger a Igreja de Deus.

Com esta humildade e obediência responsável e voluntária, os presbíteros configuram-se com Cristo, experimentando em si os sentimentos de Cristo Jesus, que «se despojou de Si mesmo, tomando a forma de servo... feito obediente até à morte» (Fil. 2, 7-9), e por esta obediência venceu e remiu a desobediência de Adão, como afirma S. Paulo: «Pela desobediência dum só homem, constituiram-se muitos pecadores: assim pela obediência dum só, constituiram-se muitos justos» (Rom. 5,19).

O celibato sacerdotal

16. A continência perfeita e perpétua por amor do reino dos céus, recomendada por Cristo Senhor (33), generosamente aceite e louvàvelmente observada através dos séculos e mesmo em nossos dias por não poucos fiéis, foi sempre tida em grande estima pela Igreja, especialmente na vida sacerdotal. É na verdade sinal e estímulo da caridade pastoral e fonte singular de fecundidade espiritual no mundo (34). De si, não é exigida pela própria natureza do sacerdócio, como se deixa ver pela prática da Igreja primitiva (35) e pela tradição das Igrejas orientais, onde, além daqueles que, com todos os Bispos, escolhem, pelo dom da graça, a observância do celibato, existem meritíssimos presbíteros casados. Recomendando o celibato eclesiástico, este sagrado Concílio de forma nenhuma deseja mudar a disciplina contrária, legìtimamente vigente nas Igrejas orientais, e exorta amorosamente a todos os que receberam o presbiterado já no matrimónio, a que, perseverando na sua santa vocação, continuem a dispensar generosa e plenamente a sua vida pelo rebanho que lhes foi confiado (36).

Todavia, o celibato harmoniza-se por muitos títulos com o sacerdócio. Na verdade, toda a missão sacerdotal se dedica totalmente ao serviço da humanidade nova, que Cristo, vencedor. da morte, suscita no mundo pelo seu Espírito e tem a sua origem, «não no sangue, nem na vontade da carne, nem na vontade do homem, mas em Deus» (Jo. l,13). Pela virgindade ou pelo celibato observado por amor do reino dos céus (37), os presbíteros consagram-se por um novo e excelente título a Cristo, aderem a Ele mais fàcilmente com um coração indiviso (38), n'Ele e por Ele mais livremente se dedicam ao serviço de Deus e dos homens, com mais facilidade servem o seu reino e a obra da regeneração sobrenatural, e tornam-se mais aptos para receberem, de forma mais ampla, a paternidade em Cristo. Deste modo, manifestam ainda aos homens que desejam dedicar-se indivisamente ao múnus que lhes foi confiado, isto é, de desposar os fiéis com um só esposo e apresentá-los como virgem casta a Cristo (39), evocando assim aquela misteriosa união fundada por Deus e que se há-de manifestar plenamente no futuro, em que a Igreja terá um único esposo, Cristo (40). Além disso, tornam-se sinal vivo do mundo futuro, já presente pela fé e pela caridade, em que os filhos da ressurreição não se casam nem se dão em casamento (41).

Por todas estas razões, fundadas no mistério de Cristo e na sua missão, o celibato, que a princípio era apenas recomendado aos sacerdotes, depois foi imposto por lei na Igreja latina a todos aqueles que deviam ser promovidos às Ordens sacras. Este sagrado Concílio aprova e confirma novamente esta legislação no que respeita àqueles que se destinam ao presbiterado, confiando no Espírito Santo que o dom do celibato, tão harmónico com o sacerdócio do Novo Testamento, será dado liberalmente pelo Pai, desde que aqueles que participam do sacerdócio de Cristo pelo sacramento da .Ordem, e toda a Igreja, humildemente e insistentemente o peçam. Exorta ainda este sagrado Concílio a todos os presbíteros que aceitaram livremente o santo celibato confiados na graça de Deus segundo o exemplo de Cristo, a que aderindo a ele de coração magnânimo e com toda a alma, e perseverando neste estado fielmente, reconheçam tão insigne dom, que lhes foi dado pelo Pai e tão claramente é exaltado pelo Senhor (42), tendo diante dos olhos os grandes mistérios que nele são significados e nele se realizam. Quanto mais, porém, a perfeita continência é tida por impossível por tantos homens no mundo de hoje, tanto mais humildemente e persistentemente peçam os presbíteros em união com a Igreja a graça da fidelidade, que nunca é negada aos que a suplicam, empregando ao mesmo tempo os auxílios sobrenaturais e naturais, que estão à mão de todos. Sobretudo não deixem de seguir as normas ascéticas, aprovadas pela experiência da Igreja e não menos necessárias no mundo de hoje. Por isso, este sagrado Concílio pede não sòmente aos sacerdotes, mas também a todos os fiéis, que tenham a peito este dom precioso do celibato sacerdotal e supliquem a Deus que o confira sempre abundantemente à Sua Igreja.

Pobreza voluntária

17. Em amigável e fraterno convívio entre si e com os outros homens, têm os presbíteros ocasião de aprender a cultivar os valores humanos e a estimar os bens criados como dons de Deus. Vivendo no mundo, saibam, porém, que, segundo a palavra do Senhor nosso mestre, não são do mundo (43), Usando, portanto, do mundo como se não usassem (44), chegarão àquela liberdade em que, desprendidos de todo o cuidado desordenado, se tornam dóceis em ouvir a voz de Deus na vida quotidiana. Esta atitude é de grande importância para os sacerdotes, porque a missão da Igreja realiza-se no meio do mundo e os bens criados são absolutamente necessários ao aperfeiçoamento pessoal do homem. Mostrem-se de ânimo agradecido por todos os bens que o Pai celeste lhes confia para levar uma vida santa. É necessário, porém, que julguem à luz da fé os bens que lhes advêm, para que sejam empregados segundo o recto uso que corresponde à vontade de Deus, e afastem de si tudo aquilo que for nocivo à sua missão.

Os sacerdotes, na verdade, porque o Senhor é a «sua parte e a sua herança» (Núm. 18,20), devem usar os bens materiais sòmente para aqueles fins a que, segundo a doutrina e ordenação da Igreja, é lícito destiná-los.

Os bens eclesiásticos pròpriamente ditos, segundo a sua mesma natureza, administrem-nos os sacerdotes, segundo as normas das leis eclesiásticas, utilizando, quanto for possível, o parecer de peritos leigos, e destinem-nos sempre segundo aqueles fins, para os quais é lícito à Igreja possuir bens temporais, isto é, para o o culto divino, honesta sustentação do clero, obras de apostolado e caridade, sobretudo para com os pobres (45). Os bens, porém, que adquirem para si, por ocasião de algum cargo eclesiástico, salvo o direito particular (46), empreguem-nos os presbíteros, da mesma maneira que os Bispos, primeiramente para a sua honesta sustentação e desempenho dos deveres próprios de seu estado; os que sobrarem, destinem-nos ao bem da Igreja ou obras de caridade. Desta forma, não tenham os cargos eclesiásticos para lucro, nem gastem os rendimentos deles provenientes em aumentar os bens próprios de família (47). Por isso, os sacerdotes, não apegando, de forma nenhuma, o coração às riquezas (48), evitem toda a cobiça e abstenham-se cuidadosamente de toda a sombra de comércio.

Antes são convidados a abraçar a pobreza voluntária, pela qual mais claramente se configuram com Cristo e se tornam mais aptos para o sagrado ministério. Na verdade, Cristo, sendo rico, fez-se pobre por amor de nós, para que nos tornássemos ricos da sua pobreza (49). Os Apóstolos, pelo seu próprio exemplo, testemunharam que deve ser dado de graça o que de graça receberam (50), sabendo viver na abundância e na penúria(51). Também algum uso comum das coisas, à maneira da comunhão de bens louvada na Igreja primitiva (52), prepara óptimo caminho para a caridade pastoral e, mediante tal forma de vida, podem os presbíteros louvàvelmente viver o espírito de pobreza recomendado por Cristo.

Guiados, pois, pelo Espírito do Senhor que ungiu o Salvador e O enviou a evangelizar os pobres (53), os presbíteros, assim como os Bispos, evitem tudo o que possa de algum modo afastar os pobres, fugindo, mais que os restantes discípulos de Cristo, a toda a sombra de vaidade nas suas coisas. Disponham a sua habitação de maneira que não se torne inacessível a ninguém, e que ninguém, por mais humilde que seja, tenha receio de se abeirar dela.

III - AUXÍLIOS PARA A VIDA DOS PRESBÍTEROS

Auxílios para promover a vida espiritual

18. Para favorecer a união com Cristo, em todas as circunstâncias da sua vida, os presbíteros dispõem, além do exercício consciente do seu ministério, de meios comuns e particulares, modernos e antigos, que o Espírito Santo nunca deixou de suscitar no Povo de Deus e que a Igreja, desejosa da santificação dos seus membros, recomenda e algumas vezes até preceitua (54). Entre todos os auxílios espirituais, sobressaem os actos pelos quais os fiéis se alimentam da palavra de Deus, na dupla mesa da Sagrada Escritura e da Eucaristia (55). De quanta importância seja a sua assídua frequência, para a própria santificação dos presbíteros, não há ninguém que o não veja.

Os ministros da graça sacramental unem-se a Cristo Salvador e pastor pela frutuosa recepção dos sacramentos, especialmente pela frequente recepção do sacramento da penitência, que preparado pelo quotidiano exame de consciência, muito favorece a necessária conversão do coração ao amor do pai das misericórdias. A luz da fé, alimentada pela leitura da Sagrada Escritura, podem perscrutar atentamente os sinais da vontade de Deus e os impulsos da sua graça nos vários acontecimentos da vida, e assim tornarem-se cada vez mais dóceis à sua missão assumida no Espírito Santo. Maravilhoso exemplo desta docilidade encontram-no na bem-aventurada Virgem Maria, que guiada pelo Espírito Santo, se dedicou totalmente ao mistério da redenção dos homens (56), Ela, a quem os presbíteros devem amar e venerar com devoção e culto filial, como Mãe do sumo e eterno sacerdote, como rainha dos Apóstolos e auxílio do seu ministério.

Para desempenhar com fidelidade o seu ministério, tenham a peito o colóquio quotidiano com Cristo Senhor, na visita e culto pessoal à Sagrada Eucaristia; entreguem-se de bom grado ao retiro espiritual, e tenham em grande apreço a direcção espiritual. De variados modos, especialmente pela prática da oração mental e das demais formas de oração, que livremente escolhem, buscam os presbíteros e instantemente pedem a Deus aquele espírito de verdadeira adoração, com que eles, ao mesmo tempo que o povo a si confiado, se unem intimamente a Cristo, mediador do Novo Testamento, e, como filhos da adopção, podem clamar: «Abba, Pai» (Rom. 8,15).

Ciência sagrada e formação pastoral

19. No rito sagrado da ordenação, os presbíteros são admoestados pelo Bispo que «sejam amadurecidos na ciência» e que a sua doutrina seja «remédio espiritual para o Povo de Deus» (57). A ciência, porém, própria do ministro sagrado, deve ser sagrada, porque é tomada de uma fonte sagrada e se orienta a um fim sagrado. Primeiro que tudo, seja haurida na leitura e meditação da Sagrada Escritura (58), mas alimente-se também com fruto, dos estudos dos santos Padres e Doutores e ainda dos outros documentos da Tradição. Além disso, para dar resposta apropriada às questões agitadas pelos homens do nosso tempo, é necessário que os presbíteros conheçam bem os documentos do magistério eclesiástico, mas sobretudo dos Concílios e dos Sumos Pontífices, assim como devem ter à mão os melhores e mais aprovados escritores de teologia.

Visto que, no nosso tempo, a cultura humana e ainda as ciências sagradas progridem incessantemente, os presbíteros são forçados a aperfeiçoar, de modo conveniente e sem interrupção, os seus conhecimentos a respeito das coisas divinas e humanas, preparando-se assim, de maneira mais oportuna, para o diálogo com os seus contemporâneos.

Para os presbíteros mais fàcilmente se darem aos estudos e aprenderem do modo mais eficaz os métodos de evangelização e apostolado, com todo o cuidado sejam-lhes proporcionados os meios convenientes, como são a organização de cursos ou congressos, segundo as condições do território de cada um, a erecção de centros destinados a estudos pastorais, a constituição de bibliotecas e a conveniente orientação de estudos feita por pessoas competentes. Considerem os Bispos, por si ou em mútua colaboração, o modo mais oportuno de fazer com que todos os presbíteros, em tempos determinados, sobretudo nos primeiros anos depois da ordenação (59), possam frequentar algum curso em que lhes seja proporcionada a ocasião não só de adquirir um maior conhecimento dos métodos pastorais e da ciência teológica, mas também de robustecer a sua vida espiritual e comunicar com seus irmãos as experiências apostólicas (60). Com estes e semelhantes auxílios, sejam ajudados ainda os párocos novos e aqueles que são destinados a uma nova obra pastoral, ou que são enviados a outra diocese ou nação.

Finalmente, os Bispos terão cuidado de que alguns deles se dediquem a um conhecimento mais profundo das coisas divinas, para que nunca faltem mestres idóneos para a formação do clero, e os outros sacerdotes e fiéis sejam ajudados na aquisição da doutrina que lhes é necessária, e se favoreça assim um são progresso nas matérias sagradas, absolutamente necessário à Igreja.

Justa remuneração económica

20. Entregues ao serviço de Deus, pelo desempenho do cargo que lhes foi confiado, os presbíteros são merecedores da justa recompensa, visto que «o operário é digno do seu salário» (Lc. 10,7) (61) e «o Senhor ordenou àqueles que anunciam o Evangelho, que vivam do Evangelho» (1 Cor. 9,14). Por isso, onde não se tiver providenciado de outra maneira à justa remuneração dos presbíteros, os mesmos fiéis, em cujo benefício eles trabalham, têm verdadeira obrigação de procurar os meios necessários para que levem uma vida digna e honesta. Os Bispos, por sua vez, estão obrigados a advertir os fiéis desta obrigação e devem procurar, ou cada um na sua diocese, ou mais convenientemente vários, num território comum, que se estabeleçam normas, segundo as quais se proveja devidamente à honesta sustentação daqueles que desempenham ou desempenharam alguma função ao serviço do Povo de Deus. A remuneração, porém, a receber por cada um, tendo em conta a natureza do múnus e as circunstâncias dos tempos e dos lugares, seja fundamentalmente a mesma para todos aqueles que se encontrem nas mesmas condições, e proporcional à sua situação, que lhes permita, além disso, não só prover devidamente à remuneração daqueles que se encontram ao seu serviço, mas também auxiliar por si mesmos de algum modo aos pobres, já que nos primeiros tempos a Igreja teve sempre em grande conta o serviço dos pobres. Esta remuneração deve, além disso, ser tal, que permita aos presbíteros, todos os anos, ter algum tempo de férias, justo e suficiente, que os Bispos devem fazer que lhes seja possível.

É necessário, todavia, dar a principal importância à missão que os ministros sagrados desempenham. Por isso, o chamado sistema beneficial seja abandonado ou, pelo menos, seja reformado de tal maneira que a parte beneficial ou o direito aos rendimentos anexos, se considere secundário, e se dê de direito o lugar de primazia ao próprio ofício eclesiástico, que, de futuro, se deve entender como qualquer múnus conferido estàvelmente a exercer com um fim espiritual.

Fundos comuns e previdência social

21. Tenha-se sempre em conta o exemplo dos fiéis da Igreja primitiva de Jerusalém, em que «todas as coisas eram comuns» (Act. 4,32), mas «repartiam-se cada um segundo a sua necessidade» Act. 4,35). Por isso, convém sumamente, pelo menos nas regiões em que a sustentação do clero depende totalmente ou em grande parte das dádivas dos fiéis, que alguma instituição diocesana reuna os bens oferecidos para este fim, administrada pelo Bispo, com a ajuda de sacerdotes para isso delegados, e, onde a utilidade o pedir, também por leigos, peritos em matéria de economia. É de desejar, além disso, quanto for possível, que, em cada diocese ou região, se constitua um fundo comum de bens, com que os Bispos possam satisfazer a outras obrigações para com as pessoas que servem a Igreja e ocorrer às necessidades da diocese, e com que possam ainda as dioceses mais ricas subsidiar as mais pobres, de tal maneira que a abundância de umas cubra a penúria das outras (62). Este fundo comum convém ser constiuído, primeiro que tudo, pelas ofertas dos fiéis, mas também provir de outras fontes, a determinar pelo direito.

Além disso, nas nações em que a previdência social em favor do clero não está ainda devidamente organizada, procurem as Conferências episcopais, tendo em conta as leis eclesiásticas e civis que haja ou instituições diocesanas, federadas entre si, ou instituições também organizadas simultâneamente para várias dioceses, ou ainda uma associação fundada para todo o território, pelas quais, sob a vigilância da Hierarquia, se proveja suficientemente tanto à previdência e assistência da saúde, como costuma dizer-se, como à devida sustentação dos presbíteros que se encontrem doentes, inválidos ou idosos. Os sacerdotes, porém, auxiliem a instituição, movidos pelo espírito de solidariedade para com seus irmãos, participando das suas tribulações (63), considerando, ao mesmo tempo, que desta forma, sem inquietação pela sorte futura, podem cultivar a pobreza com o espírito alegre do Evangelho e dar-se mais plenamente à salvação das almas. Procurem ainda aqueles a quem isso diz respeito, que as instituições do mesmo género, das diversas nações, se agrupem entre si, para conseguirem maior força e se dilatarem mais amplamente.

CONCLUSÃO E EXORTAÇÃO

Jesus Cristo, força dos presbíteros nas dificuldades actuais

22. Este sagrado Concílio, tendo em conta as alegrias da vida sacerdotal, também não pode esquecer as dificuldades que os presbíteros sofrem, nas circunstâncias da vida moderna. Não ignora quanto as condições económicas e sociais, e mesmo os costumes dos homens, se transformam, e quanto a ordem de valores se modifica no apreço dos homens. Por isso, os ministros da Igreja, e até por vezes os fiéis, sentem-se como que estranhos a este mundo, perguntando-se ansiosamente com que meios idóneos e palavras próprias podem entrar em comunicação com ele. Na verdade, os novos obstáculos que se opõem à fé, a esterilidade aparente do trabalho realizado, e ainda a dura solidão que experimentam, podem levá-los ao perigo do desalento.

Todavia, o mundo, tal qual hoje é confiado ao amor e ministério dos pastores da Igreja, Deus o amou de tal maneira que deu o Seu Filho unigénito por ele (64). Na verdade, este mundo, ainda que cativo de tantos pecados, mas dotado de não pequenos recursos, oferece à Igreja pedras vivas (65), que são edificadas para habitação de Deus no Espírito (66). O mesmo Espírito Santo, que impele a Igreja a tentar novas vias para o mundo do nosso tempo, sugere e favorece também as convenientes acomodações do ministério sacerdotal.

Lembrem-se, pois, os presbíteros que no exercício da sua missão nunca estão sós, mas apoiados na força omnipotente de Deus: e assim, com fé em Cristo que os chamou a participar do Seu sacerdócio, dêem-se com toda a confiança ao seu ministério, sabendo que Deus é poderoso para aumentar neles a caridade (67). Lembrem-se ainda que têm os seus irmãos no sacerdócio, e até os fiéis de todo o mundo, associados a si. Na verdade, todos os presbíteros cooperam na execução do plano salvador de Deus, isto é, no mistério de Cristo ou «sacramento» escondido desde os séculos em Deus (68), que se vai realizando gradualmente, pela colaboração dos diversos ministérios para a edificação do corpo de Cristo, até que se complete a medida da sua idade. Todas estas coisas, estando escondidas com Cristo em Deus (69), é sobretudo pela fé que podem ser compreendidas. É necessário o exemplo de Abraão, pai dos crentes, que pela fé «obedeceu em sair para o lugar que havia de receber em herança, e saiu, não sabendo para onde» (Heb. 11,8). Com efeito, o dispenseiro dos mistérios de Deus deve assemelhar-se ao homem que semeia no campo, de quem o Senhor disse: «E durma, e levante-se de dia e de noite, e a semente germina e cresce, sem que ele o saiba» (Mc. 4,27). Para mais, o Senhor Jesus que disse: «Confiai, Eu venci o mundo» (Jo. 16,33), não prometeu à Sua Igreja, com estas palavras, a vitória perfeita, já na terra. Todavia, o sagrado Concílio alegra-se porque a terra semeada pelo Evangelho frutifica em muitas partes pela acção do Espírito do Senhor, que enche todo o mundo e excita no coração de muitos sacerdotes e fiéis o espírito verdadeiramente missionário. Por tudo isto, o sagrado Concílio agradece afectuosamente a todos os presbíteros do mundo. «E Aquele que é poderoso para conceder mais abundantemente do que pedimos ou entendemos, segundo a força que opera em nós, a Ele se dê a glória na Igreja e em Cristo Jesus» (Ef. 3, 20-21).

Vaticano, 7 de Dezembro de 1965.

PAPA PAULO VI


Notas

Proémio e Capítulo I

1. Conc. Vat. II, Const. De Sacra Liturgia, Sacrosanctum Concilium, 4 dez. 1963: AAS 56 (1946), p. 97 s.; Const. dogm. De Ecelesia, Lumen gentium: AAS 57 (1965), p. 5 s.; Decr. De pastorali Episcoporum munere in Ecelesia, Christus Dominus; Decr. De institutione sacerdotali, Optatam totius.

2. Cfr. Mt. 3,16; Lc. 4,18; Act. 10,38.

3. Cfr. 1 Ped. 2, 5. 9.

4. Cfr. 1 Ped. 3,15.

5. Cfr. Apoc. 19,10; Cone. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium; n. 35: AAS 57 (1965), p. 40-41.

6. Conc. Trid., sess. XXIII, cap. 1 e can. 1: Denz. 957 e 961 (1764 e 1771).

7. Cfr. Jo. 20,21; Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 18: AAS 57 (1965), p. 21-22.

8. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 28: AAS 57 (1965), p.33-36.

9. Cfr. Ibid.

10. Cfr. Pont. Rom., «Ordenação dos Presbíteros», Prefácio. Estas palavras encontram-se já no Sacramentariam Veronense (ed. L. C. Möhlberg, Roma, 1956, p. 122) ; no Missale Francorum (ed. C. MShlberg, Roma, 1957, p. 9) ; no Liber sacramentorum Romanae Ecclesiae (ed. L. C. Möhlberg, Roma, 1960, p. 25); no Pontificale Romanum-germanicum (ed. Vogel-Elze, Cidade do Vaticano, 1963, vol. I, p. 34).

11. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 10: AAS 57 (1965), p. 14-15.

12. Cfr. Rom. 15,16 gr.

13. Cfr. 1 Cor. 11,26.

14. S. Agostinho, De civitat Dei, 10, 6: PL 41, 284.

15. Cfr. 1 Cor. 15,24.

16. Cfr. Hebr. 5, 1.

17. Cfr. Hebr 2,17; 4,15.

18. Cfr. 1 Cor. 9, 19-23 Vg.

19. Cfr. Act. 13,2.

20. Este esforço de perfeição religiosa e moral é estimulado cada vez mais até pelas condições externas em que a Igreja age; com efeito, ela não pode ficar imóvel e desinteressada perante as vicissitudes das coisas humanas, que a rodeiam, e de múltiplas maneiras influenciam, modificam e condicionam o seu modo de agir. É bem sabido que a Igreja não está separada do convívio humano, antes se encontra situada nele, e, por isso, os seus filhos são movidos e guiados pelo convívio humano, respiram a sua cultura, obedecem às suas leis, observam os seus costumes. Este contacto, porém, da Igreja com a sociedade humana dá continuamente origem a questões difíceis, que hoje são muitíssimo graves. ( ... ) O Apóstolo das gentes exortava assim os cristãos do seu tempo: não vos sujeiteis ao mesmo jugo com os infiéis. Como podem participar a justiça e a iniquidade? Que sociedade pode haver entre a luz e as trevas?... ou que parte existe entre o fiel e o infiel? (2 Cor. 6, 14-15). Por isso, é necessário que aqueles que hoje são na Igreja educadores e mestres advirtam a juventude católica da sua importantíssima condição e do dever que daí se segue de viver neste mundo mas não segundo o sentir deste mundo, de harmonia com a oração feita por Cristo a favor dos seus discípulos: Não peço que os tires do mundo, assim como eu não sou do mundo (Jo. 17, 15-16). A Igreja faz sua esta oração. Todavia, esta distinção não significa o mesmo que separação; nem revela negligência, medo ou. desprezo. Com efeito, quando a Igreja se distingue do género humano, não se le opõe, antes se une com ele». (Paulo VI, Carta enc. Ecclesiam suam, 6 ago. 1964: AAS 56, (1964), p. 627 e 638).

21. Cfr. Rom. 12,2.

22. Cfr. Jo. 10, 14-16.

23. Cfr. S. Policarpo, Epíst. aos Filipenses, VI, 1: «E os presbíteros sejam inclinados à compaixão, misericordiosos para com todos, reconduzindo os extraviados, visitando todos os doentes, não esquecendo as viúvas, os órfãos e os pobres; mas solícitos sempre do bem junto de Deus e dos homens, abstendo-se de toda a ira, acepção de pessoas, juizos injustos, afastando para longe toda a avareza, não acreditando fàcilmente contra alguém, não demasiados severos nos juizos, conscientes de que todos somos devedores do pecado» (ed. F. X. Funk, Patres Apostolici, I, p. 273).

Capítulo II

1. Cfr. 1 Ped. 1,23; Act. 6,7; 12,24. S. Agostinho, In Ps., 44, 23: PL 36, 508: «Pregaram (os Apóstolos) a palavra de verdade e geraram as Igrejas».

2. Cfr. Mal. 2,7; 1 Tim. 4, 11-13; 2 Tim. 4,5; Tit. 1,9.

3. Cfr. Mc. 16,16.

4. Cfr. 2 Cor. 11,7. Acerca dos presbíteros, como cooperadores dos Bispos, valem também aquelas coisas que se dizem dos Bispos. Cfr. Statuta Ecclesiae antiqua, c. 3 (ed. Ch. Munier, Paris, 1960, p. 79) ; Decretum Gratiani, C. 6, D. 88 (ed. Friedberg, I, 307); Conc. Trid., ses. V, Decr. (Conc. Oec. Decreta, ed. Herder Romae, 1962, p. 645) ; 2, n° 9 ses. XXIV, Decr. de reform., c. 4 (p. 739) ; Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecelesia, Lumen gentium, n. 25: AAS 57 (1965), p. 29-31.

5. Cfr. Constitutiones Apostolorum, II, 26, 7: «(os presbíteros) sejam mestres da ciência divina, pois foi o Senhor quem os enviou dizendo: Ide, ensinai, etc.» (ed. F. X. Funk, Didascalia et Constitutiones Apostolorum, I, Paderborn, 1905, p. 105). — Sacramentarium Leonianum e os restantes sacramentários até ao Pontificale Romanum, Prefácio na ordenação de Presbíteros: «Com esta providência, Senhor, deste como companheiros aos Apóstolos dc teu Filho os doutores da fé, com os quais eles encheram todo o mundo de novos pregadores (ou pregações)».— Líber Ordinum Liturgiae Mozarabicae, Prefácio na ordenação de Presbíteros: «Doutor dos povos e reitor dos súbditos, mantenha em ordem a fé católica, e anuncie a todos a verdadeira salvação» (ed. M. Pérotin: Le Líber Ordinum en usage dans l'Eglise Wisigothique et Mozarabe d'Espagne: Monumenta Ecclesiae Liturgicae, vol. V. Paris, 1904, col. 55 lin. 4-6

6. Cfr. Gál. 2,5.

7. Cfr. 1 Ped. 2,12.

8. Cfr. Rito da ordenação de Presbitero na Igreja alexandrina dos Jacobitas: «...Reúne o teu povo para a palavra de doutrina, como a mãe que alimenta os seus filhinhos» (H. Denzinger, Ritus orientalium, Tom. II, Würzburg, 1863, p. 14).

9. Cfr. Mt. 28,19; Mc. 16,16; Tertuliano, De baptismo, 14,2 (Corpus Christianorum, series latina I, p. 289, 11-13); S. Atanásio, Adv. Arianos, 2, 42: PG 26,237; S. Jerónimo, In Mt., 28,19: PL 26, 218 BC: «Primeiro ensinam todas as gentes, depois baptizam os que já estão ensinados. Não pode o corpo receber o sacramento do Baptismo se a alma não tiver recebido antes a verdade da fé»; S. Tomás, Expositio primae Decretalis, § 1:. «o nosso Salvador, enviando os discipulos a pregar, mandou-lhes três coisas: primeiro, que ensinassem a fé; segundo, que ministrassem os sacramentos aos crentes» (ed. Marietti, Opuscula Theologica, Taurini-Romae, 1954, 1138).

10. Cfr. Cone. Vat. II, Const. De Sacra Liturgia, Sacrosanctum Concilium, n. 35, 2: AAS 56 (1964), p. 109.

11. Cfr. Ibid., n. 33, 35, 48, 52 (p. 108-109; 113; 114).

12. Cfr. Ibid., n. 7 (p. 100-101); Pio XII, Carta enc. Mystici Corporis, 29 jun. 1943: AAS 35 (1943), p. 230.

13. S. Inácio M., Smyrn., 8, 1-2 (ed. F. X. Funk, p. 282, 6-15), Constitutiones Apostolorum, VIII, 12, 3 (ed. F. X. Funk p. 496); VIII, 29, 2 (p. 532).

14. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia Lumen gentium, n. 28: AAS 57 (1965), p. 33-36.

15. «A Eucaristia é como que a consumação da vida espiritual, e o fim de todos os sacramentos (S. Tomás, Summa Theol. III, q. 73. a. 3 c); cfr. Summa Theol. III, q. 65, a. 3.

16. Cfr. S. Tomás, Summa Theol. III, q. 65, a. 3, ad 1; q. 79, a. 1 c. e ad 1.

17. Cfr. Ef. 5, 19-20.

18. Cfr. S. Jerónimo, Epist. 114, 2: «...os cálices sagrados, os véus sagrados e as outras coisas que pertencem ao culto da Paixão do Senhor... devem ser venerados com o mesmo respeito tributado ao Corpo e Sangue do Senhor, em virtude de terem tocado no Corpo e no Sangue do Senhor» (PL. 22, 934). Cfr. Conc. Vat. II, Const. De Sacra Liturgia, Sacrosanctum Concilium, n. 122-127: AAS 56 (1964), p. 130-132.

19. Além disso, não deixem de fazer, algumas vezes, a visita ao Santíssimo Sacramento, que deve ser conservado no lugar mais nobre possível e com a maior honra possível nas igrejas segundo as leis litúrgicas; será uma prova de gratidão para com Cristo Senhor ali presente, penhor de amor e ofício de adoração devida» (Paulo VI, Encícl. Mysterium fidei, 3 set. 1965: AAS 57 (1965), p. 771).

20. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 28: AAS 57 (1965), p. 33-36.

21. Cfr. 2 Cor. 10,8; 13,10.

22. Cfr. Gál. 1,10.

23. Cfr. 1 Cor. 4,14.

24. Cfr. Didascalia, II, 34,3; II, 46,6; II, 47,1; Constitutiones Apostolorum, II, 47, 1 (ed. F. X. Funk, Didascalia et Constitutiones, I, p. 116, 142 e 143).

25. Cfr. Gál. 4,3; 5,1 e 13.

26. Cfr. S. Jerónimo, Epist. 58,7: PL 22, 584: «Que utilidade há em que as paredes brilhem de pedras preciosas, e Cristo morra no pobre?»

27. Cfr. 1Ped. 4, 10 s.

28. Cfr. Mt. 25, 34-35.

29. Cfr. Lc. 4,18.

30. Podem nomear-se outras categorias, por ex. os emigrantes, os nómadas etc. Deles trata o Conc. Vat. II no Decreto Christus Dominus, acerca do múnus pastoral dos Bispos na Igreja.

31. Cfr. Didascalia, II, 59, 1-3: «Ao ensinar, manda e exorta o povo a frequentar a igreja e a nunca faltar, mas sim a vir sempre e a não diminuir a igreja, quando se retiram, e a diminuir um membro ao corpo de Cristo... Sendo membros de Cristo, não queirais separar-vos da igreja, quando não vos juntais; pois, tendo Cristo vossa cabeça, segundo a sua promessa, presente e em comunicação convosco, não queirais desprezar-vos a vós mesmos, nem separeis o salvador dos seus membros nem dividais nem disperseis o seu corpo ...» (ed. F. X. Funk, I, 170); Paulo VI, Alocução aos sacerdotes italianos que tomaram parte na 3ª Assembleia realizada durante uma semana em Orvieto, sobre a «actualização pastoral», 6 set. 1963: AAS 55 (1963), p. 750 s.

32. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 28: AAS 57 (1965), p. 35.

33. Cfr. a chamada Constitutio Ecclesiastica Apostolorum, XVIII: «os Presbíteros são symmystai e synepimachoi dos Bispos (ed. Th. Schermann, Die allgemeine Kirchenordnung, I, Paderbon, 1914, p. 26; A. Harnack, T. u. U. II, 5, p. 13, n. 18 e 19) ; Pseudo-Jerónimo, De Septem Ordinibus Ecclesiae: « ... na bênção são participantes dos ministérios juntamente com os Bispos» (ed. A. W. Kalff, Würzburg 1937, p. 45) ; S. Isidoro de Sevilha, De Ecciesiasticis Officiis, II, c. VII: «Presidem à Igreja de Cristo e na confecção do Corpo e do Sangue são participantes juntamente com os Bispos, bem como na doutrinação dos povos e no ofício de pregar» (PL 83, 787).

34. Cfr. Didascalia, II, 28, 4 (ed. F. X. Funk, p. 108); Constitutiones Apostolorum, II, 28,4; II, 34,3 (ibid. p. 109 e 117).

35. Ibid., VIII, 16, 4 (ed. F. X. Funk, I, p. 523); cfr. Epitome Const. Apost., VI (ibid. II, p. 80, 34); Testamentum Domini: «...dá-lhe o Espírito de graça, de conselho, e de magnanimidade, o espírito de presbiterado... para ajudar e governar o teu povo em obras com temor e coração puro» (trad. I. E. Rahmani, Mogúncia, 1899, p. 69). Igualmente, na Trad. Apost. (ed. B. Botte, La Tradition Apostolique, Münster i. W., 1963, p. 20).

36. Cfr. Núm. 11, 16-25.

37. Pont. Rom., «Ordenação de Presbítero», Prefácio; estas palavras encontram-se já no Sacramentarium Leonianum, Sacramentarium Gelasianum e Sacramentarium Gregorianum. Encontram-se palavras semelhantes nas Liturgias Orientais: Cfr. Trad. Apost.: «...olha para este teu servo, e dá-lhe o espírito de graça e de conselho, para que ajude os presbíteros e governe o teu povo com coração puro, assim como olhaste para o povo da tua eleição e mandaste a Moisés que escolhesse presbíteros que tu encheste com o teu espírito que deste ao teu servo» (da antiga versão latina Veronense, ed. B. Botte, La Tradition Apostolique de S. Hippolyte. Essai de reconstruction, Münster i. W.. 1963, p. 20); Const. Apost. VIII, 16,4 (ed. F. X. Funk, I, p. 522, 16-17); Epit. Const. Apost. VI (ed. F. X. Funk, II, p. 80, 5-7); Testamentum Domini (trad. I. E. Rahmani, Mogúncia, 1899, p. 69) ; Euchologium- Serapionis, XXVII (ed. F. X. Funk, Didascalia et Constitutiones, II, p. 190, lin. 1-7); Ritus Ordinationis in ritu Maronitarum (trad. H. Denzinger, Ritus Orientalium, II, Würzburg, 1863, p. 161). Entre os Padres, podem citar-se: Teodoro de Mopsuesta, In 1 Tim. 3,8 (ed. Swete, II, p. 119-121); Teodoreto, Quaestiones in Numeros, XVIII (PG 80, 372 B).

38. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 28: AAS 57 (1965), p. 35.

39. Cfr. João XXIII, Encícl. Sacerdotii nostri primordia., 1 ago. 1959: AAS 51 (1959), p. 576; S. Pio X, Exortação ao Clero Haerent animo, 4 ago. 1908: S. Pii X Acta, vol. IV (1908), p. 237s.

40. Cfr. Conc. Vat. II, Decr. De pastorali Episcoporum munere in Ecclesia, Christus Dominus, n. 15 e 16.

41. No Direito em vigor já se fala do Cabido catedral, como «senado e conselho» do Bispo (C. 1. C., c. -391), ou, na sua falta, do grupo dos consultores diocesanos (cfr. C. I. C. cc. 423-428). Deseja-se, todavia, que estas instituições sejam revistas de tal modo que se providencie melhor às circunstâncias e necessidades actuais. É claro que este grupo de Presbíteros difere do Conselho pastoral de que fala o Conc. Vat. II no Decreto Christus Dominus, acerca do múnus pastoral dos Bispos na Igreja, 28 out. 1965, n. 27, a que pertencem também os leigos, e a quem pertence apenas investigar o que diz respeito às obras pastorais. Acerca dos Presbíteros como conselheiros dos Bispos, podem ver-se: Didascalia, II, 28, 4 (ed. F. X. Funk, I, p. 108) ; Const. Apost., II, 28, 4 (ed. F. X. Funk, I, p. 109) ; S. Inácio M., Magn. 6,1 (ed. F. X. Funk, p. 194) ; Trall. 3,1 (ed. F. X. Funk, p. 204) ; Orígenes, Contra Celsum, III, 30: Os Presbíteros são conselheiros ou boúleytai (PG 11, 957 D - 960 A).

42. S. Inácio M., Magn. 6,1: «Exorto-vos a que procureis fazer tudo na concórdia de Deus, estando o Bispo em lugar de Deus, os presbiteros em lugar do senado apostólico, e tendo sido confiado aos diáconos muito meus amados o ministério de Jesus Cristo que estava desde toda a eternidade junto do Pai e depois apareceu» (ed. F. X. Funk, p. 195). S. Inácio M., Trall. 3,1: «Todos igualmente respeitem os diáconos como a Jesus Cristo, assim como ao Bispo, que é o representante do Pai; aos presbíteros, porém, como senado de Deus e Conselho dos apóstols: sem eles, a Igreja não se pode chamar igreja» (ibid. p. 204) ; S. Jerónimo, In Isaiam, II, 3 (PL 24, 61 D): «E nós temos na Igreja o nosso senado, o corpo dos presbíteros».

43. Cfr. Paulo VI, Alocução aos párocos de Roma e pregadores quaresmais na capela Sixtina, 1 março 1965: AAS 57 (1965), p. 326.

44. Cfr. Const. Apost., VIII, 47, 39: «Os presbíteros... nada façam sem o parecer do Bispo; a ele é que foi confiado o povo do Senhor e a ele serão pedidas contas pelas almas» (ed. F. X. Funk, p. 577).

45. Cfr. 3 Jo. 8.

46. Cfr. Jo. 17,23.

47. Cfr. Hebr. 13, 1-2.

48. Cfr. Hebr. 13,16

49. Cfr. Mt. 5,10.

50. Cfr. 1 Tess. 2,12; Col. 1,13.

51. Cfr. Mt. 23,8; «Depois, é preciso que pelo facto de desejarmos ser pastores, pais e mestres dos homens, por isso mesmo procedamos como seus irmãos (Paulo VI, Encícl. Ecclesiam suam, 6 ago. 1964: AAS 58 (1964), p. 647.

52. Cfr. Ef. 4,7 e 16; Const. Apost., VIII, 1,20: «Mais ainda: nem o Bispo se levante sobre os diáconos ou presbíteros, nem os presbíteros sobre o povo, porque duns e doutros se forma o conjunto do corpo» (ed. F. X. Funk, I, 467).

53. Cfr. Fil. 2,21.

54 Cfr. 1 Jo. 4,1.

55 Cfr. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 37: AAS 57 (1965), p. 42-43.

56 Cfr. Ef. 4,14.

57. Cfr. Conc. Vat. II, Decreto De Oecumenismo, Unitatis redintegratio: AAS 57 (1965), p. 90s.

58. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia Lumen gentium, n. 37: AAS 57 (1965), p. 42-43.

59. Cfr. Hebr. 7,3.

60. Cfr. Lc. 10,1.

61. Cfr. 1 Ped. 2,25.

62. Cfr. Act. 20,28.

63. Cfr. Mt. 9,36.

64. Pont. Rom., «Ordenação dos Presbiteros».

65. Cfr. Conc. Vat. II, Decr. De institutione sacerdotali Optatam totius, n. 2.

66. «A voz de Deus que chama, exprime-se de dois modos diversos, maravilhosos e convergentes: um interior, o da graça, o do Espirito Santo, o inefável da fascinação interior que a «voz silenciosa» e poderosa do Senhor exercita nas insondáveis profundezas da alma humana; e um exterior, humano, sensível, social, jurídico, concreto, o do ministro qualificado da Palavra de Deus, o do apóstolo, o da Hierarquia, instrumento indispensável, instituído e querido por Cristo, como veículo encarregado de traduzir em linguagem perceptível a mensagem do Verbo e do preceito divino. Assim ensina com S. Paulo a doutrina católica: como ouvirão sem terem quem lhes pague... A fé vem pelo ouvido (Rom. 10,14 e 17)»: Paulo VI, alocução, 5 maio 1965: L'Osservatore Romano, 6 maio 1965, p. 1).

67. Cfr. Conc. Vat. II, Decr. De institutione sacerdotali, Optatam totius, n. 2.

68. Isto ensinam os Santos Padres, quando explicam as palavras de Cristo a Pedro: «Amas-me?... Apascenta as minhas ovelhas» (Jo. 21,17): assim S. João Crisóstomo, De sacerdotio, II, 1-2 (PG 47-48, 633); S. Gregório Magno, Reg. Past. Liber, P. I. c. 5 (PL 77, 19 a.).

Capítulo III

1. Cfr. 2 Cor. 12,9.

2. Cfr. Pio XI, Encicl. Ad catholici sacerdotii, 20 dez, 1935: AAS 28 (1936), p. 10.

3. Cfr. Jo. 10,36.

4. Cfr. Lc. 24,26.

5. Cfr. Ef. 4,13.

6 Cfr. 2 Cor., 3, 8-9.

7. Cfr. entre outros documentos: S. Pio X, Exortação ao clero Haerent animo, 4 ago. 1908: S. Pio X Acta, vol. IV (1908), p. 237 ss.; Pio XI, Encícl. Ad catholici sacerdotii, 20 dez. 1935: AAS 28 (1936), p. 5ss.; Pio XII, Exortação apost. Menti nostrae, 23 seta 1950: AAS 42 (1950), p. 657 ss.; João XIII, Encícl. Sacerdotii nostri primordia. 1 ago. 1959: AAS 51 (1959), p. 545 ss.

8. Cfr. S. Tomás, Summa Theol., II-II, q. 188, a. 7.

9. Cfr. Hebr. 3, 9-10.

10. Cfr. Act. 16,14.

11. Cfr. 2 Cor, 4,7.

12. Cfr. Ef. 3,9.

13. Cfr. Pont. Rom., «Da ordenação dos Presbíteros».

14. Cfr. Missale Romanum, oração sobre as oblatas no IX domingo depois do Pentecostes.

15. Com efeito, qualquer missa, embora seja celebrada pelo sacerdote em particular, não é privada, mas sim acto de Cristo e da Igreja; a Igreja, no sacrifício que oferece, aprende a ofercer-se a si mesma como sacrifício universal e aplica para salvação de todo o mundo a única e infinita virtude redentora do sacrifício da Cruz. Cada missa que se celebra, não se oferece só pela salvação de alguns, mas pela salvação de todo o mundo ( ... ) Recomendamos, por isso, paternal e veementemente aos sacerdotes, que são a nossa alegria e a nossa coroa no Senhor, que celebrem todos os dias digna e devotamente» (Paulo VI, Encícl. Mysterium fidei, 3 set. 1965: AAS 57 (1965), p. 761-762); Cfr. Conc. Vat. II, Const. De Sacra Liturgia, Sacrosantum Concilium, n. 26 e 27: AAS 56 (1964), p. 107.

16. Cfr. Jo. 10,11.

17. Cfr. 2 Cor. 1,7.

18. Cfr. 2 Cor. 1,4.

19. Cfr. 1 Cor. 10,3.

20. Cfr. Jo. 3,8.

21. Cfr. Jo. 4,34.

22. Cfr. 1 Jo. 3,16.

23. «Seja ofício de amor apascentar o rebanho do Senhor» (S. Agostinho, Tract. in Jo., 123, 5: PL 35, 1967).

24. Cfr. Rom. 12,2.

25. Cfr. Gál. 2,2.

26. Cfr. 2 Cor. 7,4.

27. Cfr. Jo. 4,34; 5,30; 6,38.

28. Cfr. Act. 13,2.

29. Cfr. Ef, 5,10.

30. Cfr. Act. 20,22.

31. Cfr. 2 Cor, 12,15.

32. Cfr. Ef. 4, 11-16. .

33. Cfr. Mt. 19,12.

34. Cfr. Cone. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 42: AAS 57 (1965), p. 47-49.

35. Cfr. 1 Tim. 3, 2-5; Tit. 1,6.

36. Cfr. Pio XI, Encícl. Ad Catholici sacerdotii, 20 dez. 1935: AAS 28 (1936), p. 28.

37. Cfr. Mt. 19,12.

38. Cfr. 1 Cor. 7, 32-34.

39. Cfr. 2 Cor. 11,2.

40. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, n. 42 e 44: AAS 57 (1965), p. 47-49 e 50-51; Decreto De accommodata renovatione vitae Ad catholici sacerdotii, 20 dez. 1935: AAS 28 (1936), p. 24-28; Pio XII, Encícl. religiosae, Perfectae caritatis, n. 12.

41. Cfr. Lc. 20, 35-36; Pio XI, Encícl. Sacra Virginitas, 25 março 1954: AAS 46 (1954), p. 169-172.

42. Cfr. Mt. 19,11:

43. Cfr. Jo. 17, 14-16.

44. Cfr. 1 Cor. 7,31.

45. Conc. Antioch., can, 25: Mansi, 2, 1327-1328; Decretum Gratiani, c. 23, c. 12, q. 1 (ed. Friedberg, I, 684-685).

46. Isto entende-se sobretudo dos direitos e dos costumes em vigor nas Igrejas Orientais.

47. Conc. Paris. a. 829, can. 15: MGH Legum sect. III, Concilia, t. 2, p. 622; Conc. Trid., ses. XXV, Decr. de reform., c. 1: Conc. Dec. Decreta, ed. Herder, Roma, 1962, p. 760-761.

48. Cfr. Ps. 62, 11 Vg. 61.

49. Cfr. 2 Cor. 8,9.

50. Cfr. Act, 8, 18-25.

51. Cfr. Fil. 4,12.

52. Cfr. Act. 2, 42-47.

53. Cfr. Le. 4,18.

54. Cfr. CIC, can. 125 s,

55. Cfr. Conc. Vat. II, Decr. De accommodata renovatione vitae religiosae, Perfectae caritatis, n. 7; Const

56. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De ecclesia Lumen gentium, n. 65: AAS 57 (1965), p. 64-65.

57. Pont. Rom., «ordenação dos Presbiteros».

58. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De divina Revelatione, Dei Verbum, n. 25.

59. Este curso não é o mesmo que aquele curso pastoral que deve ser feito logo a seguir à ordenação, de que fala o Decreto De institutione sacerdotali, Optatam totius,

60. Cfr. Conc. Vat. II, Decr. De pastorali Episcoporum munere in Ecclesia, Christus Dominus, n. 17.

61. Cfr. Mt. 10,10; 1 Cor. 9,7; 1 Tim. 5,18.

62. Cfr. 2 Cor. 8,14.

63. Cfr. Fil. 4,14.

64. Cfr. Jo. 3,16.

65. Cfr. 1 Ped. 2,5.

66. Cfr. Ef. 2,22.

67. Cfr. Pont. Rom., «Ordenação dos Presbíteros».

68. Cfr. Ef. 3,9.

69. Cfr. Col. 3,3.

++++++++++++++++++++++++


DECRETO
APOSTOLICAM ACTUOSITATEM
SOBRE O APOSTOLADO DOS LEIGOS

PROÉMIO

Importância e actualidade do apostolado dos leigos na vida da Igreja

1. O sagrado Concílio, desejando tornar mais intensa a actividade apostólica do Povo de Deus(1), volta-se com muito empenho para os cristãos leigos, cujas funções próprias e indispensáveis na missão da Igreja já em outros lugares recordou (2). Com efeito, o apostolado dos leigos, que deriva da própria vocação cristã, jamais poderá faltar na Igreja. A mesma Sagrada Escritura demonstra abundantemente como foi espontânea e frutuosa esta actividade no começo da Igreja (cfr. Act. 11, 19-21: 18, 26; Rom. 16, 1-16; Fil. 4, 3).

Os nossos tempos, porém, não exigem um menor zelo dos leigos; mais ainda, as condições actuais exigem deles absolutamente um apostolado cada vez mais intenso e mais universal. Com efeito, o aumento crescente da população, o progresso da ciência e da técnica, as relações mais estreitas entre os homens, não só dilataram imenso os campos do apostolado dos leigos, em grande parte acessíveis só a eles, mas também suscitaram novos problemas que reclamam a sua atenção interessada e o seu esforço. Este apostolado torna-se tanto mais urgente quanto a autonomia de muitos sectores da vida humana, como é justo, aumentou, por vezes com um certo afastamento da ordem ética e religiosa e com grave perigo para a vida cristã. Além disso, em muitas regiões onde os sacerdotes são demasiado poucos ou, como acontece por vezes, são privados da liberdade de ministério, a Igreja dificilmente poderia estar presente e activa sem o trabalho dós leigos.

Sinal desta multíplice e urgente necessidade é a evidente actuação do Espírito Santo que hoje torna os leigos cada vez mais conscientes da própria responsabilidade e por toda a parte os anima ao serviço de Cristo e da Igreja (3).

No presente Decreto, o Concílio entende ilustrar a natureza, a índole e a variedade do apostolado dos leigos, bem como enunciar os princípios fundamentais e dar as orientações pastorais para o seu mais eficaz exercício; tudo isto deverá servir de norma na revisão do Direito canónico na parte que diz respeito ao apostolado dos leigos.

CAPÍTULO I

A VOCAÇÃO DOS LEIGOS AO APOSTOLADO

Participação dos leigos na missão da Igreja

2. A Igreja nasceu para tornar todos os homens participantes da redenção salvadora (1) e, por eles, ordenar efectivamente a Cristo o universo inteiro, dilatando pelo mundo o seu reino para glória de Deus Pai. Toda a actividade do Corpo místico que a este fim se oriente, chama-se apostolado. A Igreja exerce-o de diversas maneiras, por meio de todos os seus membros, já que a vocação cristã é também, por sua própria natureza, vocação ao apostolado. Do mesmo modo que num corpo vivo nenhum membro tem um papel meramente passivo, mas antes, juntamente com a vida do corpo, também participa na sua actividade, assim também no Corpo de Cristo, que é a Igreja, todo o corpo «cresce segundo a operação própria de cada um dos seus membros» (Ef. 4, 16). Mais ainda: é tanta neste corpo a conexão e coesão dos membros (cfr. Ef. 4, 16), que se deve dizer que não aproveita nem à Igreja nem a si mesmo aquele membro que não trabalhar para o crescimento do corpo, segundo a própria capacidade.

Existe na Igreja diversidade de funções, mas unidade de missão. Aos Apóstolos e seus sucessores, confiou Cristo a missão de ensinar, santificar e governar em seu nome e com o seu poder. Mas os leigos, dado que são participantes do múnus sacerdotal, profético e real de Cristo, têm um papel próprio a desempenhar na missão do inteiro Povo de Deus, na Igreja e no mundo (2). Exercem, com efeito, apostolado com a sua acção para evangelizar e santificar os homens e para impregnar e aperfeiçoar a ordem temporal com o espírito do Evangelho; deste modo, a sua actividade nesta ordem dá claro testemunho de Cristo e contribui para a salvação dos homens. E sendo próprio do estado dos leigos viver no meio do mundo e das ocupações seculares, eles são chamados por Deus para, cheios de fervor cristão, exercerem como fermento o seu apostolado no meio do mundo.

Fundamentos do apostolado dos leigos

3. O dever e o direito ao apostolado advêm aos leigos da sua mesma união com Cristo cabeça. Com efeito, inseridos pelo Baptismo no Corpo místico de Cristo, e robustecidos pela Confirmação com a força do Espírito Santo, é pelo Senhor mesmo que são destinados ao apostolado. São consagrados em ordem a um sacerdócio real e um povo santo (cfr. 1 Ped. 2, 4-10) para que todas as suas actividades sejam oblações espirituais e por toda a terra dêem testemunho de Cristo. E os sacramentos, sobretudo a sagrada Eucaristia, comunicam e alimentam neles aquele amor que é a alma de todo o apostolado (3).

O apostolado exercita-se na fé, na esperança e na caridade, virtudes que o Espírito Santo derrama no coração de todos os membros da Igreja. Mais o preceito do amor, que é o maior mandamento do Senhor, estimula todos os fiéis a que procurem a glória de Deus, pelo advento do Seu reino, e a vida eterna para todos os homens, de modo que eles conheçam o único Deus verdadeiro e Jesus Cristo, seu enviado (cfr. Jo. 17, 3).

A todos os fiéis incumbe, portanto, o glorioso encargo de trabalhar para que a mensagem divina da salvação seja conhecida e recebida por todos os homens em toda a terra.

O Espírito Santo - que opera a santificação do Povo de Deus por meio do ministério e dos sacramentos - concede também aos fiéis, para exercerem este apostolado, dons particulares (cfr. 1 Cor. 12, 7), «distribuindo-os por cada um conforme lhe apraz» (1 Cor. 12, 11), a fim de que «cada um ponha ao serviço dos outros a graça que recebeu» e todos actuem, «como bons administradores da multiforme graça de Deus» (1 Ped. 4, 10), para a edificação, no amor, do corpo todo (cfr. Ef. 4, 1). A recepção destes carismas, mesmo dos mais simples, confere a cada um dos fiéis o direito e o dever de os actuar na Igreja e no mundo, para bem dos homens e edificação da Igreja, na liberdade do Espírito Santo, que :(sopra onde quer» (Jo. 3, 8) e, simultâneamente, em comunhão com os outros irmãos em Cristo, sobretudo com os próprios pastores; a estes compete julgar da sua autenticidade e exercício ordenado, não de modo a apagarem o Espírito, mas para que tudo apreciem e retenham o que é bom (cfr. 1 Tess. 5, 12.19.21)(4).

A espiritualidade dos leigos em ordem ao apostolado

4. A fonte e origem de todo o apostolado da Igreja é Cristo, enviado pelo Pai. Sendo assim, é evidente que a fecundidade do apostolado dos leigos depende da sua união vital com Cristo, segundo as palavras do Senhor: ,aquele que permanece em mim e em quem eu permaneço, esse produz muito fruto; pois, sem mim, nada podeis fazer» (Jo. 15, 5). Esta vida de íntima união com Cristo na Igreja é alimentada pelos auxílios espirituais comuns a todos os fiéis e, de modo especial, pela participação activa na sagrada Liturgia(5); e os leigos devem servir-se deles de tal modo que, desempenhando correctamente as diversas tarefas terrenas nas condições ordinárias da existência, não separem da própria vida a união com Cristo, mas antes, realizando a própria actividade segundo a vontade de Deus, nela cresçam. É por este caminho que os leigos devem avançar na santidade com entusiasmo e alegria, esforçando-se por superar as dificuldades com prudência e paciência (6). Nem os cuidados familiares nem outras ocupações profanas devem ser alheias à vida espiritual, conforme aquele ensinamento do Apóstolo: tudo o que fizerdes, por palavras ou por obras, tudo seja em nome do Senhor Jesus Cristo, dando por Ele graças a Deus Pai» (Col. 3, 17).

Esta vida exige o exercício constante da fé, da esperança e da caridade.

Só com a luz da fé e a meditação da palavra de Deus pode alguém reconhecer sempre e em toda a parte a Deus no qual «vivemos, nos inovemos e existimos» (Act. 17, 28), procurar em todas as circunstâncias a Sua vontade, ver Cristo em todos os homens, quer chegados quer estranhos, julgar rectamente do verdadeiro sentido e valor das realidades temporais, em si mesmas e em ordem ao fim do homem.

Aqueles que possuem tal fé, vivem na esperança da manifestação dos filhos de Deus, lembrados da cruz e da ressurreição do Senhor. Na peregrinação que é a presente vida, escondidos com Cristo em Deus e libertados da escravidão das riquezas, ao mesmo tempo que tendem para aqueles bens que permanecem eternamente, dedicam-se generosa e inteiramente a dilatar o reino de Deus e a informar e actuar com o espírito cristão a ordem temporal. No meio das adversidades desta vida, encontram força na esperança, sabendo que «os sofrimentos presentes não têm comparação com a glória futura que em nós se manifestará» (Rom. 8, 18).

Impelidos pela caridade que vem de Deus, praticam o bem com relação a todos, sobretudo para com os irmãos na fé (cfr. Gál. 6, 10), despojando-se «de toda a malícia e engano, hipocrisias, invejas e toda a espécie de maledicências» (1 Ped. 2, 1) e assim atraem a Cristo todos os homens. O amor de Deus que «foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo, que nos foi dado» (Rom. 5, 5), toma os leigos capazes de exprimir em verdade, na própria vida, o espírito das Bem-aventuranças. Seguindo a Cristo pobre, nem se deixam abater com a falta dos bens temporais nem se exaltam com a sua abundância; imitando a Cristo humilde, não são cobiçosos da glória vã (cfr. Gál. 5, 26), mas procuram mais agradar a Deus que aos homens, sempre dispostos a deixar tudo por Cristo (cfr. Lc. 14, 26) e a sofrer perseguição pela justiça (cfr. Mt. 5, 10), lembrados da palavra do Senhor: «se alguém quiser seguir-me, abnegue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me» (Mt. 16, 24). Finalmente, fomentando entre si a amizade cristã, prestam-se mútuamente ajuda em todas as necessidades.

Esta espiritualidade dos leigos deverá assumir características especiais, conforme o estado de matrimónio e familiar, de celibato ou viuvez, situação de enfermidade, actividade profissional e social. Não deixem, por isso, de cultivar assiduamente as qualidades e dotes condizentes a essas situações, e utilizar os dons por cada um recebidos do Espírito Santo.

Além disso, aqueles leigos que, seguindo a própria vocação, se alistaram em alguma das associações ou institutos aprovados pela Igreja, devem de igual modo esforçar-se por assimilar as características da espiritualidade que lhes é própria.

Tenham também em muito apreço a competência profissional, o sentido de família e o sentido cívico e as virtudes próprias da convivência social, como a honradez, o espírito de justiça, a sinceridade, a amabilidade, a fortaleza de ânimo, sem as quais também se não pode dar uma vida cristã autêntica.

O modelo perfeito desta vida espiritual e apostólica é a bem-aventurada Virgem Maria, rainha dos Apóstolos: levando, na terra, uma vida semelhante à a todo o momento se mantinha unida a seu Filho e de modo singular cooperou na obra do Salvador; agora, elevada ao céu, «cuida com amor materno dos irmãos de seu Filho que, entre perigos e angústias, peregrinam ainda na terra, até chegarem à pátria bem-aventurada» (7). Prestem-lhe todos um culto cheio de devoção e confiem à sua solicitude materna a própria vida e apostolado.

CAPÍTULO II

OS FINS DO APOSTOLADO DOS LEIGOS

Introdução: a obra de Cristo e da Igreja

5. A obra redentora de Cristo, que por natureza visa salvar os homens, compreende também a restauração de toda a ordem temporal. Daí que a missão da Igreja consiste não só em levar aos homens a mensagem e a graça de Cristo, mas também em penetrar e actuar com o espírito do Evangelho as realidades temporais. Por este motivo, os leigos, realizando esta missão da Igreja, exercem o seu apostolado tanto na Igreja como no mundo, tanto na ordem espiritual como na temporal. Estas ordens, embora distintas, estão de tal modo unidas no único desígnio divino que o próprio Deus pretende reintegrar, em Cristo, o universo inteiro, numa nova criatura, dum modo incoativo na terra, plenamente no último dia. O leigo, que é simultâneamente fiel e cidadão, deve sempre guiar-se, em ambas as ordens, por uma única consciência, a cristã.

O apostolado para a evangelização e santificação do mundo

6. A missão da Igreja tem como fim a salvação dos homens, a alcançar pela fé em Cristo e pela sua graça. Por este motivo, o apostolado da Igreja e de todos os seus membros ordena-se, antes de mais, a manifestar ao mundo, por palavras e obras, a mensagem de Cristo, e a comunicar a sua graça. Isto realiza-se sobretudo por meio do ministério da palavra e dos sacramentos, especialmente confiado ao clero, no qual também os leigos têm grande papel a desempenhar, para se tornarem «cooperadores da verdade» (3 Jo. 8). É sobretudo nesta ordem que o apostolado dos leigos e o ministério pastoral se completam mùtuamente.

Inúmeras oportunidades se oferecem aos leigos para exercerem o apostolado de evangelização e santificação. O próprio testemunho da vida cristã e as obras, feitas com espírito sobrenatural, têm eficácia para atrair os homens à fé e a Deus; diz o Senhor: «Assim brilhe a vossa luz diante dos homens, de modo que vejam as vossas boas obras e dêem glória ao vosso Pai que está nos céus» (Mt. 5, 16).

Este apostolado, contudo, não consiste apenas no testemunho da vida; o verdadeiro apóstolo busca ocasiões de anunciar Cristo por palavra, quer aos não crentes para os levar à fé, quer aos fiéis, para os instruir, confirmar e animar a uma vida fervorosa; «com efeito, o amor de Cristo estimula-nos» (2 Cor. 5, 14); e devem encontrar eco no coração de todos aquelas palavras do Apóstolo: «ai de mim, se não prego o Evangelho» (1 Cor. 9,16) (1).

E dado que no nosso tempo surgem novos problemas e se difundem gravíssimos erros que ameaçam subverter a religião, a ordem moral e a própria sociedade humana, este sagrado Concílio exorta ardentemente os leigos a que, na medida da própria capacidade e conhecimentos, desempenhem com mais diligência a parte que lhes cabe na elucidação, defesa e recta aplicação dos princípios cristãos aos problemas d6 nosso tempo, segundo a mente da Igreja.

Instauração cristã da ordem temporal

7. A vontade de Deus com respeito ao mundo é que os homens, em boa harmonia, edifiquem a ordem temporal e a aperfeiçoem constantemente.

Todas as realidades que constituem a ordem temporal-os bens da vida e da família, a cultura, os bens económicos, as artes e profissões, as instituições políticas, as relações internacionais e outras semelhantes, bem como a sua evolução e progresso -não só são meios para o fim último do homem, mas possuem valor próprio, que lhes vem de Deus, quer consideradas em si mesmas, quer como partes da ordem temporal total: «e viu Deus todas as coisas que fizera, e eram todas muito boas» (Gén. 1, 31). Esta bondade natural das coisas adquire uma dignidade especial pela sua relação com a pessoa humana, para cujo serviço foram criadas. Finalmente, aprouve a Deus reunir todas as coisas em Cristo, quer as naturais quer as sobrenaturais, «de modo que em todas Ele tenha o primado» (Col. 1, 18). Mas este destino, não só não priva a ordem temporal da sua autonomia, dos seus fins próprios, das suas leis, dos seus recursos, do seu valor para bem dos homens, mas antes a aperfeiçoa na sua consistência e dignidade próprias, ao mesmo tempo que a ajusta à vocação integral do homem na terra.

O uso das coisas temporais foi, no decurso da história, manchado com graves abusos. É que os homens, atingidos pelo pecado original, caíram muitas vezes em muitos erros acerca do verdadeiro Deus, .da natureza do homem e dos princípios da lei moral. Daí a corrupção dos costumes e das instituições humanas, daí a pessoa humana tantas vezes conculcada. Também em nossos dias, não poucos, confiando em excesso no progresso das ciências naturais e da técnica, caem numa espécie de idolatria das coisas materiais, das quais em vez de senhores se tornam escravos.

Toda a Igreja deve trabalhar por tornar os homens capazes de edificar rectamente a ordem temporal e de a ordenar, por Cristo, para Deus. Aos pastores compete propor claramente os princípios relativos ao fim da criação e ao uso do mundo e proporcionar os auxílios morais e espirituais para que a ordem temporal se edifique em Cristo.

Quanto aos leigos, devem eles assumir como encargo próprio seu essa edificação da ordem temporal e agir nela de modo directo e definido, guiados pela luz do Evangelho e a mente da Igreja e movidos pela caridade cristã; enquanto cidadãos, cooperar com os demais com a sua competência específica e a própria responsabilidade; buscando sempre e em todas as coisas a justiça do reino de Deus. A ordem temporal deve ser construída de tal modo que, respeitadas integralmente as suas leis próprias, se torne, para além disso, conforme aos princípios da vida cristã, de modo adaptado às diferentes condições de lugares, tempos e povos. Entre as actividades deste apostolado sobressai a acção social dos cristãos, a qual o sagrado Concílio deseja que hoje se estenda a todos os domínios temporais, sem exceptuar o da cultura (2).

A acção caritativa como distintivo do apostolado cristão

8. Toda a actividade apostólica deve fluir e receber força da caridade; algumas obras, porém, prestam-se, por sua própria natureza, a tornarem-se viva expressão dessa caridade. Cristo quis que elas fossem sinais da sua missão messiânica (cfr. Mt. 11, 4-5).

O maior mandamento da lei é amar a Deus de todo o coração, e ao próximo como a si mesmo (cfr. Mt. 22, 37-40). Cristo fez deste mandamento do amor para com o próximo o seu mandamento, e enriqueceu-o com novo significado, identificando-se aos irmãos como objecto da caridade, dizendo: «sempre que o fizestes a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes» (Mt. 25, 40). Com efeito, assumindo a natureza humana, Ele uniu a si como família, por uma certa solidariedade sobrenatural, todos os homens e fez da caridade o sinal dos seus discípulos, com estas palavras: «nisto conhecerão todos que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros» (Jo. 13, 35).

A santa Igreja, assim como nos seus primeiros tempos, juntando a «ágape» à Ceia eucarística, se mostrava toda unida à volta de Cristo pelo vínculo da caridade, assim em todos os tempos se pode reconhecer por este sinal do amor. E alegrando-se com as realizações alheias, ela reserva para si, como dever e direito próprios, que não pode alinear, as obras de caridade. Por isso, a misericórdia para com os pobres e enfermos e as chamadas obras de caridade e de mútuo auxílio para socorrer as múltiplas necessidades humanas são pela Igreja honradas de modo especial (3).

Estas actividades e obras tornaram-se muito mais urgentes e universais no nosso tempo, em que os meios de comunicação são mais rápidos, em que quase se venceu a distância entre os homens e os habitantes de toda a terra se tornaram membros em certo modo duma só família. A actividade caritativa, hoje, pode e deve atingir as necessidades de todos os homens. Onde quer que se encontrem homens a quem faltam sustento, vestuário, casa, remédios, trabalho, instrução, meios necessários para levar uma vida verdadeiramente humana, afligidos pelas desgraças ou pela doença, sofrendo o exílio ou a prisão, aí os deve ir buscar e encontrar a caridade cristã, consolar com muita solicitude e ajudar com os auxílios prestados. Esta obrigação incumbe antes de mais aos homens e povos que disfrutam de condição próspera (4).

Para que este exercício da caridade seja e apareça acima de toda a suspeita, considere-se no próximo a imagem de Deus, para o qual foi criado, veja-se nele a Cristo, a quem realmente se oferece tudo o que ao indigente se dá; atenda-se com grande delicadeza à liberdade e dignidade da pessoa que recebe o auxílio; não se deixe manchar a pureza de intenção com qualquer busca do próprio interesse ou desejo de domínios (5); satisfaçam-se antes de mais as exigências da justiça, nem se ofereça como dom da caridade aquilo que já é devido a título de justiça; suprimam-se as causas dos males, e não apenas os seus efeitos; e de tal modo se preste a ajuda que os que a recebem se libertem a pouco e pouco da dependência alheia e se bastem a si mesmos.

Tenham, por isso, os leigos em grande apreço e ajudem quanto possam as obras caritativas e as iniciativas de assistência social, quer privadas quer públicas, e também internacionais, que levam auxílio eficaz aos indivíduos e aos povos necessitados, cooperando neste ponto com todos os homens de boa vontade (6).

CAPÍTULO III

OS VÁRIOS CAMPOS DO APOSTOLADO

Introdução: vários campos do apostolado dos leigos.
A Igreja

9. Os leigos exercem o seu apostolado multiforme tanto na Igreja como no mundo. Em ambos os planos se abrem vários campos de actividade apostólica de que queremos aqui lembrar os principais. São: as comunidades eclesiais, a família, a juventude, o meio social, as ordens nacional e internacional. E como hoje a mulher tem cada vez mais parte activa em toda a vida social, é da maior importância que ela tome uma participação mais ampla também nos vários campos do apostolado da Igreja.

10. Porque participam no múnus sacerdotal, profético e real de Cristo, têm os leigos parte activa na vida e acção da Igreja. A sua acção dentro das comunidades eclesiais é tão necessária que, sem ela, o próprio apostolado dos pastores não pode conseguir, a maior parte das vezes, todo o seu efeito. Porque os leigos com verdadeira mentalidade apostólica, à imagem daqueles homens e mulheres que ajudavam Paulo na propagação do Evangelho (cfr. Act. 18, 18, 20; Rom. 16, 3), suprem o que falta a seus irmãos e revigoram o espírito dos pastores e dos outros membros do povo fiel (cfr. 1 Cor. 16, 17-18). Pois eles, fortalecidos pela participação activa na vida litúrgica da comunidade, empenham-se nas obras apostólicas da mesma. Conduzem à Igreja os homens que porventura andem longe, cooperam intensamente na comunicação da palavra de Deus, sobretudo pela actividade catequética, e tornam mais eficaz, com o contributo da sua competência, a cura de almas e até a administração dos bens da Igreja.

A paróquia dá-nos um exemplo claro de apostolado comunitário porque congrega numa unidade toda a diversidade humana que aí se encontra e a insere na universalidade da Igreja (1). Acostumem-se os leigos a trabalhar na paróquia intimamente unidos aos seus sacerdotes (2), a trazer para a comunidade eclesial os próprios problemas e os do mundo e as questões que dizem respeito à salvação dos homens, para que se examinem e resolvam no confronto de vários pareceres. Acostumem-se, por fim, a prestar auxílio a toda a iniciativa apostólica e missionária da sua comunidade eclesial na medida das próprias forças.

Cultivem o sentido de diocese, de que a paróquia é como que uma célula, e estejam sempre prontos, à voz do seu pastor, a somar as suas forças às iniciativas diocesanas. Mas, para responder às necessidades das cidades e das regiões rurais (3), não confinem a sua cooperação dentro dos limites da paróquia ou da diocese, mas esforcem-se por estendê-la aos campos interparoquial, interdiocesano, nacional ou internacional. Tanto mais que a crescente migração de povos, o incremento de relações mútuas e a facilidade de comunicações já não permitem que parte alguma da sociedade permaneça fechada em si. Assim devem interessar-se pelas necessidades do Povo de Deus disperso por toda a terra. Em primeiro lugar, façam suas as obras missionárias, prestando auxílios materiais ou mesmo pessoais. Pois é dever e honra dos cristãos restituir a Deus parte dos bens que d'Ele recebem.

A família

11. O criador de todas as coisas constituiu o vínculo conjugal princípio e fundamento da sociedade humana e fê-lo, por sua graça, sacramento grande em Cristo e na Igreja (cfr. Ef. 5, 32). Por isso, o apostolado conjugal e familiar tem singular importância tanto para a Igreja como para a sociedade civil.

Os esposos cristãos são cooperadores da graça e testemunhas da fé um para com o outro, para com os filhos e demais familiares. Eles são os primeiros que anunciam aos filhos a fé e os educam. Formam-nos, pela palavra e pelo exemplo, para a vida cristã e apostólica. Ajudam-nos com prudência a escolher a sua vocação e fomentam com todo o cuidado a vocação de consagração porventura neles descoberta.

Foi sempre dever dos esposos e hoje é a maior incumbência do seu apostolado: manifestar e demonstrar, pela sua vida, a indissolubilidade e a santidade do vínculo matrimonial; afirmar vigorosamente o direito e o dever próprio dos pais e tutores de educar cristãmente os filhos; defender a dignidade e legítima autonomia da família. Cooperem, pois, eles e os outros cristãos, com os homens de boa vontade para que estes direitos sejam integralmente assegurados na legislação civil. No governo da sociedade, tenham-se em conta as necessidades familiares quanto à habitação, educação dos filhos, condições de trabalho, seguros sociais e impostos. Ao regulamentar a migração salve-se sempre a convivência doméstica (4).

Foi a própria família que recebeu de Deus a missão de ser a primeira célula vital da sociedade. Cumprirá essa missão se se mostrar, pela piedade mútua dos seus membros e pela oração feita a Deus em comum, como que o santuário doméstico da Igreja; se toda a família se inserir no culto litúrgico da Igreja e, finalmente, se a família exercer uma hospitalidade actuante e promover a justiça e outras boas obras em serviço de todos os irmãos quê sofrem necessidade. Podem enumerar-se, entre as várias obras de apostolado familiar, as seguintes: adoptar por filhos crianças abandonadas, receber com benevolência estrangeiros, coadjuvar no regime das escolas, auxiliar os adolescentes com conselhos e meios materiais, ajudar os noivos a prepararem-se melhor para o matrimónio, colaborar na catequese, auxiliar os esposos e as famílias que se encontram em crise material ou moral, proporcionar aos velhos não só o necessário, mas também fazê-los participar, com equidade, dos frutos do progresso económico.

As famílias cristãs, pela coerência de toda a sua vida com o Evangelho e pelo exemplo que mostram do matrimónio cristão, oferecem ao mundo um preciosíssimo testemunho de Cristo, sempre e em toda a parte, mas sobretudo naquelas regiões em que se lançam as primeiras sementes do Evangelho ou em que a Igreja está nos começos ou atravessa alguma crise grave (5).

Pode ser oportuno que as famílias se, unam em certas associações para mais fàcilmente poderem atingir os fins do seu apostolado (6).

Os jovens

12. Os jovens exercem na sociedade de hoje um influxo da maior importância (7). As condições em que vivem, os hábitos mentais e até as relações com a própria família estão profundamente mudadas. É frequente passarem com demasiada rapidez a uma condição social e económica nova. Por um lado, cresce cada vez mais a sua importância social e até política; por outro, parecem incapazes de assumir convenientemente as novas tarefas.

Este acréscimo de influência na sociedade exige deles uma actividade apostólica correspondente. Aliás, a sua própria índole natural os dispõe para ela. Com o amadurecimento da consciência da própria personalidade, estimulados pelo ardor da vida e pela actividade transbordante, assumem a própria responsabilidade e desejam tomar a parte activa que lhes compete na vida social e cultural. Se este zelo é penetrado pelo espírito de Cristo e animado pela obediência e pelo amor para com os pastores da Igreja, podemos esperar dele frutos muito abundantes. Eles mesmos devem ser os primeiros e imediatos apóstolos da juventude e exercer por si mesmos o apostolado entre eles, tendo em conta o meio social em que vivem (8).

Os adultos procurem estabelecer com os jovens um diálogo amigo que permita a ambas as partes, superando a distância de idades, conhecerem-se mùtuamente e comunicarem uns aos outros as próprias riquezas. Estimulem os adultos a juventude ao apostolado, primeiro pelo exemplo e, dada a ocasião, por conselhos prudentes e ajuda eficaz. E os jovens mostrem para com os mais velhos respeito e confiança. E, ainda que por natureza são inclinados a novidades, tenham, contudo, na devida estima aquelas tradições que são válidas.

Também as crianças têm a sua própria actuação apostólica. Segunda as suas forças, são em verdade testemunhos vivos de Cristo entre os companheiros.

O apostolado social

13. O apostolado no meio social, isto é, o empenho em informar de espírito cristão a mentalidade e os costumes, as leis e estruturas da comunidade em que se vive, são incumbência e encargo de tal modo próprios dos leigos que nunca poderão ser plenamente desempenhados por outros. Neste campo, podem os leigos exercer um apostolado de semelhante para com semelhante. Aí completam o testemunho da vida pelo testemunho da palavra (9). Nesse campo do trabalho, da profissão, do estudo, da residência, do tempo livre ou da associação, são eles os mais aptos para ajudar os seus irmãos.

Os leigos realizam esta missão da Igreja no mundo, antes de tudo, por aquela coerência da vida com a fé, pela qual se tornam luz do mundo; pela honestidade nos negócios, com a qual a todos atraem ao amor da verdade e do bem e, finalmente, a Cristo e à Igreja; pela caridade fraterna que, fazendo-os participar das condições de vida, dos trabalhos, dos sofrimentos e aspirações de seus irmãos, prepara insensivelmente todos os corações para a acção da graça salutar; por aquela plena consciência da participação que devem ter na construção da sociedade, a qual os leva a esforçarem-se por desempenhar com magnanimidade cristã a actividade doméstica, social e profissional. Assim, o seu modo de agir penetra pouco a pouco no meio de vida e de trabalho.

Este apostolado deve abranger todos aqueles que aí se encontram e não excluir nenhum bem espiritual ou temporal que possam fazer. Mas os verdadeiros apóstolos não se contentam só com esta acção e esforçam-se por anunciar Cristo ao próximo também por meio da palavra. E que muitos homens só por meio de seus companheiros leigos podem ouvir o Evangelho e conhecer Cristo.

O apostolado na ordem nacional e internacional

14. Um imenso campo de apostolado se abre na ordem nacional e internacional, em que são sobretudo os leigos os administradores da sabedoria cristã. Os católicos sintam-se obrigados a promover o bem comum na dedicação à pátria e no fiel cumprimento dos deveres civis, e façam valer o peso da sua opinião de modo a que o poder civil se exerça com justiça e as leis correspondam aos preceitos morais e ao bem comum. Os católicos peritos nos negócios públicos e firmes, como devem ser, na fé e doutrina cristã, não recusem participar neles uma vez que, exercendo-os dignamente, podem atender ao bem comum e, ao mesmo tempo, abrir caminho ao . Evangelho.

Empenhem-se os católicos em cooperar. com todos os homens de boa vontade para promover tudo o que é verdadeiro, tudo o que é justo, tudo o que é santo, tudo o que é digno de ser amado (cfr. Fil. 4,8). Dialoguem com eles, indo ao seu encontro com prudência e bondade. E investiguem em conjunto o modo de organizar as instituições sociais e públicas segundo o espírito do Evangelho.

Entre os sinais do nosso tempo, é digno de especial menção aquele crescente e inelutável sentido de solidariedade entre todos os povos que o apostolado dos leigos tem por encargo promover activamente e converter em sincero e verdadeiro afecto fraternal. Além disso, devem os leigos ter consciência da realidade internacional e das questões e soluções, doutrinais ou práticas, que nela se originam, sobretudo quanto aos povos em desenvolvimento (10).

Lembrem-se todos aqueles que trabalham em nações estrangeiras ou lhes prestam auxílio, que as relações entre os povos devem ser um verdadeiro convívio fraterno em que ambas as partes simultânamente dão e recebem. Aqueles, porém, que viajam ou por causa de obras internacionais, ou por negócios ou por motivo de descanso, lembrem-se que são também, em toda a parte, pregoeiros itinerantes de Cristo e procedam como tais.

CAPÍTULO IV

AS VÁRIAS FORMAS DO APOSTOLADO

Introdução: apostolado individual ou associado

15. Os leigos podem exercer a sua acção apostólica quer como indivíduos quer unidos em diversas comunidades e associações.

Necessidade e natureza do apostolado individual

16. O apostolado individual que deriva com abundância da fonte de uma vida verdadeiramente cristã (cfr. Jo. 4,14), é origem e condição de todo o apostolado dos leigos, mesmo do associado, nem nada o pode substituir.

A este apostolado, sempre e em toda aparte proveitoso e em certas circunstâncias o único conveniente e possível, são chamados e, por isso, obrigados todos os leigos, de qualquer condição; ainda que não se lhes proporcione ocasião ou possibilidade de cooperar nas associações.

São muitas as formas de apostolado pelas quais os leigos edificam a Igreja, santificam o mundo e o vivificam em Cristo.

A forma peculiar do apostolado individual, e sinal muito acomodado também aos nossos tempos, porque manifesta Cristo vivo nos seus fiéis, é o testemunho de toda a vida laical que flui da fé, esperança e caridade. Porém, pelo apostolado da palavra, em certas circunstâncias absolutamente necessário, os leigos anunciam a Cristo, expõem a sua doutrina, difundem-na segundo a sua própria condição e capacidade, e professam-na com fidelidade.

Além disso, como cidadãos deste mundo, os leigos, ao cooperarem na construção e governo da ordem temporal, devem, na vida familiar, profissional, cultural e social, buscar, à luz da fé, normas de acção mais elevadas e manifestá-las aos outros oportunamente, conscientes de que assim se tornam cooperadores de Deus criador, redentor e santificador, e Lhe dão glória.

Finalmente, vivifiquem os leigos a sua vida com a caridade e mostrem-no por obras na medida do possível.

Lembrem-se todos que pelo culto público e pela oração, pela penitencia, pelos trabalhos e livre aceitação das agruras da vida; pelas quais se conformam a Cristo paciente (cfr. 2 Cor. 4,10; Col. 1,24), podem atingir todos os homens e contribuir para a salvação de todo o mundo.

O apostolado individual em circunstâncias especiais

17. Este apostolado individual é urgentemente necessário naquelas regiões em que a liberdade da Igreja é gravemente impedida. Nestas circunstâncias dificílimas, os leigos, suprindo, na medida do possível, o sacerdote, põem em risco a própria liberdade e, às vezes, a vida. Ensinam aos que os cercam a doutrina cristã, formam-nos na vida religiosa e na mentalidade católica, induzem-nos a frequência dos sacramentos e fomentam a piedade, sobretudo a eucarística (1). O sagrado Concílio dá graças dc fundo do coração a Deus que não deixa de suscitar, também em nossos dias, leigos de fortaleza heróica no meio das perseguições, e abraça-os com afecto paterno e ânimo agradecido.

O apostolado individual tem especial campo de acção nas regiões onde os católicos são poucos e dispersos. Os leigos, que exercem nelas só apostolado individual pelas causas acima mencionadas ou por razões especiais, mesmo nascidas da própria actividade profissional, reunam-se oportunamente para dialogar em grupos menores, sem forma estrita de instituição ou organização, de modo que sempre se manifeste aos outros o sinal da comunidade da Igreja como verdadeiro testemunho de amor. Deste modo, pela amizade e pela comunicação de experiências e com a , ajuda espiritual mútua, fortalecem-se para superar as dificuldades da vida e da acção demasiado isolada e produzir mais abundantes frutos de apostolado.

Importância das formas associadas

18. Os fiéis são chamados a exercer o apostolado individual nas diversas condições da sua vida. Lembrem-se, contudo, que o homem é, por natureza, social, e que aprouve ao Senhor unir um Povo de Deus (cfr. 1 Ped. 2, 5-10) e num corpo (cfr. 1 Cor. 12,12) os que crêem em Cristo. Portanto, o apostolado em associação responde com fidelidade à exigência humana e cristã dos fiéis e é, ao mesmo tempo, sinal da comunhão e da unidade da Igreja em Cristo que disse: «Onde estão dois ou três reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles (Mt. 18,20).

Os fiéis exerçam, por conseguinte, o seu apostolado trabalhando para um só fim (2). Sejam apóstolos assim nas suas comunidades familiares como nas paróquias e dioceses, as quais exprimem a índole comunitária do apostolado. Exerçam-no também nas associações livres que resolverem formar.

O apostolado em associação é de grande importância também porque, nas comunidades eclesiais e nos vários meios, o apostolado exige com frequência ser realizado mediante a acção comum. As associações criadas para a acção apostólica comum fortalecem os seus membros e formam-nos para o apostolado. Além disso, distribuem ordenadamente e orientam o seu trabalho apostólico, de modo que se podem esperar daí frutos muito mais abundantes do que se agisse cada um por sua conta.

Nas circunstâncias presentes, porém, é absolutamente necessário que se robusteça a forma associada e organizada do apostolado no campo de actividade dos leigos. É que só a estreita união das forças é capaz de conseguir plenamente os fins do apostolado de hoje e de defender com eficácia os seus bens (3). Neste ponto é particularmente importante que o apostolado atinja também a mentalidade comum e as condições sociais daqueles a quem se dirige. Doutro modo, não poderão, muitas vezes, resistir à pressão da opinião pública ou das instituições.

Multiplicidade de formas do apostolado associado

19. Há uma grande variedade de associações de apostolado (4). Umas propõem-se o fim apostólico geral da Igreja. Outras, de modo particular, fins de evangelização e santificação. Outras, ainda, têm como fim animar cristãmente a ordem temporal. Finalmente, algumas dão testemunho de Cristo, de modo especial, pelas obras de misericórdia e de caridade.

Entre estas associações são de considerar, antes de mais, aquelas que fomentam e promovem uma unidade mais íntima entre a vida prática dos membros e a sua fé. As associações não têm em si o seu fim, mas devem servir à missão que a Igreja tem de cumprir para com o mundo. A sua força apostólica depende da conformidade com os fins da Igreja e do testemunho cristão e espírito evangélico de cada um dos membros e de toda a associação.

O dever universal da missão da Igreja, dado o progresso das instituições e, ao mesmo tempo, o impulso do desenvolvimento da sociedade moderna, exige que as iniciativas apostólicas dos católicos aperfeiçoem cada vez mais as formas associadas no campo internacional. As Organizações Católicas Internacionais conseguirão melhor o seu fim se as associações que as formam e os seus membros a elas se unirem mais intimamente.

Respeitada a devida relação com a autoridade eclesiásticas (5), os leigos têm o direito de fundar associações (6), governá-las, e, uma vez fundadas, dar-lhes um nome. Deve-se, contudo, evitar a dispersão de forças que se verifica se se promovem, sem razão suficiente, novas associações e obras, ou se se mantêm, sem utilidade, associações ou métodos obsoletos. Nem sempre será oportuno que formas criadas numa nação sejam trasladadas, sem critério, para outras (7).

A acção católica

20. Há não poucos decénios, em muitas nações, os leigos, cada vez mais consagrados ao apostolado, uniram-se em várias formas de acção e associação que, em união mais estreita com a Hierarquia, se dedicaram e dedicam a fins especificamente apostólicos. Entre estas e outras instituições semelhantes mais antigas, merecem especial menção as que, seguindo embora diferentes métodos de acção, tendo sido justamente recomendadas e fomentadas pelos Sumos Pontífices e por muitos Bispos, receberam deles o nome de Acção Católica e, com muita frequência, foram declaradas como cooperação dos leigos no apostolado hierárquico(8).

Quer tenham o nome de Acção Católica quer outro, estas formas de apostolado que exercem em nossos dias uma valiosa acção apostólica são constituídas pelo conjunto das seguintes características:

a) O fim imediato de tais organizações é o fim apostólico da Igreja, isto é, ordenam-se à evangelização e santificação dos homens e à formação cristã da sua consciência, de modo a poderem imbuir do espírito do evangelho as várias comunidades e os vários meios.

b) Os leigos, cooperando a seu modo com a Hierarquia, contribuem com a sua experiência e assumem a sua responsabilidade no governo destas organizações, no estudo das condições em que a acção pastoral da Igreja se deve exercer e na elaboração e execução dos planos a realizar.

c) Os leigos agem unidos como um corpo orgânico, para que se manifeste com maior evidência a comunidade da Igreja e o apostolado seja mais eficaz.

d) Os leigos, quer se ofereçam espontâneamente quer sejam convidados à acção e directa colaboração com o apostolado hierárquico, trabalham sob a superior orientação da mesma Hierarquia, a qual pode sancionar essa cooperação com um mandato explícito.

As organizações nas quais, a juízo da Hierarquia, se encontram estas características tomadas em conjunto, devem ser consideradas Acção Católica, ainda que, por exigências de lugar ou de povos, assumam formas e nomes diversos.

O sagrado Concílio recomenda insistentemente estas instituições que correspondem, certamente, às necessidades do apostolado da Igreja em muitas nações. E convida os sacerdotes e leigos que nelas trabalham a tornarem cada vez mais realidade as características acima mencionadas e a cooperarem sempre fraternalmente, na Igreja, com as outras formas de apostolado.

Apreço das associações

21. Tenham-se na devida estima todas as associações de apostolado. Mas aquelas que a Hierarquia, segundo as necessidades do tempo e do lugar, louvar, recomendar ou mandar instituir como mais urgentes, devem ser tidas em alto apreço e ser promovidas pelos sacerdotes, religiosos e leigos, segundo a maneira que lhes é própria. Entre elas, porém, devem-se hoje contar sobretudo as associações ou agrupamentos internacionais de católicos.

Leigos que se entregam com título especial ao serviço da Igreja

22. São dignos de especial honra e recomendação na Igreja aqueles leigos, solteiros ou casados, que se dedicam, perpétua ou temporàriamente, com a sua competência profissional, ao serviço das instituições e suas actividades. É de grande alegria para a Igreja que cresça cada vez mais o número de leigos que prestam o seu serviço às associações e obras de apostolado dentro da própria nação, ou no campo internacional ou, sobretudo, nas comunidades católicas das missões e das Igrejas mais recentes.

Recebam os pastores da Igreja estes leigos de bom grado e com ânimo reconhecido e esforcem-se por que a sua condição corresponda, quanto possível, às exigências da justiça, da equidade e da caridade, principalmente no que respeita ao seu honesto sustento e das suas famílias e por que recebam a necessária formação e sintam consolação e estímulo espiritual.

CAPÍTULO V

A ORDEM A GUARDAR NO APOSTOLADO

Introdução: o apostolado hierárquico, necessário na Igreja

23. O apostolado dos leigos, quer ele seja exercido pelos fiéis individualmente quer em associação, deve-se integrar ordenadamente no apostolado de toda a Igreja. Mais ainda, a união com aqueles que o Espírito Santo pôs à frente da Igreja de Deus (cfr. Act. 20, 28) constitui elemento essencial do apostolado cristão. E não é menos necessária a cooperação entre as diversas iniciativas apostólicas, que devem ser convenientemente dirigidas pela Hierarquia.

Com efeito, para promover o espírito de união, que fará brilhar em todo o apostolado da Igreja a caridade fraterna e levará à consecução dos fins comuns evitando as emulações tão perniciosas, requere-se a estima recíproca de todas as formas de apostolado na Igreja, e a sua apta coordenação no respeito pela índole própria de cada uma (1).

Isto é da máxima conveniência, quando uma determinada acção na Igreja requer a harmonia e cooperação apostólica de ambos os cleros, dos religiosos e dos leigos.

Relações com a Hierarquia

24. Compete à Hierarquia fomentar o apostolado dos leigos, fornecer os princípios e os auxílios espirituais, ordenar para bem comum da Igreja o exercício do mesmo apostolado, e vigiar para que se conservem a doutrina e a ordem.

O apostolado dos leigos admite diversos modos de relação com a Hierarquia, segundo as suas várias formas e seus objectivos.

Assim, existem na Igreja muitas iniciativas apostólicas nascidas da livre escolha dos leigos e dirigidas com o seu prudente critério. Em determinadas circunstâncias, a missão da Igreja pode realizar-se melhor por meio de tais iniciativas, e daí o serem com frequência louvadas e recomendadas pela Hierarquia (2). No entanto, nenhuma iniciativa apostólica se pode chamar católica se não tiver a aprovação da legítima autoridade eclesiástica.

Certas formas de apostolado dos leigos são expressamente reconhecidas pela Hierarquia, de diversos modos.

Além disso, a autoridade eclesiástica, tendo em conta as exigências do bem comum da Igreja, pode escolher de entre as várias associações e iniciativas apostólicas com um fim directamente espiritual, algumas em particular, e promovê-las dum modo especial, assumindo sobre elas uma maior responsabilidade. Deste modo, a Hierarquia, ordenando o apostolado de diversas maneiras segundo as circunstâncias, vai unindo mais intimamente ao seu próprio múnus apostólico uma ou outra das suas formas, respeitando, porém, sempre a natureza e a distinção de ambas as partes, e sem com isso se tirar aos leigos a necessária liberdade de acção. Em vários documentos eclesiásticos se dá a este acto da Hierarquia o nome de mandato.

Finalmente, a Hierarquia confia aos leigos certas tarefas mais intimamente ligadas ao múnus pastoral, como exemplo, no ensino da doutrina cristã, nalguns actos litúrgicos e na cura de almas. Em virtude desta missão, os leigos ficam plenamente sujeitos à superior direcção eclesiástica, no respeitante ao desempenho desse encargo.

Quanto às obras e instituições da ordem temporal, pertence à Hierarquia eclesiástica ensinar e interpretar autênticamente os princípios morais que se devem aplicar nos assuntos temporais. Compete-lhe igualmente julgar, depois de bem considerar todas as coisas, e servindo-se do auxílio dos peritos, da conformidade de tais obras e instituições com os princípios morais e determinar o que for necessário para conservar e promover os bens de ordem sobrenatural.

Ajuda que deve prestar o clero ao apostolado dos leigos

25. Tanto os Bispos como os párocos e demais sacerdotes de ambos os cleros, devem ter presente que o direito e dever de exercer o apostolado são comuns a todos os fiéis, clérigos e leigos, e que também estes últimos têm um papel a desempenhar na edificação da Igreja (3). Tratem, pois, fraternalmente com os leigos na Igreja e para a Igreja, e tenham deles cuidado especial nas suas obras apostólicas (4).

Para ajudar os leigos nas suas diversas formas de apostolado, escolham-se diligentemente sacerdotes idóneos e bem formados (5). Os que se consagram a este ministério, por missão recebida da Hierarquia, representam-na na sua acção pastoral. Fomentem, pois, as convenientes relações dos leigos com a mesma, permanecendo sempre fiéis ao espírito e doutrina da Igreja. Dediquem-se a fomentar a vida espiritual e o sentido apostólico das associações católicas que lhes foram confiadas. Assistam com prudente conselho as suas actividades apostólicas e favoreçam as suas iniciativas. Investiguem atentamente por meio do diálogo contínuo com os leigos quais as formas de tornar mais frutuosa a sua acção apostólica; e promovam o espírito de união dentro da mesma associação, e desta com as demais.

Finalmente, os religiosos e as religiosas tenham em apreço as obras apostólicas dos leigos; consagrem-se de boa vontade a promover as obras destes, segundo o espírito e normas dos próprios Institutos (6); e procurem apoiar, auxiliar, e completar as funções sacerdotais.

Certos meios que servem para a mútua cooperação

26. Enquanto for possível, haja em todas as dioceses conselhos que ajudem a obra apostólica da Igreja, quer no campo da evangelização e santificação quer no campo caritativo, social e outros, onde os clérigos e os religiosos colaborem dum modo conveniente com os leigos. Tais órgãos poderão servir para coordenar as diversas associações de leigos e suas iniciativas apostólicas, respeitando a índole e autonomia própria de cada uma (7).

Se for possível, haja também organismos semelhantes no âmbito paroquial, interparoquial, interdiocesano, bem como no plano nacional ou internacional (8).

Além disso, crie-se junto da santa Sé algum Secretariado especial para ajudar e impulsionar o apostolado dos leigos, como centro que, por meios aptos, forneça informações sobre as várias iniciativas apostólicas dos leigos, se dedique a investigar os problemas actuais neste campo, e preste ajuda com o seu conselho à Hierarquia e aos leigos, nas suas obras de apostolado. Neste Secretariado deverão participar os diversos movimentos e iniciativas apostólicas de leigos existentes em todo o mundo, colaborando com os leigos também os clérigos e religiosos.

Cooperação com outros cristãos e não-cristãos

27. O comum património evangélico, e o dever comum do testemunho cristão que daí nasce, aconselham e com frequência exigem a colaboração dos católicos com os outros cristãos. Esta há-de exercer-se pelos indivíduos e pelas comunidades, em actuações singulares e em associações, tanto no plano nacional como no internacional (9).

Os valores humanos comuns pedem com frequência uma cooperação semelhante dos cristãos, que procuram fins apostólicos, com outros que, embora não professem a religião cristã, reconhecem, contudo, esses valores.

Por meio desta cooperação dinâmica e prudente (10), de grande importância nas actividades temporais, dão os leigos testemunho de Cristo, Salvador do mundo, e da unidade da família humana.

CAPÍTULO VI

A FORMAÇÃO PARA O APOSTOLADO

Necessidade da formação para o apostolado

28. A plena eficácia do apostolado só se pode alcançar com uma formação multiforme e integral. Exigem-na tanto o contínuo progresso espiritual e doutrinal do próprio leigo, como as diversas circunstâncias de coisas, pessoas e encargos a que a sua actividade se deve acomodar. Esta formação deve-se apoiar sobre os fundamentos afirmados e expostos por este sagrado Concílio noutros lugares(1). Além da formação comum a todos os cristãos, não poucas formas de apostolado requerem uma formação peculiar e específica, por causa da diversidade de pessoas e circunstâncias.

Princípios da formação dos leigos para o apostolado

29. Uma vez que os leigos têm um modo próprio de participar na missão da Igreja, a sua formação apostólica recebe uma característica especial que lhe vem da mesma índole secular própria do laicado e da sua espiritualidade.

A preparação para o apostolado supõe uma formação humana completa e adaptada à maneira de ser e circunstâncias próprias de cada um. Com efeito, o leigo, conhecendo bem o mundo actual, deve ser um membro da sociedade em que vive e ao nível da sua cultura.

Primeiro que tudo, aprenda o leigo a realizar a missão de Cristo e da Igreja, vivendo da fé no mistério divino da criação e da redenção, guiado pelo Espírito Santo vivificador do Povo de Deus, que impele todos os homens a amar a Deus Pai, e n'Ele, o mundo e os homens. Esta formação deve ser considerada como fundamento e condição de todo e qualquer apostolado fecundo.

Além da formação espiritual, requere-se uma sólida preparação doutrinal, teológica, ética e filosófica, de harmonia com a idade, condição e capacidade. Nem se descure de modo nenhum a importância da cultura geral e da formação prática e técnica.

Para cultivar as boas relações humanas, é necessário promover os valores verdadeiramente humanos, a começar pela arte de conviver e cooperar fraternalmente, bem como a de estabelecer diálogo com os outros.

Visto que a formação para o apostolado não pode consistir ùnicamente na instrução teórica, devem ir aprendendo gradual e prudentemente, desde o começo da formação, a ver, julgar e agir todas as coisas à luz da fé, a formar-se e aperfeiçoar-se com os outros por meio da acção e a entrar assim ao serviço activo da Igreja (2). Esta formação, que deve aperfeiçoar-se continuamente por causa da crescente maturidade da pessoa humana e em razão da evolução dos problemas, exige um conhecimento cada vez mais profundo e uma acção adaptada. Ao realizar todas estas eigências da formação, devem ter-se sempre em conta a unidade e a integridade da pessoa humana, de tal modo que se ressalve e desenvolva a sua harmonia e equilíbrio.

Deste modo, o leigo insere-se profunda e activamente na própria ordem temporal, assumindo com eficiência a sua parte na solução dos seus problemas; ao mesmo tempo, como membro vivo e testemunha da Igreja, torna-a presente e activa no meio das coisas temporais (3).

A quem pertence formar para o apostolado

30. A formação para o apostolado deve começar desde os princípios da educação infantil. Sejam, porém, iniciados no apostolado e imbuídos deste espírito particularmente os adolescentes e os jovens. Esta formação deve ser aperfeiçoada durante toda a vida, de acordo com as exigências dos encargos assumidos. E claro, portanto, que aqueles a quem compete educar cristãmente têm igualmente o dever de formar em ordem ao apostolado.

Pertence aos pais ir dispondo os filhos, desde a infância, para conhecerem o amor de Deus por todos os homens, e ir-lhes inculcando pouco a pouco, sobretudo com o exemplo, a preocupação pelas necessidades materiais e espirituais do próximo. Que toda a família se torne, pois, na. sua vida íntima, como que um estágio do apostolado.

Além disso, as crianças devem ser educadas de tal modo que, transcendendo os limites da família, se abram tanto às comunidades eclesiais como às civis. Sejam de tal modo integradas na comunidade local da paróquia que nela possam tomar consciência da sua qualidade de membros vivos e activos do Povo de Deus. Os sacerdotes, porém, na catequese e na pregação, na direcção espiritual, bem como em outras actividades pastorais, tenham em conta a formação em ordem ao apostolado.

Compete também às escolas, colégios e outras instituições católicas destinadas à formação, fomentar nos jovens o sentido católico e a acção apostólica. No caso de faltar esta formação, quer seja porque os jovens não frequentam essas escolas, quer por outra causa, então cuidem mais dela os pais, os pastores de almas e as associações apostólicas. Os professores, porém, e os educadores, que, por vocação e ofício, exercem uma superior forma de apostolado dos leigos, estejam impregnados da ciência necessária e das técnicas pedagógicas, para poder realizar eficazmente essa educação.

Do mesmo modo, os grupos e as associações de leigos, quer se dediquem ao apostolado, quer a outros fins sobrenaturais, devem fomentar com diligência e assiduidade a formação para o apostolado, segundo o próprio fim e modalidades (4). São elas, muitas vezes, o caminho ordinário duma preparação conveniente em ordem ao apostolado. Com efeito, nelas se realiza uma formação doutrinal, espiritual e prática. Os seus membros, constituindo pequenos grupos com os companheiros e amigos, consideram os métodos e os frutos da sua actividade apostólica, e confrontam com o Evangelho a sua vida quotidiana.

Deve-se orientar esta formação de modo a ter-se em conta todo o apostolado dos leigos, que deverá ser exercido não só entre os grupos das associações, mas também em todas as circunstâncias, através de toda a vida, sobretudo profissional e social. Mais ainda: cada um deve preparar-se activamente para o apostolado, o que se torna mais urgente na idade adulta. Com efeito, à medida que se avança na idade, revela-se mais cada um e assim pode descobrir melhor os talentos com que Deus enriqueceu a sua alma, e exercitar mais eficazmente os carismas que lhe foram dados pelo Espírito Santo para bem dos seus irmãos.

Formação específica para o apostolado

31. As diversas formas de apostolado exigem também uma preparação particularmente adequada.

a) Quanto ao apostolado em ordem à evangelização e santificação dos homens, devem os leigos receber uma formação especial para estabelecerem o diálogo com os outros, quer crentes quer não crentes, e comunicarem a todos a mensagem de Cristo(5).

Como, porém, em nossos dias se vão espalhando largamente por toda a parte várias formas de materialismo, até mesmo entre os católicos, convém que os leigos não só aprendam com maior diligência a doutrina católica, especialmente aqueles pontos que são objecto de controvérsia, mas também dêem testemunho de vida evangélica contra qualquer forma de materialismo.

b) Quanto à edificação cristã da ordem temporal, sejam os leigos bem instruídos sobre o verdadeiro significado e valor dos bens temporais, quer em si mesmos considerados, quer no que diz respeito a todos os fins da pessoa humana. Exercitem-se no recto uso das coisas e na organização das instituições, atendendo sempre ao bem comum segundo os princípios da doutrina moral e social da Igreja. Aprendam os leigos, antes de mais, os princípios da doutrina social e as suas conclusões, de modo a tornarem-se aptos quer para prestarem o seu contributo ao progresso da doutrina quer para aplicá-los convenientemente aos casos particulares (6).

c) Visto que as obras de caridade e misericórdia dão um esplêndido testemunho de vida cristã, deve também a formação apostólica levar ao seu exercício, para que os fiéis aprendam, logo desde a infância, a compadecer-se dos pobres e necessitados e a ajudá-los com generosidade(7).

Meios de formação

32. Para os leigos consagrados ao apostolado, existem já muitos meios por exemplo, sessões, congressos, recolecções, exercícios espirituais, reuniões frequentes, conferências, livros, revistas para se conseguir um mais perfeito conhecimento da Sagrada Escritura e da doutrina católica, para alimentar a vida espiritual e ainda para conhecer o estado do mundo e para encontrar e cultivar métodos adaptados (8).

O sagrado Concílio alegra-se com essas iniciativas, já florescentes nos ambientes em que este se exerce.

Para este fim foram também criados centros ou institutos superiores que já produziram óptimos frutos.

O sagrado Concílio alegra-se com essas iniciativas, já florescentes em algumas partes, e deseja que se promovam noutros lugares onde forem necessárias.

Criem-se, além disso, centros de documentação e de estudo não só de teologia, mas também de antropologia, psicologia, sociologia, metodologia, para fomentar mais as qualidades dos leigos, homens e mulheres, jovens e adultos, em todos os campos do apostolado.

EXORTAÇÃO

Exortação à generosidade

33. Por isso, o sagrado Concílio pede instantemente no Senhor a todos os leigos que respondam com decisão de vontade, ânimo generoso e e disponibilidade de coração à voz de Cristo, que nesta hora os convida com maior insistência, e ao impulso do Espírito Santo. Os mais novos tomem como dirigido a si de modo particular este chamamento, e recebam-no com alegria e magnanimidade. Com efeito, é o próprio Senhor que, por meio deste sagrado Concílio, mais uma vez convida todos os leigos a que se unam a Ele cada vez mais intimamente, e sentindo como próprio o que é d'Ele (cfr. Fil. 2,5), se associem à Sua missão salvadora. É Ele quem de novo os envia a todas as cidades e lugares aonde há-de chegar (cfr. Lc. 10,1); para que, nas diversas formas e modalidades do apostolado único da Igreja, se tornem verdadeiros cooperadores de Cristo, trabalhando sempre na obra do Senhor com plena consciência de que o seu trabalho não é vão no Senhor (cfr. 1 Cor. 15,28).

Vaticano, 18 de Novembro de 1965.

PAPA PAULO VI


Notas

Proémio

1.Cfr. João XXIII, Constituição apostólica Humanae salutis, 25 dez. 1961, AAS 54 (1962), p. 7-10.

2. Cfr. Conc. Vat. II, Constituição dogmática De Ecclesia, Lumen gentium, n. 33 s.: AAS 57 (1965), p. 39 s.; cfr. também Const. De sacra Liturgia, Sacrosanctum concilium, n. 26-40: AAS 56 (1964), p. 107-111; cfr. Decr. De instrumentis communicationis socialis, Inter mirifica: AAS 56 (1964), p. 145-153; cfr. Decr. De Oecumenismo, Unitatis Redintegratio: AAS 57 (1965), p. 90-107; cfr. Decr. De pastorali Episcoporum munere in Ecclesia, Christus Dominus: n. 16, 17, 18; cfr. Declaração De educatione christiana Gravissimum educationis, n. 3, 5, 7.

3. Cfr. Pio XII, Alocução aos Cardeais, 18 fev. 1946: AAS 38 (1946), p. 101-102; cfr. Pio XII, Discurso aos Jovens operários Católicos, 25 agosto 1957. AAS 49 (1957) p. 843.

Capítulo I

1. Cfr. Pio XI, Encíclica Rerum Ecclesiae: AAS 18 (1926), p. 65.

2. Cfr. Concílio Vaticano II, Constituição dogmática De Ecclesia, Lumen gentium; n. 31: AAS 57 (1965), p. 37.

3. Ibid., n. 33, p. 39; cfr. também n, 10, p. 14

4. Ibid., n. 12, p. 16.

5. Cfr. Concilio Vaticano II, Constituição dogmática De sacra Liturgia, Sacrosanctum concilium, cap. I, n. 11: AAS 56 (1964), p. 102-103.

6. Cfr. Concílio Vaticano II, Constituição De Ecclesia, Lumen gentium, n. 32: AAS 57 (1965), p. 38; cfr. também n. 40-41; Ibid., p. 45-47.

7. Ibid., n. 62, p. 63; cfr. também n. 65, p. 64-65.

Capítulo II

1. Cfr. Pio XI, Encíclica Urbi arcano, 23 dez. 1922: AAS 14 (1922), p. 659; Pio XII, Encíclica Summi Pontificatus, 20 out. 1939: AAS 31 (1939), p. 442-443.

2. Cfr. Leão XIII, Encíclica Rerum Novarum: ASS 23 (1890-1891), p, 647; Pio XI, Encíclica Quadragesimo anno: AAS 23 (1931), p. 190; Pio XII, Radiomensagem, 1 junho 1941: AAS 33 (1941), p. 207.

3. Cfr. João XXIII, Encíclica Mater et Magistra: AAS 53 (1961), p. 402.

4. Ibid., p. 440-441.

5. Ibid., p. 442-443.

6. Cfr. Pio XII, Alocução ao movimento «Pax Romana», 25 abril 1957: AAS 49 (1967), p. 298-299; e sobretudo João XXIII, Alocução ao Congresso do F. A. O., 10 nov. 1959: AAS 51 (1959), p. 856 e 866.

Capítulo III

1. Cfr. S. Pio X, Carta apost. Creationis duarum novarum paroeciarum, 1 junho 1905: ASS 38 (1905), p. 65-67; Pio XII, aloc. aos fiéis da paróquia de S. Sabas, 11 janeiro 1953: Discorsi e Radiomessaggi di S. Pio XII, 14 (1952 -1953), p. 449-454, João XXIII, Aloc. ao clero e aos fiéis da diocese suburbicária de Albano, em Castelgandolfo, 26 agosto de 1962: AAS 54 (1962), p. 656-660.

2. Cfr. Leão XIII, aloc. 28 janeiro 1894: Acta, 14 (1894), p. 424-425.

3. Cfr. Pio XII, aloc. aos Párocos, etc., 6 fevereiro 1951: Discorsi e Radiomessaggi di S. S. Pio XII, 12 (1950-1951), p. 437-443; 8 março 1952: ibid., 14 (1952-1953), p. 5-10; 27 março 1953: ibid., 15 (1953-1954), p. 27-35; 28 fevereiro 1954: ibid., p. 585-590.

4. Cfr. Pio XI, Encíclica Casti Connubii: AAS 22 (1930), p. 554; Pio XII, Radiomensagem, 1 janeiro 1941: AAS 33 (1941), p. 203; Idem, alocução aos Delegados ao Congresso da União Internacional das Associações para defesa dos direitos da família, 20 set. 1949: AAS 41 (1949), p. 552; Idem, aloc. aos pais de família franceses em peregrinação a Roma; 18 set. 1951: AAS 43 (1951), p. 731; Idem, radiomensagem no Natal de 1952: AAS 45 (1953), p. 41; João XXIII, Encíclica Mater et Magistra, 15 maio 1961: AAS 53 (1961), p. 429, 439.

5. Cfr. Pio XII, Enciclica Evangelii praecones, 2 junho 1951: AAS 43 (1951), p. 514.

6. Cfr. Pio XII, aloc. aos Delegados ao Congresso da União internacional das Associações para defesa dos direitos da familia, 20 set. 1949: AAS 41 (1949), p. 552.

7. Cfr. S. Pio X, aloc. à Associação católica da juventude francesa acerca da piedade, ciéncia e acção, 25 set. 1904: ASS 37 (1904-1905), p. 296-300.

8. Cfr. Pio XII, carta Das quelques semaines, ao Arcebispo de Marianópolis, acerca dos Congressos promovidos pelos Jovens operários cristãos do Canadá: 24 maio 1947: AAS 39 (1947), p. 257; Idem, Radiomensagem à J. O. C. de Bruxelas, 3 set. 1950: AAS 42 (1950), p. 640-641.

9. Cfr. Pio XI, Enciclica Quadragesimo anno, 15 maio 1931: AAS 23 (1931), p. 225-226.

10. Cfr. João XXIII, Encíclica Mater et Magistra, 15 maio 1961: AAS 53 (1961), p. 448-450.

Capítulo IV

1. Cfr. Pio XII, aloc. ao I Congresso mundial do Apostolado dos leigos, 14, out. 1951: AAS 43 (1951), p. 788.

2. Cfr. Pio XII, aloc. ao I Congresso mundial do Apostolado dos leigos, 15 out. 1951: AAS 43 (1951), p. 787-788.

3. Cfr. Pio XII, Encíclica Le pèlerinage de Lourdes, 2 julho 1957: AAS 49 (1957), p. 615.

4. Cfr. Pio XII, aloc. ao Conselho da Federação internacional dos homens católicos, 8 dez. 1956: AAS 49 (1957), p. 26-27.

5. Cfr. Cap. V, n. 24.

6. Cfr. Sagrada Congregação do Concílio, resolução Corrienten., 13 nov. 1920: AAS 13 (1921), p. 139.

7. Cfr. João XXIII, Encíclica Princeps pastorum, 10 dez. 1959: AAS 51 (1959), p. 856.

8. Cfr. Pio XI, carta Quae nobis, ao Cardeal Bertram, 13 nov. 1928: AAS 20 (1928), p. 385. Cfr. também Pio XII, aloc. à Acção Católica italiana, 4 set. 1940: AAS 32 (1940), p. 362.

Capítulo V

1. Cfr. Pio XI, Encíclica Quamvis nostrae, 30 abril 1936: AAS 28 (1936) p. 160-161.

2. Cfr. Sagrada Congregação do Concílio, resolução Corrienten., 13, nov. 1920: AAS 13 (1921) p. 137-140.

3. Cfr. Pio XII, Discurso ao II Congresso mundial do Apostolado dos leigos, 5 out. 1957: AAS 49 (1957) p. 927.

4. Cfr. Concílio Vaticano II, Constituição dogmática De Ecclesia, Lumen gentium, n. 37: AAS 57 (1965), p. 42-43.

5. Cfr. Pio XII, Exortação apostólica Menti nostrae, 23 set. 1950: AAS 42 (1950), p. 660.

6. Cfr. Conc. Vat. II, decreto De accomodata renovatione vitae religiosae, n. 8.

7. Cfr. Bento XIV, De Synodo dioecesano, 1. III, c. IX, n. VII-VIII: Opera omnia in tomos XVII distributa, tomo 11 (Prato, 1844), pg.76-77.

8. Cfr. Pio XI, Encíclica Quamvis nostra, 30 abril 1936: AAS 28 (1936), p. 160-161.

9. Cfr. João XXIII, Encíclica Mater et Magistra, 15 maio 1961: AAS 53 (1961), p. 456-457; cfr. Concilio Vaticano II, Decreto De Oecumenismo, Unitatis Redintegratio, n. 12: AAS 57 (1965), p. 99-100.

10. Cfr. Concilio Vaticano II, Decreto de Oecumenismo, Unitatis Redintegratio, n.12: AAS 57 (1965), p. 100; cfr. também a Constituição dogm. De Eeelesia, Lumen gentium, n.15: AAS 57 (1965), p. 19-20.

Capítulo VI

1. Cfr. Concílio Vaticano II, Constituição dogmática De Ecclesia, Lumen gentium, cap. II, IV, V: AAS 57 (1965), p. 12-21; 37-49; cfr. também Decreto De Oecumenismo, Unitatis Redintegratio, n. 4, 6, 7, 12: AAS 57 (1965), p. 94, 96, 97, 99, 100; cfr, também acima, n. 4.

2. Cfr. Pio XII, alocução à I Conferência internacional de escuteiros, 6 junho 1952: AAS 44 (1952), p. 579-580; João XXIII, Encíclica Mater et Magistra, 15 maio 1961; AAS 53 (1961), p. 456.

3. Cfr. Concílio Vaticano II, Constituição dogmática De Ecclesia Lumen gentium, n. 33: AAS 57 (1965), p. 39.

4. Cfr. João XXIII, Encíclica Mater et Magistra, 15 maio 1961; AAS 53 (1961), p. 455.

5. Cfr. Pio XII, Carta encícl. Sertum laetitiae, 1 nov. 1939: AAS 31 (1939), p. 635-644; cfr. Idem, alocução aos laureados da Acção Católica Italiana, 24 maio 1953.

6. Cfr. Pio XII, Discurso ao Congresso da Federação Mundial da JCF., 18 abril 1952: AAS 44 (1952), p. 414-419. Cfr. Idem, Discurso à Associação Cristã de Operários de Itália (A. C. L. L), 1 maio 1955: AAS 47,(1955), p. 403-404.

7. Cfr. Pio XII, alocução aos Delegados do Congresso das Associações de caridade, 27 abril 1952: AAS 44 (1952), p, 470-471,

8. Cfr. João XXIII, Encíclica Mater et Magistra, 15 maio 1961: AAS 53 (1961), p. 454.

++++++++++++++++++++++++

DECRETO
OPTATAM TOTIUS
SOBRE A FORMAÇÃO SACERDOTAL

PROÉMIO

Importância para a vida da Igreja

O sagrado Concílio reconhece que a desejada renovação de toda a Igreja depende, em grande parte, do ministério sacerdotal, animado do espírito de Cristo (1); proclama, por isso, a gravíssima importância da formação dos sacerdotes e declara alguns dos seus princípios fundamentais, pelos quais sejam confirmadas as leis já aprovadas pela experiência dos séculos e se introduzam nelas as inovações que correspondam às suas constituições e decretos e à evolução dos tempos. Esta formação sacerdotal, por causa da unidade do mesmo sacerdócio, é necessária aos dois cleros e de qualquer rito. Portanto, estas prescrições, que se referem directamente ao clero diocesano, devem ser acomodadas na devida proporção a todos os sacerdotes.

I. ESTABELECER-SE-Á EM CADA NAÇÃO UM PLANO DE FORMAÇÃO SACERDOTAL

Adaptação das normas gerais pelas Conferências episcopais

1. Uma vez que não podem dar-se senão leis gerais para tão grande variedade de povos e regiões, estabeleça-se em cada nação ou rito um peculiar «Plano de formação sacerdotal que há-de ser promulgado pela Conferência episcopal (2), revisto periodicamente e aprovado pela Santa Sé.

Por ele se acomodem as leis universais às condições particulares dos tempos e dos lugares, de maneira que a formação corresponda sempre às necessidades daquelas regiões em que há-de exercer-se o ministério sacerdotal.

II. PROMOÇÃO MAIS INTENSA DAS VOCAÇÕES SACERDOTAIS

Obrigação de toda a comunidade cristã.
Natureza da vocação.
Obra das vocações

2. O dever de fomentar as vocações (3) pertence a toda a comunidade cristã, que as deve promover sobretudo mediante uma vida plenamente cristã; mormente para isso concorrem quer as famílias, que animadas pelo espírito de fé, de caridade e piedade, são como que o primeiro seminário, quer as paróquias, de cuja vida fecunda participam os mesmos adolescentes. Os mestres e todos aqueles que, de algum modo, se ocupam da educação das crianças e dos jovens, principalmente as Associações católicas, de tal forma procurem cultivar o espírito dos adolescentes a si confiados, que eles possam sentir e seguir de bom grado a vocação divina. Os sacerdotes manifestem o máximo zelo em favorecer as vocações; e pela sua própria vida humilde, laboriosa, levada com ânimo alegre, assim como pela mútua caridade sacerdotal e fraterna cooperação, atraiam a alma dos adolescentes para o sacerdócio.

Aos Bispos pertence levar o seu rebanho à promoção das vocações, e procurar a colaboração de todas as forças e obras; e sem se pouparem a sacrifícios, ajudarem, como pais, aqueles que eles mesmos julguem chamados à herança do Senhor.

Esta diligente colaboração de todo o Povo de Deus em promover as vocações corresponde à acção da Providência divina, que concede os dotes necessários àqueles que são chamados por Deus a participar do sacerdócio hierárquico e ajuda-os com a Sua divina graça, ao mesmo tempo que aos legítimos ministros da Igreja confia o encargo de, uma vez reconhecida a idoneidade, chamarem os candidatos que, com intenção recta e liberdade plena, pedirem tão alto múnus, e de os consagrarem com o selo do Espírito Santo para o culto de Deus e serviço da Igreja (4).

O sagrado Concílio recomenda, acima de tudo, os meios tradicionais de cooperação comum, como são: a oração fervorosa, a penitência cristã, e a formação cada vez mais perfeita dos fiéis por meio da pregação, da catequese, e dos meios de comunicação social. Nesta formação há-de expor-se a necessidade, a natureza e a excelência da vocação sacerdotal. Além disso, manda que a Obra das vocações, segundo os documentos pontifícios nesta matéria, já fundada ou a fundar no âmbito de cada diocese, região ou nação, organize metódica e coerentemente e promova com zelo e discrição uma acção pastoral de conjunto para o fomento de vocações, sem deixar de lado nenhum dos meios que as hodiernas ciências psicológicas e sociológicas ùtilmente oferecem (5).

É necessário que a Obra das vocações transcenda generosamente os limites da diocese, da nação ou das famílias religiosas ou ritos e olhe para as necessidades da Igreja universal, prestando auxílio principalmente àquelas regiões que reclamam com mais instância obreiros para vinha do Senhor.

Seminários menores e Institutos peculiares

3. Nos Seminários menores, erigidos para -cultivar os gérmenes da vocação, os alunos sejam formados com uma peculiar educação religiosa, e sobretudo por uma apta direcção espiritual, de maneira a seguir Cristo Redentor de alma generosa e coração puro. Sob a orientação paterna dos Superiores, com a colaboração oportuna dos pais, levem uma vida plenamente conforme à idade, espírito e evolução dos adolescentes, segundo as normas da sã psicologia, sem omitir a devida experiência das coisas humanas e o contacto com a própria famílias. Tudo o que nos pontos seguintes se vai dizer dos Seminários maiores, aplique-se também aos Seminários menores na medida em que o fim e o modo de ser o permitem. É conveniente que os estudos neles feitos se ordenem de maneira que os alunos os possam continuar sem dificuldades noutra parte, se abraçarem outro estado de vida.

Com igual cuidado, favoreçam-se os gérmenes da vocação dos jovens e adolescentes nos Institutos peculiares que, segundo as circunstâncias dos lugares, servem também para Seminários menores, assim como daqueles que são educados em outras escolas e demais centros de educação. Promovam-se diligentemente Institutos e outros centros para aqueles que, de idade mais avançada, seguem a vocação divina.

III. ORGANIZAÇÃO DOS SEMINÁRIOS MAIORES

Necessidade, organização, formação para o tríplice ministério

4. Os Seminários maiores são necessários para a formação sacerdotal. Neles, a educação dos alunos deve tender a que, a exemplo de Nosso Senhor Jesus Cristo, mestre, sacerdote e pastor, se formem verdadeiramente pastores de almas (7). Preparem-se, pois, para o ministério da palavra: para que a palavra de Deus revelada seja por eles cada vez melhor entendida, a possuam pela meditação e a manifestem por palavras e costumes. Preparem-se para o ministério do culto e santificação: para que, pela oração e exercício das sagradas funções litúrgicas, exerçam a obra da salvação através do sacrifício eucarístico e dos sacramentos. Preparem-se para o ministério de pastores: para que saibam representar aos homens Cristo que não «veio para ser servido, mas para servir e dar a Sua vida pela redenção de muitos» (Mc. 10,45; cfr. Jo. 13, 12-17) e para que, feitos escravos de todos, ganhem a muitos (cfr. 1 Cor: 9,19).

Por isso, todos os aspectos da formação, espiritual, intelectual e disciplinar, sejam ordenados de forma harmónica para este fim pastoral, e todos os Superiores e professores, fielmente obedientes à autoridade do Bispo, se dêem à consecução deste fim, numa acção diligente e concorde:

Escolha, preparação e múnus dos educadores

5. Visto que a formação dos alunos depende de sábias leis, e sobretudo de educadores idóneos, escolham-se entre os melhores os Superiores e os professores dos Seminários (8), e preparem-se diligentemente com sólida doutrina, conveniente experiência pastoral e adequada formação espiritual e pedagógica. Por isso, é conveniente que se fundem Institutos para a consecução deste fim, ou pelo meras cursos devidamente organizados e reuniões de Superiores de Seminários em tempos determinados.

Os Superiores e os professores dos Seminários pensem sèriamente quanto o êxito da formação dos alunos depende da sua maneira de pensar e de agir. Sob a direcção do reitor, estabeleçam uma estreitíssima união de pensamento e acção e constituam entre si e com os alunos uma família que corresponda à oração do Senhor «ut sint unum» (cfr. Jo. 17,11) e alimente nestes últimos a alegria da própria vocação. O Bispo, porém, com assíduo amor anime os que trabalham no Seminário e mostre-se para com os alunos como verdadeiro pai em Cristo. Finalmente, todos os sacerdotes considerem o Seminário como coração da diocese e prestem-lhe de boa vontade a própria ajuda (9).

Exame e selecção das vocações

6. Examine-se com diligente cuidado, segundo a idade e adiantamento de cada um, a rectidão de intenção dos candidatos e a sua liberdade de vontade, idoneidade espiritual, moral e intelectual, a conveniente saúde física e psíquica, tendo também em conta as possíveis disposições hereditárias. Examine-se ainda a capacidade dos candidatos para aguentar com as obrigações sacerdotais e exercer os deveres pastorais (10).

Em toda a selecção e provação dos candidatos mantenha-se a firmeza de espírito, ainda que seja de lamentar a penúria de sacerdotes (11). Deus não permitirá que a Sua Igreja careça de ministros, se se promoverem os dignos e, no devido tempo, os não idóneos forem paternalmente encaminhados para outras ocupações e ajudados para que, cônscios da sua vocação cristã, se entreguem alegremente ao apostolado laical.

Seminários diocesanos e interdiocesanos

7. Naquelas regiões em que as dioceses não puderem por si mesmas fundar Seminários próprios, erijam-se e fomentem-se Seminários comuns a várias dioceses ou para toda uma região ou nação, para que se proveja do modo mais eficaz à sólida formação dos alunos, que nesta matéria deve ser tida como lei suprema. Estes Seminários, se forem regionais ou nacionais, rejam-se por estatutos dados pelos Bispos a quem dizem respeito e aprovados pela Sé Apostólica.

Nos Seminários, porém, onde há muitos alunos, conservada a unidade de regime e de formação científica, distribuam-se convenientemente em grupos menores, para que melhor se atenda à formação pessoal de cada um.

IV. FORMAÇÃO ESPIRITUAL MAIS CUIDADA

Importância e orientação cristocêntrica

8. A formação espiritual deve estar estreitamente unida com a formação doutrinal e pastoral (13) graças sobretudo à colaboração do director espiritual; seja dada de tal maneira que os alunos aprendam a viver em união familiar e assídua com o Pai por meio de Seu Filho Jesus Cristo, no Espírito Santo: Havendo de ser configurados pela sagrada ordenação com Cristo sacerdote, habituem-se também a aderir a Ele, como amigos, em íntima união de toda a sua vida (14). Vivam de tal maneira o Seu mistério pascal, que nele saibam iniciar o povo que lhes há-de ser confiado. Aprendam a buscar Cristo na meditação fiel da palavra de Deus, numa activa comunicação com os santíssimos mistérios da Igreja, sobretudo na sagrada Eucaristia e no Ofício divino (15); no Bispo que os envia e nos homens a quem são enviados, sobretudo nos pobres, nas crianças, nos doentes, nos pecadores e incrédulos. Amem e venerem com filial confiança a Santíssima Virgem, que foi dada como mãe ao discípulo por Jesus Cristo moribundo na cruz.

Promovam-se com empenho os exercícios de piedade recomendados pelo venerando uso da Igreja. Procure-se, porém, que a formação espiritual não se reduza a eles nem cultive só o sentimento. Aprendam sobretudo os alunos a viver segundo o Evangelho, a firmar-se na fé, esperança e caridade, para que, no seu exercício, adquiram o espírito de oração (16), encontrem a força e defesa da sua vocação, alcancem o vigor de todas as virtudes e cresçam no zelo de conquistar todos os homens para Cristo.

Sentido eclesial

9. Sejam os alunos imbuídos do mistério da Igreja, declarado de modo especial por este sagrado Concílio, de tal maneira que, unidos ao Vigário de Cristo por um amor humilde e filial e, uma vez elevados ao sacerdócio, ligados ao seu Bispo como fiéis cooperadores, colaborando em fraterna caridade com os seus irmãos no sacerdócio, dêem testemunho daquela unidade que atrai os homens para Cristo (17). De coração magnânimo, aprendam a participar em toda a vida da Igreja, segundo o que diz S. Agostinho: «Quanto cada um amar a Igreja de Cristo, tanto tem o Espírito Santo» (18). Entendam os alunos bem claramente que não se destinam ao mando, nem. às honras, mas que se devem ocupar totalmente no serviço de Deus e no ministério pastoral. Sejam educados na obediência sacerdotal, na pobreza de vida e abnegação de si mesmos com particular solicitude (19), de tal maneira que se habituem a renunciar generosamente mesmo àquilo que, sendo lícito, não é conveniente, é a conformar-se com Cristo crucificado.

Exponham-se aos alunos as responsabilidades que hão-de tomar, sem ocultar nenhuma das dificuldades da vida sacerdotal. Todavia, que não olhem quase só para os perigos da actividade futura, mas sejam preparados para saber fortalecer a vida espiritual com o exercício da acção pastoral.

Preparação para o celibato

10. Os alunos que, segundo as santas e constantes leis do próprio rito, seguem a veneranda tradição do celibato sacerdotal, sejam preparados com diligente cuidado para este estado, no qual, por amor do reino dos céus, renunciando à união da família (cfr. Mt. 19,12), aderem com amor indiviso ao Senhor (20) muito em conformidade com a nova Aliança, dão testemunho da ressurreição da vida futura (cfr. Lc. 20,36) (21), e obtêm um auxílio muitíssimo útil para o exercício contínuo daquela caridade perfeita pela qual podem no ministério sacerdotal fazer-se tudo para todos (22). Considerem profundamente como devem receber de ânimo agradecido aquele estado, não só como prescrito pela lei eclesiástica, mas como precioso dom de Deus que deve ser humildemente implorado, ao qual se apressem a corresponder livre e generosamente, estimulados e ajudados pela graça do Espírito Santo.

Conheçam devidamente os deveres e a dignidade do matrimónio cristão, que simboliza o amor entre Cristo e a Sua Igreja (cfr. Ef. 5,32 s.). Compreendam, porém, a excelência maior da virgindade consagrada a Cristo (23), de tal maneira que, por uma opção maduramente deliberada e magnânima, se entreguem ao Senhor por uma inteira doação de corpo e alma.

Sejam prevenidos contra os perigos que ameaçam a sua castidade, sobretudo na sociedade do nosso tempo (24). Ajudados pelos auxílios divinos e humanos, aprendam de tal maneira a integrar a renúncia ao matrimónio, que a sua vida e acção não só não venham a sofrer detrimento algum por causa do celibato mas adquiram um mais alto domínio da alma e do corpo, um maior progresso na maturidade, e uma mais perfeita compreensão da bem-aventurança do Evangelho.

Maturidade humana

11. Observem-se santamente as normas da educação cristã e aperfeiçoem-se devidamente com as descobertas mais recentes da psicologia e da pedagogia. Por meio duma formação bem ordenada, cultive-se também nos alunos a devida maturidade humana, comprovada principalmente por uma certa estabilidade de ânimo, pela capacidade de tomar decisões ponderadas, e por um juízo recto sobre os homens e os acontecimentos. Habituem-se os alunos a dominar o próprio temperamento, formem-se na fortaleza de espírito e aprendam a estimar aquelas virtudes que são tidas em maior conta diante dos homens e recomendam o ministro de Cristo (25), como são a sinceridade, a preocupação constante da justiça, a fidelidade às promessas, a urbanidade no trato, a modéstia e caridade no falar.

A disciplina do Seminário deve ser tida não só como válida defesa da vida comum e da caridade, mas também como parte necessária de toda a formação para adquirir o domínio de si mesmo, promover a sólida maturidade da pessoa e formar as restantes disposições de espírito que tornam mais ordenada e frutuosa a actividade da Igreja. Seja, todavia, observada de tal maneira que se torne uma disposição interna dos alunos para acatar a autoridade dos Superiores por íntima persuasão ou em consciência (cfr. Rom. 13,5) e por razões sobrenaturais. As normas de disciplina, porém, apliquem-se de tal maneira, segundo as idades dos alunos, que estes, aprendendo a dirigir-se gradualmente a si mesmos, se habituem a usar sàbiamente da liberdade, a tomar iniciativas e responsabilidades (26) e a colaborar com os seus companheiros e com os leigos.

É necessário que se ordene de tal maneira toda a vida do Seminário, impregnada de piedade, silêncio e empenho de ajuda mútua, que já seja uma iniciação da vida que o sacerdote há-de levar mais tarde.

Experiências para uma melhor formação

12. Para que a formação espiritual se apoie em razões sólidas e os alunos abracem a vocação por uma opção maduramente deliberada, caberá aos Bispos estabelecer um intervalo de tempo para um mais intenso tirocínio espiritual. Fica também ao seu juízo julgar da oportunidade duma interrupção dos estudos ou dum apto estágio pastoral para se prover mais convenientemente à provação dos candidatos ao sacerdócio. Segundo a condição de cada região, pertence igualmente aos Bispos poder prolongar a idade até agora estabelecida pelo direito comum para as ordens sacras e deliberar da oportunidade de estabelecer que os alunos, terminado o curso teológico, exerçam por algum tempo a ordem de diácono antes de serem promovidos ao sacerdócio.

V. REVISÃO DOS ESTUDOS ECLESIÁSTICOS

Formação humanística e científica prévias. Latim

13. Antes de entrarem nos estudos pròpriamente eclesiásticos, devem os seminaristas possuir uma formação humanística e científica semelhante àquela de que precisam os jovens da sua nação para entrarem nos estudos superiores. Além disso, adquiram o conhecimento da língua latina, com que possam compreender e utilizar as fontes de numerosas ciências e os documentos da Igreja (27). Tenha-se como necessário o estudo da língua litúrgica de cada rito e fomente-se muito o conhecimento conveniente das línguas da Sagrada Escritura e da Tradição.

Coordenação cristocêntrica da Filosofia e da Teologia

14. Na revisão dos estudos eclesiásticos, atenda-se principalmente a que as disciplinas filosóficas e teológicas se coordenem de forma apta e concorram de modo harmónico para que à mente dos alunos se abra o mistério de Cristo, que atinge toda a história do género humano, continuamente penetra a vida da Igreja e se actua principalmente pelo ministério sacerdotal (28).

Para que esta visão se comunique aos alunos no limiar da sua formação, iniciem-se os estudos eclesiásticos por um curso introdutório durante o tempo conveniente. Nesta iniciação dos estudos, proponha-se o mistério da salvação, de tal modo que os alunos atinjam o sentido dos estudos eclesiásticos e vejam a ordem e o fim pastoral deles, ao mesmo tempo que recebam ajuda para fundamentar e penetrar toda a sua vida de fé e se confirmem a abraçar a vocação de ânimo alegre e por uma doação pessoal.

Filosofia: as diversas disciplinas e o seu método

15. As disciplinas filosóficas sejam ensinadas de forma que os alunos possam adquirir antes de mais um conhecimento sólido e coerente do homem, do mundo e de Deus, apoiados num património filosófico perenemente válido (29), tendo em conta as investigações filosóficas dos tempos actuais, sobretudo aquelas que maior influxo exercem na própria nação, assim como o progresso recente das ciências, de modo que, compreendendo a mentalidade hodierna, eles se preparem devidamente para o diálogo com os homens do seu tempo (30).

A história da filosofia seja exposta de maneira que os alunos, ao verem os princípios fundamentais dos vários sistemas, retenham aquilo que neles há de verdadeiro e saibam descobrir as raízes dos seus erros e refutá-los. No próprio modo de ensinar, desperte-se nos alunos o amor à investigação rigorosa cia verdade, observação e demonstração, reconhecendo ao mesmo tempo honestamente os limites do conhecimento humano. Atenda-se com cuidado à relação entre a filosofia e os verdadeiros problemas e questões da vida que agitam a mente dos alunos. Ajudem-se a compreender o nexo entre as matérias da filosofia e os mistérios da salvação, que na teologia são vistos à luz superior da fé.

Teologia: as diversas disciplinas e o seu método

16. As disciplinas teológicas sejam ensinadas à luz da fé e sob a direcção do magistério da Igreja (31), de tal forma que os alunos possam encontrar com exactidão a doutrina católica na Revelação divina, a penetrem profundamente, façam dela alimento da vida espiritual (32) e se tornem capazes de a anunciar, expor e defender no ministério sacerdotal.

Os alunos sejam formados com particular empenho no estudo da Sagrada Escritura, que deve ser como que a alma de toda a teologia (33). Depois da conveniente introdução, iniciem-se cuidadosamente no método da exegese, estudem os temas de maior importância da Revelação divina e encontrem na leitura e meditação dos Livros sagrados estímulo e alimento (34).

A teologia dogmática ordene-se de tal forma que os temas bíblicos se proponham em primeiro lugar. Exponha-se aos alunos o contributo dos Padres da Igreja oriental e ocidental para a Interpretação e transmissão fiel de cada uma das verdades da Revelação, bem como a história posterior do Dogma tendo em conta a sua relação com a história geral da Igreja (35). Depois, para aclarar, quanto for possível, os mistérios da salvação de forma perfeita, aprendam a penetra-los mais profundamente pela especulação, tendo por guia Santo Tomás, e a ver o nexo existente entre eles (36). Aprendam a vê-los presentes e operantes nas acções litúrgicas (37) e em toda a vida da Igreja. Saibam buscar, à luz da Revelação, a solução dos problemas humanos, aplicar as verdades eternas à condição mutável das coisas humanas e anuncia-las de modo conveniente aos homens seus contemporâneos (38).

De igual modo, renovem-se as restantes disciplinas teológicas por meio dum contacto mais vivo com o mistério de Cristo e a história da salvação. Ponha-se especial cuidado em aperfeiçoar a teologia moral, cuja exposição científica, mais alimentada pela Sagrada Escritura, deve revelar a grandeza da vocação dos fiéis em Cristo e a sua obrigação de dar frutos na caridade para vida do mundo. Na exposição do direito canónico e da história eclesiástica, atenda-se ao mistério da Igreja, segundo a Constituição dogmática «De Ecclesia» promulgada por este sagrado Concílio. A sagrada Liturgia, que deve ser tida como a primeira e necessária fonte do espírito verdadeiramente cristão, ensine-se segundo o espírito dos artigos 15 e 16 da Constituição «De sacra liturgia» (39).

Tendo em consideração as condições locais, sejam os alunos levados a conhecer mais perfeitamente as igrejas e comunidades eclesiais separadas da Sé Apostólica de Roma, para que possam concorrer para a restauração da unidade de todos os cristãos, segundo as normas deste sagrado Concílio (40).

Sejam ainda iniciados no conhecimento das outras religiões mais espalhadas em cada região, para que melhor possam conhecer o que de bom e de verdadeiro têm, segundo a disposição de Deus, aprendam a refutar os seus erros e possam comunicar a plena luz da verdade àqueles que não a têm.

Revisão dos métodos didácticos

17. Porque a formação doutrinal deve tender não só à mera comunicação de noções, mas a uma íntima e verdadeira formação dos alunos, revejam-se os métodos didácticos tanto quanto às prelecções, colóquios e exercícios, como quanto ao incitamento dos alunos ao estudo tanto em particular como em pequenos grupos. Busquem-se com interesse a unidade e a solidez da formação, evitando a demasiada multiplicação das matérias e das aulas, omitindo aquelas questões que ou não têm quase importância nenhuma, ou devem ser remetidas para os estudos académicos superiores.

Especialização sacerdotal

18. Pertence aos Bispos procurar que os jovens aptos pelo seu carácter, virtude e talento, sejam enviados a institutos especiais, Faculdades ou Universidades, para que sejam sacerdotes melhor preparados nas ciências sagradas ou outras que se julguem oportunas, e assim, com maior preparação científica, possam depois satisfazer às várias necessidades do apostolado. De modo algum, porém, se deve negligenciar a sua formação espiritual e pastoral, sobretudo se não são ainda sacerdotes.

VI. FORMAÇÃO ESTRITAMENTE PASTORAL

Necessidade dessa formação

19. A solicitude pastoral que deve informar toda a formação dos alunos (41), pede também que eles sejam instruídos no que respeita especialmente ao sagrado ministério, sobretudo na catequese, na pregação, no culto litúrgico e na administração dos sacramentos, nas obras de caridade, no dever de ir ao encontro dos incrédulos e dos errantes, assim como nos restantes deveres pastorais. Sejam cuidadosamente instruídos na arte da direcção das almas, pela qual possam, primeiro que tudo, formar os filhos da Igreja numa vida cristã consciente e apostólica e levá-los ao cumprimento dos deveres próprios do seu estado. Com igual solicitude saibam ajudar os religiosos e as religiosas a perseverar na graça da própria vocação e a adiantar segundo o espírito dos vários Institutos (42).

Cultivem-se, em geral, nos alunos as convenientes aptidões que mais concorrem para o diálogo com os homens, como é a capacidade de ouvir os outros e de abrir a alma em espírito de caridade nas várias circunstâncias das relações humanas (43).

Conhecimentos pedagógicos, psicológicos e sociológicos

20. Sejam também instruídos no uso dos auxílios que as disciplinas pedagógicas, psicológicas e sociológicas (44) podem prestar, segundo os devidos métodos e as normas da autoridade eclesiástica. Sejam também cuidadosamente informados da maneira de despertar e favorecer a acção apostólica dos leigos (45), e ainda de promover as várias e mais eficazes formas de apostolado. Com espírito verdadeiramente católico, habituem-se a transcender a própria diocese, nação ou rito, e ajudar as necessidades de toda a Igreja, dispostos a pregar o Evangelho em toda a parte (46).

Prática pastoral durante os estudos

21. É necessário que os alunos aprendam a arte de exercer o apostolado não só de maneira teórica, mas também prática, e saibam comportar-se com responsabilidade própria e em colaboração com os outros; para isso, sejam iniciados já durante os estudos e até no tempo de férias, na prática pastoral com exercícios convenientes, que devem ser levados a cabo, de harmonia com a idade dos alunos e circunstâncias dos lugares, segundo o prudente juízo dos Bispos, de forma metódica e sob a orientação de homens peritos em assuntos pastorais, não esquecendo a força superior cios auxílios sobrenaturais (47).

VII. FORMAÇÃO COMPLEMENTAR DEPOIS DOS ESTUDOS

Institutos pastorais, assembleias e exercícios apropriados

22. Devendo a formação sacerdotal ser continuada e completada, mesmo depois de terminado o curso do Seminário, por causa das condições do mundo moderno (48), pertence às Conferências episcopais estabelecer em cada nação os meios mais aptos, como sejam Institutos pastorais em colaboração com paróquias bem escolhidas, assembleias em tempos estabelecidos e exercícios apropriados. Por meio destes auxílios, o clero jovem deverá ser gradualmente introduzido na vida sacerdotal e na actividade apostólica sob o aspecto espiritual, intelectual e pastoral, e renová-las e promovê-las cada vez mais.

CONCLUSÃO

Exortação aos educadores e aos seminaristas

Os Padres deste sagrado Concílio, continuando a obra começada pelo Concílio de Trento, ao mesmo tempo que, esperançados, confiam aos Superiores e professores dos Seminários o encargo de formarem os futuros sacerdotes de Cristo no espírito de renovação promovida por este mesmo Concílio, exortam ardentemente aqueles que se preparam para o ministério sacerdotal a que sintam vivamente que a esperança da Igreja e a salvação das almas lhes está confiada e que, aceitando de ânimo generoso as normas deste decreto, dêem frutos abundantíssimos que permaneçam para sempre.

Vaticano, 28 de Outubro de 1965.

PAPA PAULO VI


Notas

1. Que o progresso de todo o Povo de Deus, segundo a vontade de Cristo, depende sobretudo do ministério sacerdotal, vê-se claramente pelas palavras com que o Senhor constituiu os Apóstolos e os seus sucessores e colaboradores como pregoeiros do Evangelho, chefes escolhidos do novo Povo eleito e dispensadores dos mistérios de Deus; isto mesmo se confirma com as palavras dos Santos Padres e com os repetidos documentos dos Sumos Pontífices. . Cfr. sobretudo: S. Pio X, Exortação ao clero Haerent animo, 4 ago. 1908: S. Pii X Acta, IV, p. 237-264. Pio XI, encíclica Ad catholici Sacerdotii, 20 dez. 1935: AAS 28 (1936), sobretudo p. 37-52. Pio XII, Exortação apostólica Menti Nostrae, 23 set. 1950: AAS 42 (1950) p. 657-702. João XXIII, Encíclica Sacerdotii nostri primordia, 1 ago. 1959: AAS 51 (1959), p. 545-579. Paulo VI, Carta apostólica Summi Dei Verbum, 4 nov. 1965: AAS 55 (1963) p. 979-995.

2. Toda a formação sacerdotal, isto é, a ordenação e a disciplina dos alunos, e os exercícios pastorais, tudo deve ser adaptado às circunstâncias de cada lugar. Esta adptação, pelo que toca às normas principais, deve ser feita segundo as leis comuns, para o clero secular pelas Conferências episcopais, e para o clero regular pelos respectivos Superiores (cfr. Estatutos gerais anexos à Constituição apostólica Sedes Sapientiae, art. 19).

3. Entre as principais dificuldades que hoje afligem a Igreja, sobressai quase por toda a parte a falta de vocações. Cfr.: Pio XII, Exortação apostólica Menti nostrae; «...o número dos sacerdotes quer nos países católicos quer nas terras de missão é em geral insuficiente para as necessidades cada vez maiores»: AAS 42 (1950) p. 682. João XXIII: «O problema das vocações eclesiásticas e religiosas é a preocupação quotidiana do Papa... é o anelo da oração, a aspiração ardente da sua alma». Da alocução ao I Congresso internacional das Vocações para os estados de perfeição, 16. dez. 1961: AAS 54 (1962) p. 33.

4. Pio XII, Constituição apostólica Sedes Sapientiae, 31 maio 1956: AAS 48 (1956), p. 357; Paulo VI, Carta apostólica Summi Dei Verbum, 4 nov. 1963: AAS 55 (1963) p. 984 s.

5. Cfr. sobretudo: Pio XII, Motu proprio Cum nobis, sobre a erecção da Pontifícia Obra das Vocações sacerdotais junto da S. Congregação dos Seminários e Universidades, 4 nov. 1941: AAS 44 (1941) p. 479; com os Estatutos e as Normas anexas promulgadas pela mesma S. Congregação no dia 8 set. 1943. Motu proprio Cum supremae acerca da Pontifícia Obra das Vocações Religiosas, 11 fev. 1955: AAS 47 (1955) p. 266, com os Estatutos e as Normas anexas promulgadas pela S. Congregação dos Religiosos (ibid. p. 298-301); Conc. Vat. II, Decreto De accomodata renovatione vitae religiosas, Perfectae Caritatis, n. 24; Decreto De Pastorali Episcoporum in Ecclesia, Christus Dominus, n. 15.

6. Cfr. Pio XII, Exortação Apostólica Menti nostrae, de 23 set. 1950: AAS 42 (1950) p. 685.

7. Cfr. Conc: Vat. II, Constituição dogmática Lumen gentium, n. 28: AAS 57 (1965) p: 34.

8. Cfr. Pio XI, Encíclica Ad catholici Sacerdotii, 20 dez: 1935: AAS 28 (1936) p: 37: «Seja sobretudo cuidada a escolha dos Superiores e dos professores... Destinai a. estes colégios sacerdotes ornados de grande virtude;, nem hesiteis em retirá-los de outras funções, na aparência de maior importância, mas que na realidade não têm comparação com este ministério essencial, a que nenhum outro leva vantagem»: Este principio da escolha dos melhores é inculcado novamente por Pio XII na Carta apostólica dirigida aos Bispos do Brasil em 23 abril: 1947: Discorsi e Radiomessaggi IX, p: 579-580.

9. Do dever comum de se dedicar ao auxilio dos Seminários, cfr. Paulo VI, Carta apostólica Summi Dei Verbum, 4 nov. 1963: AAS 53 (1963) p: 984.

10. Cfr. Pio XII, Exortação apostólica :Menti Nostrae, de 23 set. 1950: AAS 42 (1950) p. 684; e cfr. S: Congregação dos Sacramentos, Carta circular Magna quidem aos Ordinários de lugar, 27 dez. 1935, n. 10. Para os reli giosos, cfr. Estatutos Gerais anexos à Const. apost. Sedes Sapientiae 31 maio 1956, art. 33. Paulo VI, Carta apostólica Summi Dei Verbum, 4 nov. 1963: AAS 55 (1963) p: 987 s.

11. Cfr. Pio XI, Encíclica Ad catholici Sacerdotii, dec. 1935: AAS 28 (1936), p: 41.

12. Estabelece-se que ao determinar os Estatutos dos Seminários regionais ou nacionais, todos os Bispos interessados tomem parte sendo derrogado o que vem prescrito no cânone 1357, § 4 do C: I: C.

13. Cfr. Pio XII, Exortação apostólica Menti Nostrae, 23 set. 1950: AAS 42 (1950) p: 674; S: Congregação dos Seminários e Universidades, La Formazione spirituale dei candidato ai sacerdozio, Cidade do Vaticano, 1965.

14. Cfr. S. Pio X, Exortação ao clero católico Haerent animo, 4 ago; 1908: S. Pii X Acta, IV, p. 242-244; Pio XII, Exortação apostólica Menti Nostrae, 23 set. 1950: AAS 42 (1950), p. 659-661; João XXIII, Encíclica Sacerdotii Nostri primordia, 1 ago. 1959: AAS 51 (1959) p. 550.

15. Cfr. Pio XII, Encíclica Mediator Dei, 20 nov. 1947: AAS 39 (1947) p. 547 s. e 572 s.; João XXIII, Exortação apostólica Sacrae Laudis, 6 jan. 1962: A.AS 54 (1962) p. 69; Conc. Vat. II, Const. de Sacra Liturgia Sacrosanctum Concilium, art. 16 e 17: AAS 56 (1964) p. 104 s.; S. Congregação dos Ritos, Instructio ad exsecutionem Constitutionis de Sacra Liturgia recte ordinandam, 26 set. 1964, nn, 14-17: AAS 56 (1964) p. 880 s.

16. Cfr. João XXIII, Encíclica Sacerdotii Nostri primordia: AAS 51 (1959) p. 559 s.

17. Cfr. Conc. Vat. II, Constituição dogmática De Ecelesia, Lumen gentium, n. 28: AAS 57 (1965) p. 35 s.

18. S. Agostinho, In Io. tract. 32,8: PL 35, 1646,

19. Cfr. Pio XII, Exortação Apostólica Menti nostrae: AAS 42 (1950) pp. 662 s., 685, 690; João XXIII, Encíclica Sacerdotii Nostri primordia: AAS 51 (1959) p. 551-553; 556 s.; Paulo VI, Encíclica Ecclesiam suam, 6 ago. 1964: AAS 56 (1964) p. 634 s.; Conc. Vat. II, Constituição dogmática De Ecelesia, Lumen gentium, sobretudo o n. 8: AAS 7 (1965) p. 12

20. Cfr. Pio XII, Encíclica Sacra Virginitas, 25 mar, 1954: AAS 46 (1954) p. 165 s.

21. Cfr. S. Cipriano, De habitu virginum, 22: PL 4, 475; S. Ambrósio, De virginibus I, 8,52: PL 16, 202 S.

22. Cfr. Pio XII, Exortação apostólica Menti Nostrae: AAS 41 (1950) p. 663.

23. Cfr. Pio XII, Encíclica Sacra Virginitas, 1. c., p. 170-174.

24. Cfr. Pio XII, Exortação apostólica Menti Nostrae, 1. c., p. 664 e 690 s.

25. Cfr. Paulo VI, Carta apostólica Summi Dei Verbum, 4 nov. 1963: AAS 55 (1963), p. 991.

26. Cfr. Pio XII, Exortação apostólica Menti Nostrae, 1. c., p. 993.

27. Paulo VI, Carta.apostólica Summi Dei Verbum, loc. cit., p. 993

28. Cf. Conc. Vat..II, Constituição dogmática De Ecelesia, Lumen gentium, n. 7 e 28: AAS 57 (1965) p. 9-11; 33.

29. Cfr. Pio XII, Enciclica Humani Generis, 12 ago. 1950: AAS 42 (1950) p. 571-572.

30. Cfr. Paulo VI, Enciclica Ecclesiam Suam, 6 ago. 1964: AAS 56 (1964) p. 637 ss.

31. Cfr. Pio XII, Encíclica Humani Generis, 12 ago. 1950: AAS 42 (1950) p. 567-569; Alocução Si diligis, de 31 maio 1954: AAS 46 (1954) p. 314 s. Paulo VI, Alocução na Pontifícia Universidade Gregoriana, 12 mar. 1964: AAS 56 (1964) p. 364 ss.: Conc. Vat. II, Constituição dogmática De Ecelesia, Lumen gentium, n. 25: AAS 57 (1965) p. 29-31.

32. Cfr. S. Boaventura, Itinerarium mentis in Deum, prol. n, 4: «(Ninguém) julgue que lhe basta a leitura sem a piedade, a especulação sem a devoção, a investigação sem a admiração, a visão sem o gozo, a perícia sem a piedade, a ciência sem a caridade, a inteligência sem a humildade, o estudo sem a graça divina, a aparência sem a sabedoria inspirada por Deus» (Opera Omnia, V, Quaracchi, 1891, p. 296).

33. Cfr. Leão XIII, Encíclica Providentissimus Deus, 18 nov. 1893: ASS 26 (1893-94) p. 283.

34. Cfr. Pontifícia Comissão Bíblica, In structio de Sacra Scriptura reste docenda, 13 maio 1950: AAS 42 (1950) p. 502 s.:»...

35. Cfr. Pio XII, Encíclica Humani Generis, 12 ago. 1950: AAS 42 (1950) p. 568 s.: «...pelo estudo das fontes sagradas, as sagradas disciplinas conservam sempre um vigor renovado; pelo contrário, a especulação que negligencia a investigação ulterior do depósito sagrado resulta estéril, como sabemos pela experiência».

36. Cfr. Pio XII, Discurso aos Seminaristas, 24. jun. 1939: AAS 31 (1939) p. 247: «O desejo sincero... em procurar e propagar a verdade, não é suprimido pela recomendação da doutrina de S. Tomás, mas é antes estimulado e orientado com mais segurança». Paulo VI, Alocução na Universidade Gregoriana, 12 mar. 1964: AAS 56 (1964), p. 365: «(Os Mestres)... oiçam com reverência a voz dos Doutores da Igreja, entre os quais merece o primeiro lugar S. Tomás; é tão grande o engenho do Doutor Angélico, tão sincero o seu amor à verdade e tão grande a sabedoria em investigar, explicar e dar admirável unidade às verdades mais sublimes, que a sua doutrina é o instrumento mais eficaz, não só para fundamentar sòlidamente a fé, mas também para colher com utilidade e segurança os frutos dum são progresso». Cfr. também a Alocução ao VI Congresso Internacional Tomístico, 10 set. 1965.

37. Cfr. Conc. Vat. II, Constituição De Sacra Liturgia, Sacrosanctum concilium, n. 7 e 16: AAS 56 (1964) p. 100 s. e 104 s.

38. Cfr. Paulo VI, Encíclica Ecclesiam Suam, 6 ago. 1964: AAS 56 (1964) p. 640 s.

39. Conc. Vat. II, Constituição De Sacra Liturgia, Sacrosanctum concilium, n. 10, 14, 15, 16; S. C. dos Ritos, Instructio ad exsecutionem Constitutionis de Sacra Liturgia reste ordinandam, 26 set. 1964, n. 11 e 12: AAS 56 (1964) p. 879 s.

40. Cfr. Conc. Vat. II, Decreto De Oecumenismo, Unitatis Redintegratio, n. 1, 9, 10: AAS 57 (1965) p. 90 e 98 s.

41. A imagem perfeita do Pastor pode deduzir-se dos recentes documentos Pontifícios que tratam expressamente da vida, dos dotes, e da instrução dos sacerdotes, principalmente: S. Pio X, Exortação ao clero Haerent animo, S. Pii X Acta, IV, p. 237 s.; Pio XI, Encíclica Ad Catholici Sacerdotii: AAS 28 (1963), p. 5 s.; Pio XII, Exortação apostólica Menti Nostrae: AAS 42 (1950), p. 657 s.; João XXIII, Encíclica Sacerdotii Nostri primordia: AAS 51 (1959), p. 545 s.; Paulo VI, Carta apostólica Summi Dei Verbum: AAS 55 (1963) p. 979 s. Acerca da formação pastoral, cfr. Encíclica Mystici Corporis (1943), Mediator Dei (1947), Evangelii Praecones (1951), Sacra Virginitas (1954), Musicae Sacrae Disciplina (1955), Princeps Pastorum (1959), bem como a Constituição apostólica Sedes Sapientiae (1956), para os Religiosos. Pio XII, João XXIII e Paulo VI ilustraram frequentemente também a figura do bom pastor nas alocuções aos seminaristas e aos sacerdotes.

42. Da importância do estado, constituído pela profissão dos conselhos evangélicos, cfr. Conc. Vat. II, Constituição dogmática De Ecclesia Lumen gentium, cap. VI: AAS 57 (1965) p. 49-58; Decreto De accommodata renovatione vitae religiosae Perfectae caritatis.

43. Cfr. Paulo VI, Encíclica Ecclesiam suam, 6 ago. 1964: ATAS 56 (1964), passim, sobretudo p. 635 s. e 640 s.

44. Cfr. sobretudo João XXIII, Encíclica Mater et Magistra, 15 maio. 1961: AAS 53 (1961) p. 401 s.

45. Cfr. principalmente Conc. Vat. II, Const. dogm. de Ecclesia, Lumen gentium, n.° 33: AAS 57 (1965) p. 39 s.

46. Cfr. Conc. Vat. II, Constituição dogmática De Ecclesia, Lumen gentium, n. 17: AAS 57 (1965) p. 20 s.

47. Muitos documentos pontifícios previnem contra o perigo de negligenciar o fim sobrenatural na acção pastoral e de menosprezar, pelo menos na prática, os auxílios sobrenaturais; cfr. sobretudo os documentos mencionados na nota 41.

48. Documentos recentes da Santa Sé urgem o cuidado particular que se deve ter dos neo-sacerdotes. Recordem-se sobretudo os seguintes: Pio XII, Motu proprio Quandoquidem, 2 abril 1949: AAS 41 (1949) p. 165-167; Exortação apostólica Menti Nostrae, 23 set. 1950: AAS 42 (1950) ; Constituição apostólica (para os Religiosos) Sedes Sapientiae, 31 maio 1956, e os Estatutos Gerais anexos; Alocução aos sacerdotes do Convicto de Barcelona, 14 jun. 1957, Discorsi e Radiomessaggi, XIX, p. 271-273. Paulo VI, Alocução aos sacerdotes do Instituto «Gian Matteo Giberti» da diocese de Verona, 11 março 1964: L'Osservatore Romano, 13 março 1964.

++++++++++++++++++++++++



DECRETO
PERFECTAE CARITATIS
SOBRE A CONVENIENTE RENOVAÇÃO
DA VIDA RELIGIOSA

Natureza da Vida Religiosa

1. O sagrado Concílio já mostrou, na Constituição que começa pelas palavras «Lumen gentium», que a consecução da caridade perfeita por meio dos conselhos evangélicos tem a sua origem na doutrina e nos exemplos do divino mestre e brilha como um sinal luminoso do reino dos céus. Agora, porém, propõe-se tratar da disciplina e vida dos Institutos, cujos membros professam castidade, pobreza e obediência, e prover às necessidades dos mesmos, conforme sugerem os nossos tempos.

Logo desde os princípios da Igreja, houve homens e mulheres, que pela prática dos conselhos evangélicos procuraram seguir Cristo com maior liberdade e imitá-lo mais de perto, consagrando, cada um a seu modo, a própria vida a Deus. Muitos deles, movidos pelo Espírito Santo, levaram vida solitária, ou fundaram famílias religiosas, que depois a Igreja de boa vontade acolheu e aprovou com a sua autoridade. Daqui proveio, por desígnio de Deus, uma variedade admirável de famílias religiosas, que muito contribui para que a Igreja não só esteja preparada para toda a obra boa (cfr. 2 Tim. 3,17) e para o ministério da edificação do corpo de Cristo (cfr. Ef. 4,12), mas ainda, aformoseada com a variedade dos dons dos seus filhos, se apresente como esposa ornada ao seu esposo (cfr. Apoc. 21,2) e por ela brilhe a multiforme sabedoria de Deus (cfr. Ef. 3,10).

Em tanta variedade de dons, todos aqueles que são chamados por Deus à prática dos conselhos evangélicos e fielmente os professam, consagram-se de modo particular ao Senhor, seguindo Cristo, que, sendo virgem e pobre (cfr. Mt. 8,20; Lc. 9,58), remiu a santificou todos os homens pela obediência até à morte da cruz (Fil. 2,8). Movidos assim pela caridade, que o Espírtio Santo derrama nos seus corações (cfr. Rom. 5,5), mais e mais vivem para Cristo e para o seu corpo, que é a Igreja (cfr. Col.- 1,24). Quanto mais fervorosamente se unirem, portanto, a Cristo por uma doação que abraça a vida inteira, tanto mais rica será a sua vida para a, Igreja e mais fecundo o seu apostolado.

Ora, para que o valor excelente da vida consagrada pela profissão dos conselhos evangélicos e a sua função necessária nas presentes circunstâncias resultem em maior bem para a Igreja, este sagrado Concílio estabelece o que se segue, e que diz apenas respeito aos princípios gerais duma conveniente renovação da vida e disciplina das religiões, e respeitada a sua índole própria, das sociedades de vida comum sem votos e dos Institutos seculares. As normas particulares, porém, para conveniente exposição e aplicação destes princípios, serão dadas depois do Concílio pela autoridade competente.

Princípios gerais para a sua renovação

2. A conveniente renovação da vida religiosa compreende não só um contínuo regresso às fontes de toda a vida cristã e à genuína inspiração dos Institutos mas também a sua adaptação às novas condições dos tempos.

Esta renovação, sob o impulso do Espírito Santo e a orientação da Igreja, deve promover-se segundo os princípios seguintes:

a) Dado que a vida religiosa tem por última norma o seguimento de Cristo proposto no Evangelho, deve ser esta a regra suprema de todos os Institutos.

b) Reverte em bem da Igreja que os Institutos mantenham a sua índole e função particular; por isso, sejam fielmente aceites e guardados o espírito e as intenções dos fundadores bem como as sãs tradições, que constituem o património de cada Instituto.

c) Todos os Institutos participem da vida da Igreja, e, segundo a própria índole, tenham como suas e favoreçam quanto puderem as iniciativas e empresas da mesma Igreja em matéria bíblica, dogmática, pastoral, ecuménica, missionária e social.

d) Promovam os Institutos nos seus membros o conveniente conhecimento das circunstâncias dos tempos e dos homens bem como das necessidades da Igreja; de maneira que, sabendo julgar sàbiamente das situações do mundo dos nossos dias à luz da fé, e ardendo de zelo apostólico, possam mais eficazmente ir ao encontro dos homens.

e) Dado que a vida religiosa se ordena antes de tudo a que os seus membros sigam a Cristo e se unam a Deus, mediante a profissão dos conselhos evangélicos, deve pesar-se sèriamente que as melhores adaptações às necessidades do nosso tempo não sortirão efeito, se não forem animadas da renovação espiritual, que sempre, mesmo na promoção das obras exteriores, deve ter a parte principal.

Critérios práticos para a sua renovação

3. O modo de viver, de orar e trabalhar seja devidamente adaptado às condições físicas e psicológicas, bem como, segundo a índole de cada Instituto, às necessidades de apostolado, às exigências de cultura, às situações sociais e económicas, e isto em toda a parte, mas sobretudo em terras de Missões.

Segundo estes mesmos critérios, examine-se também o modo de governo dos Institutos.

Por isso, as constituições, os «directórios, os livros de costumes, de orações, cerimónias, etc., tudo seja revisto convenientemente e, pondo de lado as prescrições obsoletas, adaptem-se aos documentos deste sagrado Concílio.

Autoridade competente para levar a cabo a renovação

4. A renovação eficaz e a adaptação conveniente não se podem obter sem a colaboração de todos os membros do Instituto. Estabelecer, porém, as normas e dar as leis desta renovação, assim como dar possibilidades para uma suficiente e prudente experiência, pertence sòmente às autoridades competentes, sobretudo aos Capítulos gerais, salva a aprovação da Santa Sé ou dos Ordinários de lugar, quando for necessária, segundo as normas do direito. Todavia, os Superiores, nas coisas que dizem respeito a todo o Instituto, consultem e oiçam os seus súbditos de modo conveniente.

Para a devida renovação dos mosteiros de monjas, poder-se-ão obter também os votos e pareceres das assembleias das Federações ou de outras reuniões legitimamente convocadas.

Lembrem-se, porém, todos que a esperança de renovação deve ser posta mais na diligente observância da regra e das constituições do que na multiplicação das leis.

Exigências fundamentais da vocação religiosa

5. Os membros de todo e qualquer Instituto lembrem-se sobretudo que responderam à vocação divina pela profissão dos conselhos evangélicos, não só para morrerem ao pecado (cfr. Rom. 6,11), mas também para, renunciando ao mundo, viverem exclusivamente para Deus. Puseram toda a vida ao Seu serviço, o que constitui uma consagração especial, que se radica intimamente na consagração do Baptismo e a exprime mais perfeitamente.

Tendo, porém, esta doação de si mesmos sido aceite pela Igreja, considerem-se também como adstritos ao seu serviço.

Este serviço de Deus deve urgir e alimentar neles o exercício das virtudes, sobretudo da humildade e da obediência, da fortaleza e da castidade, pelas quais participam no despojamento de Cristo (cfr. Fil. 2,7-8) e na Sua vida em espírito (cfr. Rom. 8, 1-13).

Os religiosos, portanto, fiéis à profissão, deixando tudo por amor de Cristo (cfr. Mc. 10,28), sigam-no (Mt., 19,21) como única coisa necessária (cfr. Lc. 10, 42), ouvindo a Sua palavra (Lc. 10,39), solícitos das coisas que são d'Ele (cfr. 1 Cor. 7,32).

Por isso, os membros de qualquer Instituto, buscando acima de tudo e ùnicamente a Deus, saibam conciliar a contemplação, pela qual aderem a Deus pela mente e pelo coração, com o amor apostólico; é este amor que os leva a esforçar-se por se associarem à obra da Redenção e por dilatar o Seu reino.

Caridade e vida interior

6. Os que professam os conselhos evangélicos, busquem e amem antes de tudo a Deus que primeiro nos amou (cfr. 1 Jo. 4,10), e procurem em todas as circunstâncias cultivar a vida escondida com Cristo em Deus (cfr. Col. 3,3), da qual dimana e se estimula o amor do próximo para a salvação do mundo e edificação da Igreja. É também esta caridade que anima e rege a prática dos conselhos evangélicos.

Por isso, os membros dos Institutos cultivem com contínuo esforço o espírito de oração e a mesma oração, haurindo-a das genuínas fontes da espiritualidade cristã. Sobretudo tenham todos os dias entre mãos a Sagrada Escritura, para que aprendam, pela leitura e meditação, «a eminente ciência de Jesus Cristo» (Fil. 3,8). Celebrem a sagrada Liturgia, sobretudo o sagrado mistério da Eucaristia, pelo coração e pela palavra, segundo o espírito da Igreja, e alimentem desta abundantíssima fonte a vida espiritual.

Deste modo, alimentados à mesa da divina lei e do sagrado altar, amem fraternalmente os membros de Cristo, reverenciem e amem com espírito filial os seus pastores, vivam e sintam mais e mais com a Igreja e dediquem-se totalmente à sua missão.

Institutos de vida contemplativa

7. Os Institutos que se dedicam exclusivamente à contemplação, de tal em oração contínua e alegre penitência, conservam sempre a parte mais excelente dentro do Corpo Místico de Cristo, em que «nem todos os membros... têm a mesma função» (Rom. 12,4), embora seja urgente a necessidade do apostolado. Na verdade, oferecem a Deus um exímio sacrifício de louvor, enriquecem com abundantes frutos de santidade o Povo de Deus, movem com o seu exemplo e dilatam-no mercê da sua misteriosa fecundidade apostólica. São honra da Igreja e fonte das graças celestes. O seu modo de viver, porém, seja revisto segundo os princípios acima expostos e os critérios duma conveniente renovação, mantendo-se, contudo, intactos a sua separação do mundo e os exercícios próprios da vida contemplativa.

Institutos de vida apostólica

8. Muitos são na Igreja os Institutos tanto clericais como laicais, dados às várias obras de apostolado, cada um com dons diferentes, segundo a graça que lhes foi dada: o ministério para servir; a doutrina para ensinar; o que exorta, para exortar; o que dá, com simplicidade; o que pratica a caridade, com alegria (cfr. Rom. 12, 5-8). «As graças são diferentes, mas o Espírito é o mesmo» (1 Cor. 12,4).

Em tais Institutos, pertence à própria natureza da vida religiosa a actividade apostólica e de beneficência, como o exercício do santo ministério e as obras de caridade próprias, que a Igreja lhes confiou e que eles devem exercer em seu nome. Por isso, toda a vida religiosa dos seus membros seja imbuída de espírito apostólico e toda a sua acção apostólica seja informada pelo espírito religioso. Para corresponderem à sua vocação de seguir a Cristo e servir ao próprio Cristo nos Seus membros, é necessário que a sua acção apostólica dimane da sua união com Cristo. Sucederá que, desta forma, se alimenta a caridade para com Deus e para com o próximo.

Por isso, estes Institutos conciliem as suas observâncias e costumes com as exigências do apostolado a que se dedicam. Revestindo, porém, a vida religiosa consagrada às obras apostólicas muitas e variadas formas, é necessário que a sua renovação tenha em conta esta diversidade e que, nos vários Institutos, a vida dos membros ao serviço de Cristo seja favorecida com os meios que lhes são próprios.

Institutos de vida monástica

9. Conserve-se fielmente e brilhe cada vez mais no seu genuíno espírito, tanto no Oriente como no Ocidente, a venerável instituição da vida monástica, que tantos méritos alcançou no decorrer dos séculos na Igreja e na sociedade humana. O principal dever dos monges é servir dum modo ao mesmo tempo humilde e nobre, a divina majestade dentro das paredes do seu mosteiro, quer se entreguem totalmente ao culto divino na vida contemplativa, quer tenham assumido legitimamente algumas obras de apostolado ou caridade cristã. Mantida, pois, a índole própria da instituição, renovem as suas antigas e beneméritas tradições e acomodem-nas às necessidades hodiernas das almas, de tal forma que os mosteiros sejam como que os alfobres de edificação do Povo cristão.

Do mesmo modo, às religiões que por regra ou instituto associam intimamente a vida apostólica à vida de coro e às observâncias monásticas, de maneira a manter fielmente a sua forma de vida, já que esta é de tão grande proveito para a Igreja.

A vida religiosa laical

10. A vida religiosa laical, tanto de homens como de mulheres, constitui em si mesma um estado completo da profissão dos conselhos evangélicos. Por isso, o sagrado Concílio, que a tem em grande estima, tão útil ela, é à missão pastoral da Igreja na educação da juventude, cuidado dos doentes e outros ministérios, confirma os seus membros na vocação e exorta-os a adaptar a sua vida às exigências modernas.

O sagrado Concílio declara que nada obsta a que nos Institutos de Irmãos, permanecendo embora firme a sua índole laical, alguns dos membros recebam as ordens sacras, por disposição do Capítulo geral, para atenderem às necessidades do ministério sacerdotal nas suas casas.

Institutos seculares

11. Os Institutos seculares, embora não sejam Institutos religiosos, implicam uma verdadeira e completa profissão dos conselhos evangélicos no mundo, reconhecida pela Igreja. Esta profissão confere uma consagração, tanto a homens como mulheres, a leigos ou clérigos que vivem no mundo. Por isso, procurem sobretudo fazer uma total doação de si mesmos a Deus na caridade perfeita; e os próprios Institutos mantenham o seu carácter próprio e peculiar, isto é, a secularidade, para poderem exercer eficazmente e por toda a parte o apostolado no mundo e como que a partir do mundo; para isso foram instituídos.

Tenham, todavia, muito presente que não poderão exercer tão alta missão, se os membros não forem cuidadosamente formados nas coisas divinas e humanas, de tal maneira que sejam verdadeiramente fermento no mundo para vigor e incremento do Corpo de Cristo. Os responsáveis cuidem sèriamente da formação, sobretudo espiritual, dos membros e do seu ulterior aperfeiçoamento.

O voto de castidade

12. A castidade «por amor do reino dos céus» (Mt. 19,12), que os religiosos professam, deve ser tida como exímio dom da graça. Liberta de modo singular o coração do homem (cfr. 1 Cor 7, 32-35), para que mais se acenda na caridade para com Deus e para com todos os homens. É, por isso, sinal dos bens celestes e meio aptíssimo pelo qual os religiosos alegremente se dedicam ao serviço de Deus e às obras de apostolado. Assim, dão testemunho diante de todos os cristãos daquele admirável consórcio estabelecido por Deus e que se há-de manifestar plenamente na vida futura, pelo qual a Igreja tem a Cristo por seu único esposo.

É necessário, portanto, que os religiosos, ao esforçarem-se por ser fiéis à sua profissão, acreditem na palavra do Senhor e, confiados no Seu auxílio, não presumam das próprias forças e dêem-se à mortificação e à guarda dos sentidos. Não descuidem os meios naturais que favorecem a saúde mental e corporal. Assim sucederá que não se deixarão mover pelas doutrinas daqueles que apresentam a continência perfeita como impossível ou nociva à perfeição humana, e repelirão, como que por um instinto espiritual, tudo aquilo que põe em perigo a castidade. Lembrem se, além disso, todos, sobretudo os Superiores, que a castidade se conserva mais seguramente, quando entre os membros reina o verdadeiro amor fraterno na vida comum.

Visto que a observância da castidade perfeita atinge intimamente inclinações mais profundas da natureza humana, os candidatos não se abeirem nem sejam admitidos à profissão da castidade, senão depois duma provação verdadeiramente suficiente e com a devida maturidade psicológica e afectiva. Sejam não só instruídos sobre os perigos que ameaçam a castidade, mas formem-se de tal maneira que abracem o celibato consagrado a Deus também como um bem de toda a pessoa.

O voto de pobreza

13. A pobreza voluntária abraçada para seguir a Cristo, do que ela é um sinal hoje muito apreciado, seja diligentemente cultivada pelos religiosos e, se for necessário, exprima-se até sob novas formas. Por ela é participada a pobreza de Cristo, que sendo rico, por nosso amor se fez pobre, para que nós fôssemos ricos da sua pobreza (cfr. 2 Cor 8, 9; Mt. 8,20).

Pelo que toca, porém, à pobreza religiosa, não basta sujeitar-se aos Superiores no uso dos bens, mas é preciso que os religiosos sejam pobres real e espiritualmente, possuindo os seus tesouros no céu (cfr. Mt. 6,20).

Cada um no seu ofício, sintam-se todos sujeitos à lei comum do trabalho, e, enquanto buscam as coisas necessárias à sustentação e às obras, ponham de lado toda a solicitude exagerada e entreguem-se à Providência do Pai celeste (cfr. Mt. 6,25).

As Congregações religiosas podem permitir nas constituições que os seus membros renunciem aos bens patrimoniais adquiridos ou a adquirir. Os próprios Institutos, tendo em conta as condições de cada lugar, esforcem-se por dar um testemunho por assim dizer colectivo de pobreza, e de boa vontade concorram com alguma coisa dos próprios bens para as demais necessidades da Igreja e para a sustentação dos pobres a quem todos os religiosos devem amar nas entranhas de Cristo (cfr. Mt. 19,21; 25,34-46; Tg. 2.15-16; 1 Jo. 3,17). As províncias e as casas religiosas comuniquem umas com as outras nos bens temporais, de maneira que aquelas que têm mais, ajudem as que sofrem necessidade.

Embora os Institutos, salvas as regras e constituições, tenham direito a possuir o que é necessário à vida temporal e às próprias obras, evitem, contudo, toda a aparência de luxo, de lucro exagerado e de acumulação de bens.

O voto de obediência

14. Pela profissão da obediência, os religiosos oferecem a plena oblação da própria vontade como sacrifício de si mesmos a Deus, e por ele se unem mais constante e seguramente à vontade divina salvífica. Por isso, a exemplo de Jesus Cristo, que veio para fazer a vontade do Pai (cfr. Jo. 4,34; 5,30; Heb. 10,7; Salm. 39,9), e «tomando a forma de servo» (Fil. 2,7), aprendeu a obedecer por aquilo que padeceu (cfr. Heb. 5,8), os religiosos, sob a moção do Espírito Santo, sujeitam-se na fé aos Superiores, ;vigários de Deus, e por eles são levados a servir todos os seus irmãos em Cristo, da mesma maneira que o próprio Cristo, por causa da sua sujeição ao Pai, serviu os irmãos e deu a sua vida para redenção de muitos (cfr. Mt. 20,28; Jo. 10, 14-18). Assim, unem-se mais estreitamente ao serviço da Igreja e procuram chegar à medida da idade plena de Cristo (cfr. Ef. 4,13).

Portanto, os religiosos, em espírito de fé e de amor à vontade de Deus, obedeçam humildemente aos Superiores, segundo as próprias regras e constituições, colocando as forças da inteligência e da vontade bem como os dons da natureza e da graça na execução das ordens e no cumprimento dos cargos que lhes forem confiados, sabendo que estão a colaborar para a edificação do Corpo de Cristo segundo o desígnio de Deus. Desta maneira, a obediência religiosa, longe de diminuir a dignidade da pessoa humana, leva-a à maturidade, aumentando a liberdade dos filhos de Deus.

Os Superiores, porém, como quem deverá dar contas das almas que lhes foram confiadas (cfr. Heb. 13,17), dóceis à vontade de Deus no cumprimento do seu cargo, exerçam a autoridade em espírito de serviço a favor de seus irmãos, de tal maneira que sejam a expressão da caridade com que Deus os ama. Governem os súbditos como filhos de Deus e com respeito pela pessoa humana, promovendo a sua submissão voluntária. Por isso, deixem-lhes de modo particular a devida liberdade no que toca ao sacramento da Penitência e à direcção espiritual. Levem os súbditos a colaborar, com obediência activa e responsável, no desempenho das funções e na aceitação das empresas. Procurem, por isso, os Superiores ouvir de boa vontade os súbditos e promover a sua colaboração para bem do Instituto e da Igreja, mantendo, todavia, a sua autoridade para decidir e ordenar o que deve fazer-se.

Os Capítulos e os Conselhos cumpram fielmente a sua função no governo, e, cada um a seu modo, exprimam a participação e a solicitude de todos os membros no bem da comunidade inteira.

A vida comum: sua reforma e actualização

15. A vida comum, a exemplo do que sucedia na primitiva Igreja, onde a multidão dos fiéis era um só coração e uma só alma (cfr. Act. 4,32), alimentada pela doutrina evangélica, pela sagrada Liturgia e sobretudo pela Eucaristia, persevere na oração e na comunhão do mesmo espírito (cfr. Act. 2,42). Os religiosos, como membros de Cristo, honrem-se mùtuamente em fraterna conversação (cfr. Rom. 12,10), levando o peso uns aos outros (cfr. Gál. 6,2). Com efeito, mercê do amor de Deus difundido nos corações pelo Espírtio Santo (cfr. Rom. 5,5), a comunidade, como verdadeira família, reunida em nome do Senhor, goza da Sua presença (cfr. Mt. 18,20). O amor, porém, é a plenitude da lei (cfr. Rom. 13,10) e vínculo de perfeição (cfr. Col. 3,14), e sabemos que, mercê dele, fomos transferidos da morte para a vida (cfr. 1 Jo. 3,14). Mais ainda, a unidade dos irmãos manifesta o advento de Cristo (cfr. Jo. 13,15; 17,21), e dela dimana uma grande virtude apostólica.

Mas, para que seja mais íntimo o vínculo da fraternidade entre os religiosos, aqueles que dão pelo nome de irmãos conversos, coadjutores, etc., estejam estreitamente unidos à vida e aos trabalhos da comunidade. Se as circunstâncias não aconselharem verdadeiramente outra coisa, procure-se nos Institutos femininos chegar a uma só categoria de irmãs. Conserve-se apenas aquela distinção de pessoas que for exigida pela diversidade de trabalhos a que as irmãs são destinadas por uma particular vocação de Deus ou por uma especial aptidão.

Os mosteiros masculinos, porém, e os Institutos não meramente laicais, podem admitir, de harmonia com a sua natureza e segundo as próprias constituições, clérigos e leigos, que terão os mesmos direitos e os mesmos deveres, excepto naquelas coisas que provêm da Ordem sacra.

A clausura das monjas: sua reforma e actualização

16. A clausura papal mantem-se no seu rigor para as religiosas de vida exclusivamente contemplativa; seja, porém, adaptada, depois de ouvido o parecer dos próprios mosteiros, segundo as condições de tempo e lugar, suprimindo os costumes que forem obsoletos.

As outras religiosas que, por força do Instituto, se dedicam às obras externas do apostolado, sejam dispensadas da clausura papal para poderem realizar melhor os encargos apostólicos que lhes forem confiados, conservando, porém, a clausura segundo as próprias constituições.

O hábito religioso: sua reforma e actualização

17. O hábito religioso, como sinal de consagração, seja simples e modesto, simultâneamente pobre e condigno, e, além disso, consentâneo com as exigências da saúde e acomodado às condições de tempo e lugar e às necessidades do ministério. O hábito, masculino ou feminino, que não estiver de harmonia com estas normas, deve ser mudado.

A formação: sua reforma e actualização

18. A conveniente renovação dos Institutos depende sobretudo da formação dos membros. Por isso, não se destinem às obras de apostolado imediatamente depois do noviciado os religiosos não clérigos e as religiosas, mas prolongue-se convenientemente, em casas aptas, a sua formação religiosa e apostólica, doutrinal e técnica, sem excluir até a consecução de, títulos convenientes.

Para que a adaptação da vida religiosa às exigências do nosso tempo não seja meramente externa, nem se dê o caso de aqueles que se destinam, por força do Instituto, ao apostolado externo, não se encontrarem preparados para o seu múnus, sejam convenientemente instruídos, segundo os dotes intelectuais e a índole pessoal de cada um, acerca dos hábitos e dos modos de sentir e pensar da vida social hodierna. A formação seja de tal modo orientada que concorra pela harmónica fusão dos seus elementos, para dar unidade à vida dos religiosos.

Durante toda a vida, procurem os religiosos completar cuidadosamente esta cultura espiritual, doutrinal e técnica; e os Superiores dêem-lhes, tanto quanto puderem, oportunidade, ajuda e tempo para isso.

É também dever dos Superiores cuidar que os Directores, os mestres de espírito e os Professores sejam muito bem escolhidos e cuidadosamente preparados.

Fundação de novos Institutos

19. Na fundação de novos Institutos, pondere-se atentamente a necessidade ou pelo menos a sua grande utilidade, assim como a possibilidade de desenvolvimento, para que não surjam imprudentemente Institutos inúteis ou desprovidos de suficiente vigor. Promovam-se e cultivem-se de modo especial nas cristandades recentes aquelas formas de vida religiosa que se adaptem à índole, costumes, tradições e situações dos seus habitantes.

Conservação, adaptação ou abandono das obras próprias

20. Mantenham e realizem fielmente os Institutos as obras que lhes são próprias, e acomodem-nas, tendo em conta a utilidade da Igreja universal e das dioceses, às necessidades dos lugares, provendo-as de meios ; oportunos e até novos, e abandonando as obras que hoje estão menos conformes com genuíno espírito e natureza do Instituto.

Conserve-se inteiramente o espírito missionário nos Institutos religiosos e adapte-se, segundo a índole de cada um às condições dos nossos dias, de tal maneira que a pregação do Evangelho se torne cada vez mais eficaz junto de todos os povos.

Institutos e mosteiros decadentes

21. Os Institutos e mosteiros que, uma vez ouvido o parecer dos Ordinários de lugar a quem dizem respeito, não derem, a juízo da Santa Sé, fundada esperança de vir a florescer posteriormente, sejam proibidos de receber noviços no futuro e, se for possível, unam-se a outros Institutos ou mosteiros, que não difiram muito do seu fim e do seu espírito

Promoção da união entre os Institutos

22. Os Institutos e mosteiros autónomos, segundo a oportunidade o pedir e com a aprovação da Santa Sé, promovam entre si federações, se de algum modo pertencem à mesma família religiosa, ou uniões, se tiverem quase as mesmas constituições e costumes e forem informados do mesmo espírito, sobretudo quando são demasiadamente pequenos; ou ainda associações, se se derem às mesmas ou semelhantes obras externas.

Conferências de Superiores Maiores

23. Devem favorecer-se as Conferências ou conselhos de Superiores maiores erectos pela. Santa Sé, que muito podem contribuir para conservação mais perfeita do fim de cada Instituto, para uma mais eficaz colaboração para o bem da Igreja, distribuição de operários do Evangelho em determinado território de forma mais equitativa, assim como para tratar os negócios comuns dos religiosos, estabelecendo-se a conveniente coordenação e a cooperação com as Conferências episcopais quanto ao exercício do apostolado.

As mesmas Conferências podem ser estabelecidas para os Institutos seculares.

Promoção das vocações religiosas

24. Os sacerdotes e educadores cristãos empenhem-se sèriamente em dar às vocações religiosas, devida e atentamente seleccionadas, um novo incremento que corresponda perfeitamente às necessidades da Igreja. Mesmo na pregação ordinária fale-se frequentemente dos conselhos evangélicos e do estado religioso. Os pais, na educação cristã dos filhos, cultivem e protejam nos seus corações a vocação religiosa.

É lícito aos Institutos divulgar o conhecimento de si mesmos, para promover as vocações e encontrar candidatos, contanto que o façam com a devida prudência e segundo as normas dadas pela Santa Sé e pelos Ordinários de lugar.

Lembrem-se, porém, os religiosos que o exemplo da própria vida é a melhor recomendação do seu Instituto e um convite a abraçar a vida religiosa.

Conclusão: Correspondência dos Institutos à graça da vocação

25. Os Institutos, para os quais se dão estas normas de adaptação e renovação, correspondam de ânimo generoso à sua divina vocação e à sua missão nos actuais tempos da Igreja. Este sagrado Concílio estima muito o seu género de vida, feita de virgindade, pobreza e obediência, de que o próprio Cristo Senhor nosso foi exemplo, e deposita uma firme esperança no seu tão fecundo trabalho escondido e manifesto. Todos os religiosos, portanto, difundam no mundo inteiro a boa nova de Cristo, pela integridade da sua fé, caridade para com Deus e para com o próximo, amor à cruz e esperança da glória futura, a fim de que o seu testemunho seja visível a todos e glorificado o nosso Pai que está nos céus (cfr. Mt. 5,16). Assim. por intercessão da dulcíssima Virgem Maria, Mãe de Deus, «cuja vida é para todos ensinamento» (S. Ambrósio, De Virginitate, L. II, c. II, n. 15.), receberão cada dia maior incremento e clarão frutos mais abundantes.

Vaticano, 28 de Outubro de 1965

PAPA PAULO VI


++++++++++++++++++++++++



DECRETO
CHRISTUS DOMINUS

SOBRE O MÚNUS PASTORAL
DOS BISPOS NA IGREJA

PROÉMIO

Os Apóstolos, continuadores da missão de Cristo

1. Cristo Senhor, Filho de Deus vivo, que veio salvar o seu povo dos pecados (1) e santificar todos os homens, assim como Ele foi enviado pelo pai, assim também enviou os seus Apóstolos (2), a quem santificou, dando-lhes o Espírito Santo, para que também eles glorificassem o Pai na terra e salvassem os homens, «para a edificação do corpo de Cristo» (Ef. 4, 12), que é a Igreja.

A sucessão de Pedro e dos Apóstolos

2. Nesta Igreja de Cristo, o Romano Pontífice, como sucessor de Pedro, a quem o mesmo Cristo mandou que apascentasse as suas ovelhas e os seus cordeiros, está revestido, por instituição divina, de poder supremo, pleno, imediato e universal, em ordem à cura das almas. Por isso, tendo sido enviado como pastor de todos os fiéis para promover o bem comum da Igreja universal e o de cada uma das igrejas particulares, ele tem a supremacia do poder ordinário sobre todas as igrejas.

Por outro lado, porém, também os Bispos, constituídos pelo Espírito Santo, sucedem aos Apóstolos como pastores das almas, (3) e, juntamente com o Sumo Pontífice e sob a sua autoridade, foram enviados a perpetuar a obra de Cristo, pastor eterno.(4) Na verdade, Cristo deu aos Apóstolos e aos seus sucessores o mandato e o poder de ensinar todas as gentes, de santificar os homens na verdade e de os apascentar. Por isso, foram os Bispos constituídos, pelo Espírito Santo que lhes foi dado, verdadeiros e autênticos mestres, pontífices e pastores (5).

O ministério colegial e individual dos Bispos

3. Os Bispos, participando da solicitude por todas as igrejas, exercem este seu ministério, recebido pela sagração episcopal, (6) em união com o Sumo Pontífice e sob a sua autoridade, naquilo que se refere ao magistério e ao governo pastoral: todos unidos num colégio ou corpo a favor de toda a Igreja de Deus.

Individualmente, exercem-no para com a porção do rebanho do Senhor a cada um assinalada, quando cada um cuida da igreja particular que lhe fora confiada, ou quando vários reunidos provêem a certas necessidades comuns a diversas igrejas. Por isso, o sagrado Concílio, tendo em conta as condições da sociedade humana, que em nossos dias está evoluindo para uma ordem nova, (7) e desejando determinar mais em particular o múnus pastoral dos Bispos, estabelece tudo quanto segue.

CAPÍTULO I
OS BISPOS E A IGREJA UNIVERSAL


I — O PAPEL DOS BISPOS NA IGREJA UNIVERSAL

Exercício do poder do Colégio Episcopal

4. Os Bispos, em virtude da sua consagração sacramental e pela comunhão hierárquica com a cabeça e os membros do colégio, são constituídos membros do corpo episcopal (1). «A ordem dos Bispos, porém, que sucede ao colégio dos Apóstolos no magistério e no governo pastoral, e, mais ainda, na qual o corpo apostólico se continua perpètuamente, é também, juntamente com o Romano Pontífice, sua cabeça, e nunca sem a cabeça, sujeito do supremo e pleno poder sobre toda a Igreja, poder este que não se pode exercer senão com o consentimento do Romano Pontífice» (2). Este poder «exerce-se solenemente no Concílio Ecuménico»(3): por isso, determina o sagrado Concílio que todos os Bispos, membros do colégio episcopal, têm direito a tomar parte nos Concílios Ecuménicos.

«O mesmo poder colegial pode ser exercido, juntamente com o Papa, pelos Bispos espalhados pelo mundo, contanto que a cabeça do colégio os chame a uma acção colegial ou, pelo menos, aprove ou aceite livremente a acção conjunta dos Bispos dispersos, de forma que haja verdadeiro acto colegial» (4).

O Sínodo episcopal

5. Alguns Bispos das diversas regiões do mundo, escolhidos do modo e processo que o Romano Pontífice estabeleceu ou vier a estabelecer, colaboram mais eficazmente com o pastor supremo da Igreja formando um Conselho que recebe o nome de Sínodo Episcopal s. Este Sínodo, agindo em nome de todo o Episcopado católico, mostra ao mesmo tempo que todos os Bispos em comunhão hierárquica participam da solicitude por toda a Igreja (6).

Solicitude dos Bispos pela Igreja universal

6. Os Bispos, como legítimos sucessores dos Apóstolos e membros do colégio episcopal, considerem-se unidos sempre entre si e mostrem-se solícitos de todas as igrejas, pois cada um, por instituição divina e por exigência do múnus apostólico, é responsável por toda a Igreja, juntamente com os outros Bispos (7). Interessem-se particularmente por aquelas regiões em que não foi ainda anunciada a palavra de Deus ou em que, sobretudo por causa da escassez de sacerdotes, os fiéis correm perigo de se afastarem da prática dos mandamentos e até de perderem a fé.

Assim, procurem com todas as forças que as obras de evangelização e apostolado sejam sustentadas e promovidas com alacridade pelos fiéis. Esforcem-se também por preparar ministros sagrados aptos, e auxiliares, tanto religiosos como leigos, para as missões e territórios que não têm clero. Cuidem igualmente, quanto for possível, que alguns dos seus sacerdotes vão para essas missões ou dioceses, para exercer aí o ministério sagrado definitivamente ou, pelo menos, durante algum tempo. Lembrem-se, além disso, os Bispos que, no uso dos bens eclesiásticos, devem ter em conta as necessidades não só das próprias dioceses mas também das outras igrejas particulares, que fazem parte da única Igreja de Cristo. Apliquem-se, finalmente, a aliviar, na medida do possível, as calamidades que afligem outras dioceses ou regiões.

Caridade eficaz para com os Bispos perseguidos

7. Abracem com espírito fraternal e prestem ajuda sincera e eficaz sobretudo àqueles Bispos que, pelo nome de Cristo, são caluniados e perseguidos, se encontram encarcerados ou se vêem impedidos de exercer o seu ministério, para que as dores que eles sofrem, sejam aliviadas e suavizadas com a oração e a ajuda dos seus irmãos.

II — OS BISPOS E A SÉ APOSTÓLICA

Poder dos Bispos na sua própria diocese

8. a) Aos Bispos, como sucessores dos Apóstolos, compete de direito, na diocese a cada um confiada, todo o poder ordinário, próprio e imediato, que é necessário para o exercício do seu cargo pastoral, salvaguardado sempre em tudo o poder que, em razão do seu múnus, o Romano Pontífice tem de reservar causas a si ou a outra autoridade.

b) A cada um dos Bispos diocesanos é dada a faculdade de, em casos particulares, dispensar da lei geral da Igreja os fiéis sobre quem exercem autoridade segundo o direito, todas as vezes que a dispensa pareça útil para bem espiritual dos mesmos, a não ser que a suprema autoridade da Igreja tenha estabelecido alguma reserva.

Dicastérios da Cúria Romana; sua missão e renovação

9. No exercício do poder supremo, pleno e imediato sobre a Igreja universal, o Romano Pontífice serve-se dos Dicastérios da Cúria romana, que, por isso, trabalham em seu nome e com a sua autoridade, para bem das igrejas e em serviço dos sagrados pastores.

Desejam, todavia, os Padres do sagrado Concílio que estes Dicastérios, que prestaram, sem dúvida, precioso auxílio ao Romano Pontífice e aos pastores da Igreja, sejam reorganizados, segundo as necessidades dos tempos, das regiões e dos ritos, sobretudo quanto ao número, nome, competência e modo de proceder de cada um, bem como no que respeita à coordenação recíproca dos trabalhos. (8) Desejam também que, tendo em conta o múnus pastoral próprio dos Bispos, se determinem mais claramente as atribuições dos Núncios pontíficios.

Dicastérios da Cúria Romana: sua composição

10. Além disso, tendo sido criados estes Dicastérios para bem da Igreja universal, deseja-se que os seus membros, oficiais e consultores, e do mesmo modo os Núncios do Romano Pontífice, provenham mais, quanto for possível, das diversas regiões -da Igreja, de maneira que os serviços ou órgãos centrais da Igreja católica tenham carácter verdadeiramente universal.

Fazem-se igualmente votos por que, entre os membros dos Dicastérios, se contem também alguns Bispos, sobretudo diocesanos, que possam manifestar mais plenamente ao Sumo Pontífice a mentalidade, os anseios e as necessidades de todas as igrejas.

Por último, os Padres conciliares julgam muito útil que estes Dicastérios ouçam mais os leigos que se distinguem pela virtude, ciência e experiência, para que também estes influam, quanto convém, nas coisas da Igreja.

CAPÍTULO II
OS BISPOS E AS IGREJAS PARTICULARES OU DIOCESES

1-OS BISPOS DIOCESANOS

Noção de diocese e ofício do Bispo na diocese

11. Diocese é a porção do Povo de Deus, que se confia a um Bispo para que a apascente com a colaboração do presbitério, de tal modo que, unida ao seu pastor e reunida por ele no Espírito Santo por meio do Evangelho e da Eucaristia, constitui uma Igreja particular, na qual está e opera a Igreja de Cristo, una, santa, católica e apostólica.

Cada Bispo, a quem é confiada uma igreja particular, apascenta em nome do Senhor as suas ovelhas, sob a autoridade do Sumo Pontífice, como próprio, ordinário e imediato pastor, exercendo em favor das mesmas o múnus de ensinar, santificar e governar. Deve, porém, reconhecer os direitos que legitimamente competem quer aos Patriarcas quer a outras autoridades hierárquicas (1).

Apliquem-se os Bispos ao seu múnus apostólico como testemunhas de Cristo diante de todos os homens, interessando-se não só por aqueles que já seguem o Príncipe dos pastores, mas consagrando-se com toda a alma àqueles que de algum modo se transviaram do caminho da verdade ou ignoram o Evangelho e a misericórdia salvadora de Cristo, até conseguirem que todos caminhem «em toda a bondade, justiça e verdade» (Ef. 5, 9).

Dever de ensinar do Bispo

12. No exercício do seu múnus de ensinar, anunciem o Evangelho de Cristo aos homens, que é um dos principais deveres dos Bispos, (2) chamando-os à fé com a fortaleza do Espírito ou confirmando-os na fé viva. Proponham-lhes na sua integridade o mistério de Cristo, isto é, aquelas verdades que não se podem ignorar sem ignorar o mesmo Cristo. E ensinem-lhes o caminho que Deus revelou para ser glorificado pelos homens e estes conseguirem a bem-aventurança eterna (3).

Mostrem, além disso, que as coisas terrestres e as instituições humanas no plano de Deus Criador se ordenam também para a salvação dos homens e podem, por conseguinte, contribuir não pouco para a edificação do Corpo de Cristo.

Ensinem, por isso, quanto, segundo a doutrina da Igreja, valem a pessoa humana, com a sua liberdade e a própria vida corpórea; a família e a sua unidade e estabilidade, a procriação e a educação dos filhos; a sociedade civil, com as suas leis e profissões; o trabalho e o descanso, as artes e a técnica; a pobreza e a riqueza. Exponham, por fim, os princípios com que se hão-de resolver os problemas gravíssimos da posse, do aumento e da justa distribuição dos bens materiais, da paz e da guerra, e da convivência fraterna de todos os povos (4).

Métodos de ensinar

13. Expliquem a doutrina cristã com métodos apropriados às necessidades dos tempos, isto é, que respondam às dificuldades e problemas que mais preocupam e angustiam os homens; protejam também esta doutrina, ensinando os fiéis a defendê-la e a propagá-la. No modo de a ensinar, mostrem a solicitude maternal da Igreja para com todos os homens, quer fiéis quer infiéis, e tenham especial cuidado dos pobres e dos fracos, a quem o Senhor os mandou evangelizar.

Sendo dever da Igreja entrar em diálogo com a sociedade humana, no meio da qual vive (5), cabe primeiramente aos Bispos ir ter com os homens e provocar e fomentar o diálogo com eles. Mas, para que se alie sempre a verdade com a caridade, e a compreensão com o amor, convém que estes diálogos de salvação se imponham não só pela clareza da linguagem e pela humildade e mansidão, mas também pela devida prudência, aliada, porém, à confiança, porque esta, fomentando a amizade, une por sua natureza os espíritos (6).

Para anunciar a doutrina cristã, esforcem-se por utilizar os vários meios de que dispomos actualmente: primeiramente, a pregação e a formação catequética, que sempre conservam o primeiro lugar; mas também a exposição da doutrina nas escolas e centros culturais, por meio de conferências e em reuniões de todo o género, feitas por ocasião de certos acontecimentos, por meio da imprensa e dos vários instrumentos de comunicação social, dos quais é necessário usar para anunciar o Evangelho de Cristo (7).

Instrução catequética

14. Vigiem que a instrução catequética, que se orienta a fazer com que a fé, ilustrada pela doutrina, se torne viva, explícita e operosa nos homens, seja cuidadosamente ministrada quer às crianças e aos adolescentes, quer aos jovens, quer até aos adultos: procurem que esta instrução seja dada segundo a ordem e o método que mais convêm não só à matéria de que se trata mas também à índole, capacidade, idade e condições de vida dos ouvintes, e que se baseie na Sagrada Escritura, na Tradição, na Liturgia, no magistério e na vida da Igreja.

Procurem, além disso, que os catequistas se preparem devidamente, adquirindo perfeito conhecimento da doutrina da Igreja e aprendendo teórica e pràticamente as leis psicológicas e as ciências pedagógicas.

Esforcem-se também por estabelecer ou organizar melhor a formação dos catecúmenos adultos.

Dever de santificar do Bispo

15. No exercício do seu múnus de santificar, lembrem-se os Bispos que foram escolhidos dentre os homens e constituídos a favor dos homens nas coisas que se referem a Deus, para oferecerem dons e sacrifícios pelos pecados. Na verdade, os Bispos têm a plenitude do sacramento da Ordem, e deles dependem, no exercício do seu poder, quer os presbíteros — que são consagrados verdadeiros sacerdotes do Novo Testamento para serem cooperadores providentes da ordem episcopal — quer os diáconos, ordenados para servir o Povo de Deus em união com o Bispo e com o seu presbitério; os Bispos são, portanto, os principais dispensadores dos mistérios de Deus, como também ordenadores, promotores e guardas da vida litúrgica na igreja a si confiada (8).

Não se poupem, por isso, a esforços para que os fiéis, por meio da Eucaristia, conheçam e vivam cada vez mais perfeitamente o mistério pascal, de modo a formarem um corpo bem compacto na unidade da caridade de Cristo; (9) «insistindo na oração e no ministério da palavra» (Act. 6, 4) esforcem-se por que todos aqueles que estão entregues aos seus cuidados sejam unânimes na oração (10), e, por meio da recepção dos sacramentos, cresçam na graça e sejam testemunhas fiéis do Senhor.

Como santificadores, procurem os Bispos promover a santidade dos seus clérigos, dos religiosos e dos leigos, segundo a vocação de cada um (11), lembrando-se da obrigação que têm de dar exemplo de santidade pela caridade, humildade e simplicidade de vida. Santifiquem de tal modo as igrejas que lhes estão confiadas, que nelas brilhe plenamente o modo de sentir de toda a Igreja de Cristo. Por isso, promovam o mais possível as vocações sacerdotais e religiosas, e de modo particular as missionárias.

Dever de reger e apascentar do Bispo

16. No exercício do seu múnus de pais e pastores, comportem-se os Bispos no meio dos seus como quem serve (12), como bons pastores que conhecem as suas ovelhas e por elas são conhecidos como verdadeiros pais que se distinguem pelo espírito de amor e de solicitude para com todos, de modo que todos se submetam fàcilmente à sua autoridade recebida de Deus. Reunam à sua volta a família inteira da sua grei e formem-na de tal modo que todos, conscientes dos seus deveres, vivam e operem em comunhão de caridade.

Para conseguirem este objectivo, os Bispos, «preparados para toda a obra boa» (2 Tim. 2,21) e «suportando tudo por amor dos eleitos» (2 Tim. 2,10), orientem a sua vida de maneira que ela corresponda às necessidades dos tempos

Abracem sempre com especial caridade os sacerdotes, que compartilham das suas funções e solicitude, e tão zelosamente satisfazem esses deveres com o trabalho de cada dia, considerando-os como filhos e amigos (13), e, portanto, mostrando-se prontos a ouvi-los e tratando-os com confiança, procurem dar nova vida a toda a actividade pastoral da diocese inteira.

Preocupem-se com as condições espirituais, intelectuais e materiais dos mesmos, para que possam viver santa e piamente, e exercer com fidelidade e fruto o seu ministério. Com este fim, favoreçam as instituições e organizem reuniões espirituais, a que os sacerdotes acorram algumas vezes quer para fazer exercícios espirituais mais longos em ordem à renovação da vida, quer para se aperfeiçoarem nas ciências eclesiásticas, sobretudo na Sagrada Escritura e na teologia, nas questões sociais mais importantes, bem como nos novos métodos de acção pastoral. Tenham uma compaixão prática pelos sacerdotes que se encontram nalgum perigo ou faltaram já a alguns dos seus deveres.

Para poderem atender melhor ao bem dos fiéis, segundo a condição de cada um, procurem conhecer-lhes bem as necessidades, dentro das circunstâncias sociais em que vivem, recorrendo aos meios convenientes, sobretudo à investigação social. Mostrem interesse por todos, de qualquer idade, condição ou nacionalidade que sejam, quer pelos naturais da terra, quer pelos adventícios e peregrinos. No exercício desta solicitude pastoral, respeitem a parte que pertence aos seus fiéis em matéria eclesiástica, reconhecendo-lhes também a obrigação e o direito de colaborar activamente na edificação do Corpo místico de Cristo.

Estendam o seu amor aos irmãos separados, recomendando também aos fiéis que os tratem com grande delicadeza e caridade, e favorecendo o ecumenismo, como o entende a Igreja (14). Estimem igualmente os não baptizados, para que também a eles se revele a caridade de Jesus Cristo, de quem os Bispos são testemunhas diante de todos.

Formas especiais de apostolado

17. Favoreçam-se as várias formas de apostolado e, em toda a diocese e em cada uma das suas partes, a coordenação e a união de todas as obras apostólicas sob a direcção do Bispo, de maneira que todas as iniciativas e instituições de carácter catequético, missionário, caritativo, social, familiar e escolar, e qualquer outro trabalho com finalidade pastoral, tenham um desenvolvimento harmónico, o que ao mesmo tempo fará sobressair mais a unidade da diocese.

Inculque-se com insistência a obrigação que todos os fiéis têm de exercer o apostolado, segundo a própria condição e capacidade; e recomende-se-lhes que dêem o seu nome e apoio às várias obras de apostolado dos leigos, sobretudo à Acção Católica. Promovam-se também e favoreçam-se as associações que têm em vista, directa ou indirectamente, um fim sobrenatural, isto é, a consecução de vida mais perfeita, a propagação do Evangelho de Cristo, a difusão da doutrina cristã, o incremento do culto público, a resolução de problemas sociais, ou ainda o exercício de obras de piedade ou caridade.

Os métodos de apostolado adaptem-se perfeitamente às necessidades actuais, tendo em vista as novas condições, não só espirituais e morais, mas também sociais, demográficas e económicas. Para se conseguir essa adaptação com eficácia e fruto, serão muito úteis os inquéritos sociais e religiosos, realizados por centros de sociologia pastoral que muito se recomendam.

Solicitudes pastorais especiais

18. Atenda-se com especial solicitude àqueles fiéis que, pelas suas condições de vida, não podem beneficiar suficientemente do ministério pastoral ordinário dos párocos, ou se vêem dele completamente privados, como é o caso de muitíssimos emigrantes, exilados e refugiados, marinheiros e aviadores, nómadas, etc. Promovam-se métodos convenientes de assistência espiritual àqueles que se deslocam temporàriamente a outros lugares para passarem as férias.

As Conferências episcopais, sobretudo as nacionais, examinem atentamente os problemas mais urgentes relativos às sobreditas categorias de pessoas, e de comum acordo e em união de esforços, com meios e instituições adequadas, procurem favorecer a assistência religiosa das mesmas, tendo presentes as normas estabelecidas (15) ou a estabelecer pela Sé Apostólica, adaptadas às condições de tempos, lugares e pessoas.

Liberdade dos Bispos e suas relações com a autoridade civil

19. No exercício do seu ministério apostólico, ordenado à salvação das almas, os Bispos têm de direito liberdade plena e perfeita, e independência de qualquer poder civil. Por isso, não é lícito impedir-lhes directa ou indirectamente o exercício do seu múnus eclesiástico nem proibir-lhes de comunicarem livremente com a Sé Apostólica, com as outras autoridades eclesiásticas e com os seus súbditos.

Sem dúvida, os sagrados pastores, quando atendem ao bem espiritual dos seus rebanhos, favorecem ao mesmo tempo o progresso social e civil, e fomentam a prosperidade, colaborando eficazmente para tal fim com as autoridades públicas — em virtude do seu ofício, e como convém a Bispos — e recomendando a obediência às leis justas e o respeito às autoridades legitimamente constituídas.

Liberdade na nomeação dos Bispos

20. Tendo sido instituído por Cristo Senhor o múnus apostólico dos Bispos, e visando ele a uma finalidade espiritual e sobrenatural, o sagrado Concílio Ecuménico declara que o direito de nomear e criar os Bispos é próprio, peculiar e, por sua natureza, exclusivo da competente autoridade eclesiástica.

Por isso, para defender devidamente a liberdade da Igreja e promover mais eficaz e prontamente o bem dos fiéis, o sagrado Concílio deseja que, de futuro, não se continuem a conceder às autoridades civis quaisquer direitos ou privilégios de eleição, nomeação, apresentação ou designação para o episcopado. As autoridades civis, porém, cuja deferência para com a Igreja o sagrado Concílio reconhece e aprecia com gratidão, pede-se com todo o respeito que, de acordo com a Sé Apostólica, renunciem espontâneamente aos sobreditos direitos ou privilégios de que gozem actualmente em virtude de concordata ou costume.

Renúncia do ministério Episcopal

21. Sendo o múnus pastoral dos Bispos de tanta importância e responsabilidade, pede-se instantemente aos Bispos diocesanos e aos outros a eles equiparados pelo direito que, vendo-se menos aptos para exercer o seu ministério por motivo de idade avançada ou por outra causa grave, apresentem a renúncia do seu cargo, ou espontâneamente ou a convite da autoridade competente. Por sua parte, esta autoridade competente, se a aceitar, providenciará para que não lhes falte a justa sustentação e lhes sejam reconhecidos peculiares direitos.

II — OS LIMITES DAS DIOCESES

Necessidade de rever as circunscrições das dioceses

22. Para se conseguir a finalidade própria da diocese, é preciso que a natureza da Igreja se manifeste claramente no Povo de Deus que pertence à diocese; que os Bispos possam cumprir eficazmente nelas. os próprios deveres pastorais; e que, finalmente, se atenda, o mais perfeitamente possível, à salvação do Povo de Deus.

Isto exige quer a conveniente delimitação territorial das dioceses, quer uma distribuição dos clérigos e dos recursos racional e correspondente às exigências do apostolado. Tudo isto reverte em benefício não só dos clérigos e dos fiéis directamente interessados mas também de toda a Igreja católica.

Portanto, em matéria de limites das dioceses, o sagrado Concílio dispõe que, na medida em que o bem das almas o exigir, quanto antes se realize com prudência a conveniente revisão, dividindo ou desmembrando ou unindo dioceses, alterando limites ou transferindo para locais mais convenientes as sedes episcopais, ou, por fim, sobretudo quando se tratar de dioceses que compreendem grandes cidades, dando-lhes nova organização interna.

Normas gerais

23. Na revisão dos limites das dioceses, salvaguarde-se, primeiro que tudo, a unidade orgânica de cada diocese quanto a pessoas, cargos e instituições, à semelhança dum corpo vivo. Em cada caso, depois de examinadas atentamente todas as circunstâncias, tenham-se presentes os critérios gerais seguintes:

1) Ao determinar os limites da diocese, atenda-se, quanto possível, à variedade da composição do Povo de Deus, o que muito pode concorrer para o melhor exercício da acção pastoral. Ao mesmo tempo, faça-se o possível por que os agrupamentos demográficos, com os organismos civis e as instituições sociais que constituem a sua estrutura orgânica, se conservem unidos quanto for possível. Por isso, o território de cada diocese deve apresentar-se contínuo.

Se o caso o permitir, atenda-se aos limites das circunscrições civis, e também às circunstâncias particulares de pessoas e lugares: psicológicas, económicas, geográficas, históricas.

2) Geralmente, a extensão do território diocesano e o número dos seus habitantes sejam tais que, por um lado, o Bispo, embora ajudado por outros, possa exercer os seus deveres pontificais, fazer convenientemente as visitas pastorais, dirigir e coordenar todas as obras de apostolado, e, sobretudo, conhecer os seus sacerdotes e também os religiosos e os leigos que participam de algum modo nas actividades diocesanas; e, por outro lado, haja campo suficiente e capaz, no qual tanto o Bispo como os sacerdotes possam aplicar ùtilmente todas as suas forças no ministério, sem esquecer as necessidades da Igreja inteira.

3) Por último, para que na diocese se possa atender melhor ao ministério da salvação, tenha-se como regra que em cada diocese há-de haver clérigos, pelo menos suficientes em número e preparação, que se dediquem a cultivar devidamente o Povo de Deus; não faltem os serviços, instituições e obras que são próprios duma igreja particular e que se reconhecem necessários para o bom governo e apostolado; deve haver, finalmente, para a sustentação das pessoas e das instituições diocesanas, os meios necessários certos ou pelo menos a previsão prudente de que eles não hão-de faltar vindos doutras fontes.

Também para este fim, onde há fiéis de rito diverso, proveja o Bispo diocesano às necessidades particulares deles, por meio de sacerdotes ou paróquias do mesmo rito, ou por meio dum Vigário episcopal munido das convenientes faculdades e, se for necessário, revestido de carácter episcopal - ou desempenhando o Bispo diocesano por si mesmo o múnus de Ordinário de ritos diversos. Mas, se nada disto, a juízo da Sé Apostólica, se puder realizar por motivos especiais, constitua-se então uma hierarquia própria para cada rito (16).

Em circunstâncias análogas, proveja-se à necessidade dos fiéis de língua diversa por meio de sacerdotes ou paróquias dessa língua, ou por meio dum Vigário episcopal que a conheça perfeitamente e possua, se necessário, o carácter episcopal, ou ainda doutro modo mais conveniente.

Consultas das Conferências episcopais

24. Antes de, segundo os números 22 e 23, se proceder a mudanças ou inovações nas dioceses, é recomendável que, salvaguardada a disciplina das Igrejas orientais, estes assuntos sejam examinados pelas Conferências episcopais competentes, cada uma em seu território; e recorra-se mesmo, se parecer conveniente, a uma Comissão especial constituída pelos Bispos das províncias ou das regiões interessadas no caso. Em seguida, comuniquem os pareceres e votos à Sé Apostólica.

III - COOPERADORES DO BISPO DIOCESANO NO MÚNUS PASTORAL

1. Bispos Coadjutores e Auxiliares

Normas para a sua constituição

25. No governo das dioceses, proveja-se de tal modo ao múnus pastoral dos Bispos que o bem do rebanho do Senhor seja sempre a regra suprema. Este bem, para ser devidamente atingido, exigirá não raro que se constituam Bispos Auxiliares, em virtude de o Bispo diocesano — pela excessiva extensão da diocese, pelo exagerado número de habitantes, por condições especiais do apostolado ou por outras causas várias — não poder cumprir por si mesmo todas as obrigações episcopais, segundo as exigências do bem das almas. As vezes, é uma necessidade especial que exige se dê ao Bispo diocesano um Bispo Coadjutor para o ajudar. Estes Bispos Coadjutores e Auxiliares devem receber as convenientes faculdades, para que, salvas sempre a unidade do governo diocesano e a autoridade do Bispo diocesano, a acção deles seja mais eficaz e a dignidade episcopal melhor se assegure.

Ora, os Bispos Coadjutores e Auxiliares, uma vez que são chamados a participar da solicitude do Bispo diocesano, devem cumprir a sua missão de maneira que em tudo procedam de perfeita harmonia com ele. Mostrem também constante reverência e respeito ao Bispo diocesano, e este, por sua vez, ame fraternalmente e estime os Bispos Coadjutores e Auxiliares.

Suas faculdades

26. Quando o bem das almas o requerer, não tenha dificuldade o Bispo diocesano em pedir à autoridade competente um ou vários Auxiliares que são dados à diocese sem direito de sucessão.

Se o documento de nomeação nada disser, o Bispo diocesano faça o seu Auxiliar Vigário Geral ou, se forem vários, Vigários Gerais ou, pelo menos, Vigários episcopais, só dependentes da sua autoridade. E queira consultá-los sobre os problemas de maior importância, principalmente de carácter pastoral.

A não ser que outra coisa seja determinada pela autoridade competente, os poderes e faculdades que por direito têm os Bispos Auxiliares, não expiram com a cessação no cargo do Bispo diocesano. E mesmo desejável que ao vagar a Sé, não havendo razões graves que aconselhem o contrário, o encargo de governar a diocese seja confiado ao Bispo Auxiliar, ou a um dos Auxiliares, se há vários.

O Bispo Coadjutor, isto é, aquele que é nomeado com direito de sucessão, sempre há-de ser constituído Vigário Geral pelo Bispo diocesano. Em casos particulares, poderá a autoridade competente conceder-lhe faculdades mais amplas.

Para o maior bem presente e futuro da diocese, o Bispo coadjuvado e o Bispo Coadjutor não deixem de se consultar mùtuamente, nas questões de maior importância.

2. Cúria e conselhos diocesanos

Organização da cúria e dos conselhos diocesanos

27. O cargo principal da Cúria diocesana é o de Vigário Geral. Mas, sempre que o exija o bom governo da diocese, pode o Bispo nomear um ou vários Vigários episcopais, que, por direito, gozam do poder atribuído pelo direito comum ao Vigário Geral sobre uma determinada parte da diocese ou sobre um determinado género de assuntos ou sobre os fiéis dum determinado rito.

Entre os cooperadores do Bispo no governo da diocese, contam-se também os presbíteros que formam o seu senado ou conselho, como são os. membros do Cabido catedral, o grupo dos consultores ou outros conselhos, segundo as circunstâncias e a índole dos diversos lugares. Estas instituições, sobretudo os Cabidos catedrais, hão-de reorganizar-se, quanto for necessário, para que se acomodem às necessidades actuais.

Os sacerdotes e os leigos, que pertencem à Cúria diocesana, lembrem-se de que prestam auxílio ao ministério pastoral do Bispo.

Organize-se a Cúria diocesana de modo que seja instrumento apto nas mãos do Bispo, não só para administrar a diocese mas também para fomentar as obras de apostolado.

É muito para desejar que se estabeleça em cada diocese um Conselho pastoral, a que presida o Bispo diocesano e do qual façam parte clérigos, religiosos e leigos bem escolhidos. Terá, como missão, investigar e apreciar tudo o que diz respeito às actividades pastorais e formular conclusões práticas.

3. Clero diocesano

Sacerdotes diocesanos

28. Todos os presbíteros, quer diocesanos quer religiosos, participam e exercem com o Bispo o sacerdócio único de Cristo; estão, pois, constituídos cooperadores providentes da ordem episcopal. Mas, na cura de almas, os primeiros são os sacerdotes diocesanos, porque eles, estando incardinados ou aplicados a uma igreja particular, consagram-se inteiramente ao serviço dela, a fim de pastorearem uma parte do rebanho do Senhor; constituem, por isso, um só presbitério e uma só família, de que o Bispo é o pai. Este, para poder distribuir com mais acerto e equidade os ministérios sagrados entre os seus sacerdotes, deve ter a liberdade necessária para conferir os ofícios e benefícios, ficando suprimidos os direitos ou privilégios que de algum modo coarctem essa liberdade.

As relações entre os Bispos e os sacerdotes diocesanos hão-de fundar-se sobretudo nos vínculos de caridade sobrenatural, de maneira que a unidade de vontade entre os sacerdotes e o Bispo torne mais fecunda a actividade pastoral de todos. Por isso, a fim de se promover mais e mais o serviço das almas, não deixe o Bispo de chamar os sacerdotes para conversar com eles, mesmo com vários juntos, sobre assuntos pastorais; isto, não só ocasionalmente mas mesmo em tempos determinados, quanto for possível.

Além disso, mantenham-se unidos entre si todos os sacerdotes diocesanos, e sintam-se corresponsáveis pelo bem espiritual de toda a diocese; e lembrando-se que os bens materiais, adquiridos no exercício do ofício eclesiástico, estão intimamente ligados ao múnus sagrado, socorram generosamente as necessidades materiais da diocese, segundo as indicações do Bispo e as próprias disponibilidades.

Sacerdotes dedicados a obras supra-paroquiais

29. Muito próximos cooperadores do Bispo são também aqueles sacerdotes, a quem ele confia um cargo pastoral ou obras de apostolado de natureza supra-paroquial, seja num território determinado da diocese ou com grupos especiais de fiéis, seja ainda para o exercício duma forma particular de actividade.

Prestam igualmente colaboração preciosa aqueles sacerdotes, a quem o Bispo confia diversos cargos de apostolado quer nas escolas quer noutros institutos ou associações. Também os sacerdotes, dedicados a obras supra-diocesanas, uma vez que realizam excelente trabalho de apostolado, são dignos de particular consideração, sobretudo por parte do Bispo em cuja diocese vivem.

Párocos e seus cooperadores

30. Os principais colaboradores do Bispo são, todavia, os párocos, a quem, como pastores próprios, é confiada, sob a autoridade do Bispo, a cura de almas numa parte determinada da diocese.

1) No desempenho desta cura de almas, os párocos, com os seus coadjutores, exerçam de tal maneira o seu ministério de ensinar, santificar e governar, que os fiéis e as comunidades paroquiais se sintam de facto membros tanto da diocese como do todo que forma a Igreja universal. Colaborem, portanto, com outros párocos e com outros sacerdotes que ou exercem o múnus pastoral no território (como são, por exemplo, os vigários forâneos, os arciprestes) ou estão dedicados a obras de carácter supra-paroquial, para que na diocese não falte unidade ao ministério pastoral e este se torne até mais eficaz.

Além disso, seja a cura de almas sempre penetrada de espírito missionário para abranger, como deve, todos os que vivem na paróquia. Mas, se os párocos não puderem atingir por si mesmos alguns grupos, recorram a outras pessoas, mesmo a leigos, que os auxiliem no apostolado.

Para que aumente a eficácia desta cura de almas, recomenda-se insistentemente a vida comum dos sacerdotes, sobretudo da mesma paróquia: ao mesmo tempo que facilita a actividade apostólica, dá aos fiéis o exemplo de caridade e união.

2) No desempenho do múnus de ensinar, os párocos devem: pregar a palavra de Deus a todos os fiéis, para que estes, fundados na fé, na esperança e na caridade, cresçam em Cristo, e a comunidade cristã dê aquele testemunho de caridade que o Senhor recomendou (17); e, do mesmo modo, comunicar aos fiéis, pela instrução catequética, o conhecimento pleno do mistério da salvação, adaptado à idade de cada um. Para darem esta instrução, procurem não só o auxílio de religiosos mas igualmente a cooperação de leigos, erigindo a Confraria da Doutrina cristã.

Para levarem, a cabo o trabalho de santificação, procurem os párocos que a celebração do sacrifício eucarístico seja o centro e o ponto culminante de toda a vida da comunidade cristã; e esforcem-se também por que os fiéis se alimentem no espírito, recebendo com devoção e frequência os sacramentos e tomando parte consciente e activa na Liturgia. Lembrem-se também os párocos que o sacramento da Penitência contribui muitíssimo para fomentar a vida cristã; mostrem, por isso, facilidade em ouvir confissões, chamando até, sendo necessário, outros sacerdotes que saibam diversas línguas.

No cumprimento do dever pastoral, esforcem-se primeiramente os párocos por conhecer o próprio rebanho. E, como estão ao serviço de todas as ovelhas, promovam o progresso da vida cristã quer nos indivíduos, quer nas famílias, quer nas associações sobretudo de apostolado, quer ainda em toda a comunidade paroquial. Visitem, portanto, as casas e as escolas, segundo as exigências do múnus pastoral; atendam diligentemente à adolescência e juventude; amem paternalmente os pobres e os doentes; por fim, tenham especial cuidado dos operários e estimulem os fiéis a que auxiliem as obras de apostolado.

3) Os vigários paroquiais, sendo cooperadores do pároco, prestam diàriamente auxílio precioso e prático ao ministério pastoral exercido sob a autoridade do pároco. Haja, pois, entre este e os seus vigários, relações fraternais, caridade e reverência recíproca. Ajudem-se mùtuamente com conselhos, auxílios e exemplo. E realizem o trabalho paroquial com unidade de vontades e concordância de esforços.

Nomeação, mudança e renúncia dos párocos

31. Para ajuizar da idoneidade dum sacerdote para dirigir urna paróquia, tenha o Bispo em conta não só a ciência mas também a piedade, o zelo apostólico, e os outros dotes e qualidades que a boa cura de almas exige.

Além disso, uma vez que o ministério paroquial está todo em função do bem das almas, para que o Bispo proceda mais fácil e acertadamente à provisão das paróquias, suprimam-se, salvo o direito dos religiosos, quaisquer direitos de apresentação, nomeação e reserva, e, onde ela existia, a lei do concurso quer geral quer particular.

Os párocos tenham nas suas paróquias a estabilidade que pede o bem das almas. Portanto, suprimida a distinção entre párocos amovíveis e inamovíveis, reveja-se e simplifique-se o modo de proceder na transferência e remoção dos párocos, para que o Bispo, observando a equidade natural e canónica, possa prover melhor às exigências do bem das almas.

Por outro lado, aos párocos que, em virtude da idade avançada ou por outras causas graves, já não podem desempenhar com perfeição e fruto os próprios deveres, pede-se instantemente que renunciem ao cargo espontâneamente ou a convite do Bispo. E este proveja para que não falte aos renunciantes o sustento conveniente.

Erecção e modificações das paróquias

32. Por fim, seja a salvação das almas motivo para estabelecerem ou reverem erecções ou supressões de paróquias, ou quaisquer outras alterações que o Bispo poderá realizar por autoridade própria.

4. Os religiosos

Os religiosos e as obras de apostolado

33. A todos os religiosos — aos quais em tudo quanto segue são equiparados os membros dos outros Institutos que professam os conselhos evangélicos — incumbe, segundo a vocação particular de cada Instituto, o dever de trabalharem com todo o empenho e diligência na edificação e crescimento de todo o Corpo Místico de Cristo e no bem das igrejas particulares.

Devem atingir estes objectivos, primeiro com a oração, as obras de penitência e o exemplo de vida. Este sagrado Concílio exorta-os insistentemente a progredirem sempre na estima e consecução prática dos objectivos indicados. Mas devem, ao mesmo tempo, participar, cada vez com maior prontidão, segundo a índole de cada Instituto, nas obras exteriores de apostolado.

Os religiosos cooperadores do Bispo no apostolado

34. Os religiosos sacerdotes, que são consagrados presbíteros para serem cooperadores activos da ordem episcopal, podem prestar maior auxílio aos Bispos, hoje que são maiores as necessidades das almas. Deve, pois, dizer-se que pertencem verdadeiramente ao clero da diocese, uma vez que têm parte na cura de almas e no exercício das obras de apostolado sob a autoridade dos sagrados pastores.

E os outros religiosos, quer homens quer mulheres, que pertencem também de modo especial à família diocesana, prestam grande auxílio à sagrada hierarquia, e podem e devem aumentá-lo cada dia, à medida que as necessidades do apostolado vão crescendo.

Normas concretas

35. Para que as obras de apostolado em cada diocese se desenvolvam em concórdia e se mantenha a unidade na disciplina diocesana, estabelecem-se os princípios fundamentais seguintes:

1) Todos os religiosos, considerando os Bispos como sucessores dos Apóstolos, mostrem-lhes sempre respeito e reverência. Além disso, sempre que são encarregados legitimamente de obras de apostolado, devem cumprir essas missões de modo que sejam auxiliares subordinados aos Bispos (18). Mais: os religiosos anuam pronta e fielmente aos pedidos e desejos dos Bispos para assumirem maiores responsabilidades no ministério da salvação dos homens, respeitando-se, porém, a índole e as constituições de cada Instituto. Mas estas últimas, se for necessário, acomodem-se a este objectivo, segundo os princípios deste Decreto.

Sobretudo por causa das necessidades urgentes das almas e da escassez de clero diocesano, os Institutos religiosos não dedicados ùnicamente à vida contemplativa, podem ser chamados pelos Bispos para colaborar nos diversos ministérios pastorais, atendendo-se, contudo, à índole de cada um. E os Superiores religiosos favoreçam, quanto puderem, esta colaboração dos próprios súbditos, aceitando até paróquias mesmo só temporàriamente.

2) Os Religiosos, quando empregados no apostolado externo, mostrem-se penetrados do espírito do seu Instituto e conservem-se fiéis à observância regular e à obediência aos próprios Superiores; obrigação esta que mesmo os Bispos não deixarão de recomendar.

3) A isenção - em virtude da qual os religiosos são chamados a depender do Sumo Pontífice ou doutra autoridade eclesiástica, ficando subtraídos à jurisdição dos Bispos - diz sobretudo respeito à ordem interna dos Institutos, para que neles todas as coisas fiquem mais ajustadas e unidas, e melhor se atenda ao incremento e perfeição da vida religiosa (19); e também para que o Sumo Pontífice possa dispor deles para bem da Igreja universal (20), e as demais autoridades competentes para bem das igrejas a elas sujeitas.

Contudo, esta isenção não impede que os religiosos estejam sujeitos à jurisdição dos Bispos em cada diocese, segundo a norma do direito, quando o exijam o ministério pastoral dos Bispos e a cura de almas bem ordenada (21).

4) Todos os religiosos, tanto isentos como não isentos, estão sujeitos ao poder do Ordinário do lugar no que diz respeito ao culto divino público, salva a diversidade dos ritos; no que diz respeito à cura de almas, à pregração ao povo, à educação religiosa e moral, sobretudo das crianças, à instrução catequética, à formação litúrgica, ao decoro do estado clerical, e também às várias obras no que se refere ao apostolado. As escolas católicas dos religiosos estão também sujeitas ao Ordinário de lugar no que respeita em geral à organização e vigilância, mantendo-se, porém, o direito dos rellgiosos quanto à direcção. Do mesmo modo, estão os religiosos obrigados a observar todas as disposições que os Concílios ou as Conferências episcopais legitimamente estabelecerem para todos.

5) Favoreça-se a cooperação ordenada entre os vários Institutos religiosos, e entre estes e o clero diocesano. Haja também íntima coordenação de todas as obras e actividades apostólicas, a qual resulta principalmente daquela disposição de corações e de espíritos que se radica e funda na caridade. Promover esta coordenação, compete, para a Igreja universal, à Sé Apostólica; em cada diocese, ao seu Bispo; e finalmente, no próprio território, aos Sínodos patriarcais e às Conferências episcopais.

Pelo que toca às obras de apostolado exercidas pelos religiosos, queiram os Bispos ou as Conferências episcopais, e os Superiores religiosos ou as Conferências dos Superiores apreciar em comum os planos préviamente apresentados.

6) Para se fomentarem concordes e frutuosas relações mútuas entre os Bispos e os religiosos, queiram reunir-se, periòdicamente e sempre que pareça oportuno, os Bispos e os Superiores religiosos para tratar das questões que dizem respeito em geral ao apostolado no respectivo território.

CAPÍTULO III
OS BISPOS E O BEM COMUM DA IGREJA

I -SÍNODOS, CONCÍLIOS E SOBRETUDO CONFERÊNCIAS EPISCOPAIS

Sínodos e Concílios particulares

36. Desde os primeiros séculos da Igreja que os Bispos, postos à frente das igrejas particulares, movidos pela caridade fraterna e pelo zelo da missão universal confiada aos Apóstolos, uniram as suas forças e vontades para promoverem o bem comum e o de cada uma das igrejas. Com este fim, foram instituídos quer os Sínodos, quer os Concílios provinciais, quer mesmo os Concílios plenários, em que os Bispos estabeleceram para diversas igrejas um sistema comum quanto ao ensino das verdades da fé e à ordenação da disciplina eclesiástica.

Este sagrado Concílio Ecuménico deseja que a veneranda instituição dos Sínodos e Concílios retome novo vigor, para se prover mais adequada e eficazmente ao incremento da fé e à conservação da disciplina nas várias igrejas, segundo as exigências dos tempos.

Importância das Conferências Episcopais

37. Sobretudo nos nossos tempos, não é raro verem-se os Bispos impedidos de cumprir, de maneira apta e frutuosa, o seu múnus, se não tornam cada vez mais íntima e harmónica a colaboração com os outros Bispos. E como as Conferências episcopais — já constituídas em muitas nações — deram brilhantes provas de tornarem o apostolado mais fecundo, julga este sagrado Concílio que será muito conveniente que, em todo o mundo, os Bispos da mesma nação ou região se reunam periòdicamente em assembleia, para que, da comunicação de pareceres e experiências, e da troca de opiniões, resulte uma santa colaboração de esforços para bem comum das igrejas.

Por isso, estabelece o seguinte a respeito das Conferências episcopais:

Noção, estrutura, competência e cooperação das Conferências episcopais

38. 1) Conferência episcopal é uma espécie de assembleia em que os Bispos duma nação ou território exercem juntos o seu múnus pastoral, para conseguirem, por formas e métodos de apostolado conformes às circunstâncias do tempo, aquele bem maior que a Igreja oferece aos homens.

2) A Conferência episcopal pertencem todos os Ordinários de lugar de qualquer rito, com excepção dos Vigários Gerais, os Bispos Coadjutores, Auxiliares e outros que desempenham um cargo especial confiado pela Sé Apostólica ou pelas Conferências episcopais. Os restantes Bispos titulares, e também os Núncios do Romano Pontífice, só por causa do cargo que desempenham no território, não. são, de direito, membros da Conferência. O voto deliberativo pertence aos Ordinários de lugar e aos Coadjutores. Aos Auxiliares e outros Bispos, que têm o direito de tomar parte na Conferência, os estatutos desta atribuirão voto deliberativo ou só consultivo.

3) Cada Conferência episcopal redige os próprios estatutos, que serão revistos pela Sé Apostólica. Neles, hão-de constar, além doutros meios em vista, os organismos de maior importância para a consecução do fim proposto, como são, por exemplo; o Conselho permanente dos Bispos, ás Comissões episcopais e o Secretariado geral.

4) As decisões da Conferência episcopal, que forem legìtimamnte aprovadas com a maioria de pelo menos dois terços dos votos dos Prelados que fazem parte da Conferência com voto deliberativo, e revistas pela Sé Apostólica, tenham força para obrigar juridicamente nos casos em que o direito comum o prescrever ou uma ordem particular da Sé Apostólica, dada espontâneamente ou pedida pela mesma Conferência, o estabelecer.

5) Onde circunstâncias especiais o requeiram, poderão os Bispos de várias nações, com a aprovação da Sé Apostólica, constituir uma só Conferência. Favoreçam-se também relações entre as Conferências episcopais de nações diversas, para promover e defender um bem maior.

6) Recomenda-se encarecidamente aos Prelados das Igrejas orientais que, ao promoverem a disciplina da própria igreja nos Sínodos e ao fomentarem as actividades para bem da religião, tenham também em vista o bem comum do território todo onde se encontram várias igrejas de ritos diversos, e troquem também impressões em reuniões inter-rituais, segundo as normas que a autoridade competente vier a estabelecer.

II - DELIMITAÇÃO DAS PROVÍNCIAS ECLESIÁSTICAS
E ERECÇÃO DE REGIÕES ECLESIÁSTICAS

Princípio para a revisão das delimitações

39. O bem das almas exige a delimitação adequada não só das dioceses mas também das províncias eclesiásticas; sugere até a erecção de regiões eclesiásticas, para melhor se atender às necessidades do apostolado conforme as circunstâncias sociais e locais, e se tornarem mais fáceis e frutuosas as relações dos Bispos tanto entre si como com os Metropolitas e os outros Bispos da mesma nação, bem como dos Bispos com as autoridades civis.

Normas concretas

40. Portanto, a fim de se conseguirem os objectivos indicados, o sagrado Concílio dispõe o seguinte:

1) Revejam-se oportunamente os limites das províncias eclesiásticas e determinem-se, com novas e convenientes normas, os direitos e os privilégios dos Metropolitas.

2) Tenha-se como regra que todas as dioceses, e as outras circunscrições territoriais equiparadas às dioceses, devem ser incluídas em alguma província eclesiástica. Por isso, as dioceses, agora sujeitas imediatamente à Sé Apostólica e não unidas a nenhuma outra, formem nova província eclesiástica, se possível, ou agreguem-se à província eclesiástica mais próxima ou àquela que mais convenha, e sejam submetidas ao direito do Arcebispo metropolitano, segundo o direito comum.

3) Onde a utilidade o aconselhar, as províncias eclesiásticas disponham-se em regiões, a que se dará ordenação jurídica.

Consultas das Conferências Episcopais

41. Convém que as Conferências episcopais competentes examinem o assunto desta delimitação das províncias ou da erecção de regiões, segundo as normas já estabelecidas nos números 23 e 24 para a delimitação das dioceses, e proponham à Sé Apostólica as suas sugestões e desejos.

III- OS BISPOS COM ENCARGO INTERDIOCESANO

Constituição dos seus ofícios especiais e cooperação com os Bispos

42. Tornando-se cada vez mais necessário que os ministérios pastorais sejam dirigidos e promovidos de comum acordo, convém que, para serviço de todas ou de várias dioceses duma determinada região ou nação, se constituam alguns organismos, que podem ser confiados mesmo a Bispos. Recomenda, porém, o sagrado Concílio que, entre os Prelados ou Bispos, que desempenhem estes cargos, e os Bispos diocesanos e as Conferências episcopais, reinem sempre união e bom entendimento na acção pastoral, cujas linhas devem ser determinadas também pelo direito comum.

Vicariatos castrenses

43. Como a assistência espiritual aos soldados, por causa das condições particulares de vida que levam, exige grande cuidado, erija-se sendo possível, um vicariato castrense em cada nação. Tanto o Vigário como os capelães dediquem-se com zelo a este difícil apostolado, de acordo com os Bispos diocesanos (1). Para isso, os Bispos diocesanos concedam ao Vigário castrense o número suficiente de sacerdotes idóneos para este cargo, e favoreçam ao mesmo tempo as iniciativas para o bem espiritual dos soldados (2).

DISPOSIÇÃO GERAL

Revisão do Código de Direito Canónico e preparação de Directórios

44. Dispõe o sagrado Concílio que, na revisão do Código de Direito Canónico, se estabeleçam leis adequadas, segundo os princípios contidos neste Decreto, tendo presentes as observações que foram apresentadas ou pelas Comissões ou pelos Padres conciliares.

Dispõe também o sagrado Concílio que se redijam Directórios gerais para a cura de almas, tanto destinados aos Bispos como aos párocos, onde uns e outros encontrem métodos seguros para mais fácil e frutuoso desempenho das obrigações pastorais.

Redijam-se ainda quer um Directório especial sobre a cura pastoral dos grupos particulares de fiéis, segundo as circunstâncias de cada nação ou região, quer um Directório sobre a formação catequética do povo cristão, que exponha os princípios fundamentais, a orientação e também o modo de elaborar os livros acerca desta matéria. Na elaboração destes Directórios tenham-se igualmente em conta as observações apresentadas tanto pelas Comissões como pelos Padres conciliares.

Vaticano, 28 de Outubro de 1965.

PAPA PAULO VI


Notas

Proémio

1. Cfr. Mt. 1,21.

2. Cfr. Jo. 20,21.

3. Cfr. Conc. Vat. I, Const. dogm. I De Ecclesia Christi, cap. 3: Denz. 1828 (3061).

4. Cfr. Conc. Vat. I, Const. dogm. De Ecclesia Christi, Proémio: Denz. 1821 (3050).

5. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. Lumen gentium, cap. III, n° 21, 24, 25: AAS 57 (1965) p. 24-25, 29-31.

6. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. Lumen gentium, cap. III, n° 21: AAS 57 (1965) p. 24-25.

7. Cfr. João XXIII, Const. Apost. Humanae salutis, 25 dez. 1961: AAS 54 (1962) p. 6.

Capítulo I

1. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. Lumen gentium, cap. III, n.° 22: AAS 57 (1965) p. 25-27.

2. Conc. Vat. II, Const. dogm. Lumen gentium, ibid.

3. Conc. Vat. II, Const. dogm. Lumen gentium, ibid.

4. Conc. Vat. II, Const. dogm. Lumen gentium, ibid.

5. Cfr. Paulo VI, Motu próprio Apostolica Sollicitudo, 15 set. 1965: AAS 57 (1965), p. 775-780.

6. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. Lumen gentium, cap. III, n.° 23: AAS 57 (1965) p. 27-28.

7. Cfr. Pio XII, Encícl. Fidei donum, 21 abril 1957: AAS 49 (1957) p. 237 s.; cfr. também: Bento XV, Carta Apost. Maximum illud, 30 nov. 1919: AAS 11 (1919) p. 440; Pio XI, Encícl. Rerum Ecclesiae, 28 fev. 1926: AAS 18 (1926) p. 68 ss.

8. Cfr. Paulo VI, Alocução aos Emin. Cardeais, Ex.mos Bispos e Rev.mos Prelados e outros oficiais da Cúria romana, 21 set. 1963: AA8 55 (1963) p. 793 s.

Capítulo II

1. Cfr. Conc. Vat. II, Decr. De Ecclesiis Orientalibus Catholicis, Orientalium Ecclesiarum, n. 7-11: AAS 57 (1965) p. 79-80.

2. Cfr. Conc. Trid. Ses. V, De reform., c. 2: Mansi 33, 30; ses. XXIV, Decr. De reform. c. 4: Mansi 33, 159; Decr. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, cap. III, n. 25: AAS 57 (1965) p. 29

3. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, cap. III, n. 25: AAS 57 (1965) p. 29-31.

4. Cfr. João XXIII, Encicl. Pacem in terris, 11 abril 1963, passim: AAS 55 (1963) p. 257-304.

5. Cfr. Paulo VI, Encícl. Ecclesiam suam, 6 ago. 1964: AAS 56 (1964) p. 639.

6. Cfr. Paulo VI, Encicl. Ecclesiam suam, 6 ago. 1964: AAS 56 (1964) p. 644-645.

7. Cfr. Conc. Vat. II, Decr. De instrumentis commmunicationis socialis, Inter mirifica: AAS 56 (1964) p. 145-153.

8. Cfr. Conc. Vat. II, Const. De sacra Liturgia, Sacrosanctum Concilium: AAS 56 (1964) p. 97 s.; Paulo VI, Motu próprio Sacram Liturgiam, 25 jan. 1964: AAS 56 (1964) p. 139 s.

9. Cfr. Pio XII, Encícl. Mediator Dei, 20 nov, 1947: AAS 39 (1947), p. 521 ss.; Paulo VI, Encícl. Mysterium fidei, 3 set. 1965: AAS 57 (1965), p. 753-774.

10. Cfr. Act. 1,14 e 2,46.

11. Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia, Lumen gentium, cap. VI, n. 44-45: AAS 47 (1965) p. 50-52.

12. Cfr. Luc. 22, 26-27.

13. Cfr. Jo. 15,15.

14. Cfr. Conc. Vat. II, Decr. De Oecumenismo, Unitatis redintegratio: AAS 57 (1965) p. 90-107.

15. Cfr. S. Pio X, Motu próprio Iampridem, 19 março, 1914: AAS 6 (1914) p. 173 s.; Pio XII, Const. Apost. Exsul Familia, 1 ago. 1952: AAS 54 (1952) p. 649 s.; Regulamento da obra do Apostolado do Mar, promulgado por Pio XII, 21 nov. 1957: AAS 50 (1958) p. 375-383.

16. Cfr. Conc. Vat. II, Decr. De Ecclesiis Orientalibus Catholicis, Orientalium Ecclesiarum, n. 4: AAS 57 (1865) p. 77.

17. Cfr. Jo. 13,35.

18. Cfr. Pio XII, Alocução, 8 dez. 1950: AAS 43 (1951) p. 28. Paulo VI, Alocução, 23 maio 1964: AAS 56 (1964) p. 571.

19. Cfr. Leão XIII, Const. Apost. Romanos Pontifices, 8 maio 1881: Acta Leonis XIII, vol. II (1882), p. 234 s.

20. Cfr. Paulo VI, Alocução, 23 maio 1964: AAS 56 (1964) p. 570-571. 21 Cfr. Pio XII, Alocução, 8 dez. 1950: 1. c.

Capítulo III

1. Cfr. S. C. Consistorial: Instrução sobre os vigários castrenses: 23 abril 1951: AAS 43 (1951) p. 562-565; Fórmula a usar na relação a respeito do estado do Vicariato castrense, 20 out. 1956: AAS 49 (1957) p. 150-163; Decr. De Sacrorum Liminum visitatione a Vicariis Castrensibus peragenda, 28 fev. 1959: AAS 51 (1959) p. 272-274; Decr. Facultas audiendi confessiones militum Cappellanis extenditur, 27 nov. 1960: AAS 53 (1961) p. 49-50. Cfr. também S. C. dos Religiosos, Instrução sobre os capelães militares religiosos, 2 fev. 1955: AAS 47 (1955) p. 93-97.

2. Cfr. S. C. Consistorial: Carta aos Emin. Cardeais, Arcebispos, Bispos e restantes Ordinários de Espanha, 21 jun. 1951: AAS 43 (1951) p. 566.


++++++++++++++++++++++++



DECRETO
UNITATIS REDINTEGRATIO
SOBRE O EUMENISMO

PROÉMIO

Natureza do movimento ecuménico

1. Promover a restauração da unidade entre todos os cristãos é um dos principais propósitos do sagrado Concílio Ecuménico Vaticano II. Pois Cristo Senhor fundou uma só e única Igreja. Todavia, são numerosas as Comunhões cristãs que se apresentam aos homens como a verdadeira herança de Jesus Cristo. Todos, na verdade, se professam discípulos do Senhor, mas têm pareceres diversos e caminham por rumos diferentes, como se o próprio Cristo estivesse dividido(1). Esta divisão, porém, contradiz abertamente a vontade de Cristo, e é escândalo para o mundo, como também prejudica a santíssima causa da pregação do Evangelho a toda a criatura.

O Senhor dos séculos, porém, prossegue sábia e pacientemente o plano de sua graça a favor de nós pecadores. Começou ultimamente a infundir de modo mais abundante nos cristãos separados entre si a compunção de coração e o desejo de união. Por toda a parte, muitos homens sentiram o impulso desta graça. Também surgiu entre os nossos irmãos separados, por moção da graça do Espirito Santo, um movimento cada vez mais intenso em ordem à restauração da unidade de todos os cristãos. Este movimento de unidade é chamado ecuménico. Participam dele os que invocam Deus Trino e confessam a Cristo como Senhor e Salvador, não só individualmente mas também reunidos em assembleias. Cada qual afirma que o grupo onde ouviu o Evangelho é Igreja sua e de Deus. Quase todos, se bem que de modo diverso, aspiram a uma Igreja de Deus una e visível, que seja verdadeiramente universal e enviada ao mundo inteiro, a fim de que o mundo se converta ao Evangelho e assim seja salvo, para glória de Deus.

Este sagrado Concílio considera todas essas coisas com muita alegria. Tendo já declarado a doutrina sobre a Igreja, movido pelo desejo de restaurar a unidade de todos os cristãos, quer propor a todos os católicos os meios, os caminhos e as formas com que eles possam corresponder a esta vocação e graça divina.

CAPÍTULO I

PRINCÍPIOS CATÓLICOS DO ECUMENISMO

Unidade da Igreja

2. Nisto se manifestou a caridade de Deus para connosco, em que o Filho unigénito de Deus foi enviado ao mundo pelo Pai a fim de que, feito homem, desse nova vida pela Redenção a todo o género humano e o unificasse(2). Antes de se imolar no altar da cruz como hóstia imaculada, rogou ao Pai pelos que crêem, dizendo: «Para que todos sejam um, como tu, Pai, em mim e eu em ti; para que sejam um em nós, a fim de que o mundo creia que tu me enviaste» (Jo. 17,21). Na Sua Igreja instituiu o admirável sacramento da Eucaristia, pelo qual é tanto significada como realizada a unidade da Igreja A Seus discípulos deu o novo mandamento do mútuo amor (3) e prometeu o Espírito Paráclito (4), que, como Senhor e fonte de vida, com eles permanecesse para sempre.

Suspenso na cruz e glorificado, o Senhor Jesus derramou o Espírito prometido. Por Ele chamou e congregou na unidade da fé, esperança e caridade o Povo da nova Aliança, que é a Igreja, como atesta o Apóstolo: «Só há um corpo e um espírito, como também fostes chamados numa só esperança da vossa vocação. Só há um Senhor, uma fé, um Baptismo» (Ef. 4, 45). Com efeito, «todos quantos fostes baptizados em Cristo, vos revestistes de Cristo... Pois todos sois um em Cristo Jesus» (Gál. 3, 27-28). O Espírito Santo habita nos crentes, enche e rege toda a Igreja, realiza aquela maravilhosa comunhão dos fiéis e une a todos tão intimamente em Cristo, que é princípio da unidade da Igreja. Ele faz a distribuição das graças e dos ofícios (5), enriquecendo a Igreja de Jesus Cristo com múltiplos dons, «a fim de aperfeiçoar os santos para a obra do ministério, na edificação do corpo de Cristo» (Ef. 4,12).

Para estabelecer esta Sua Igreja santa em todo mundo até à consumação dos séculos, Cristo outorgou ao colégio dos doze o ofício de ensinar, governar e santificar (6). Dentre eles, escolheu Pedro, sobre quem, após a profissão de fé, decidiu edificar a Sua Igreja. A ele prometeu as chaves do reino dos céus (7) e, depois da profissão do seu amor, confiou-lhe a tarefa de confirmar todas as ovelhas na fé (8) e de apascentá-las em perfeita unidade (9), permanecendo eternamente o próprio Cristo Jesus como pedra angular fundamental (10) e pastor de nossas almas(11).

Jesus Cristo quer que o Seu Povo cresça mediante a fiel pregação do Evangelho, administração dos sacramentos e governo amoroso dos Apóstolos e dos seus sucessores os Bispos, com a sua cabeça, o sucessor de Pedro, sob a acção do Espírito Santo; e vai aperfeiçoando a sua comunhão na unidade: na confissão duma só fé, na comum celebração do culto divino e na fraterna concórdia da família de Deus.

Assim a Igreja, a única grei de Deus, como um sinal levantado entre as nações (12), oferecendo o Evangelho da paz a todo o género humano(13), peregrina em esperança, rumo à meta da pátria celeste(14).

Este é o sagrado mistério da unidade da Igreja, em Cristo e por Cristo, realizando o Espírito Santo a variedade dos ministérios. Deste mistério o supremo modelo e princípio é a unidade dum só Deus, o Pai e o Filho no Espírito Santo, na Trindade de pessoas.

Ruptura da unidade da Igreja: laços de união entre todos os cristãos

3. Nesta una e única Igreja de Deus já desde os primórdios surgiram algumas cisões (15), que o Apóstolo censura asperamente como condenáveis (16). Nos séculos posteriores, porém, originaram-se dissensões mais amplas. Comunidades não pequenas separaram-se da plena comunhão da Igreja católica, algumas vezes não sem culpa dos homens dum e doutro lado. Aqueles, porém, que agora nascem em tais comunidades e são instruídos na fé de Cristo, não podem ser acusados do pecado da separação, e a Igreja católica os abraça com fraterna reverência e amor. Pois que crêem em Cristo e foram devidamente baptizados, estão numa certa comunhão, embora não perfeita, com a Igreja católica. De facto, as discrepâncias que de vários modos existem entre eles e a Igreja católica - quer em questões doutrinais e às vezes também disciplinares, quer acerca da estrutura da Igreja - criam não poucos obstáculos, por vezes muito graves, à plena comunhão eclesiástica. O movimento ecuménico visa a superar estes obstáculos. No entanto, justificados no Baptismo pela fé, são incorporados a Cristo (17), e, por isso, com direito se honram com o nome de cristãos e justamente são reconhecidos pelos filhos da Igreja católica como irmãos no Senhor (18).

Ademais, dentre os elementos ou bens com que, tomados em conjunto, a própria Igreja é edificada e vivificada, alguns e até muitos e muito importantes podem existir fora do âmbito da Igreja católica: a palavra de Deus escrita, a vida da graça, a fé, a esperança e a caridade e outros dons interiores do Espírito Santo e elementos visíveis. Tudo isso, que de Cristo provém e a Cristo conduz, pertence por direito à única Igreja de Cristo.

Também não poucas acções sagradas da religião cristã são celebradas entre os nossos irmãos separados. Por vários modos, conforme a condição de cada Igreja ou Comunidade, estas acções podem realmente produzir a vida da graça. Devem mesmo ser tidas como aptas para abrir a porta à comunhão da salvação.

Por isso, as Igrejas (19) e Comunidades separadas, embora creiamos que tenham defeitos, de forma alguma estão despojadas de sentido e de significação no mistério da salvação. Pois o Espírito de Cristo não recusa servir-se delas como de meios de salvação cuja virtude deriva da própria plenitude de graça e verdade confiada à Igreja católica.

Contudo, os irmãos separados, quer os indivíduos quer as suas Comunidades e Igrejas, não gozam daquela unidade que Jesus quis prodigalizar a todos os que regenerou e convivificou num só corpo e numa vida nova e que a Sagrada Escritura e a venerável Tradição da Igreja professam. Porque só pela Igreja católica de Cristo, que é o meio geral de salvação, pode ser atingida toda a plenitude dos meios salutares. Cremos também que o Senhor confiou todos os bens da nova Aliança ao único colégio apostólico, a cuja testa está Pedro, com o fim de constituir na terra um só corpo de Cristo. É necessário que a ele se incorporem plenamente todos os que de alguma forma pertencem ao Povo de Deus. Este Povo, durante a peregrinação terrena, ainda que sujeito ao pecado nos seus membros, cresce incessantemente em Cristo. É conduzido suavemente por Deus, segundo os Seus misteriosos desígnios, até que chegue, alegre, à total plenitude da glória eterna na celeste Jerusalém.

O movimento ecuménico

4. Hoje, em muitas partes do mundo, mediante o sopro da graça do Espírito Santo, empreendem-se, pela oração, pela palavra e pela acção, muitas tentativas de aproximação daquela plenitude de unidade que Jesus Cristo quis. Este sagrado Concilio, portanto, exorta todos os fiéis a que, reconhecendo os sinais dos tempos, solicitamente participem do trabalho ecuménico.

Por «movimento ecuménico» entendem-se as actividades e iniciativas, que são suscitadas e ordenadas, segundo as várias necessidades da Igreja e oportunidades dos tempos, no sentido de favorecer a unidade dos cristãos. Tais são: primeiro, todos os esforços para eliminar palavras, juízos e acções que, segundo a equidade e a verdade, não correspondem à condição dos irmãos separados e, por isso, tornam mais difíceis as relações com eles; depois, o «diálogo» estabelecido entre peritos competentes, em reuniões de cristãos das diversas Igrejas em Comunidades, organizadas em espírito religioso, em que cada qual explica mais profundamente a doutrina da sua Comunhão e apresenta com clareza as suas características. Com este diálogo, todos adquirem um conhecimento mais verdadeiro e um apreço mais justo da doutrina e da vida de cada Comunhão. Então estas Comunhões conseguem também uma mais ampla colaboração em certas obrigações que a consciência cristã exige em vista do bem comum. E onde for possível, reúnem-se em oração unânime. Enfim, todos examinam a sua fidelidade à vontade de Cristo acerca da Igreja e, na medida da necessidade, levam vigorosamente por diante o trabalho de renovação e de reforma.

Desde que os fiéis da Igreja católica prudente e pacientemente trabalhem sob a vigilância dos pastores, tudo isto contribuirá para promover a equidade e a verdade, a concórdia e a colaboração, o espírito fraterno e a união. Assim, palmilhando este caminho, superando pouco a pouco os obstáculos que impedem a perfeita comunhão eclesiástica, todos os cristãos se congreguem numa única celebração da Eucaristia e na unidade de uma única Igreja. Esta unidade, desde o início Cristo a concedeu à Sua Igreja. Nós cremos que esta unidade subsiste indefectivelmente na Igreja católica e esperamos que cresça de dia para dia. até à consumação dos séculos.

Mas é evidente que o trabalho de preparação e reconciliação dos indivíduos que desejam a plena comunhão católica é por sua natureza distinto da empresa ecuménica: Entretanto, não existe nenhuma oposição entre as duas, pois ambas procedem da admirável Providencia divina.

É, sem dúvida, necessário que os fiéis católicos na empresa ecuménica se preocupem com os irmãos separados, rezando por eles, comunicando com eles sobre assuntos da Igreja, dando os primeiros passos em direcção a eles. Sobretudo, porém, examinam com espírito sincero e atento aquelas coisas que na própria família católica devem ser renovadas e realizadas para que a sua vida dê um testemunho mais fiel e luminoso da doutrina e dos ensinamentos recebidos de Cristo, através dos Apóstolos.

Embora a Igreja católica seja enriquecida de toda a verdade revelada por Deus e de todos os instrumentos da graça, os seus membros, contudo, não vivem com todo aquele fervor que seria conveniente. E assim, aos irmãos separados e ao mundo inteiro o rosto da Igreja brilha menos e o seu crescimento é retardado. Por esse motivo, todos os católicos devem tender à perfeição cristã (20) e, cada um segundo a própria condição, devam procurar que a Igreja, levando em seu corpo a humildade e mortificação de Jesus (21), de dia para dia se purifique e se renove, até que, Cristo a apresente a Si gloriosa, sem mancha e sem ruga (22).

Guardando a unidade nas coisas necessárias, todos na Igreja, segundo o múnus dado a cada um, conservem a devida liberdade tanto nas várias formas de vida espiritual e de disciplina, como na diversidade de ritos litúrgicos e até mesmo na elaboração teológica da verdade revelada. Mas em tudo cultivem a caridade. Por este modo de agir, manifestarão sempre melhor a autêntica catolicidade e apostolicidade da Igreja.

Por outro lado, é mister que os católicos reconheçam com alegria e estimem os bens verdadeiramente cristãos, oriundos de um património comum, que se encontram nos irmãos de nós separados. É digno e salutar reconhecer as riquezas de Cristo e as obras de virtude na vida de outros que dão testemunho de Cristo, às vezes até à efusão do sangue. Deus é, com efeito, sempre admirável e digno de admiração em Suas obras.

Nem se passe por alto o facto de que tudo o que a graça do Espírito Santo realiza nos irmãos separados pode também contribuir para a nossa edificação. Tudo o que é verdadeiramente cristão jamais se opõe aos bens genuínos da fé, antes sempre pode fazer com que mais perfeitamente se compreenda o próprio mistério de Cristo e da Igreja.

Todavia, as divisões dos cristãos impedem a Igreja de realizar a plenitude de catolicidade que lhe é própria naqueles filhos que, embora incorporados pelo Baptismo, estão separados da sua plena comunhão. E até para a própria Igreja se torna mais difícil exprimir na realidade da vida e sob todos os aspectos a sua plena catolicidade.

Este sagrado Concílio verifica com alegria que a participação dos fiéis na acção ecuménica aumenta cada vez mais. Recomenda-a aos Bispos de todo o mundo, para que a promovam com interesse e prudentemente a dirijam.

CAPÍTULO II

PRÁTICA DO ECUMENISMO

Trabalho de toda a Igreja

5. A solicitude na restauração da união vale para toda a Igreja, tanto para os fiéis como para os pastores. Afecta a cada um em particular, de acordo com sua capacidade, quer na vida cristã quotidiana, quer nas investigações teológicas e histéricas. Essa preocupação já manifesta de certo modo a união fraterna existente entre todos os cristãos, e conduz à unidade plena e perfeita, segundo a benevolência de Deus.

A renovação da Igreja: sua importância e necessidade

6. Toda a renovação da Igreja (23) consiste essencialmente numa maior fidelidade à própria vocação. Esta é, sem dúvida, a razão do movimento para a unidade. A Igreja peregrina é chamada por Cristo a essa reforma perene. Como instituição humana e terrena, a Igreja necessita perpetuamente desta reforma. Assim, se em vista das circunstancias das coisas e dos tempos houve deficiências, quer na moral, quer na disciplina eclesiástica, quer também no modo de enunciar a doutrina - modo que deve cuidadosamente distinguir-se do próprio depósito da fé - tudo seja recta e devidamente restaurado no momento oportuno.

Esta renovação tem, por isso, grande importância ecuménica. Ela já é efectuada em várias esferas da Igreja. Tais são os movimentos bíblico e litúrgico, a pregação da palavra de Deus e a catequese, o apostolado dos leigos, as novas formas de vida religiosa, a espiritualidade do matrimónio, a doutrina e actividade da Igreja no campo social. Tudo isto deve ser tido como penhor e auspicio que felizmente prognosticam os futuros progressos do ecumenismo.

A conversão do coração

7. Não há verdadeiro ecumenismo sem conversão interior. É que os anseios de unidade nascem e amadurecem a partir da renovação da mente (24), da abnegação de si mesmo e da libérrima efusão da caridade. Por isso, devemos implorar do Espírito divino a graça da sincera abnegação, humildade e mansidão em servir, e da fraterna generosidade para com os outros. «Portanto - diz o Apóstolo das gentes - eu, prisioneiro no Senhor, vos rogo que vivais de modo digno da vocação a que fostes chamados, com toda a humildade e mansidão, com paciência, suportando-vos uns aos outros em caridade, e esforçando-vos solicitamente por conservar a unidade do Espírito no vínculo da paz» (Ef. 4, 1-3). Esta exortação visa sobretudo aqueles que foram elevados à sagrada Ordem na intenção de que seja continuada a missão de Cristo, que entre nós «não esteve para ser servido, mas para servir» (Mt. 20,28).

Também das culpas contra a unidade, vale o testemunho de S. João: «Se dissermos que não temos pecado, fazemo-lo mentiroso e a sua palavra não está em nós» (1 Jo. 1,10). Por isso, pedimos humildemente perdão a Deus e aos irmãos separados, assim como também nós perdoamos àqueles que nos ofenderam.

Lembrem-se todos os cristãos de que tanto melhor promoverão e até realizarão a união dos cristãos quanto mais se esforçarem por levar uma vida mais pura, de acordo com o Evangelho. Porque, quanto mais unidos estiverem em comunhão estreita com o Pai, o Verbo e o Espírito, tanto mais íntima e facilmente conseguirão aumentar a fraternidade mútua.

A oração pela unidade

8. Esta conversão do coração e esta santidade de vida, juntamente com as orações particulares e públicas pela unidade dos cristãos, devem ser tidas como a alma de todo o movimento ecuménico, e com razão podem ser chamadas ecumenismo espiritual.

É coisa habitual entre os católicos reunirem-se frequentemente para aquela oração pela unidade da Igreja que o próprio Salvador pediu ardentemente ao Pai, na vigília de sua morte: «Que todos sejam um» (Jo. 17,21).

Em algumas circunstâncias peculiares, como por ocasião das orações prescritas «pro unitate» em reuniões ecuménicas, é lícito e até desejável que os católicos se associem aos irmãos separados na oração. Tais preces comuns são certamente um meio muito eficaz para impetrar a unidade. São uma genuína manifestação dos vínculos pelos quais ainda estão unidos os católicos com os irmãos separados: «Onde dois ou três estão congregados em meu nome, ali estou eu no meio deles» (Mt. 18,20).

Todavia, não é lícito considerar a communicatio in sacris como um meio a ser aplicado indiscriminadamente na restauração da unidade dos cristãos. Esta communicatio depende principalmente de dois princípios: da necessidade de testemunhar a unidade da Igreja e da participação nos meios da graça. O testemunho da unidade frequentemente a proíbe. A busca da graça algumas vezes a recomenda. Sobre o modo concreto de agir, decida prudentemente a autoridade episcopal local, considerando todas as circunstancias dos tempos, lugares e pessoas, a não ser que outra coisa seja determinada pela Conferência episcopal, segundo os seus próprios estatutos, ou pela Santa Sé.

O conhecimento dos irmãos separados

9. É preciso conhecer a mente dos irmãos separados. Para isso, necessariamente se requer um estudo, a ser feito segundo a verdade e com animo benévolo. Católicos devidamente preparados devem adquirir um melhor conhecimento da doutrina e história, da vida espiritual e litúrgica, da psicologia religiosa e da cultura própria dos irmãos. Muito ajudam para isso as reuniões de ambas as partes para tratar principalmente de questões teológicas, onde cada parte dever agir de igual para igual, contanto que aqueles que, sob a vigilância dos superiores, nelas tomam parte, sejam verdadeiramente peritos. De tal diálogo também se ver mais claramente qual é a situação real da Igreja católica. Por esse caminho se conhecer outrossim melhor a mente dos irmãos separados e a nossa fé lhes ser mais aptamente exposta.

A formação ecuménica

10. A sagrada teologia e as outras disciplinas, principalmente as históricas, devem ser ensinadas também sob o ponto de vista ecuménico, de modo que respondam mais exactamente à verdade das coisas.

Importa muito que os futuros pastores e sacerdotes estudem a teologia bem elaborada deste modo e não polemicamente, sobretudo nas questões que incidem sobre as relações entre os irmãos separados e a Igreja católica.

É da formação dos sacerdotes que depende em grande parte a necessária instrução e formação espiritual dos fiéis e dos religiosos.

Devem ainda os católicos que se entregam a obras missionárias nas mesmas terras que outros cristãos, especialmente hoje em dia, conhecer os problemas e os frutos que, para o seu apostolado, se originam do ecumenismo.

A exposição clara e fiel da fé

11. O modo e o método de formular a doutrina católica de forma alguma devem transformar-se em obstáculo por diálogo com os irmãos. É absolutamente necessário que toda a doutrina seja exposta com clareza. Nada tão alheio ao ecumenismo como aquele falso irenismo pelo qual a pureza da doutrina católica sobre detrimento e é obscurecido o seu sentido genuíno e certo.

Ao mesmo tempo, a fé católica deve ser explicada mais profunda e correctamente, de tal modo e com tais termos que possa ser de facto compreendida também pelos irmãos separados.

Ademais, no diálogo ecuménico, os teólogos católicos, sempre fiéis à doutrina da Igreja, quando investigarem juntamente com os irmãos separados os divinos mistérios, devem proceder com amor pela verdade, com caridade e humildade. Na comparação das doutrinas, lembrem-se que existe uma ordem ou «hierarquia» das verdades da doutrina católica, já que o nexo delas com o fundamento da fé cristã é diferente. Assim se abre o caminho pelo qual, mediante esta fraterna emulação, todos se sintam incitados a um conhecimento mais profundo e a uma exposição mais clara das insondáveis riquezas de Cristo (25).

A colaboração com os irmãos separados

12. Todos os cristãos professem diante do mundo inteiro a fé em Deus uno e trino, no Filho de Deus encarnado, nosso Redentor e Salvador. Por um esforço comum e em estima mútua dêem testemunho da nossa esperança, que não confunde. Visto que nos nossos tempos largamente se estabelece a cooperação no campo social, todos os homens são chamados a uma obra comum, mas com maior razão os que crêem em Deus, sobretudo todos os cristãos assinalados com o nome de Cristo. A cooperação de todos os cristãos exprime vivamente aquelas relações pelas quais já estão unidos entre si e apresenta o rosto de Cristo Servo numa luz mais radiante. Esta cooperação, que já se realiza em não poucas nações, deve ser aperfeiçoada sempre mais, principalmente nas regiões onde se verifica a evolução social ou técnica. Vai ela contribuir para apreciar devidamente a dignidade da pessoa humana, promover o bem da paz, aplicar ainda mais o Evangelho na vida social, incentivar o espírito cristão nas ciências e nas artes e aplicar toda a espécie de remédios aos males da nossa época, tais como a fome e as calamidades, o analfabetismo e a pobreza, a falta de habitações e a inadequada distribuição dos bens. Por essa cooperação, todos os que crêem em Cristo podem mais facilmente aprender como devem entender-se melhor e estimar-se mais uns aos outros, e assim se abre o caminho que leva à unidade dos cristãos.

CAPÍTULO IlII

IGREJAS E COMUNIDADES ECLESIAIS
SEPARADAS DA SÉ APOSTÓLICA ROMANA

Duas categorias de cismas

13. Temos diante dos olhos as duas principais categorias de cisões que ferem a túnica inconsútil de Cristo.

As primeiras divisões sobrevieram no Oriente, já por contestação das fórmulas dogmáticas dos Concílios de Éfeso e Calcedónia, já em tempo posterior, pela ruptura da comunhão eclesiástica entre os Patriarcados orientais e a Sé Romana.

As outras, após mais de quatro séculos, originaram-se no Ocidente, provocadas pelos acontecimentos comumente conhecidos com o nome de Reforma. Desde então, muitas Comunhões, nacionais ou confessionais, se separaram da Sé Romana. Entre aquelas nas quais continuam parcialmente as tradições e as estruturas católicas, ocupa um lugar especial a Comunhão anglicana.

Estas diversas divisões, todavia, diferem muito entre si, não apenas em razão da origem, lugar e tempo, mas principalmente pela natureza e gravidade das questões relativas à fé e à estrutura eclesiástica.

Por isso, sem querer minimizar as diferenças entre os vários grupos cristãos e sem desconhecer os laços que, não obstante a divisão, entre eles existem, este sagrado Concílio determina propor as seguintes considerações para levar a cabo uma prudente acção ecuménica.

I. CONSIDERAÇÃO PECULIAR SOBRE AS IGREJAS ORIENTAIS

Carácter e história própria dos orientais

14. Durante não poucos séculos, as Igrejas do Oriente e do Ocidente seguiram por caminhos próprios, unidas, contudo, pela fraterna comunhão da fé e da vida sacramental. Quando entre elas surgiam dissensões acerca da fé ou da disciplina, era a Sé de Roma quem, de comum acordo, as resolvia. Entre outras coisas de grande importância, é grato ao sagrado Concílio trazer à memória de todos o facto de que no Oriente florescem muitas Igrejas particulares ou locais, entre as quais sobressaem as Igrejas patriarcais; não poucas delas se gloriam de ter origem nos próprios Apóstolos. Por isso entre os orientais prevaleceu e prevalece a solicitude e o cuidado de conservar na comunhão de fé e caridade aquelas relações fraternas que devem vigorar entre as Igrejas locais como entre irmãs.

Semelhantemente, não se deve esquecer que as Igrejas do Oriente têm desde a origem um tesouro, do qual a Igreja do Ocidente herdou muitas coisas em liturgia, tradição espiritual e ordenação jurídica. Nem se deve subestimar o facto de que os dogmas fundamentais da fé cristã sobre a Trindade e o Verbo de Deus encarnado da Virgem Maria, foram definidos em Concílios Ecuménicos celebrados no Oriente. Para preservar esta fé, muito sofreram e ainda sofrem aquelas Igrejas.

Mas a herança deixada pelos Apóstolos foi aceite de formas e modos diversos e desde os primórdios da Igreja cá e lá foi explicada de maneira diferente, também por causa da diversidade de génio e condições de vida. Tudo isso, além das causas externas, e também por falta de mútua compreensão e caridade, deu ocasião às separações.

Em vista disto, o sagrado Concilio exorta a todos, mormente aos que pretendem dedicar-se à restauração da plena comunhão desejada entre as Igrejas orientais e a Igreja católica, a que tenham na devida consideração esta peculiar condição da origem e do crescimento das Igrejas do Oriente e da índole das relações que vigoravam entre elas e a Sé Romana antes da separação. Procurem apreciar rectamente todos estes factores. Acuradamente observadas, estas coisas contribuirão muito para o desejado diálogo.

A tradição litúrgica espiritual dos orientais

15. Também é conhecido de todos com quanto amor os cristãos-orientais realizam as cerimónias litúrgicas, principalmente a celebração eucarística, fonte da vida da Igreja e penhor da glória futura, pela qual os fiéis unidos ao Bispo, tendo acesso a Deus Pai mediante o Filho, o Verbo encarnado, morto e glorificado, na efusão do Espírito Santo, conseguem a comunhão com a Santíssima Trindade, feitos «participantes da natureza divina» (2 Ped. 1,4). Por isso, pela celebração da Eucaristia do Senhor, em cada uma dessas Igrejas, a Igreja de Deus é edificada e cresce (26), e pela concelebração se manifesta a comunhão entre elas.

Neste culto litúrgico, os orientais proclamam com belíssimos hinos a grandeza de Maria sempre Virgem, a quem o Concílio Ecuménico de Éfeso solenemente proclamou Santíssima Mãe de Deus, para que se reconhecesse verdadeira e propriamente a Cristo como Filho de Deus e Filho do Homem segundo as Escrituras. Cantam hinos também a muitos santos, entre os quais os Padres da Igreja universal.

Como essas Igrejas, embora separadas, têm verdadeiros sacramentos, e principalmente, em virtude da sucessão apostólica, o sacerdócio e a Eucaristia, ainda se unem muito intimamente connosco. Por isso, alguma communicatio in sacris não só é possível mas até aconselhável, em circunstâncias oportunas e com aprovação da autoridade eclesiástica.

Também no Oriente se encontram as riquezas daquelas tradições espirituais, que o monaquismo sobretudo expressou. Pois desde os gloriosos tempos dos santos Padres floresceu no Oriente aquela elevada espiritualidade monástica, que de lá se difundiu para o Ocidente e da qual a vida religiosa dos latinos se originou como de sua fonte, e em seguida, sem cessar, recebeu novo vigor. Recomenda-se, por isso, vivamente que os católicos se abeirem com mais frequência destas riquezas espirituais dos Padres do Oriente que elevam o homem todo à contemplação das coisas divinas.

Conhecer, venerar, conservar e fomentar o riquíssimo património litúrgico e espiritual dos orientais é da máxima importância para guardar fielmente a plenitude da tradição cristã e realizar a reconciliação dos cristãos orientais e ocidentais.

Disciplina própria dos orientais

16. Além do mais, desde os primeiros tempos as Igrejas do Oriente seguiam disciplinas próprias, sancionadas pelos santos Padres e Concílios, mesmo Ecuménicos. Longe de obstar à unidade da Igreja, uma certa diversidade de costumes e usos, como acima se lembrou, aumenta-lhe a beleza e ajuda-a não pouco a cumprir a sua missão. Por isso, o sagrado Concilio, para tirar todas as dúvidas, declara que as Igrejas do Oriente, conscientes da necessária unidade de toda a Igreja, têm a faculdade de se governarem segundo as próprias disciplinas, mais conformes à índole de seus fiéis e mais aptas para atender ao bem das almas. A observância perfeita deste tradicional princípio, nem sempre respeitada, é condição prévia indispensável para a restauração da união.

Carácter da teologia dos orientais

17. O que acima foi dito acerca da legítima diversidade, apraz declarar também com relação à diversidade na enunciação teológica das doutrinas. Com efeito, no estudo da verdade revelada, o Oriente e o Ocidente usaram métodos e modos diferentes para conhecer e exprimir os mistérios divinos. Não admira, por isso, que alguns aspectos do mistério revelado sejam por vezes apreendidos mais convenientemente e postos em melhor luz por um que por outro. Nestes casos, deve dizer-se que aquelas várias fórmulas teológicas, em vez de se oporem, não poucas vezes se completam mutuamente. Com relação às tradições teológicas autênticas dos orientais, devemos reconhecer que elas estão profundamente radicadas na Sagrada Escritura, são fomentadas e expressas pela vida litúrgica, são nutridas pela viva tradição apostólica e pelos escritos dos Padres orientais e dos autores espirituais, e promovem a recta ordenação da vida e até a contemplação perfeita da verdade cristã.

Dando graças a Deus porque muitos filhos orientais da Igreja católica, que guardam este património e desejam vivê-lo mais pura e plenamente, já vivem em plena comunhão com os irmãos que cultivam a tradição ocidental, este sagrado Concilio declara que todo esse património espiritual e litúrgico, disciplinar e teológico, nas suas diversas tradições, faz parte da plena catolicidade e apostolicidade da Igreja.

A busca da unidade

18. Tendo ponderado tudo isso, este sagrado Concílio renova o que foi declarado pelos sagrados Concílios anteriores e também pelos Pontífices Romanos: para restaurar ou conservar a comunhão e a unidade, é preciso «não impor nenhum outro encargo além do necessário» (Act. 15, 28). Veementemente deseja também, que nas várias instituições e formas de vida da Igreja, se envidem todos os esforços para uma gradual concretização desta unidade, principalmente pela oração e pelo diálogo fraternal em torno da doutrina e das necessidades mais urgentes do ministério pastoral de hoje. Do mesmo modo recomenda aos pastores e fiéis da Igreja católica as boas relações com aqueles que já não vivem no Oriente, mas longe da pátria, para que cresça a colaboração fraterna com eles no espírito da caridade, excluído todo o espírito de contenda e rivalidade. E se este trabalho for promovido com todo o entusiasmo, o sagrado Concílio espera que, demolido o muro que separa a Igreja ocidental da oriental, haja finalmente uma única morada, firmada na pedra angular, Jesus Cristo, que fará de ambas uma só coisa (27).

II. IGREJAS E COMUNIDADES ECLESIAIS SEPARADAS NO OCIDENTE

Condição própria destas comunidades

19. As Igrejas e Comunidades eclesiais, que se separaram da Sé Apostólica Romana naquela grave perturbação iniciada no Ocidente já pelos fins da Idade média, ou em tempos posteriores, continuam, contudo, ligadas à Igreja católica pelos laços de uma peculiar afinidade devida à longa convivência do povo cristão na comunhão eclesiástica durante os séculos passados. Visto que estas Igrejas e Comunidades eclesiais, por causa da diversidade de origem, doutrina e vida espiritual não só diferem de nós mas também diferem consideravelmente entre si, descrevê-las de modo adequado é um trabalho muito difícil, que não entendemos fazer aqui.

Embora o movimento ecuménico e o desejo de paz com a Igreja católica ainda não sejam vigorosos em toda a parte, temos a esperança de que crescerão pouco a pouco em todos o sentido ecuménico e a estima mútua.

É preciso, contudo, reconhecer que entre estas Igrejas e Comunidades e a Igreja católica há discrepâncias consideráveis, não só de índole histórica, sociológica, psicológica, cultural, mas sobretudo de interpretação da verdade revelada. Para que mais facilmente, não obstante estas diferenças, se possa estabelecer o diálogo ecuménico, queremos expor seguidamente alguns pontos que podem e devem ser o fundamento e o incentivo deste diálogo.

A confissão de Cristo

20. Consideramos primeiramente aqueles cristãos que, para glória de Deus único, Pai e Filho e Espírito Santo, abertamente confessam Jesus Cristo como Deus e Senhor e único mediador entre Deus e os homens. Sabemos existirem não pequenas discrepâncias em relação à doutrina da Igreja católica, mesmo sobre Cristo, Verbo de Deus encarnado, e sobre a obra da redenção e por conseguinte sobre o mistério e o ministério da Igreja, bem como sobre a função de Maria na obra da salvação. Alegramo-nos, contudo, vendo que os irmãos separados tendem para Cristo como fonte e centro da comunhão eclesiástica. Levados pelo desejo de união com Cristo, são mais e mais compelidos a buscarem a unidade bem como a darem em toda a parte e diante de todos o testemunho da sua fé.

Estudo da Sagrada Escritura

21. O amor e a veneração e quase o culto da Sagrada Escritura levam os nossos irmãos a um constante e cuidadoso estudo do texto sagrado: pois o Evangelho é «força de Deus para salvação de todo aquele que crê, primeiro do judeu, mas também do grego» (Rom. 1,16).

Invocando o Espírito Santo, na própria Sagrada Escritura, procuram a Deus que lhes fala em Cristo anunciado pelos profetas, Verbo de Deus por nós encarnado. Nela contemplam a vida de Cristo e aquilo que o divino Mestre ensinou e realizou para a salvação dos homens, sobretudo os mistérios da Sua morte e ressurreição.

Mas, embora os cristãos de nós separados afirmem a autoridade divina da Sagrada Escritura, pensam diferentemente de nós - cada um de modo diverso - sobre a relação entre a Escritura e a Igreja. Na Igreja, segundo a fé católica, o magistério autêntico tem lugar peculiar na exposição e pregação da palavra de Deus escrita.

No entanto, no próprio diálogo a Sagrada Escritura é um exímio instrumento na poderosa mão de Deus para a consecução daquela unidade que o Salvador oferece a todos os homens.

A vida sacramental: o Baptismo, a ceia do Senhor

22. Pelo sacramento do Baptismo, sempre que for devidamente conferido segundo a instituição do Senhor e recebido com a devida disposição de alma, o homem é verdadeiramente incorporado em Cristo crucificado e glorificado, e regenerado para participar na vida divina, segundo esta palavra do Apóstolo: «Com Ele fostes sepultados no Baptismo e n'Ele fostes conressuscitados pela fé no poder de Deus, que O ressuscitou dos mortos» (Col. 2,12) (28).

O Baptismo, pois, constitui o vínculo sacramental da unidade que liga todos os que foram regenerados por ele. O Baptismo, porém, de per si é o inicio e o exórdio, pois tende à consecução da plenitude de vida em Cristo. Por isso, o Baptismo ordena-se à completa profissão da fé, à íntegra incorporação na obra da salvação, tal como o próprio Cristo o quis, e finalmente à total inserção na comunhão eucarística.

Embora falte às Comunidades eclesiais de nós separadas a unidade plena connosco proveniente do Baptismo, e embora creiamos que elas não tenham conservado a genuína e íntegra substancia do mistério eucarístico, sobretudo por causa da falta do sacramento da Ordem, contudo, quando na santa Ceia comemoram a morte e a ressurreição do Senhor, elas confessam ser significada a vida na comunhão de Cristo e esperam o Seu glorioso advento. É, por isso, necessário que se tome como objecto do diálogo a doutrina sobre a Ceia do Senhor, sobre os outros sacramentos, sobre o culto e sobre os ministérios da Igreja.

A vida com Cristo: liturgia e moral

23. A vida cristã destes irmãos alimenta-se da fé em Cristo e é fortalecida pela graça do Baptismo e pela audição da palavra de Deus. Manifesta-se na oração privada, na meditação bíblica, na vida familiar cristã, no culto da comunidade congregada para o louvor de Deus. Aliás, o culto deles contém por vezes notáveis elementos da antiga Liturgia comum.

A sua fé em Cristo produz frutos de louvor e acção de graças pelos benefícios recebidos de Deus. Há também, entre eles, um vivo sentido da justiça e uma sincera caridade para com o próximo. Esta fé operosa produziu não poucas instituições para aliviar a miséria espiritual e corporal, promover a educação da juventude, tornar mais humanas as condições sociais da vida e estabelecer por toda a parte a paz.

E se em assuntos morais muitos dentre os cristãos nem sempre entendem o Evangelho do mesmo modo que os católicos, nem admitem as mesmas soluções para questões mais difíceis da sociedade hodierna, querem, no entanto, como nós, aderir à palavra de Cristo como fonte da virtude cristã e obedecer ao preceito do Apostolo: «Tudo quanto fizerdes por palavra ou por obra, fazei tudo em nome do Senhor Jesus Cristo, dando graças a Deus Pai por Ele» (Col. 3,17). Daqui é que pode começar o diálogo ecuménico sobre a aplicação moral do Evangelho.

Exortação ao ecumenismo prudente e católico

24. Assim, após termos exposto brevemente as condições segundo as quais se pode exercer a acção ecuménica e os princípios pelos quais ela deve ser orientada, olhamos com confiança para o futuro. Este sagrado Concílio exorta os fiéis a absterem-se de qualquer zelo superficial ou imprudente que possa prejudicar o verdadeiro progresso da unidade. Com efeito, a sua acção ecuménica não pode ser senão plena e sinceramente católica, isto é, fiel à verdade que recebemos dos Apóstolos e dos Padres, e conforme à fé que a Igreja católica sempre professou, e ao mesmo tempo tendente àquela plenitude mercê da qual o Senhor quer que cresça o Seu corpo no decurso dos tempos.

Este sagrado Concílio deseja insistentemente que as iniciativas dos filhos da Igreja católica juntamente com as dos irmãos separados se desenvolvam; que não se ponham obstáculos aos caminhos da Providência; e que não se prejudiquem os futuros impulsos do Espírito Santo. Além disso, declara estar consciente de que o santo propósito de reconciliar todos os cristãos na unidade de uma só e única Igreja de Cristo excede as forças e a capacidade humana. Por isso, coloca inteiramente a sua esperança na oração de Cristo pela Igreja, no amor do Pai para connosco e na virtude do Espírito Santo. «E a esperança não será confundida, pois o amor de Deus se derramou em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado» (Rom. 5,5).

Vaticano, 21 de Novembro de 1964.

PAPA PAULO VI


Notas

1. Cfr. 1 Cor., 1, 13.

2. Cfr. 1 Jo. 4,9; Col. 1, 18-20; Jo. 11,52.

3. Cfr. Jo. 13,34.

4. Cfr. Jo. 16,7.

5. Cfr. 1 Cor. 12, 4-11.

6. Cfr. Mt. 28, 18-20; Jo. 20, 21-23.

7. Cfr. Mt. 16,19; Mt. 18,18.

8. Cfr. Lc. 22,32.

9. Cfr. Jo. 21, 15-17.

10. Cfr. Ef. 2,20.

11. Cfr. 1 Ped. 2,25; I Conc. Vatic., Const. Pastor aeternus: Coll. Lac. 7, 482 a.

12. Cfr. Is. 11, 10-12.

13. Cfr. Ef. 2, 17-18; Mc. 16,15.

14. Cfr. 1 Ped. 1, 3-9.

15. Cfr. 1 Cor. 11, 18-19; Gal. 1, 6-9; 1 Jo. 2, 18-19.

16. Cfr. 1 Cor. 1, 11 ss.; 11,22.

17. Cfr. Conc. Florentino, ses. VIII, Decr. Exultate Deo; Mansi 31, 1055 A.

18. Cfr. S. Agostinho, In Ps. 32, Enarr. II, 29: PL 36, 299.

19. Cfr. IV Conc. Lateranense (1215), const. IV: Mansi 22, 990; II Conc. Lugdunense, Profissão de fé de Miguel Paleólogo: Mansi 24, 71 E; Conc. Florentino, Ses. VI, definição Laetentur Coeli: Mansi 31, 1026 E.

20. Cfr. Tg. 1,4; Rom. 12, 1-2.

21. Cfr. 2 Cor. 4,10; Fil. 2, 5-8.

22. Cfr. Ef. 5,27.

23. Cfr. IV Conc. Lateranense, ses. XII, Const. Constituti: Mansi 32, 988 B-C.

24. Cfr. Ef. 4,23.

25. Cfr. Ef. 3, 8.

26. Cfr. S. João Crisóstomo, In Jo. hom. XLVI: PG 59, 260-262.

27. Cfr. Conc. Florentino, ses. VI, Definição Laetentur coeli: Mansi 31, 1026 E.

28. Cfr. Rom. 6, 4.

++++++++++++++++++++++++



DECRETO
ORIENTALIUM ECCLESIARUM
SOBRE AS IGREJAS ORIENTAIS CATÓLICAS

PROÉMIO

Estima das Igrejas Orientais

1. A Igreja católica aprecia as instituições, os ritos litúrgicos, as tradições eclesiásticas e a disciplina cristã das Igrejas Orientais. Com efeito, ilustres em razão da sua veneranda antiguidade, nelas brilha aquela tradição que vem dos Apóstolos através dos Padres(1) e quê constitui parte do património divinamente revelado e indiviso da Igreja universal. Por isso, no exercício da sua solicitude pelas Igrejas Orientais, que são vivas testemunhas desta tradição, este sagrado e ecuménico Concílio, desejando que elas floresçam e realizem com novo vigor apostólico a missão que lhes foi confiada, decidiu estabelecer alguns pontos, além daquilo que diz respeito à Igreja universal, deixando o restante à providência dos Sínodos orientais e da Sé Apostólica.

AS IGREJAS PARTICULARES OU RITOS

Diversidade de ritos na unidade da Igreja

2. A santa Igreja católica, Corpo místico de Cristo, consta de fiéis que se unem orgânicamente no Espírito Santo pela mesma fé, pelos mesmos sacramentos e pelo mesmo regime. Juntando-se em vários grupos unidos pela Hierarquia, constituem as igrejas particulares ou os ritos. Entre elas vigora admirável comunhão, de tal forma que a variedade na Igreja, longe de prejudicar-lhe a unidade, antes a manifesta. Pois esta é a intenção da Igreja católica: que permaneçam salvas e íntegras as tradições de cada igreja particular ou rito. E ela mesma quer igualmente adaptar a sua forma de vida às várias necessidades dos tempos e lugares (2).

Submissão ao Romano Pontífice

3. Tais igrejas particulares, tanto do Oriente como do Ocidente, embora difiram parcialmente entre si em virtude dos ritos, isto é, pela liturgia, disciplina eclesiástica e património espiritual, são, todavia, de igual modo confiadas o governo pastoral do Pontífice Romano, que por instituição divina sucede ao bem-aventurado Pedro no primado sobre a Igreja universal. Por isso, elas gozam de dignidade igual, de modo que nenhuma delas precede as outras em razão do rito; gozam dos mesmos direitos e têm as mesmas obrigações, mesmo no que diz respeito à pregação do Evangelho em todo o mundo (cfr. Mc. 16,15), sob a direcção do Pontífice Romano.

Protecção e desenvolvimento

4. Proveja-se, portanto, no mundo inteiro, à tutela e ao incremento de todas as igrejas particulares. E onde for necessário para o bem espiritual dos fiéis, constituam-se paróquias e hierarquia própria. Mas os hierarcas das várias igrejas particulares com jurisdição no mesmo território procurem, mediante encontros periódicos, favorecer a unidade de acção; e unindo as forças, ajudem as obras comuns, a fim de promover mais desimpedidamente o bem da religião e proteger mais eficazmente a disciplina do clero (3). Todos os clérigos e os que vão ascendendo às Ordens sacras sejam bem instruídos acerca dos ritos e principalmente das normas práticas nas matérias inter-rituais; e até mesmo os leigos, na instrução catequética, sejam instruídos acerca dos ritos e suas normas. Enfim, todos e cada um dos católicos, bem como os baptizados de qualquer igreja ou comunidade acatólica que ingressarem na plenitude da comunhão católica, conservem em toda a parte o próprio rito, e observem-no na medida do possível (4). Fica, todavia, salvo o direito de recorrer em casos peculiares de pessoas, comunidades ou regiões à Sé Apostólica; esta, na qualidade de árbitro supremo das relações inter-eclesiais, proverá às necessidades com espírito ecuménico, por si mesma ou através de outras autoridades, dando as oportunas normas, decretos ou rescritos.

A CONSERVAÇÃO DO PATRIMÓNIO ESPIRITUAL DAS IGREJAS ORIENTAIS

A disciplina oriental, património da Igreja de Cristo

5. A história, as tradições e muitas instituições eclesiásticas claramente atestam quanto mereceram as Igrejas Orientais em relação à Igreja universal (5). Por isso, o sagrado Concílio não só honra este património eclesiástico e espiritual com a estimação devida e com o justo louvor, mas também o considera firmemente como património da Igreja universal de Cristo. Por esta razão, declara solenemente que tanto as Igrejas do Oriente como as do Ocidente possuem o direito e têm o dever de se regerem segundo as próprias disciplinas peculiares, enquanto se recomendam por veneranda antiguidade, são mais conformes aos costumes de seus fiéis e resultam mais aptas a buscar o bem das almas.

Conservação e restauração das antigas tradições

6. Saibam e tenham por certo todos os Orientais que sempre podem e devem observar os seus legítimos ritos litúrgicos e a sua disciplina; e que não serão introduzidas modificações a não ser em razão de um progresso próprio e orgânico. Tudo isto, pois, deve ser observado pelos próprios Orientais com a maior fidelidade. E de tudo isto devem eles adquirir um conhecimento cada vez maior e uma prática cada vez mais perfeita. E se indevidamente os abandonaram em vista das circunstâncias de tempos ou pessoas, procurem regressar às tradições ancestrais. Aqueles, porém, que, por motivos do ofício ou do ministério apostólico, têm contacto frequente com as Igrejas Orientais ou seus fiéis, busquem um melhor conhecimento e prática dos ritos, da disciplina, da doutrina, da história e da índole dos Orientais, de acordo com a importância do cargo que exercem(6). Recomenda-se com empenho às Ordens e Associações de rito latino que trabalham nos países do Oriente ou entre os fiéis orientais, que, para maior eficácia do apostolado, estabeleçam, na medida do possível, casas ou mesmo províncias de rito oriental (7).

OS PATRIARCAS ORIENTAIS

Natureza e jurisdição

7. Desde antiquíssimos tempos vigora na Igreja a instituição do Patriarcado, já reconhecida pelos primeiros Concílios ecuménicos (8). Pelo nome de Patriarca oriental entende-se o Bispo que no próprio território ou rito tem a jurisdição sobre todos os Bispos, não exceptuados os Metropolitas, sobre o clero e o povo, de acordo com a norma do direito e salvo o primado do Romano Pontífice (9). Onde quer que se constitua, fora dos limites do território patriarcal, um hierarca de algum rito, permanece ele agregado à hierarquia do Patriarcado do mesmo rito, de acordo com as normas do direito.

Igualdade entre eles na dignidade

8. Embora posteriores uns aos outros no tempo, os Patriarcas das Igrejas Orientais são, no entanto, todos iguais em razão da dignidade patriarcal, salva a precedência de honra legitimamente estatuída entre eles (10).

Restabelecimento de seus direitos e privilégios

9. Segundo a antiquíssima tradição da Igreja, singulares honras devem ser atribuídas aos Patriarcas das Igrejas Orientais, pois cada um deles preside, como pai e cabeça, ao seu Patriarcado. Por isso, estabelece este sagrado Concílio que se restaurem os seus direitos e privilégios, de acordo com as antigas tradições de cada Igreja e os decretos dos Concílios Ecuménicos (11). Estes direitos e privilégios são os que vigoravam ao tempo da união do Oriente e Ocidente, embora devam ser um pouco adaptados às condições hodiernas. Os Patriarcas com os seus sínodos constituem a instância suprema para todos os assuntos do Patriarcado, não excluído o direito de constituir novas eparquias e de nomear Bispos do seu rito dentro dos limites do território patriarcal, salvo o direito inalienável do Romano Pontífice de intervir em cada caso.

Os Arcebispos maiores

10. O que foi dito dos Patriarcas vale também, de acordo com as normas do direito, para os Arcebispos maiores, que presidem a toda uma Igreja particular ou rito (12).

Erecção de novos patriarcados

11. Sendo a instituição Patriarcal nas Igrejas Orientais a forma tradicional do regime, o sagrado e ecuménico Concílio deseja que, onde for necessário, se erijam novos Patriarcados, cuja constituição é reservada ao Concílio Ecuménico ou ao Romano Pontífice (13).

A DISCIPLINA DOS SACRAMENTOS

Conservação e restauração da disciplina oriental

12. O sagrado Concílio Ecuménico confirma, louva e, quando necessário, deseja muito que seja restaurada a antiga disciplina sacramentária vigente nas Igrejas Orientais, bem como a praxe da sua celebração e administração.

O ministro da Confirmação

13. Seja plenamente restaurada a disciplina referente ao ministro da Confirmação vigente entre os Orientais desde os tempos antigos. Por isso, os presbíteros podem conferir este sacramento com o crisma benzido pelo Patriarca ou pelo Bispo (14).

14. Todos os presbíteros orientais podem administrar este sacramento a todos os fiéis de qualquer rito, sem exceptuar o latino, quer juntamente com o Baptismo, quer separadamente, observando, porém, o que para sua liceidade é prescrito pelo direito comum ou particular (15). Também os presbíteros de rito latino, segundo as faculdades que receberam para a administração deste sacramento, podem administrá-lo aos fiéis das Igrejas Orientais sem prejuízo do rito, observadas, porém, as prescrições de direito comum ou particular no que toca à liceidade (16).

A Sagrada Eucaristia

15. Os fiéis estão obrigados nos domingos e dias de festa a participar na divina liturgia, ou, segundo as prescrições ou costumes do próprio rito, na celebração do Ofício divino (17). E para que mais fàcilmente possam cumprir esta obrigação, estabelece-se que o tempo útil para o cumprimento deste preceito decorre a partir da tarde da vigília até ao fim do domingo ou da festa (18). Com empenho se recomenda aos fiéis que nestes dias, ou até mais frequentemente, ou mesmo diàriamente, recebam a sagrada Eucaristia (19).

O Ministro da Penitência

16. Devido ao convívio diário dos fiéis das diversas igrejas particulares numa mesma região ou território oriental, a faculdade dos presbíteros de qualquer rito para ouvir confissões, concedida legitimamente e sem nenhuma restrição pelos próprios hierarcas, estende-se a todo o território daquele que concede e também aos lugares e fiéis de qualquer rito no mesmo território, a não ser que isso seja negado pelo hierarca do lugar no que diz respeito aos lugares de seu próprio rito (20).

O diaconato e as ordens inferiores

17. Para que a antiga disciplina do Sacramento da Ordem vigore novamente nas Igrejas Orientais, deseja este sagrado Concílio que a instituição do diaconado permanente seja restaurada onde caiu em desuso (21). Quanto ao subdiaconado e às ordens menores, providencie a autoridade legislativa de cada igreja particular (22).

Os matrimônios mistos

18. Para evitar matrimónios inválidos quando católicos orientais casam com acatólicos orientais baptizados, e para garantir a indissolubilidade e santidade dos casamentos e a paz doméstica, o sagrado Concílio estabelece que a forma canónica de celebração para estes matrimónios obriga tão sòmente para a liceidade. Para a validade, é suficiente a presença de um ministro sagrado, observando-se o que por direito deve ser observado (23).

O CULTO DIVINO

Os dias festivos

19. De futuro, competirá unicamente ao Concílio Ecuménico ou à Sé Apostólica constituir, transferir ou suprimir dias de festas comuns a todas as Igrejas Orientais. Além da Santa Sé, todavia, compete também aos Sínodos patriarcais e arquiepiscopais constituir, transferir ou suprimir os dias de festa para cada igreja particular, tendo-se, porém, na devida consideração, toda a região e as outras igrejas particulares (24).

A data da Páscoa

20. Enquanto não se chegar ao desejado acordo entre todos os cristãos acerca de um único dia em que seja celebrada por todos a festa da Páscoa, para favorecer a unidade entre os que vivem numa mesma região ou nação, confia-se aos Patriarcas ou às supremas autoridades do lugar que, por consenso unânime e depois de ouvidas as opiniões dos interessados, convenham sobre a celebração da festa da Páscoa no mesmo domingo (25).

O ciclo litúrgico

21. Os fiéis que residem fora da região ou território do próprio rito, podem, acerca da lei dos tempos sagrados, conformar-se inteiramente com a disciplina vigente no lugar onde moram. Nas famílias de rito mixto, é lícito observar essa lei segundo um mesmo e único rito (26).

O ofício litúrgico

22. Os clérigos e religiosos orientais celebrem segundo os preceitos e as tradições da própria disciplina o Ofício divino, que desde antiga data era tido em grande honra por todas as Igrejas Orientais (27). Seguindo o exemplo dos antepassados, os fiéis, na medida do possível, participem devotamente no Ofício divino.

O uso das línguas vernáculas

23. Ao Patriarca com o Sínodo, ou à suprema autoridade de cada igreja com o conselho dos hierarcas compete o direito de regular o uso das línguas nas cerimónias litúrgicas, bem como, depois de comunicar à Sé Apostólica, aprovar as versões dos textos em língua vernácula (28).

A CONVIVÊNCIA COM OS IRMÃOS DAS IGREJAS SEPARADAS

Importância das Igrejas orientais no movimento ecuménico

24. As Igrejas Orientais que vivem em comunhão com a Sé Apostólica de Roma compete a peculiar obrigação de favorecer, sgundo os princípios do decreto sobre o Ecumenismo deste sagrado Concílio, a unidade de todos os cristãos, principalmente dos Orientais, sobretudo pela oração e pelo exemplo de vida, pela fidelidade religiosa para com as antigas tradições orientais, pelo melhor conhecimento mútuo, pela colaboração e estima fraterna das instituições e das mentalidades (29).

A incorporação dos irmãos separados

25. Dos Orientais separados que, sob o influxo da graça do Espírito Santo, se encaminham à unidade católica, não se exija mais que a simples profissão de fé católica. E já que entre eles se conservou o sacerdócio válido, aos clérigos orientais que entram para a unidade católica dê-se a faculdade de exercerem a própria Ordem, segundo as normas estatuídas pela competente autoridade (30).

A «communicatio in sacris»

26. A communicatio in sacris que ofende a unidade da Igreja ou inclui adesão formal ao erro ou perigo de aberração na fé, de escândalo e de indiferentismo, é proibida por lei divina (31). Mas a praxe pastoral demonstra, com relação aos irmãos orientais, que se podem e devem considerar as várias circunstâncias das pessoas nas quais nem é lesada a unidade da Igreja, nem há perigos a evitar, mas urgem a necessidade de salvação e o bem espiritual das almas. Por isso, a Igreja católica, consideradas as circunstâncias de tempos, lugares e pessoas, muitas vezes tem usado e usa de modos de agir mais suaves, a todos dando os meios de salvação e o testemunho de caridade entre os cristãos através da participação nos sacramentos e em outras funções e coisas sagradas. Considerado tudo isso, o sagrado Concílio, «para não sermos, devido à severidade da sentença, impedimento para aqueles que se salvam» (32) e para mais e mais favorecer a união com as Igrejas Orientais separadas de nós, estabelece a seguinte norma:

27. De harmonia com estes princípios, podem ser conferidos aos Orientais que de boa fé se acham separados da Igreja católica, quando espontâneamente pedem a estão bem dispostos, os sacramentos da Penitência, Eucaristia e Unção dos enfermos. Também aos católicos é permitido pedir os mesmos sacramentos aos ministros acatólicos em cuja Igreja haja sacramentos válidos, sempre que a necessidade ou a verdadeira utilidade espiritual o aconselhar e o acesso ao sacerdote católico se torne física ou moralmente impossível (33).

28. Supostos estes mesmos princípios, permite-se, igualmente por justa causa, a communicatio nas funções sagradas, coisas e lugares entre católicos e irmãos separados orientais (34).

29. Esta norma mais suave da communicatio in sacris com os irmãos das Igrejas Orientais separadas, é confiada à vigilância e à moderação dos hierarcas locais, de forma que, ouvindo-se mutuamente, e, quando for o caso, ouvindo também os hierarcas das Igrejas separadas, regulem com oportunos e eficazes preceitos e normas a convivência entre cristãos.

CONCLUSÃO

Colaboração na consecução da unidade

30. Muito se alegra este sagrado Concílio pela frutuosa e activa colaboração entre as Igrejas católicas Orientais e Ocidentais, e ao mesmo tempo declara: todas estas disposições do direito se estabelecem em função das presentes condições até quando a Igreja católica e as Igrejas Orientais separadas se encontrarem na plenitude da comunhão.

Por ora, contudo, todos os cristãos, orientais e ocidentais, são vivamente exortados a que façam fervorosas, frequentes e mesmo quotidianas orações a Deus para que, com o auxílio da Santíssima Mãe de Deus, todos sejam um. Peçam ainda que aflua a plenitude do conforto e da consolação do Espírito Paráclito a tantos cristãos de toda a Igreja que, confessando corajosamente o nome de Cristo, sofrem è se angustiam.

Que nos amemos todos uns aos outros com caridade fraterna, porfiando em honrar-nos mutuamente (35).

Roma, 21 de Novembro de 1964.

PAPA PAULO VI


Notas

1. Cfr. Leão XIII, Carta Apost. Orientalium dignitas, 30 nov. 1894: Acta Leonis XIII, vol. XIV, p. 201-202.

2. Cfr. S. Leão IX, Carta In terra pax, ano 1053: «ut enim»; Inocêncio III, V Concilio Lateranense, ano 1215, cap. V: «Licet graecos»; Carta Inter quatuor, 2 ago. 1206: «Postulasti postmodum»; Inocéncio IV, Carta Cum de cetero, 27 ago. 1247; Carta Sub Catholicae, 6 março 1254, proémio; Nicolau III, Instrução Istud est memoriale, 9 out. 1278; Leão X, Carta Apost. Accepimus nuper, 18 maio 1521; Paulo III, Carta Apost. Dudum, 23 dez. 1534; Pio IV, Const. Romanus Pontifex, 16 fev. 1564, § 5; Clemente VIII, Const. Magnus Dominus, 23 dez. 1595, § 10; Paulo V, Const. Solet circunspecta, 10 dez. 1615, § 3; Bento XIV, Carta Encicl. Demandatam, 24 dez. 1743, § 3; Carta Encícl. Allatae sunt, 26 jun. 1755 §§ 3, 6-19, 32; Pio VI, Encicl. Catholicae Communionis, 24 maio 1787; Pio IX, Carta In suprema, 6 jan. 1848, § 3; Carta Apost. Ecclesiam Christi, 26 nov. 1853; Const. Romani Pontificis, 6 jan. 1862; Leão XIII, Carta Apost. Praeclara, 20 jun. 1894, n" 7; Carta Apost. Orientalium dignitas, 30 nov. 1894, proémio; etc.

3. Cfr. Pio XII, Motu proprio Cleri sanctitati, 2 jun. 1957, cân. 4.

4. Pio XII, Motu proprio Cleri sanctitati, 2 jun. 1957, cân. 8; «sine licentia Sedis Apostolicae», seguindo a praxe dos séculos precedentes; igualmente, quanto aos baptizados acatólicos, lê-se no cân. 11: «ritum quem maluerint amplecti possunt»; no texto aduzido dispõe-se de modo positivo a observãncia do rito para toda a gente e em toda a parte.

5. Cfr. Leão XIII, Carta Apost. Orientalium dignitas, 30 nov. 1894; Carta Apost. Praeclara, 20 jun. 1894, e os documentos referidos na nota n° 2.

6. Cfr. Bento XV, Motu proprio Orientis catholici, 15 out. 1917; Pio XI, Encicl. Rerum orientalium, 8 set. 1928, etc.

7. A praxe da Igreja católica nos tempos de Pio XI, Pio XII e João XXIII demonstra abundantemente este movimento.

8. Cfr. I Conc. Niceno, cân. 6; I Conc. Constantinopolitano, cân. 2 e 3; Conc. Calcedonense, cân. 28; cân. 9; IV Conc. Constantinopolitano, cân. 17; cân. 21; IV Conc. Lateranense, cân. 5; cân. 30; Conc. Florentino, Decretum pro graecis; etc.

9. Cfr. I Conc. Niceno, cân. 6; I Conc. Constantinopolitano, cân. 3; IV Conc. Constantinopolitano, cân. 17; Pio XII, Motu proprio Cleri sanctitati, cân. 216, § 2, 11.

10. Nos Concílios Ecumênicos: I Conc. Niceno, cân. 6; I Conc. Constantinopolitano, cân. 3; IV Conc. Constantinopolitano, cân. 21; IV Conc. Lateranense, cân. 5; Conc. Florentino, Decretam pro graecis, 6 jul. 1439, § 9. Cfr. Pio XII, Motu proprio Cleri sanctitati, 2 jun. 1957, cân. 219, etc..

11. Cfr. nota 8.

12. Cfr. Conc. Efesino, cân. 8; Clemente VIII, Decet Romanum Pontificem, 23 fev. 1596: Pio VII, Carta Apost. In universalis Ecclesiae, 22 fev. 1807; Pio XII, Motu proprio Cleri sanctitati, 2 jun. 1957, cân. 324-327; Conc. Cartaginense, ano 419, cân. 17.

13. Conc. Cartaginense, ano 419, cân. 17 e 57; Conc. Calcedonense, ano 451, cân. 12; S. Inocêncio I, Carta Et onus et honor, a. c. 415: «Nam quid sciscitaris»; S. Nicolau I, Carta Ad consulta vestra, 13 nov. 866: «a quo sutem»; Inocêncio III, Carta Rex regam, 25 fev. 1204; Leão XII, Const. Apost. Petrus Apostolorum Princeps, 15 ago. 1824; Leão XIII, Carta Apost. Christi Domini, ano 1895; Pio XII, Motu proprio Cleri sanctitati, 2 jun. 1957, cân. 159.

14. Cfr. Inocêncio IV, Carta Sub catholicae, 6 março 1254, § 3, n. 4; II Conc. Lugdunense, ano 1274 (profissão de fé de Miguel Paleólogo oferecida a Gregório X) ; Eugênio IV, no Conc. Florentino, Const. Exsultate Deo, 22 nov. 1439, § 11; Clemente VIII, Instrução Sanctissimus, 31 ago. 1595; Bento XIV, Const. Etsi pastoralis, 26 maio 1742, § 2, n.o 1, § 3, n.° 1, etc.; Conc. Laodicense, ano 347-381, cân. 48; Sínodo Sisen. dos Arménios, ano 1342; Sínodo Libanense dos Maronitas, ano 1736, P. II, cap. III, n.° 2, e outros Sínodos particulares.

15. Cfr. Instrução do Santo Oficio (ao Bispo de Scepusien.), ano 1783; Propaganda Fide (para os Coptas), 15 março 1790, n° XIII: Decr. 6 out. 1863, C, a; Igreja Oriental, 1 maio 1948: Santo Oficio, resp. 22 abril 1896 com a carta de 19 maio 1896.

16. C.I.C., cân. 782, § 4. Decreto para a Igreja Oriental «De sacramento Confirmationis administrando etiam fidelibus orientalibus a presbyteris latini ritus qui hoc indulto gaudeant pro fidelibus sai ritus», 1 maio 1948.

17. Cfr. Conc. Laodicense, ano 347-381, cân. 29; S. Nicéforo C. P„ cap. 14, Sín. Duinen. dos Armênios, ano 719, cân. 31; S. Teodoro Estudita, serm. 21; S. Nicolau I, carta Ad consulta vestra, 13 nov. 866: «In quorum Apostolorum»; «Nosse cupitis»; «Quod interrogatis»; «Praeterea consulitis»; «Si die Dominico»; e os Sínodos particulares.

18. Há algo de novo, ao menos onde vigora a obrigação de ouvir a sagrada liturgia; de resto, concorda com o dia litúrgico entre os orientais.

19 Cfr. Canones Apostolorum, 8 e 9; Sín. Antioqueno, ano 341, cân. 2; Timóteo Alexandrino, interrog. 3; Inocêncio III, Const. Quia divinae, 4 jan. 1215; e muitos Sinodos particulares mais recentes das Igrejas orientais.

20. Salva a territorialidade da jurisdição, o cân. pretende providenciar, para bem das almas, à pluralidade de jurisdição no mesmo território.

21. Cfr. I Conc. Niceno, cân. 18; Sín. Neocesarense, ano 314-325, cân. 12; Sin. Sardicense, ano 343, cân. 8; S. Leão M., Carta Omnium quidem, 13 jan. 444; Conc. Calcedonense, cân. 6; IV Cone. Constantin., cân. 23, 26; etc.

22. Em várias Igrejas orientais, o subdiaconado é considerado ordem menor; mas pelo Motu proprio Cleri sanctitati de Pio XII, prescreveram-se aos subdiáconos as obrigações das Ordens maiores. O cân. propõe para que se volte à disciplina antiga de cada uma das Igrejas, no que toca às obrigações dos subdiáconos, revogando o direito comum.

23. Cfr. Pio XII, Motu proprio Crebrae allatae, 22 fev. 1949, cân. 32, § 2, n.° 5.° (faculdade dos Patriarcas de dispensarem da forma); Pio XII, Motu próprio Cleri sanctitati, 2 jun. 1957, cân. 267 (faculdade dos Patriarcas de sanarem in radice); as Congregações do Santo Ofício e da Igreja oriental concedem por cinco anos fora dos Patriarcados aos metropolitas e restantes Ordinários de lugar... que não têm nenhum Superior abaixo da Santa Sé, a faculdade de dispensarem da forma e de sanarem o defeito de forma.

24. Cfr. S. Leão M., Carta Quod saepissime, 15 abril 454; «Petitionem autem»; S. Nicéforo. CP., cap. 13; Sín. do Patriarca Sérgio, 18 set. 1596, cân. 17; Pio VI, Carta Apost. Assueto paterne, 8 abril 1775, etc.

25. Cfr. Conc. Vat. II, Const. De sacra Liturgia, 4 dez. 1963.

26. Cfr. Clemente VIII, Instr. Sanctissimus, 31 ago. 1595, § 6: «Si ipsi graeci»; Santo Oficio, 7 jun. 1673, ad 1 e 3; 13 março 1727, ad 1; Propaganda Fide, Dec. 18 ago. 1913, art. 33, Decr. 14 ago. 1914, art. 27; Decr. 27 março 1916 art. 14; Congregação da Igreja oriental, Decr. 1 março 1929, art. 36; Decr. 4 maio 1930, art. 41.

27. Cfr. Conc. Laodicense, 347-381, cân. 18; Sín. Mar. de Isaac dos Caldeus, ano 410, cân. 15; S. Nerses Glaien. dos Arménios, ano 1166; Inocêncio IV, Carta Sub catholicae, 6 março 1254, § 8; Bento XIV, Const. Etsi pastoralis, 26 maio 1742, § 7, n. 5; Instr. Eo quamvis tempore, 4 maio 1745, § 42 ss. E os Sínodos particulares mais recentes: dos Armênios (1911), dos Coptas (1898), dos Maronitas (1736), dos Rumenos (1872), dos Rutenos (1891) e dos Sírios (1888).

28. E a tradição oriental.

29. Do teor das Bulas de união de cada Igreja oriental católica.

30. Obrigação sinodal quanto aos irmãos orientais separados e quanto a todas as ordens de qualquer grau quer de direito divino quer de direito eclesiástico.

31. Esta doutrina vale também para as Igrejas separadas.

32. S. Basilio M., Epístula canonica ad Amphilochium, PG 32, 669 B.

33. Considera-se fundamento de mitigação: a) a validade dos sacramentos; b) a boa fé e disposição; c) a necessidade de salvação eterna; d) a ausência do sacerdote próprio; e) a exclusão de perigos a evitar e de adesão formal ao erro.

34. Trata-se da chamada «communicatio in sacris» extra-sacramental. E o Concilio que concede a mitigação, servatis servandis.

35. Cfr. Rom. 12, 10.

++++++++++++++++++++++++



DECRETO
INTER MIRIFICA
SOBRE OS MEIOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL

PROÉMIO

Importância dos meios de comunicação social

1. Entre as maravilhosas invenções da técnica que, principalmente nos nossos dias, o engenho humano extraiu, com a ajuda de Deus, das coisas criadas, a santa Igreja acolhe e fomenta aquelas que dizem respeito, antes de mais, ao espírito humano e abriram novos caminhos para comunicar facilmente notícias, ideias e ordens. Entre estes meios, salientam-se aqueles que, por sua natureza, podem atingir e mover não só cada um dos homens mas também as multidões e toda a sociedade humana, como a imprensa, o cinema, a rádio, a televisão e outros que, por isso mesmo, podem chamar-se, com toda a razão meios de comunicação social.

Relação com a ordem moral

2. A mãe Igreja sabe que estes meios, rectamente utilizados, prestam ajuda valiosa ao género humano, enquanto contribuem eficazmente para recrear e cultivar os espíritos e para propagar e firmar o reino de Deus; sabe também que os homens podem utilizar tais meios contra o desígnio do Criador e convertê-los em meios da sua própria ruína; mais ainda, sente uma maternal angústia pelos danos que, com o seu mau uso, se têm infligido, com demasiada frequência, à sociedade humana.

Em face disto, o sagrado Concílio, acolhendo a vigilante preocupação de Pontífices e Bispos em matéria de tanta importância, considera seu dever ocupar-se das principais questões respeitantes aos meios de comunicação social. Confia, além disso, em que a sua doutrina e disciplina, assim apresentadas, aproveitarão não só ao bem dos cristãos, mas também ao progresso de toda a sociedade humana.

CAPÍTULO I

A Igreja e os meios de comunicação social

3. A Igreja católica, fundada por Nosso Senhor Jesus Cristo para levar a salvação a todos os homens, e por isso mesmo obrigada a evangelizar, considera seu dever pregar a mensagem de salvação, servindo-se dos meios de comunicação social, e ensina aos homens a usar rectamente estes meios.

À Igreja, pois, compete o direito nativo de usar e de possuir toda a espécie destes meios, enquanto são necessários ou úteis à educação cristã e a toda a sua obra de salvação das almas; compete, porém, aos sagrados pastores o dever de instruir e de dirigir os fiéis de modo que estes, servindo-se dos ditos meios, alcancem a sua própria salvação e perfeição, assim como a de todo o género humano.

Além disso, compete principalmente aos leigos vivificar com espírito humano e cristão estes meios, a fim de que correspondam à grande esperança do género humano e aos desígnios divinos.

Normas para o seu recto uso

4. Para o recto uso destes meios, é absolutamente necessário que todos os que servem deles conheçam e ponham fielmente em prática, neste campo, as normas da ordem moral. Considerem, pois, as matérias que se difundem através destes meios, segundo a natureza peculiar de cada um; tenham, ao mesmo tempo, em conta todas as circunstâncias ou condições, isto é, o fim, as pessoas, o lugar, o tempo e outros factores mediante os quais a comunicação se realiza e que podem mudar ou alterar inteiramente a sua bondade moral; entre estas circunstancias, conta-se o carácter específico com que actua cada meio, nomeadamente a sua própria força, que pode ser tão grande que os homens, sobretudo se não estão prevenidos, dificilmente serão capazes de a descobrir, dominar e, se se der o caso, a pôr de lado.

Formação de uma consciência recta sobre a informação

5. É necessário, sobretudo, que todos os interessados na utilização destes meios de comunicação formem rectamente a consciência acerca de tal uso, em especial no que se refere a algumas questões acremente debatidas nos nossos dias.

A primeira questão refere-se à chamada informação, ou obtenção e divulgação das notícias. É evidente que tal informação, em virtude do progresso actual da sociedade humana e dos vínculos mais estreitos entre os seus membros, resulta muito útil e, na maioria das vezes, necessária, pois a comunicação pública e oportuna de notícias sobre acontecimentos e coisas facilita aos homens um conhecimento mais amplo e contínuo dos factos, de tal modo que pode contribuir eficazmente para o bem comum e maior progresso de toda a sociedade humana. Existe, pois, no seio da sociedade humana, o direito à informação sobre aquelas coisas que convêm aos homens, segundo as circunstâncias de cada um, tanto particularmente como constituídos em sociedade. No entanto, o uso recto deste direito exige que a informação seja sempre objectivamente verdadeira e, salvas a justiça e a caridade, íntegra. Quanto ao modo, tem de ser, além disso, honesto e conveniente, isto é, que respeite as leis morais do homem, os seus legítimos direitos e dignidade, tanto na obtenção da notícia como na sua divulgação. Na verdade, nem toda a ciência aproveita, «mas a caridade é construtiva» ( 1 Cor. 8,1).

Sobre a relação entre arte e moral

6. Uma segunda questão se põe sobre as relações que medeiam entre os chamados direitos da arte e as normas da lei moral. Dado que, não raras vezes, as controvérsias que surgem sobre este tema têm a sua origem em falsas doutrinas sobre ética e estética, o Concílio proclama que a primazia da ordem moral objectiva há-de ser aceite por todos, porque é a única que supera e coerentemente ordena todas as demais ordens humanas, por mais dignas que sejam, sem excluir a arte. Na realidade, só a ordem moral atinge, em toda a sua natureza, o homem, criatura racional de Deus e chamado ao sobrenatural; quando tal ordem moral se observa íntegra e fielmente, condu-lo à perfeição e bem-aventurança plena.

Sobre a apresentação do mal moral

7. Finalmente, a narração, descrição e representação do mal moral podem, sem dúvida, com o auxílio dos meios de comunicação social, servir para conhecer e descobrir melhor o homem e para fazer que melhor resplandeçam e se exaltem a verdade e o bem, obtendo, além disso, oportunos efeitos dramáticos; todavia, para que não produzam maior dano que utilidade às almas, hão de acomodar-se plenamente às leis morais, sobretudo se se trata de coisas que merecem o máximo respeito ou que incitam mais facilmente o homem, marcado pela culpa original, a desejos depravados.

Justiça e caridade na formação da opinião pública

8. Visto que a opinião pública exerce hoje uma poderosa influência em todas as ordens da vida social, pública e privada, é necessário que todos os membros da sociedade cumpram os seus deveres de justiça e de caridade também nesta matéria e, portanto, que com o auxílio destes meios, se procure formar e divulgar uma recta opinião pública.

Deveres dos destinatários

9. Deveres peculiares competem a todos os destinatários da informação, leitores, espectadores e ouvintes, que, por pessoal e livre escolha, recebem as informações difundidas por estes meios de comunicação. Na realidade, uma recta escolha exige que estes favoreçam plenamente tudo o que se destaca pela perfeição, ciência e arte, e evitem, em contrapartida, tudo o que possa ser causa ou ocasião de dano espiritual para eles e para os outros, pelo mau exemplo que possam ocasionar-lhes, e o que dificulte as boas produções e favoreça as más produções e boas, o que sucede amiúde, contribuindo economicamente para empresas que somente atendem ao lucro com a utilização destes meios.

Assim, pois, para que os destinatários da informação cumpram a lei moral, devem cuidar de informar-se oportunamente sobre os juízos ou critérios das autoridades competentes nesta matéria e segui-los segundo as normas da recta consciência Todavia, para que possam, com maior facilidade, opor-se aos maus conselhos e apoiar plenamente os bons, procurem dirigir e formar a sua consciência com os recursos adequados.

Moderação e disciplina no seu uso

10. Os destinatários, sobretudo os jovens, procurem acostumar-se a ser moderados e disciplinados no uso destes meios; ponham, além disso, empenho em entenderem bem o que ouvem, lêem e vêem; dialoguem com educadores e peritos na matéria e aprendam a formar um recto juízo.

Recordem os pais que é seu dever vigiar cuidadosamente por que os espectáculos, as leituras e coisas parecidas que possam ofender a fé ou os bons costumes não entrem no lar e por que os seus filhos não os vejam noutra parte.

Deveres dos realizadores e autores

11. Importante obrigação moral incumbe, quanto ao bom uso dos meios de comunicação social, aos jornalistas, escritores, actores, produtores, realizadores, exibidores, distribuidores, empresários e vendedores, críticos e, além destes, a todos quantos intervêm na realização e difusão das comunicações. Na realidade, é de todo evidente a transcendente importância desta obrigação nas actuais condições humanas, já que eles, informando e incitando, podem encaminhar recta ou torpemente o género humano.

Portanto, é sua missão tratar as questões económicas, políticas ou artísticas de modo que não causem prejuízo ao bem comum; para se conseguir isto mais facilmente, bem será que se associem profissionalmente – incluindo-se, se for necessário, o compromisso de observar, desde o começo, um código moral – àquelas associações que imponham a seus membros o respeito pelas leis morais nas empresas e trabalhos da sua profissão.

Lembrem-se sempre de que a maior parte dos leitores e espectadores é composta de jovens necessitados de imprensa e de espectáculos que lhes ofereçam exemplos de moralidade e os estimulem a sentimentos elevados. Procurem, além disso, que as comunicações sobre assuntos religiosos se confiem a pessoas dignas e peritas e se tratem com a devida reverência.

Deveres das autoridades civis

12. As autoridades civis têm peculiares deveres nesta matéria em razão do bem comum ao qual se ordenam estes meios. Em virtude da sua autoridade e em função da mesma, compete-lhes defender e tutelar a verdadeira e justa liberdade de que a sociedade moderna necessita inteiramente para seu proveito, sobretudo no que se refere à imprensa; promover a religião, a cultura e as belas artes; defender os receptores, para que possam gozar livremente dos seus legítimos direitos. Por outro lado, à autoridade civil compete fomentar aquelas iniciativas que, sendo especialmente úteis à juventude, não poderiam de outro modo ser realizadas.

Por último, a mesma autoridade pública, que legitimamente se ocupa da saúde dos cidadãos, está obrigada a procurar justa e zelosamente, mediante a oportuna promulgação e diligente execução das leis, que não se cause dano aos costumes e ao progresso da sociedade através de um mau uso destes meios de comunicação. Essa cuidada diligência não restringe, de modo algum, a liberdade dos indivíduos ou das associações, sobretudo quando faltam as devidas precauções por parte daqueles que, por motivo do seu oficio, manejam estes meios.

Tenha-se um especial cuidado em proteger os jovens contra a imprensa e os espectáculos que sejam perniciosos para a sua idade.

CAPÍTULO II

Os meios de comunicação social e o apostolado

13. Procurem, de comum acordo, todos os filhos da Igreja que os meios de comunicação social se utilizem, sem demora e com o máximo empenho nas mais variadas formas de apostolado, tal como o exigem as realidades e as circunstâncias do nosso tempo, adiantando-se assim às más iniciativas, especialmente naquelas regiões em que o progresso moral e religioso reclama uma maior atenção.

Apressem-se, pois, os sagrados pastores a cumprir neste campo a sua missão, intimamente ligada ao seu dever ordinário de pregar. Por seu lado, os leigos que fazem uso dos ditos meios, procurem dar testemunho de Cristo, realizando, em primeiro lugar, as suas próprias tarefas com perícia e espírito apostólico, e oferecendo, além disso, no que esteja ao seu alcance, mediante as possibilidades da técnica, da economia, da cultura e da arte, o seu apoio directo à acção pastoral da Igreja.

Iniciativas dos católicos

14. Há que fomentar, antes de mais, a boa imprensa. Porém, para imbuir plenamente de espírito cristão os leitores, deve criar-se e difundir-se uma imprensa genuinamente católica que – sob o estímulo e a dependência directa quer da autoridade eclesiástica quer de homens católicos – editada com a intenção de formar, afirmar e promover uma opinião pública em consonância com o direito natural e com a doutrina e princípios católicos, ao mesmo tempo que divulga e desenvolve adequadamente os acontecimentos relacionados com a vida da Igreja. Devem advertir-se os fiéis da necessidade de ler e difundir a imprensa católica para conseguir um critério cristão sobre todos os acontecimentos.

Promovam-se por todos os meios eficazes e assegurem-se a todo o custo a produção e a exibição de filmes destinados ao descanso honesto do espírito, proveitosos para a cultura e arte humana, sobretudo aqueles que se destinam à juventude; isto consegue-se, sobretudo, apoiando e coordenando as realizações e as iniciativas honestas, tanto da produção como da distribuição, recomendando as películas que merecem elogio por juízo concorde e pelos prémios dos críticos, fomentando e associando entre si as salas pertencentes a bons empresários católicos.

Preste-se, também, apoio eficaz às emissões radiofónicas e televisivas honestas, antes de mais àquelas que sejam apropriadas para as famílias. E fomentem-se com todo o interesse as emissões católicas, mediante as quais os ouvintes e os espectadores sejam estimulados a participar na vida da Igreja e se compenetrem das verdades religiosas. Com toda a solicitude, devem promover-se, onde for oportuno, as estações católicas; cuide-se, porém, que as suas transmissões primem pela sua perfeição e pela sua eficácia.

Cuide-se, enfim, de que a nobre e antiga arte cénica, que hoje se propaga amplamente através dos meios de comunicação social, trabalhe a favor dos valores humanos e da ordenação dos costumes dos espectadores.

Formação técnica e apostólica para o seu uso

15. Para prover às necessidades acima indicadas hão-de formar-se oportunamente sacerdotes, religiosos e também leigos, que possuam a devida perícia nestes meios e possam dirigi-los para os fins do apostolado.

Em primeiro lugar, devem ser instruídos os leigos na arte, doutrina e costumes, multiplicando o número das escolas, faculdades e institutos, onde os jornalistas, autores cinematográficos, radiofónicos, de televisão e demais interessados possam adquirir uma formação íntegra, penetrada de espírito cristão, sobretudo no que toca à doutrina social da Igreja. Também os actores cénicos hão-de ser formados e ajudados para que sirvam convenientemente, com a sua arte, a sociedade humana. Por último, hão-de preparar-se cuidadosamente críticos literários, cinematográficos, radiofónicos, da televisão e outros meios, que dominem perfeitamente a sua profissão, preparados e estimulados para emitir juízos nos quais a razão moral apareça sempre na sua verdadeira luz.

Formação da juventude

16. Tendo-se na devida conta que o uso dos meios de comunicação social, que se dirigem a pessoas diferentes na idade e na cultura, requer nestas pessoas uma formação e uma experiência adequadas e apropriadas, devem favorecer-se, multiplicar-se e encaminhar-se, segundo os princípios da moral cristã, as iniciativas que sejam aptas para conseguir este fim – sobretudo se se destinam aos jovens – nas escolas católicas de qualquer grau, nos Seminários e nas associações apostólicas dos leigos. Para que se obtenha isto com maior rapidez, a exposição e explicação da doutrina e disciplina católicas nesta matéria devem ter lugar no ensino do catecismo.

Ajuda económica

17. Como não convém absolutamente aos filhos da Igreja suportar insensivelmente que a doutrina da salvação seja obstruída e impedida por dificuldades técnicas ou por gastos, certamente volumosos, que são próprios destes meios, este sagrado Concílio chama a atenção para a obrigação de sustentar e auxiliar os diários católicos, as revistas e iniciativas cinematográficas, as estações e transmissões radiofónicas e televisivas, cujo fim principal é divulgar e defender a verdade, e prover à formação cristã da sociedade humana. Igualmente convida insistentemente as associações e os particulares, que gozam de uma grande autoridade nas questões económicas e técnicas, a sustentar com largueza e de bom grado, com os seus bens económicos e a sua perícia, estes meios, enquanto servem o aposto lado e a verdadeira cultura.

Dia mundial

18. Para que se revigore o apostolado da Igreja em relação com os meios de comunicação social, deve celebrar-se em cada ano em todas as dioceses do mundo, a juízo do Bispo, um dia em que os fiéis sejam doutrinados a respeito das suas obrigações nesta matéria, convidados a orar por esta causa e a dar uma esmola para este fim, a qual ser destinada a sustentar e a fomentar, segundo as necessidades do orbe católico, as instituições e as iniciativas promovidas pela Igreja nesta matéria.

Organismo da Santa Sé

19. Para exercitar a suprema cura pastoral sobre os meios de comunicação social, o Sumo Pontífice tem à sua disposição um peculiar organismo da Santa Sé (1).

Vigilância e solicitude pastoral dos Bispos

20. Será da competência dos Bispos, nas suas próprias dioceses, vigiar estas obras e iniciativas e promovê-las e, enquanto tocam ao apostolado público, ordená-las, sem excluir aquelas que se encontram submetidas à direcção dos religiosos isentos.

Organismos nacionais

21. Todavia, como a eficácia do apostolado em toda a nação requer unidade de propósitos e de esforços, este sagrado Concílio estabelece e manda que em toda a parte se constituam e se apoiem, por todos os meios, secretariados nacionais para os problemas da imprensa, do cinema, da rádio e da televisão. A missão destes secretariados será de velar por que a consciência dos fiéis se forme rectamente sobre o uso destes meios e estimular e organizar tudo o que os católicos realizem neste campo.

Em cada nação, a direcção destes secretariados há-de confiar-se a uma Comissão especial do Episcopado ou a um Bispo delegado. Nestes secretariados, hão de participar também leigos que conheçam a doutrina da Igreja sobre estas actividades.

Associações Internacionais

22. Posto que a eficácia de tais meios ultrapassa os limites das nações, e é como se convertesse cada homem em cidadão da humanidade, cooperem as iniciativas deste género, tanto no plano nacional como no internacional. Aqueles secretariados, de que se fala no número 21, hão-de trabalhar denodadamente em união com a sua correspondente Associação católica internacional. Estas Associações católicas internacionais, porém, são legitimamente aprovadas só pela Santa Sé e dela dependem.

CLÁUSULAS

Preparação de uma instrução pastoral pontifícia

23. Para que todos os princípios deste sagrado Concílio e as normas acerca dos meios de comunicação social se levem a efeito, publicar-se-á, por expresso mandato do Concilio e com a colaboração de peritos de várias nações, uma instrução pastoral; a sua publicação ficar a cargo do organismo da Santa Sé, de que se fala no número 19.

Exortação final

24. Além do mais, este sagrado Concílio confia em que estas instruções e normas serão livremente aceites e santamente observadas por todos os filhos da Igreja, os quais, por esta razão, ao utilizarem tais meios, longe de padecer dano, como sal e como luz darão sabor à terra e iluminarão o mundo. O Concílio convida, além disso, todos os homens de boa vontade, especialmente aqueles que dirigem estes meios, a que se esforcem por os utilizar a bem da sociedade humana, cuja sorte depende cada dia mais do uso recto deles.

Assim, pois, como nos monumentos artísticos da antiguidade, também agora, nos novos inventos, deve ser glorificado o nome do Senhor, segundo o que diz o Apóstolo: «Jesus Cristo, ontem e hoje, Ele mesmo por todos os séculos dos séculos» (Hebr. 13,8).

Vaticano, 4 de Dezembro de 1966.

PAPA PAULO VI


(1) Os Padres do Concílio, fazendo seu o voto do «Secretariado para a Imprensa e para a orientação dos Espectáculos», reverentemente pedem ao Sumo Pontífice que estenda as obrigações e competências deste organismo a todos os meios de comunicação social sem excluir a imprensa, associando a ele especialistas das diferentes nações, entre os quais também leigos.




Nenhum comentário:

Postar um comentário